ANÁLISE SEMIÓTICA PEIRCEANA DA 5ª CENA DO ESPETÁCULO DE DANÇA INDÍGENA “KEDACERY” DA UATÊ COMPANHIA DE DANÇA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102501281049


Ismael Maciel de Menezes Filho
Orientador: Prof. Dr. Caio Augusto Teixeira Souto


Resumo: Este Trabalho de pesquisa apresenta uma análise de interpretações de espectadores, relacionado a um trecho do espetáculo Kedacery da UATÊ Cia de Dança, com tradução pela Semiótica Peirceana, feita pelo presente pesquisador. Baseado no teórico Charles Sanders Peirce, falará um pouco sobre a trajetória da representante da companhia “Mara Pacheco”, um pouco da cia “UATÊ”. Para fazer uma análise semiótica é muito importante lembrar que a interpretação está inteiramente ligada ao repertório cultural e social em que sujeito espectador está inserido, ou seja, devem-se levar em conta todas as suas experiências e vivências, pois cada indivíduo pode interpretar da sua própria maneira. Pensando nisso, as interpretações foram captadas de alunos do primeiro ano do ensino médio e a pesquisa esteve voltada a análise semiótica de tudo o que a cena estava sendo proposto no espetáculo de dança, tais como figurino, objetos, cenário e, principalmente, os movimentos, fazendo a percepção das interpretações dos alunos e relacionando-as com a proposta do criador. Os resultados obtidos foram significativos, os alunos fizeram suas interpretações de uma forma sucinta, por não terem vivência com o que estava sendo proposto, mas suas interpretações foram suficientes para obtenção dos resultados.

Palavras–chave: Semiótica Peirceana. Análise. Interpretação.

Abstract: This research work presents an analysis of spectators’ interpretations, related to an excerpt from the show Kedacery by UATÊ Cia de Dança, translated by Semiótica Peirceana, made by the present researcher. Based on the theorist Charles Sanders Peirce, he will talk a little about the trajectory of the company representative “Mara Pacheco”, a little about the company “UATÊ”. To carry out a semiotic analysis, it is very important to remember that interpretation is entirely linked to the cultural and social repertoire in which the spectator is inserted, that is, all their experiences and experiences must be taken into account, as each individual can interpret in their own way. own way. With this in mind, the interpretations were captured from first-year high school students and the research was focused on the semiotic analysis of everything that the scene was being proposed in the dance show, such as costumes, objects, scenery and, mainly, the movements , perceiving the students’ interpretations and relating them to the creator’s proposal. The results obtained were significant, the students made their interpretations succinctly, as they had no experience with what was being proposed, but their interpretations were sufficient to obtain the results.

Keywords: Peircean Semiotics. Analysis. Interpretation.

Introdução

Este estudo problematiza a seguinte questão: Como a semiótica Peirceana pode auxiliar a análise das interpretações dos alunos as práticas corporais presentes na dança do espetáculo Kedacery, da Companhia de dança Uatê? (Cia de dança indígena da Região Norte). Para auxiliar no desenvolvimento do presente trabalho, a hipótese deste estudo se respalda no

pressuposto de que dança não se comunica de forma literal ou em tradução direta ao que a artista intenta mostrar, sendo neste prospecto da interpretação, que a pesquisa pretende investigar. Tal hipótese é fundamentada na lógica de que o campo de atuação da semiótica é relativamente complexo e os pesquisadores ainda não adquiriram resiliência suficiente para lidarem com a gama de possibilidade aferentes e eferentes que esta ciência oferece.

O foco da pesquisa será a análise semiótica peirceana, levando em conta a percepção da interpretação do aluno espectador e relacionando-a com a proposta apresentada pelo coreógrafo. Diante disso, buscar-se-á compreender a interpretação de cada aluno espectador, considerando a conclusão analítica e se cada coreógrafo (a) e/ou bailarino (a) está conseguindo fazer com que o expectador reconheça o que está sendo proposto por eles em sua obra.

