REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cs10202411150525
Leandro Grillo Fernandes de Oliveira1
Resumo – Este artigo tem por objetivo apresentar uma proposta de aplicação de um Sistema de Gestão Integrada (SGI) para laboratórios de ensaios balísticos não acreditados, situados no Brasil, que realizam a avaliação da conformidade de Produtos Controlados pelo Exército. Foi realizada uma análise das normas NBR ISO 9001:2015, NBR ISO 14001:2015 e NBR ISO 45001:2018 com foco no cotidiano de um laboratório de ensaios balísticos e posterior aplicação destas normas integradas no atendimento dos requisitos do Anexo E da Portaria n° 189-EME, visando melhorias na gestão organizacional do laboratório. Da análise apresentada, conclui-se que é possível integrar os requisitos do Anexo E da Portaria n° 189-EME com o SGI, facilitando assim a posterior acreditação destes laboratórios pela norma NBR ISO/IEC 17025:2017.
Palavras-chave: Produtos Controlados pelo Exército; Laboratório de ensaios balísticos; Sistema de Gestão Integrada; SGI.
Abstract – This article aims to present a proposal for the application of an Integrated Management System (IMS) for non-accredited ballistic testing laboratories, located in Brazil, which carry out conformity assessment of Products Controlled by the Army. An analysis of the Standards NBR ISO 9001:2015, NBR ISO 14001:2015 and NBR ISO 45001:2018 was carried out with a focus on the daily life of a ballistic testing laboratory and the subsequent application of these integrated Standards in meeting the requirements of Annex E of Ordinance no. 189-EME, aiming to improve the organizational management of the laboratory. From the analysis presented, it is concluded that it is possible to integrate the requirements of Annex E of Ordinance No. 189- EME with the IMS, thus facilitating the subsequent accreditation of these laboratories by the NBR ISO/IEC 17025:2017 standard.
Keywords: Products Controlled by the Army; Integrated Management System; Ballistic Testing Laboratories; IMS.
1. Introdução
Em 1° de setembro de 2020 entrou em vigor a Portaria n° 189-EME, do Estado Maior do Exército, que aprova as “Normas reguladoras dos processos de avaliação de Produtos Controlados pelo Exército (PCE)”. Anteriormente à portaria supramencionada, os processos de avaliação da conformidade de PCE eram executados somente nos laboratórios do Centro de Avaliações do Exército (CAEx), no Rio de Janeiro.
Com esta mudança na legislação, outros laboratórios de organizações públicas ou privadas podem também realizar os ensaios, testes e inspeções de PCE de acordo com a base normativa definida pela legislação. Estes laboratórios devem estar acreditados pela Coordenação Geral de Acreditação do INMETRO (CGCRE) e/ou signatários dos Acordos de Reconhecimento Mútuo (ARM) do ILAC (International Laboratory Accreditation Cooperation) ou IAAC (Interamerican Accreditation Cooperation), no escopo de PCE.
Adicionalmente, a Portaria n° 189-EME permite que laboratórios não acreditados possam realizar ensaios, testes e inspeções de PCE, desde que atendam também aos requisitos constantes no Anexo E da Portaria n° 189- EME. Conforme o Artigo 8° da Portaria, no parágrafo § 4º, informa-se que, no caso de inexistência de laboratórios de 3° parte acreditados, é permitido ao Organismo Certificador Designado (OCD) adotar laboratórios não acreditados de 3° ou 1° parte, nessa ordem, devendo avaliar e registrar todos os requisitos discriminados no Anexo E, da Portaria n° 189-EME. A avaliação é realizada pelo OCD, por meio de um profissional que possua registro de treinamento de, no mínimo, 16 horas/aula, na norma ABNT NBR ISO IEC 17025 vigente, além de comprovação formal de experiência e conhecimento técnico específico quanto aos ensaios da base normativa estabelecida no Anexo A da portaria em questão.
Um laboratório de ensaios balísticos lida com atividades de alto risco por sua finalidade e característica, portanto, necessita de pessoal altamente qualificado e experiente para a execução de suas atividades. Segundo Júnior (2017, p.11) “a Balística é a ciência que estuda o movimento dos projéteis e os fenômenos conexos”. Para registrar estes fenômenos conexos e seus efeitos, o laboratório precisa utilizar equipamentos de alta tecnologia, que devem estar obrigatoriamente calibrados e certificados. O ambiente interno do laboratório deve ser controlado e as atividades cotidianas apresentam características que devem ser mapeadas e tratadas, visando a saúde e segurança dos trabalhadores e o trato com o meio ambiente interno e externo.
