EPIDEMIOLOGICAL ANALYSIS OF MATERNAL MORTALITY IN THE STATE OF PARÁ, BRAZIL
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7916591
Mayra Danielly Santos Cavalcante1
Rachel Souza Rodrigues2
Williams Cardec da Silva3
Resumo
A redução da mortalidade materna no Brasil é ainda um desafio para os serviços de saúde e a sociedade como um todo. As altas taxas encontradas se configuram como uma violação dos direitos humanos de mulheres e um grave problema de saúde pública. Objetivou-se, portanto, analisar o perfil clínico-epidemiológico das gestantes vítimas de óbitos maternos no estado do Pará. Trata-se de uma pesquisa documental de caráter descritivo e retrospectivo, com abordagem quantitativa. Realizou-se mediante a coleta de dados de domínio público contidos no Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM –DATASUS). Foi realizada a análise dos óbitos maternos no estado, no período de 2011 a 2020. Verificou-se a ocorrência de 1.104 óbitos, com maior incidência em 2020, predominando em mulheres com 20 a 29 anos (45,4%), pardas (76,2%), com escolaridade de 8 a 11 anos (35,4%) e solteiras (39,1%). O principal local de ocorrência foram os hospitais (91,5%), as principais causas foram as obstétricas diretas (73,1%), 73,1% dos óbitos foram investigados através da ficha síntese e 55,2% aconteceram no puerpério, até 42 dias. Pode-se concluir que a morte materna ainda permanece como um grave problema de saúde pública no estado do Pará, de forma que se apresenta como reflexo de uma realidade precária de assistência em saúde para a população, associada às desigualdades socioeconômicas, em razão da persistência dos óbitos maternos por causas evitáveis no período de 2011 a 2020.
Palavras-chave: Mortalidade materna. Saúde pública. Epidemiologia.
Abstract
Reducing maternal mortality in Brazil is still a challenge for health services and for society as a whole. The high rates found constitute a violation of women’s human rights and a serious public health problem. The objective, therefore, was to analyze the clinical epidemiological profile of pregnant women victims of maternal deaths in the state of Pará. This is a documentary research of a descriptive and retrospective nature, with a quantitative approach. It was carried out by collecting public domain data contained in the Mortality Information System (SIM –DATASUS). An analysis of maternal deaths in the state was carried out in the period from 2011 to 2020. There were 1,104 deaths, with a higher incidence in 2020, predominantly in women aged 20 to 29 years (45.4%), brown (76 .2%), with 8 to 11 years of schooling (35.4%) and single (39.1%). The main place of occurrence was hospitals (91.5%), the main causes were direct obstetrics (73.1%), 73.1% of deaths were investigated through the systemic form and 55.2% occurred in the puerperium, up to 42 days. It can be concluded that maternal death still remains a serious public health problem in the state of Pará, in a way that it presents itself as a reflection of a precarious reality of health care for the population, associated with socioeconomic inequalities, due to the continuity of maternal deaths from preventable causes in the period 2011 to 2020.
Keywords: Maternal mortality. Public health. Epidemiology
1. INTRODUÇÃO
A mortalidade materna (MM) é definida pela Organização Mundial de Saúde – OMS (1998) como a morte de uma mulher durante a gravidez ou dentro de um período de 42 dias após o término da gestação, independente da duração ou localização da gravidez, devido a qualquer causa relacionada ou agravada por ela e seu manejo, com exceção das causas incidentais ou acidentais.
De acordo com o Ministério da Saúde – MS (Brasil, 2009), as MM são classificadas como obstétricas e não obstétricas. As causas obstétricas são divididas em dois tipos, as diretas e as indiretas. Estas, são as resultantes de doenças que existiam antes da gestação ou que se desenvolveram durante esse período ou que foram agravadas pelos efeitos fisiológicos da gravidez. Aquelas são as que ocorrem por complicações durante gravidez, parto ou puerpério, relacionadas a intervenções, omissões, tratamento incorreto ou a uma cadeia de eventos, resultantes de qualquer uma dessas causas.