Com relação a abordagem, a pesquisa foi de cunho qualitativo, sendo o espetáculo Kedacery o objeto de pesquisa dentre os espetáculos de dança do Brasil. Tem como objetivo analisar as interpretações dos alunos através da semiótica peirceana uma cena do espetáculo Kedacery, da UATÊ Companhia de Dança da Região Norte. E seus objetivos específicos são: relacionar as interpretações dos alunos espectadores frente a cena do espetáculo Kedacery à ideia repassada pelo coreógrafo durante a apresentação; identificar se a obra pode ou não revelar a tricotomia Peirceana; verificar se a interpretação dos alunos espectadores estão sendo de acordo tal como o coreógrafo quis propor ao seu público.

Um dos motivos que levou ao proponente do estudo a desenvolver esta pesquisa foi o pioneirismo da temática no contexto da dança e a importância de se compreender o significado no dizer artístico da obra, de modo a se verificar se o público-alvo está conseguindo compreender o significado através do gestual da dança e dos elementos usados para compor a cena. Essa abordagem se faz pertinente, pois durante a desenvoltura dos referidos artistas, ao longo de um espetáculo, surgem diversos comentários do público em geral acerca do que fora encenado, atribuindo-se possíveis significados às ações realizadas. Menciona-se que tais interpretações são importantes e condutoras pois instigam o imaginário do público em conhecer o real significado por detrás de tamanha criatividade quando o que está em questão é o cerne da interpretação como fenômeno semiótico em evidência.

O presente manuscrito tem como pretensão mostrar as diversas interpretações de cada aluno espectador para se chegar à validação ou não da hipótese elaborada, a partir da tentativa de resolução da problemática proposta. Pretende-se verificar se cada aluno espectador tem uma interpretação diferente do espetáculo apresentado e se o (a) coreógrafo (a) e/ou bailarino (a) consegue fazer o público reconhecer a significação da proposta cênica por eles executada.

Salienta-se que esta pesquisa se justifica devido ao seu proponente acreditar que há necessidade de amplo colóquio para um debate de melhor entendimento sobre como o aluno espectador compreende a obra do espetáculo em uma perspectiva semiótica. Acredita-se que o espetáculo Kedacery possui um valoroso trabalho de criatividade e inovação com um repertório de apresentações potenciais no que tange à cenários, ao figurino, à música e à coreografia, que permitem realizar o espetáculo sem perder a essência de um discurso claro e diversificado.

Justifica-se ainda, a realização deste estudo pelo aprofundamento da semiótica no contexto da coreografia contemporânea que reflita uma posição de reflexão crítica ampliada no atual cenário da temática. Tal justificativa perfaz uma delimitação respaldada também no ensino pedagógico das artes, com um caminho metodológico baseado em um estudo inicialmente de ordem teórica-reflexiva para, posteriormente, assumir um caráter pragmático. Essa discussão, portanto, faz-se necessária por abarcar possíveis resultados ainda desconhecidos por grande parte da sociedade e comunidade científica.

Semiótica Pierciana

Optou-se por utilizar os estudos teóricos da semiótica Peirceana pela condição metodológica (por meio de manejo alternativo) de discussões críveis que proporciona ao objeto de estudo. A semiótica Peirceana, nesse contexto, pela interdisciplinaridade entre várias ciências, produz sentidos e significados com concepções pedagógicas e artísticas com significações múltiplas, o que permite o seu manejo alternativo adaptando-a à contextualização desta pesquisa adequadamente. Nesse sentido, a compreensão dos movimentos e gestos executados ao longo do espetáculo se faz necessária por refletir a cultura do discurso defendido. A partir desse enfoque, a coreografia demonstra qual o grau de complexidade e pluralidade de sentidos culturais que apresenta e se o espectador realmente percebeu, em suas concepções, o real entendimento da ação coreográfica.

Justifica-se ainda, a realização deste estudo, pelo aprofundamento da semiótica Peirceana no contexto da coreografia de dança moderna com características indígenas que reflita uma posição de reflexão crítica ampliada no atual cenário da temática. Tal justificativa perfaz uma delimitação respaldada também no ensino pedagógico das artes, com um caminho metodológico baseado em um estudo inicialmente de ordem teórica-reflexiva para, posteriormente, assumir um caráter pragmático. Essa discussão, portanto, faz-se necessária por abarcar possíveis resultados ainda desconhecidos por grande parte da sociedade e comunidade científica.