Existe ainda a grande necessidade da gestão documental, pois inúmeros registros e relatórios são gerados a cada ensaio, contendo dados que servirão de informação para pareceres técnicos, estudos, auditorias, medições e outras atividades ligadas aos ensaios voltados para PCE e também para gestão da organização e suporte para as partes interessadas.
A integração das normas NBR ISO 9001:2015, NBR ISO 14001:2015 e NBR ISO 45001:2018 tem suma importância no que tange às regulamentações e requisitos legais de vários setores relacionados às atividades executadas pelos laboratórios de ensaios balísticos. Áreas como qualidade, meio ambiente, saúde e segurança dos trabalhadores estão presentes nestas atividades e podem gerar riscos e oportunidades para a organização, necessitando assim que exista um robusto sistema de gestão nestas áreas. Conforme Furtado (2020, p.7), “os riscos são itens importantes para a consecução dos objetivos estratégicos, uma vez que o que foi planejado pode ser impactado por acontecimentos que causem resultados positivos ou negativos no negócio”.
Do exposto, este trabalho tem como objetivo apresentar uma proposta de integração das normas do Sistema de Gestão Integrada – SGI, visando atender os requisitos presentes no Anexo E da Portaria n° 189-EME, no âmbito de laboratórios de ensaios balísticos não acreditados. Com esta integração entre o SGI e a Portaria n° 189-EME, acredita-se que será possível que o laboratório consiga atender parcialmente os requisitos da norma NBR ISO/IEC 17025:2017 para viabilizar uma posterior acreditação.
2. Referencial Teórico
2.1. Laboratórios não acreditados
Inicialmente, para que houvesse um entendimento mais concreto sobre a questão dos laboratórios não acreditados, foi preciso esclarecer que estes laboratórios são classificados dessa forma porque não obtiveram a acreditação por um Organismo de Acreditação, especificamente na norma NBR ISO/IEC 17025:2017. Esta norma estabelece os requisitos gerais para procedimentos técnicos executados em laboratórios que realizam atividades relacionadas à área da metrologia.
Conforme a Portaria n° 189-EME determina, no caso da adoção do uso de laboratórios não acreditados, um Órgão Certificador Designado (OCD) deverá avaliar e registrar todos os requisitos discriminados no Anexo E da própria Portaria. Os requisitos do Anexo E são 12, conforme demostrado abaixo:
1. Confidencialidade;
2. Organização;
3. Sistema de gestão;
4. Pessoal;
5. Acomodações e condições ambientais;
6. Equipamentos e materiais de referência;
7. Rastreabilidade das medições e calibrações;
8. Calibração e método de ensaio;
9. Manuseio dos itens;
10. Registros;
11. Relatórios de ensaio; e
12. Serviços de apoio e fornecimentos externos.
A conformidade com estes requisitos deverá ser feita pelo OCD em conjunto com um profissional com experiência nos ensaios de base normativa para avaliação da conformidade de protótipo, fixados no Anexo A da Portaria n° 189-EME, sendo que este profissional obrigatoriamente tenha o mínimo de 16 horas/aula de treinamento na norma NBR ISO/IEC 17025:2017.
Cabe observar que um laboratório pode ter certificações de gestão ISO, porém,
ter um sistema de gestão da qualidade e a certificação do mesmo, é possível sem se obter a acreditação, contudo, a acreditação é impossível de obter, sem que a organização possua um sistema de gestão da qualidade, quando a mesma diz respeito a técnicas específicas. Isto advém do âmbito da Certificação que lhes é atribuída, pois podem, apenas, certificar e acreditar o sistema administrativo e não as técnicas praticadas. (Campelo, 2020, p.5).
Isto quer dizer que independente das certificações que o laboratório possua, é necessário o cumprimento dos requisitos gerais para a competência de laboratórios de ensaio e calibração, da norma NBR ISO/IEC 17025:2017, assegurando assim que as técnicas praticadas pelo laboratório sejam confiáveis e aceitas nacional e internacionalmente.
2.2. Sistema de Gestão Integrada (SGI)
A adoção da prática de integração das normas NBR ISO 9001:2015, NBR ISO 14001:2015 e NBR ISO 45001:2018 é uma realidade já consolidada em diversas organizações do mundo todo. Conforme definido a seguir:
Um Sistema de Gestão Integrado (SGI) corresponde a um conjunto de processos, atividades, tarefas, organização e unificação de recursos tangíveis e intangíveis, meios e critérios, para a implantação de políticas de qualidade, meio ambiente, segurança e saúde do trabalho (QMS&ST), atingir os objetivos, metas, a aprendizagem contínua e a melhoria contínua em uma organização. (Mançú, 2022, p.87).