Quanto a MM não obstétrica, o MS (Brasil, 2009) considera que esta pode ocorrer no momento da gravidez, parto ou puerpério por causas incidentais ou acidentais, tais como suicídio, atropelamento, homicídio, dentre outros. Além disso, pode-se também elencar o óbito materno tardio relacionado por causas obstétricas diretas ou indiretas, com mais de 42 dias e menos de um ano após o término da gravidez.
A OMS (2015) define a razão da mortalidade materna (RMM) pelo número de mortes maternas, por 100 mil nascidos vivos, de mães residentes em certo espaço geográfico no ano, configurando-se como um indicador sensível da qualidade da atenção à saúde da mulher. Para esse cálculo, o MS (Brasil, 2007), considera as mortes decorrentes de causas obstétricas diretas e obstétricas indiretas, excluindo as causas não obstétricas e MM tardia.
Nas duas décadas anteriores a esse estudo, de 1990 a 2010, o MS (Brasil, 2014) concluiu que as duas principais causas específicas de morte materna foram a hipertensão e a hemorragia, seguidas pela infecção puerperal e as complicações relacionadas ao
aborto. Entre as causas indiretas, o grupo com maior frequência foi o das doenças do aparelho circulatório complicadas pela gestação, pelo parto ou pelo puerpério. De acordo com Freitas Junior (2020), em 2000, países de todo o mundo pactuaram os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), assumindo como meta reduzir a MM em 75%. Para o Brasil, a meta dos ODM era reduzir, até 2015, a MM para um valor igual ou inferior a 35 óbitos por 100 mil nascidos-vivos (NV), o que não foi alcançado. Países considerados em níveis de desenvolvimento semelhantes ao Brasil ou ainda mais pobres possuem menores números de mortalidade materna, como por exemplo o Chile (25 mortes/100.000 NV), o Uruguai (29/100.000 NV) e a Costa Rica (40/100.000 NV).
Segundo a Organização Panamericana da Saúde – OPAS (2016), os novos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) representam a iniciativa global, sucedendo os ODM. Eles convocam o mundo para a eliminação da mortalidade materna evitável até 2030, com a meta de reduzir a RMM global de 210/100.000 NV para menos de 70/100.000 NV, representando redução de dois terços.
Isto significa que será necessária a redução de 58/100.000 NV para aproximadamente 20/100.000 NV no Brasil, de 73/100.000 NV para 24/100.000 NV na região Norte e de 80/100.000 NV para 27/100.000 NV no estado do Pará.
O MS (Brasil, 2007) infere que a redução da MM no Brasil é ainda um desafio para os serviços de saúde e a sociedade como um todo. As altas taxas encontradas se configuram como uma violação dos direitos humanos de mulheres e um grave problema de saúde pública, atingindo desigualmente as regiões brasileiras com maior prevalência entre mulheres das classes sociais com menor ingresso e acesso aos bens sociais.
Osanan et al. (2018) consideram que a MM é um indicador das condições de vida e cuidados de saúde de uma população, onde níveis baixos de instrução, condições nutricionais inadequadas, apoio social insuficiente e falta de acesso a cuidados de saúde estão fortemente associados a esse tipo de morte. Além disso, a MM é o principal indicador da mortalidade diferencial entre os mais ricos e os mais pobres, entre nações, grupos sociais e famílias.
A MM reflete ainda, como expõe Rodrigues et al. (2019), a insatisfatória operacionalização das políticas públicas voltadas à saúde da mulher, assim como a deficiência de qualidade da assistência oferecida nos serviços de saúde, visto que a MM se configura como um evento com alta incidência no país.
Portanto, é de suma importância produzir conhecimento sobre o tema, para fomentar alternativas para a redução da MM no estado do Pará, bem como, fortalecer as políticas públicas de saúde e o planejamento de ações voltadas para a redução da mortalidade materna no estado. Através do delineamento socioepidemiológico dessa população, será possível identificar grupos mais vulneráveis e as falhas na assistência, favorecendo a tomada de decisão e a sensibilização da gestão pública para que ocorra um maior envolvimento nessa problemática.