Tricotomia Peirceana

Objeto: O ritual indígena, assunto principal da cena.

Representamen: O próprio espetáculo (Que é a obra artística que está representando o ritual indígena).

Interpretante: Tudo que o espectador compreendeu sobre o ritual indígena na sua profundidade. Nas duas cenas seguintes nominadas, respectivamente, os rituais de Pajelança e Dabacuri, entram em cena dois bailarinos representando os outros dois pajés (onça e pajé sacaca) e dançam. Depois Kedacery faz o ritual da pajelança e, nesse momento, ouve-se a voz do verdadeiro pajé Sr. Kedacery (gravação de voz). Surge um canto de chamado para o dabucuri (voz da esposa do verdadeiro Kedacery), os bailarinos entram em cena com bastões de ritmo e convidam o público para a grande festa em homenagem ao grande Pajé Kedacery.

Espetáculo Kedacery: contextualização e descrição das cenas

A roteirização do espetáculo Kedacery foi desenvolvida a partir de diálogos com os tariana. “Os Tariana” são um dos 20 povos indígenas que vivem na região do Alto Rio Negro, no estado do Amazonas, e na região de fronteira com a Colômbia. E se concentram em grande maioria às margens do rio Uaupés. O prólogo do espetáculo Kedacery consiste no ritual de passagem dos povos: Primeiramente, ocorre o ritual com o menino em sua fase jovem. Nesse ritual surge o velho pajé e o apresenta aos quatro bastões-caniços, o pajé oferece um rolo de pimenta para que o jovem possa aspirar o cheiro e passar na superfície facial. Ele faz o “benzimento” dos bastões com a pimenta e começa a bater no jovem, chicoteá-lo dos pés à cabeça para que o protótipo infantil desvaneça e dê lugar ao espírito adulto. Depois do ritual de passagem o Kedacery já pode ser considerado homem, então escolhe uma esposa.

O benzimento ou a invocação serve para o futuro pajé ter o dom da sabedoria e aprender a invocar os Deuses. Após o benzimento se invoca um ser mítico conhecido como Biciu, pai da Floresta, o maior ser capaz de engolir todos os seres humanos, e junto com ele os espíritos do Miniá (três tipos de pássaros que o acompanham: o Pássaro Verde Picu-picu que avisa sobre possíveis existências de humanos na região; o Pássaro do Lago que traz as cordas da sabedoria nas cores verde, preto, vermelho. E o Pássaro Arcaroti cujo som causa uma espécie de embriaguez (capaz de deixar o indígena candidato a pajé tonto). O mítico Biciu puxa a alma do indígena com seus braços e dedos em formato de “bastão de ritmo”. O Biciu porta todas as

músicas nativas dali (mawaco, cariçu). Daí, com a devida musicalidade, ele invoca o espírito da bebida e torna a mente do Kedacery aberta para receber todos os poderes.

Terminando a invocação, outro pajé leva um cigarro e o kaahpi (bebida) para o jovem que vai ser o pajé e sopra nele a “fumaça mágica” que é o receptar do espírito de Biciu, que finalmente se incorpora no jovem Kedacery. Nesse momento Biciu começa a tocar e fazer benzimentos e o velho pajé compartilha ensinamentos para o aprendiz não perder o poder. Então eles passam a noite conversando sobre os benzimentos e no intervalo tocam as músicas, e quando acordam, o candidato a pajé já é considerado literalmente “pajé”. A mulher do pajé prepara o mingau e o peixe para o pajé e é ela que passa a cuidar dele pelos próximos anos.

A quinta cena designa a passagem da sabedoria para o novo pajé, entra a ritual um intérprete representando o pajé velho que dança em redor de Kedacery e em gestos lhe oferece uma bebida. Em seguida, o jovem dança com movimentos cambaleantes, sinuosos, e depois sobe no tecido, momento solo de Kedacery em que demonstra o momento de êxtase sob o poder de Biciu.