A integração das normas NBR ISO 9001:2015, NBR ISO 14001:2015 e NBR ISO 45001:2018, consiste na identificação e correspondência dos itens considerados requisitos destas normas. Segundo Cardoso (2015, p.52): “Ao integrar a gestão de cada um dos “impactos” que a atividade produtiva da organização provoca, a empresa está buscando formas de gerenciar suas questões de modo eficaz”.
Porém, para uma organização obter a certificação em uma destas normas, é necessário basicamente que estes requisitos sejam checados e avaliados quanto à sua aplicação na organização por auditorias internas e posteriormente, por uma auditoria externa independente, para certificar que esta organização está em conformidade com a norma de gestão que decidiu adotar. Todavia, na implementação destes sistemas de gestão separadamente, ou seja, ao obter a certificação para cada sistema de gestão, verifica-se a ocorrência de problemas como duplicidade de esforços, aumento de custos, padronização deficiente e impactos diretos para todas as partes interessadas.
Unificar e integrar estas normas a fim de obter um sistema de gestão único, capaz de atender aos requisitos de qualidade, meio ambiente e saúde e segurança dos trabalhadores, poderá trazer para a organização uma série de melhorias, tais como: eficiência operacional, a unificação de diferentes áreas facilitando políticas internas, agilidade no monitoramento dos requisitos das normas, atendimento às regulamentações, gestão de riscos mais eficaz e melhoria contínua da organização.
3. Método
Neste artigo foi realizada uma abordagem por meio de uma pesquisa qualitativa do tema, procurando esclarecer pontos necessários para entender e analisar as vantagens de implantar um Sistema de Gestão Integrada das normas NBR ISO 9001:2015, NBR ISO 14001:2015 e NBR ISO 45001:2018, atendendo os requisitos presentes no Anexo E da Portaria n° 189-EME. A principal linha de trabalho foi a pesquisa bibliográfica, onde foram levantadas várias referências teóricas publicadas em diferentes meios de pesquisa. De natureza aplicada, visando solucionar uma condição que é característica de vários laboratórios situados no país, foram levantados todos os requisitos comuns às normas abordadas neste artigo. Também com objetivo exploratório, foi feita a delimitação do tema especificando os laboratórios de ensaios balísticos como objeto principal da pesquisa.
Inicialmente foi feita uma análise do Anexo E da Portaria n° 189-EME para aprofundar o entendimento dos seus requisitos e sua aplicabilidade em um laboratório de ensaios balísticos. A leitura do Anexo E focada nos seus requisitos trouxe luz à possibilidade de integração com outras normas visto que para atender seus requisitos são necessários esforços e conhecimentos técnicos específicos para laboratórios de ensaios e calibração. Neste processo foi verificado que existem correspondências significativas com alguns subitens da norma NBR ISO/IEC 17025:2017. Com base nesta verificação, foi montada uma matriz de correspondência entre os requisitos do Anexo E da Portaria n° 189-EME e a norma NBR ISO/IEC 17025:2017conforme segue:
Fonte: Elaborado pelo autor.
A correspondência entre os requisitos do Anexo E da Portaria n° 189- EME e as seções da norma NBR ISO/IEC 17025:2017 é importante para identificar a correlação entre os requisitos, além de possibilitar uma análise mais ampla para facilitar uma possível correspondência com o Sistema de Gestão Integrada.
Neste contexto, foi elaborada uma segunda matriz de correspondência onde foram abordados os requisitos do Anexo E da Portaria n° 189-EME e as seções das normas ISO do Sistema de Gestão Integrada. Cada item do Anexo E da Portaria n° 189-EME foi analisado separadamente e comparado com a estrutura de alto nível das normas de sistemas de gestão a fim de verificar se existe algum requisito que não seja aplicável.
Como resultado, foi gerada uma matriz de correspondência onde foram analisados todos os requisitos do Anexo E da Portaria n° 189-EME que tenham correspondência direta com as seções, itens e subitens das normas NBR ISO 9001:2015, NBR ISO 14001:2015 e NBR ISO 45001:2018. Esta matriz de correspondência é demonstrada a seguir com a relação direta entre os requisitos analisados, porém existe a possibilidade de aprofundamento da análise para buscar novas correlações, visto que foram buscados apenas os requisitos com correlação direta.
Fonte: Elaborado pelo autor.