Este estudo teve como objetivos: analisar o perfil clínico-epidemiológico das gestantes vítimas de óbito materno no estado do Pará de 2011 a 2020; caracterizar os óbitos maternos segundo a faixa etária, cor/raça, grau de escolaridade e estado civil das vítimas; identificar os óbitos maternos de acordo com a local de ocorrência, causa e investigação dos óbitos; classificar os óbitos maternos segundo o período de ocorrência.
2. METODOLOGIA
Trata-se de uma pesquisa documental de caráter descritivo e retrospectivo, com abordagem quantitativa, que visa a análise do serviço de saúde do estado do Pará, permitindo uma visão ampla da preocupante situação atual da saúde pública no que tange às altas taxas de mortalidade materna.
Os dados foram coletados no banco de dados de domínio público do Departamento de Informática do MS (DATASUS), por intermédio do site www.datasus.gov.br, através de pesquisa no Sistema de Informação de Mortalidade (SIM), software disponibilizado pelo DATASUS (http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?sim/cnv/mat10pa.def) para o registro e acompanhamento de óbitos no Brasil. Acessando-se o Tabnet, localizou-se o link estatísticas vitais, em seguida, selecionou-se o item mortalidade materna, com os dados referentes ao Estado do Pará, região Norte e Brasil, por ano de ocorrência e os dados epidemiológicos correlacionados.
O universo da pesquisa foi composto por todos os óbitos maternos notificados e registrados no SIM, do estado do Pará, no período compreendido entre 2011 a 2020. Foram incluídos no estudo 100% dos óbitos declarados no SIM que estiveram de acordo com os seguintes critérios: mulheres com idade em idade fértil (entre 10 a 49 anos) vítimas de óbito materno; óbitos maternos de causa obstétrica. Foram excluídos os óbitos maternos que, embora ocorridos no Pará, não eram de pacientes residentes no estado.
Os dados foram coletados no mês de março de 2023. As variáveis pesquisadas foram: faixa etária; cor/raça; grau de escolaridade; estado civil das vítimas; investigação dos óbitos; o local de ocorrência; período de ocorrência (gravídico/puerperal); e a causa dos óbitos.
Os dados obtidos foram registrados em planilhas do Programa Excel 2013 da Microsoft Office, pelos pesquisadores, para facilitar a tabulação e análise dos dados. As informações foram organizadas em categorias, tabelas e gráficos e interpretados através de frequências absolutas e percentuais para discussão dos resultados obtidos com o referencial relacionado ao tema.
Este estudo seguiu os princípios éticos definidos na Resolução 510/2016, o qual delimita que estudos que usam informações de acesso público, de domínio público, e/ou de bancos de dados, em que conhecimentos são fornecidos sem identificar os sujeitos envolvidos não precisam catalogadas nem examinadas pelo Comitê de Ética em Pesquisa. Entretanto, cabe ressaltar que foram obedecidas as recomendações da Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), que define as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
O presente estudo verificou a ocorrência de 2.299 óbitos maternos na região norte no período de 2011 a 2020, o que representa 13,6% do total de óbitos maternos do país, inserindo essa região como a terceira colocada na quantidade de óbitos por região brasileira.
A análise do gráfico 1 revela que 16.943 óbitos maternos foram registrados no Brasil no período de 2011 a 2020. Na região norte foram registrados 2299 casos (13,6%), na nordeste, 5665 casos (33,4%), na sudeste, 6027 casos (35,6%), na sul, 1556 casos (9,2%) e na centro-oeste, 1396 casos (8,2%). Sendo assim, a ocorrência de óbito materno foi mais expressiva na região sudeste e menos expressiva na região centro-oeste, corroborando com a proporção da concentração demográfica dessas regiões.
De acordo com o IBGE (Brasil, 2020), a estimativa populacional da região Norte no ano de 2020 foi de 18.672.591 habitantes. Destes, 8.690.745 viviam no estado do Pará, o mais populoso da região, o que representa 46,54% do total, podendo este dado justificar a maior ocorrência de óbitos maternos do norte do país.