Quinta cena do espetáculo de dança indígena “Kedacery” https://drive.google.com/file/d/14MhzZbeMfkaoryh0NHmcGbBCZx8M_466/view?us

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Procedimento Metodológico

A metodologia desta pesquisa, sendo de abordagem qualitativa, consiste em uma análise semiótica dos gestos e movimentos em uma performance de dança moderna que incorpora elementos da cultura indígena. A pesquisa, dentre outros objetivos, visa compreender como os signos corporais presentes na dança, ao se entrelaçarem com referências culturais tradicionais, são interpretados e ressignificados pelos alunos. A análise será dividida em três etapas: observação e seleção da performance, análise semiótica dos gestos, e entrevistas com os alunos.

Após coletar e ouvir as interpretações dos alunos, foi feito uma análise semiótica das interpretações seguindo a tricotomia (Representamen, Objeto e Interpretante) de Charles Sanders Peirce, dos alunos “Esmeralda” e “Lótus”, em relação a cena do espetáculo Kedacery da UATÊ cia de dança da Região Norte. Através desse procedimento de análise de dados elencamos alguns tópicos principais para discussão e elaboração desta análise, sendo eles: Elementos cênicos e Gestos e movimentos.

Os sujeitos da pesquisa serão alunos do 1º ano do ensino médio do Instituto Federal do Amazonas – IFAM no Município de Manacapuru-AM. Menciona-se que a referida escolha da localidade aconteceu por meio de sorteio entre as escolas (municipais, estaduais e federal) do município de Manacapuru, AM, a qual pudesse contemplar, aleatoriamente, sem ser por escolha pessoal do proponente deste estudo. Cada aluno será escolhido igualmente por critério de sorteio durante a pesquisa exploratória.

Análise dos Elementos Cênicos: Primeira Tricotomia Representamen

Aluna Esmeralda

Em relação a 1ª tricotomia representamen, ou seja, o espetáculo em si em geral, verificamos em primeiridade, no quali-signo, que a aluna identificou as cores da iluminação e das roupas, que na sua percepção eram cores fortes e claras, como o azul marinho, preto, marrom e verde; em secundidade; o sin-signo é definido que seja algo indígena pelos objetos, identificando a cuia; e em terceiridade; o legi-signo define que realmente a cuia, percebida no sin signo, leva ao legi signo de que se trata de um ambiente indígena. Nessa junção das cores das roupas do cenário, da iluminação, e dos objetos indígenas usados na cena, pode-se concluir que a aluna percebeu o(s) representamen(s) da cena, ou seja informações que a levaram a perceber que se tratava de um ambiente indígena.

Aluno Lótus

Em relação a 1ª tricotomia representamen, verificamos em primeiridade, no quali- signo, o aluno identificou a cor verde da iluminação; o sin-signo é definido que seja algo indígena pelos objetos centrais, tais como um pote de barro, um vaso que carrega algo que se assemelha a um cachimbo; e em terceiridade; o legi-signo define que os objetos estão relacionados a um ambiente indígena.

Para entender melhor sobre a função do representamen, faz se entender que é aquilo que funciona como representante do signo para quem o percebe. A 1ª. tricotomia mostra o processo de identificação desse representamen, das cores e formas até a definição concreta dele. Relacionando isso as interpretações dos alunos, vimos que eles conseguem perceber essas representações do objeto da cena.

Vale ressaltar que segundo Peirce (2005, p. 52) o qualissigno é a qualidade do signo; o sinsigno é formado por vários qualissignos, mas de um tipo particular que só constituem um signo quando se corporificam; já o Legissigno geralmente é estabelecido pelo homem e que todo o signo é um legissigno, e possui um caráter de lei, esse signo descreve inúmeros objetos, de ordem generalizada, sobre o que e como ele representa.