A matriz de correspondência acima apresenta a existência de correlação entre os requisitos do Anexo E da Portaria n° 189 – EME e as seções das normas aplicáveis ao Sistema de Gestão Integrada.
Como forma de tornar mais clara a ordem em que foram analisadas as correspondências entre a Portaria n° 189-EME, com a norma NBR ISO/IEC 17025:2017 e posteriormente analisadas as normas NBR ISO 9001:2015, NBR ISO 14001:2015 e NBR ISO 45001:2018 com o Anexo E da Portaria n° 189 – EME foram concebidos dois fluxogramas sequenciais para direcionar o estudo e sua aplicação prática, onde a entrada sempre será a Portaria n° 189 – EME como base para análise com as outras normas.
Fonte: Elaborado pelo autor.
Por fim, definidas as correspondências, foram analisados alguns aspectos específicos observados no cotidiano de um laboratório de ensaios balísticos, com a finalidade de detectar os requisitos para implantar um Sistema de Gestão Integrada. Contudo cabe ressaltar que:
É certo que a decisão de implantação de um sistema, tomada pela alta direção, é o fator crítico de sucesso, pois comprova-se o comprometimento destes com a proposta de alterar a cultura reinante com a introdução de um novo modelo de trabalho e direcionamento. (Lu; Pavanelli, 2020, p.170).
Ainda no escopo do estudo, foram verificadas oportunidades que poderão contribuir na obtenção de acreditação do laboratório pela CGCRE do INMETRO e/ou signatários dos Acordos de Reconhecimento Mútuo (ARM) do ILAC ou IAAC.
4. Resultados e Discussão
4.1. Resultados
Os resultados são apresentados a seguir, de forma resumida, onde os requisitos do Anexo E da Portaria n° 189-EME são comparados com as seções, itens, subitens mais relevantes das normas NBR ISO 9001:2015, NBR ISO 14001:2015 e NBR ISO 45001:2018, ou seja, os requisitos que encontram relação direta com o Anexo E da Portaria n° 189-EME. Existe ainda a possibilidade de um requisito do Anexo E ter mais de uma correspondência com os requisitos do SGI, como também existe a possibilidade de um requisito do SGI não ser utilizado neste estudo por não atender diretamente todos aos requisitos da portaria, ficando assim a possibilidade de um estudo mais aprofundado.
O requisito “1. Confidencialidade”, do Anexo E da Portaria n° 189-EME determina que o laboratório deva possuir procedimentos para preservação da confidencialidade das informações, o que vai ao encontro do subitem “7.5.3 Controle de informação documentada” do Sistema de Gestão Integrada.
O requisito “2. Organização”, do Anexo E da Portaria n° 189-EME, encontra no item ”5.3 Papéis, responsabilidades e autoridades organizacionais” do SGI, correspondência direta em relação a quem se deve atribuir responsabilidades e autoridade.
Os requisitos “3. sistema de gestão e 8. calibração e método de ensaio”, do Anexo E da Portaria n° 189-EME, tratam de informação documentada e tem correspondência direta com o item “7.5 informação documentada” do SGI.
O requisito “4. Pessoal”, do Anexo E da Portaria n° 189-EME, define características, procedimentos e registros, referentes ao pessoal envolvido nas atividades do laboratório, e possui correspondência diretamente ao item “7.2 Competência”, do SGI.
O requisito “5 Acomodações e condições ambientais”, do Anexo E da Portaria n° 189-EME, encontra alinhamento com o item “7.1.4 Ambiente para operação dos processos”, do SGI, no sentido em que este item trata dos recursos para o ambiente e estrutura onde se desenvolverá a atividade laboratorial, que deve assegurar o bom funcionamento dos sistemas de gestão. Em relação às normas NBR ISO 14001:2015 e NBR ISO 45001:2018, há correspondência indireta com o item “7.1 Recursos”.
O requisito “6 Equipamentos e materiais de referência”, do Anexo E da Portaria n° 189-EME, orienta a questão dos laboratórios possuírem equipamentos e materiais de referência e direciona a forma de tratamento e registro deles, sendo desta forma aplicável ao item “7.1.3 Infraestrutura” da norma NBR ISO 9001:2015. Em relação às normas NBR ISO 14001:2015 e NBR ISO 45001:2018, há correspondência indireta com o item “7.1 Recursos”.
O requisito “7 Rastreabilidade das medições e calibrações”, do Anexo E da Portaria n° 189-EME, corresponde ao subitem “7.1.5.2 Rastreabilidade de medição” da NBR ISO 9001:2015 e também indiretamente ao item “9.1 Monitoramento, medição, análise e avaliação de desempenho” das normas NBR ISO 14001:2015 e NBR ISO 45001:2018.