O Gráfico 1 mostra a distribuição de óbitos maternos por região do Brasil, no período de 2011 a 2020.
Gráfico 1 – Distribuição de óbitos maternos por região. Brasil, 2011 a 2020 (n=16.943).
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM
O Gráfico 2 mostra a distribuição anual dos óbitos maternos no estado do Pará no período de 2011 a 2020.
Gráfico 2 – Distribuição anual de óbitos maternos. Pará, Brasil. 2011 a 2020 (n=1.104).
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM
O gráfico 2 aponta a ocorrência de 1.104 óbitos maternos, no estado do Pará, no período de 2011 a 2020, o que corresponde a 48,02% dos casos registrados na região norte, com média anual de 110,4 casos/ano.
Os dados observados revelam um padrão oscilante, com ascensão e declínio na quantidade de óbitos, que varia de 85 a 132 casos, entre os anos de 2011 a 2020. O ano de 2011 apresentou o menor número de casos, 85 óbitos maternos (7,7%) e o ano de 2020 apresentou o maior número de registros, 132 óbitos (11,9%).
Esperava-se, porém, que a ocorrência de óbitos maternos apresentasse um padrão decrescente, já que no ano de início do estudo, no mês de junho, dentre outras políticas públicas, houve a implantação da Rede Cegonha, cujo objetivo é a ampliação do acesso, melhoria da qualidade da assistência pré-natal, da qualidade de assistência ao parto e puerpério e assistência à criança nos primeiros 24 meses de vida.
A Tabela 1 mostra a distribuição dos óbitos maternos no estado do Pará entre 2011 e 2020, classificados segundo aspectos sociodemográficos.
Tabela 1 – Características sociodemográficas dos óbitos maternos. Pará, Brasil. 2011 a 2020 (n=1104).
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM
A tabela 1 evidencia que a maior parte das mulheres apresentava de 20 a 29 anos (45,4%), era de cor parda (76,2%), possuía 8 a 11 anos de estudo (35,4%) e era solteira (39,1%).
Afere-se ainda que houve um maior predomínio de óbitos maternos nas mulheres de 20 a 29 anos, com 501 notificações (45,4%), seguido pela faixa de 30 a 39 anos, com 321 óbitos (29,1%). A faixa etária que apresentou o menor número de óbitos foi a de 10 a 14 anos, com 11 óbitos (0,9%). A predominância dos óbitos maternos nas mulheres de 20 a 29 anos pode ser justificada pelo fato desta faixa concentrar o período de maior atividade reprodutiva.
Freitas et al. (2010) relatam que mulheres muito jovens ou com uma faixa etária muito avançada apresentam maior risco associado à gestação, ao parto e ao puerpério, no entanto, tal ocorrência não foi constatada nesta pesquisa. Apesar disso, entende-se que é necessária uma melhor assistência obstétrica independentemente do fator de risco idade e/ou exposição a outros fatores de morbimortalidade.
Em relação à variável raça/cor observou-se uma maior proporção de óbitos maternos em mulheres autodeclaradas pardas, com 841 casos (76,2%) e o menor número em mulheres da cor/raça amarela, com 1 caso (0,1%).
Morse et al., (2011) observaram a RMM elevada nas mulheres de cor parda e preta. A prevalência desse grupo em condições de maior vulnerabilidade social, o que dificulta seu acesso aos serviços de saúde de melhor qualidade, associada à maior predisposição genética dessas mulheres às doenças, em especial síndromes hipertensivas da gravidez, podem justificar a ocorrência de 917 casos (83,1%) entre mulheres pretas e pardas.
Além disso, os resultados da pesquisa revelaram que a maioria dos óbitos ocorreram em mulheres que possuíam entre 8 a 11 anos de escolaridade, com 391 casos (35,4%) e a menor ocorrência foi registrada entre as mulheres que nunca frequentaram a escola, com 37 casos (3,4%). Diferente de outros estudos, nos quais a MM estava associada à baixa escolaridade, aqui a escolaridade elevada não resultou em forte fator protetor para MM.