[…] Um Qualissigno é uma qualidade que é um Signo. Não pode realmente atuar como signo até que se corporifique; mas esta corporificação nada tem a ver com seu caráter como signo. Um Sinsigno (onde a silaba sin é considerada em seu significado de “uma única vez’”, como em singular, simples, no Latim 7emel, etc. é uma coisa ou evento existente e real que é um signo. E só o pode ser através de suas qualidades, de tal modo que envolve um qualissigno ou, melhor, vários qualissignos. Mas estes qualissignos são de um tipo particular e só constituem um signo quando realmente se corporificam. Um Legissigno é uma lei que é um signo. Normalmente, esta lei é es estabelecida pelos homens. Todo signo convencional é um legissigno (porém a recíproca não é verdadeira). Não é um objeto singular, porém um tipo geral que tem-se concordado, será significante. Todo legissigno significa através de um caso de sua aplicação, que pode ser denominada Réplica. […] (PEIRCE, 2005, p. 52).

Análise dos Elementos Cênicos: Segunda Tricotomia Objeto

Aluna Esmeralda

Em relação a 2ª tricotomia objeto, ou seja, ao assunto da obra artística, do que ela se trata, em primeiridade, identifico que o ícone em relação ao elemento cênico não há um objeto icônico que tenha uma relação direta com o ritual indígena; em secundidade, o índice é o objeto cênico, a cuia, mesmo tendo outros objetos na cena, a aluna deu ênfase a esse objeto usado na cena do espetáculo, que dá uma relação direta ao objeto, exemplo, na hora que ele usa a cuia para dar a bebida aos índios (onde já entra o gestual); em terceiridade, o objeto cênico também podem ser o símbolo, pois eles têm uma associação direta e de lei com o assunto da obra que definem a ideia de se tratar de um ritual indígena.

Aluno Lótus

Em relação a 2ª tricotomia objeto, em primeiridade, identifico que o ícone em relação ao elemento cênico não há um objeto icônico que tenha uma relação direta com o ritual indígena; em secundidade, o índice é tudo que indica esse objeto cênico, objetos centrais, tais como pote, cuia, vaso, peneira, o aluno não consegue dizer quais, mas visualmente sabe que o objeto é característico do cotidiano dos povos indígenas; em terceiridade, o objeto cênico também podem ser o símbolo, pois eles têm uma associação direta que definem uma ideia, a “lei” desta ideia, por exemplo, uma roupa de penas e palhas revestindo o corpo dos atores e os utensílios manipulados.

O objeto traz o signo de uma forma abstrata, não é o signo propriamente dito, mas ele se assemelha ao signo, podendo ser uma imagem, palavra. Dando um exemplo através das interpretações dos alunos, é a forma como eles relacionam os objetos, iluminação e figurinos àquilo que o espetáculo está propondo enquanto obra, então através desses elementos cênicos conseguem identificar que se trata de um ritual indígena.

Análise dos Elementos Cênicos: Terceira Tricotomia Interpretante

Aluna Esmeralda

Por último, a 3ª tricotomia, com relação ao interpretante, ou seja, àquilo que se compreendeu, interpretou, a partir dos elementos cênicos. Em primeiridade, a rema vem como a primeira hipótese, primeira interpretação, quase que instintiva. De início as cores, roupas e objetos trouxeram uma compreensão de que se travava de algo da natureza e indígena, mas ainda sem um contexto; em secundidade, o discente afirma que as cores e o objeto cênico definem se tratar de um ritual indígena; em terceiridade, o argumento é algo pessoal, é a complexidade racional do signo.

E sobre os objetos cênicos a aluna diz:

[…] As cores das roupas, chamavam mais atenção, as cores do fundo, eram umas cores fortes, tipo umas cores claras, isso me chamou mais atenção. Foi que atrás era tipo que meio azul marinho com algumas partes pretas, um marrom bem escuro mesmo, outras partes eram as que estavam nas roupas, era um verde. Deixa dar um exemplo, um verde bem claro e o preto, um preto bem forte e havia uma outra cor, mas só que eu me esqueci qual era que me chamam bastante atenção também. […]. “Eu acho que era uma origem deles, uma origem indígena, acho que era isso, pelo que eu vi assim, do modo que ele deu a bebida na cuia (Esmeralda, entrevista 2021).

Aluno Lótus

Por último, a 3ª tricotomia, com relação ao interpretante. Em primeiridade, a rema vem como primeira hipótese. De início a iluminação, roupas e objetos trouxeram uma compreensão, mas ainda sem um contexto, quando ele diz que a cor verde da iluminação lhe traz em mente uma floresta. Podemos afirmar, portanto, que em termos iniciais, o aluno percebeu o ambiente indígena e que a cena se trataria de algo neste contexto, apesar de serem percepções apenas iniciais; em secundidade, o discente observa que as cores e os objetos cênicos afirmam se tratar de um lugar que não seja uma cidade e que realmente está ligado a algo indígena; em terceiridade, o argumento é algo pessoal, é a complexidade racional do signo e sobre os objetos cênicos o aluno diz:

Acho que foi o ‘verdinho’ que se encontra no fundo, tipo ‘umas luzinhas’ eu acho que, como se estivesse em uma floresta”. “as vestimentas são bem típicas aos dos indígenas, foi a primeira coisa que eu percebi, os objetos que estavam no local […] que deram para perceber que era um ritual (Lótus, entrevista 2021).

Essa tricotomia é o foco desta pesquisa, onde se vê a capacidade de interpretação do signo, onde o sujeito começa a ter sua a relação íntima com o signo, é onde suas experiências com o signo faz com que cada um tenha uma ideia e percepção diferente relacionado ao mesmo signo. Deste modo, vemos que os alunos conseguiram identificar através do cenário, iluminação, junto com os figurinos e os objetos usados em cenas, que o vídeo contento a cena do espetáculo Kedacery se tratava de um ritual com origens indígenas.

Análise dos Gestos e Movimentos: Primeira Tricotomia Representamen

Aluna Esmeralda

Analisando a interpretação da aluna espectadora, a 1ª tricotomia em relação ao representamen, ou seja, todos aqueles gestos que representam o assunto da obra em si. Temos em primeiridade, o quali-signo, as formas, a aluna diz que alguns movimentos eram expressivos e outros leves e corpo parado; em secundidade o sin-signo é concretizado que se trata de algo indígena através dos movimentos na qual se deslocavam, movimentos de animais e outros com movimentos contínuo; e em terceiridade, o legi-signo define que está relacionado a um ritual e a vida indígena.

Aluno Lótus

Analisando a interpretação do aluno espectador, a 1ª tricotomia em relação ao representamen. Temos em primeiridade, o quali-signo, as formas, o aluno diz que se destacam nos movimentos expressivos, deslocamento e giratórios; em secundidade o sin-signo é identificado os movimentos na qual o índio conduz a cuia até o outro índio, os movimentos de animais de quatro patas e movimentações do corpo girando; e em terceiridade, o legi-signo define que está relacionado a um ritual e a vida indígena.

Qualquer coisa nesse mundo perceptivo ao nosso olhar pode ser um signo e essas três propriedades formam a identificação de um signo. O nosso cérebro é capaz de identificar isso em milésimos de segundos e a tricotomia como um todo mostra esse processo de reconhecimento. Neste caso do representamen, os alunos conseguiram identificar os gestos e movimentos o que o autor estava propondo em sua obra, desde as linhas e formas do quali- signo, os aspectos que individualizam no sin-signo (identificando do que se tratavam tais formas) e as aplicações de perspectivas no legi-signo.

Análise dos Gestos e Movimentos: Segunda Tricotomia Objeto

Aluna Esmeralda

A 2ª tricotomia em relação ao objeto, ou seja, tudo que os gestos e movimentos podem provocar de relação direta com o assunto da obra: em primeiridade, relacionado ao ícone a aluna se referiu indiretamente a expressão dos movimentos dizendo que representava um ritual; em secundidade, deu referência ao índice, disse que esses movimentos e gestos fortes usados pelos bailarinos na cena do espetáculo fizeram com que ela identificasse que eram movimentos indígenas; em terceiridade, esses gestos e movimentos fortes e expressivos colocados pela aluna também foram utilizados para identificar os símbolos de danças indígenas.

Aluno Lótus

A 2ª tricotomia em relação ao objeto: em primeiridade, relacionado ao ícone o aluno se referiu a expressão dos movimentos que eram movimentos de característicos a de animais e movimentos giratórios; em secundidade, deu referência ao índice, dizendo que esses gestos giratórios e as expressões de animais usados pelos bailarinos na cena do espetáculo fizeram com que ele identificasse que eram movimentos indígenas; em terceiridade, esses gestos e movimentos giratórios, expressando animais colocados pelo aluno também foram utilizados para identificar os símbolos.