Quanto ao variável estado civil, esse estudo identificou a maior ocorrência de óbito materno entre as mulheres solteiras, com 432 casos (39,1%) e a menor ocorrência entre viúvas e separadas judicialmente, com 6 casos (0,5%) cada.
Os dados referentes à situação conjugal encontrados neste estudo corroboram com o realizado por Ferraz e Bordignon (2012), que afirma que a prevalência de óbitos maternos ocorridos entre mulheres solteiras pode estar relacionada com o fato de que a grande maioria não recebe apoio emocional, social, financeiro, afetivo, caracterizando-as como um grupo vulnerável. Além disso, esse tipo de relação conjugal pode estar relacionado à quebra de vínculos e não aceitação da gravidez.
A Tabela 2 apresenta a distribuição dos óbitos maternos, no estado do Pará entre 2011 e 2020, de acordo com o local de ocorrência.
Tabela 2 – Óbitos maternos segundo o local de ocorrência. Pará, Brasil. 2011 a 2020 (n=1.104).
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM
Quanto ao local de maior ocorrência dos óbitos maternos, o ambiente hospitalar concentrou o maior número de registros, com 1.010 casos (91,5%) e a ocorrência em local ignorado registrou apenas 1 caso (0,1%). O ambiente hospitalar, como o principal local de ocorrência dos óbitos, se justifica por ser este o principal lugar procurado pelas gestantes para a realização do parto e para atendimento de intercorrências durante a gravidez ou após o parto.
De Oliveira, Ramos e Rodrigues (2020) consideram que o nível de gravidade, bem como as condições instáveis de saúde das mulheres, encaminhadas aos hospitais em decorrência de uma assistência pré-natal insuficiente e incapaz de identificar os sinais precoces de complicações, estão associadas ao elevado índice de MM.
No que diz respeito às causas dos óbitos maternos, o maior índice foi registrado na causa obstétrica direta, com 807 casos (73,1%), seguida pela obstétrica indireta, com 277 casos (25,1%), enquanto os casos não especificados corresponderam a menor proporção, com 20 casos (3,3%).
A Tabela 3 apresenta a distribuição dos óbitos maternos, segundo a causa obstétrica.
Tabela 3 – Óbitos maternos segundo a causa obstétrica. Pará, Brasil. 2011 a 2020 (n=1.104).
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM
A classificação das causas de morte materna e obstétrica direta e obstétrica indireta auxilia na identificação das mortes evitáveis. A alta incidência de óbito materno por essas causas é um reflexo da urgente necessidade de melhoria na qualidade da assistência pré-natal, realização de consultas e exames, para identificar mulheres vulneráveis e expostas a maiores riscos maternos e fetais durante a gravidez.
De acordo com o MS (Brasil, 2007), as causas de morte materna estão relacionadas a fatores relacionados à dificuldade de acesso, à baixa qualidade do atendimento recebido e à falta de ações e capacitação de profissionais de saúde voltadas para os riscos específicos aos quais as mulheres estão expostas. Neste contexto, a fim de reduzir a MM, a Atenção Primária à Saúde pode contribuir por meio da implementação de ações e estratégias de promoção à saúde reprodutiva e sexual, no oferecimento de atividades educativas relacionadas ao pré-natal, puerpério e planejamento familiar.
A Tabela 4 mostra a distribuição dos óbitos maternos, segundo os óbitos investigados no estado do Pará, no período de 2011 a 2020.
Tabela 4 – Óbitos maternos segundo óbito investigado. Pará, Brasil. 2011 a 2020 (n=1104).
Constatou-se que os óbitos maternos investigados, com ficha síntese informada, registraram 807 ocorrências (73,1%), os óbitos maternos investigados, porém sem ficha síntese informada, registraram 277 ocorrências (25,1%). Os demais casos, 20 (1,8%), foram de óbitos não investigados.