Vimos que ficou bem evidente as semelhanças das interpretações desses movimentos e gestos, que a cena em que os índios estão expressando efeito da erva, os faz realizar movimentos estranhos. Dois intérpretes, um faz movimentos giratórios ao beber o líquido e o outro se comporta como animal andando em quatro patas, esses movimentos chamaram a atenção dos alunos, fazendo com que eles tivessem o foco total a esses movimentos, de onde tiraram suas conclusões de que se tratava de um ritual indígena.

Análise dos Gestos e Movimentos: Terceira Tricotomia Interpretante

Aluna Esmeralda

E por último, a 3ª tricotomia, com relação ao interpretante, ou seja, toda a interpretação dada pelos gestos e movimentos que gira em torno da compreensão da obra como um todo, em primeiridade, a rema, a aluna disse que esses movimentos trazem uma percepção indígena pela qualidade dos movimentos e formas pelas quais se movem; em secundidade, sobre o discente disse que os movimentos e os gestos afirmaram se tratar de um ritual indígena; em terceiridade, o argumento, sua interpretação foi:

[…] um índio começa a fazer uma dança esquisita e o outro ele começa a se transformar em bicho se arrastando pelo chão, […]. “Os gestos já foram um pouco diferentes. Os gestos que eles faziam não repetiam junto com a música, a música era suave e tranquila, já os gestos eram bem diferentes, não combinavam era como se houvesse briga, raiva (Esmeralda, entrevista 2021)

Segundo Peirce (2005) com relação a terceira tricotomia interpretante o rema traz como representação do seu objeto as suas características, sem uma compreensão concreto sobre o objeto, já o discente traz a existência real do objeto, a compreensão de sua existência, e por fim o argumento traz a interpretação e significado de modo pessoal sobre o objeto.

[…] Um rema é um signo que é entendido como representando seu objeto apenas em seus caracteres; que um dicissigno é um signo que é entendido como representando seu objeto com respeito à existência real; e que um argumenta é um signo que é entendido coma representando seu objeto em seu caráter de signo. […] (PEIRCE, 2005, p. 53).

Aluno Lótus

E por último, a 3ª tricotomia, com relação ao interpretante, em primeiridade, a rema, o aluno disse que esses movimentos trazem uma percepção indígena pela qualidade de movimento e formas pelas quais se movem; em secundidade, sobre o discente disse que os movimentos e os gestos usados pelos intérpretes afirmaram se tratar de um ritual indígena; em terceiridade, o argumento, sua interpretação foi:

[…] a movimentação é muito parecida com a de animais, pois um dos índios fica andando igual um animal de quatro patas, enquanto o outro apenas fica girando após ingerir o líquido[…]. […] um pouco dos movimentos deles que deram para perceber que era um ritual. Achei bem interessante, ainda mais na parte que parece que eles incorporam algum espírito, e ficam agindo de modo como se fosse animais. (Lótus, entrevista 2021).

Sendo assim, os alunos Esmeralda e Lótus através dos gestos e movimentos conseguiram identificar o que estava sendo proposto na cena do espetáculo. De um modo geral, para eles as cores relacionadas ao cenário e as roupas, os gestos e movimentos dos bailarinos, e os objetos usados em cena lhe chamaram muita a atenção e contribuíram para que eles chegassem à conclusão que se tratava de um ritual de origem indígena.

Devemos levar em consideração que foi apenas uma cena do espetáculo disponibilizados aos alunos que fizeram parte desta pesquisa, que talvez a disponibilidade do espetáculo em sua totalidade faria os alunos terem um entendimento maior, porém tornaria a pesquisa cansativa a eles, levando em consideração que precisamos trabalhar com uma metodologia mais lúdica com esse tipo de público adolescentes.

Conclusão

Por tanto, o foco da pesquisa foi a análise semiótica peirceana, levando em conta a percepção da interpretação do aluno espectador e relacionando-a com a proposta apresentada pelo coreógrafo. Diante disso, buscou-se compreender a interpretação de cada aluno espectador, considerando a conclusão analítica e se cada coreógrafo (a) e/ou bailarino (a) conseguiu fazer com que o expectador reconhecesse o que estava sendo proposto por eles em sua obra.

Teve como objetivo geral analisar as interpretações dos alunos através da semiótica peirceana uma cena do espetáculo Kedacery, da UATÊ Companhia de Dança da Região Norte. E seus objetivos específicos foram: relacionar as interpretações dos alunos espectadores frente a cena do espetáculo Kedacery à ideia repassada pelo coreógrafo durante a apresentação; identificar se a obra pode ou não revelar a tricotomia Peirceana; verificar se a interpretação dos alunos espectadores estão sendo de acordo tal como o coreógrafo quis propor ao seu público.

Diante disso, os alunos espectadores conseguiram identificar o contexto histórico da cena do espetáculo Kedacery. Todos os objetos de análise foram identificados em suas falas, tais como os objetos cênicos, iluminação, cenário e gestos e movimentos usados na cena. De modo sucinto, os alunos espectadores conseguiram identificar o contexto histórico da cena do espetáculo, alcançando assim a proposta que o autor estava expondo em sua obra.

Através da obra conseguimos identificar que ela pode sim nos revelar a tricotomia peirceana. Nas análises é nítido identificar a primeiridade, secundidade e terceiridade de cada tricotomia em relação ao espetáculo. Em relação a interpretação está de acordo tal como o coreógrafo quis propor ao seu público, entretanto vimos a diferença das interpretações, o que é

comum acontecer. Isso depende da experiência de cada pessoa em relação a vivência com a arte e/ou com o signo (ritual indígena e cena contemporânea) que ela tem contato.

Sabemos que é impossível termos interpretações iguais, podemos ter interpretações e pensamentos parecidos, mas nunca iguais, a experiência pessoal é a chave principal para ter um resultado significativo sobre as interpretações. Deste modo foi assinalado que as interpretações dos alunos espectadores foram alcançadas tal como o coreógrafo estava propondo em sua obra, mas de maneira sucinta e objetiva. Trabalhar com a semiótica foi algo desafiador, porém muito satisfatório. Ver cada análise, saber como cada signo se constitui na mente, de como o nosso cérebro é capaz de reconhecer e interpretar um signo.

Enquanto pesquisador tive todas as minhas dúvidas e anseios totalmente supridos, tive uma realização e satisfação enorme de trabalhar com essa pesquisa, venho amadurecendo essa ideia desde do momentos que tive contato com a Semiótica no quinto período do curso de Licenciatura em Dança, e foi enaltecedor conhecer a semiótica, principalmente a parte interpretativa, saber a capacidade das pessoas de interpretar um signo e que cada signo identificado tem uma representatividade de acordo com cada pessoa.

Isso tudo foi alcançado nessa pesquisa, visto as diferenças nas interpretações e experiências de cada aluno, poucos deles com facilidades, pois tiveram a oportunidade mesmo sendo mínima de ter um contato no passado com algo que se remeta as artes, de modo geral, ou ao cotidiano indígena, suas crenças, ritos e danças, e a maioria com nenhuma oportunidade ou experiência com a arte ou de conhecer os costumes dos povos indígenas.

Aproveito para expor a importância do ensino das artes dentro do âmbito escolar, o quanto é importante proporcionar essas experiências para os alunos, fazendo com que eles se tornem pessoas mais críticas e capazes de sentir a experiência de ter as artes em suas vidas. Quando falo artes é de modo geral, dança, música, teatro, artes visuais, não só a arte, mas a cultura do nosso país, a cultura do nosso povo, das nossas raízes que cada vez mais perde seu espaço e memória dentro da sociedade. Portanto, finalizo esta pesquisa com êxito, tendo todas as minhas expectativas e resultados alcançados de maneira satisfatória. Como um bom pesquisador, esse trabalho de pesquisa terá continuidade, mas de uma outra forma e com outro objetivo, porém com o mesmo pensamento teórico.

REFERÊNCIAS

PEIRCE, C. S. Semiótica. São Paulo: Perspectiva, 2005.


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