Dentre os diversos desafios para minimizar a MM, o principal é entender sua real grandiosidade, já que os sub registros e subnotificações das causas de morte mascaram o verdadeiro número de vítimas de morte materna. Com vistas a sanar esse entrave, o MS publicou a Portaria 653/2003 que determina que, a partir de então, o óbito materno passa a ser considerado evento de notificação compulsória, tornando obrigatória a investigação, por parte de todos os municípios, dos óbitos de mulheres em idade fértil cujas causas possam ocultar o óbito materno.
Baseado na Portaria 653/2003 e na necessidade de oportunizar a implementação de políticas mais eficazes de atenção à mulher no planejamento familiar, durante a gravidez, parto e puerpério, o MS (Brasil, 2007) propôs a adoção do Pacto Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal. Uma de suas ações estratégicas é a implantação dos Comitês de morte materna, muito importantes para a melhoria do sistema de registro desses óbitos e, consequentemente, para o aumento da quantidade e da qualidade das informações disponíveis relativas à mortalidade materna.
A Tabela 5 apresenta a distribuição dos óbitos maternos segundo o período de ocorrência, no estado do Pará entre 2011 e 2020, de acordo com o local de ocorrência.
Tabela 5 – Óbitos maternos segundo o período de ocorrência (Gravídico/Puerperal). Pará, Brasil. 2011 a 2020 (n=1104).
Os resultados mostraram que os óbitos maternos aconteceram, em sua maioria, durante o puerpério, até 42 dias, com 610 casos (55,2%), seguido do período de gravidez, parto ou aborto, com 371 casos (33,6%). A menor ocorrência foi no período informado inconsistente, onde foram registrados 4 casos (0,4%).
Considerando a definição de MM pela OMS (1998) como aquela que ocorre durante a gestação ou até os 42 dias após o término desta, independentemente da duração da gravidez, a morte é causada por qualquer fator relacionado ou agravado pela gestação ou medidas tomadas em relação a ela e resulta de complicações ocorridas no período gravídico puerperal, excluindo a causas acidentais ou incidentais, observa-se o grande índice de MM no estado do Pará entre os anos de 2011 e 2020, que somam 981 casos (88,8%.
4. CONCLUSÃO
Dessa maneira, com base na análise realizada pelo estudo, pode-se concluir que o óbito materno persiste como um grave problema de saúde pública enfrentado pelo estado do Pará. O atual cenário de mortalidade materna evidencia a necessidade de implantação de políticas de saúde mais eficazes, com a garantia de uma assistência pré-natal de qualidade, que identifique e gerencie precocemente complicações obstétricas.
Para tanto, os profissionais envolvidos na assistência devem ser capacitados, para que prestem assistência adequada às gestantes, sendo capazes de identificar intercorrências, fazer diagnóstico correto e conduta resolutiva. Esses profissionais devem ser sensibilizados sobre a importância de seu papel na redução do número de óbitos maternos evitáveis, uma vez que ficam evidentes as deficiências na assistência, resultando em elevados números de óbitos que poderiam ser evitados.
Vale ressaltar que é de suma importância que seja garantida às mulheres uma rede de serviços de saúde com estrutura apropriada, com fluxos de referência e contrarreferência e transporte adequado. Ademais, faz-se necessária a implementação de estratégias para a melhoria da qualidade do registro de dados para alimentar o Sistema de Informação sobre Mortalidade. A correta notificação dos óbitos maternos proporciona uma visão real dos indicadores relacionados à mortalidade materna no país, contribuindo para o planejamento e implementação de ações e estratégias de saúde.
Os achados apresentados neste estudo contribuem para o ensino, pesquisa e assistência relacionada à saúde materna, uma vez que proporcionam um panorama situacional do perfil epidemiológico da mortalidade materna local, contribuindo para a redução da mortalidade materna no estado do Pará.
REFERÊNCIAS
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1Centro Universitário UNINOVAFAPI, Brasil, mdssc22@gmail.com
2Centro Universitário UNINOVAFAPI, Brasil, rachelsouza86@gmail.com
3Centro Universitário UNINOVAFAPI, Brasil, willcardec@hotmail.com