Os requisitos “9 Manuseio dos itens; 10. Registros; e 11. Relatórios de ensaio”, do Anexo E da Portaria n° 189-EME estão alinhados com o que determina o item “8.5 Produção e provisão de serviço” da NBR ISO 9001:2015. Em relação às normas NBR ISO 14001:2015 e NBR ISO 45001:2018, não há correspondência direta.
Por fim, o requisito “12 Serviços de apoio e fornecimentos externos”, do Anexo E da Portaria n° 189-EME está alinhado com o que determina o item “8.4 Controle de processos, produtos e serviços providos externamente” da NBR ISO 9001:2015, NBR ISO 14001:2015 e NBR ISO 45001:2018, do SGI.
4.2. Discussão
Nesta seção será demonstrada a possibilidade de integração das normas NBR ISO 9001:2015, NBR ISO 14001:2015, NBR ISO 45001:2018 como um Sistema de Gestão Integrada, com os requisitos do Anexo E da Portaria n° 189 – EME, considerando as atividades desempenhadas por um laboratório de ensaios balísticos.
O laboratório de ensaios balísticos utilizado como referência para este artigo adota um documento onde os colaboradores assumem por escrito o compromisso de manter confidencialidade e sigilo sobre todas as informações a que tiver acesso nas dependências do laboratório. Este documento possui identificação alfanumérica, data de emissão, índice de revisão, as assinaturas do gerente da qualidade e da alta direção do laboratório. Toda informação documentada fica protegida suficientemente contra perda de confidencialidade, uso impróprio ou perda de integridade, pois somente o pessoal do laboratório, devidamente autorizado, tem acesso às informações documentadas, internas e externas, para uso, acesso e disposição. Assim, o requisito “1. Confidencialidade”, do Anexo E da Portaria n° 189-EME é atendido pelo subitem “7.5.3 Controle de informação documentada” das normas do Sistema de Gestão Integrada – SGI.
No manual da qualidade do laboratório fica definida a sua estrutura organizacional, além disso, em uma seção do manual da qualidade foi definida uma matriz de responsabilidade que nomeia os responsáveis pelas funções e seus substitutos. O manual da qualidade ainda detalha todas as atribuições de cada componente do laboratório com suas responsabilidades e a autoridade que lhes compete. Desta forma, o requisito “2. Organização”, do Anexo E da Portaria n° 189-EME, que exige definições de responsabilidades, é atendido pelo item ”5.3 Papéis, responsabilidades e autoridades organizacionais” das normas do Sistema de Gestão Integrada – SGI.
As três normas definem que a Alta Direção deve assegurar que as autoridades e responsabilidades para papéis pertinentes sejam atribuídas e comunicadas dentro da organização. Além disso, também é previsto nas três normas que a Alta Direção deve atribuir a responsabilidade e a autoridade tanto para assegurar que o sistema de gestão esteja conforme com os requisitos da respectiva norma quanto para relatar o desempenho do respectivo sistema de gestão para a própria Alta Direção. (Bitencourt; Nepomuceno, 2022. p. 7)
Toda informação documentada do laboratório de ensaios balísticos segue um procedimento para tratamento de documentos, dados e registros. Este procedimento é um documento que estabelece a estrutura para os controles e registros aplicáveis à documentação utilizada no laboratório de ensaios balísticos. O procedimento é identificado por meio de código alfanumérico, possui data de revisão e assinatura de seus responsáveis. Igualmente, os requisitos do Anexo E da Portaria n° 189-EME listados abaixo:
3. Sistema de gestão;
8. Calibração e método de ensaio;
10. Registros;
11. Relatórios de ensaio; e
12. Serviços de apoio e fornecimentos externos.
Exigem gestões para que se mantenha um sistema de registro para gerir de forma segura toda a informação documentada necessária para o bom desempenho das atividades de um laboratório. Este sistema, com seu controle sobre a criação, identificação e atualização de informações, abrange o item “7.5 informação documentada”, das normas do SGI.
As três normas definem que o sistema de gestão, seja ele da qualidade, meio ambiente ou SST, deve incluir informação documentada requerida pelas respectivas normas, bem como informação documentada determinada pela organização como sendo necessária para a eficácia do sistema de gestão. Além disso, também é estabelecido pelas três normas que, ao criar e atualizar informações documentadas, a organização deve assegurar apropriada identificação, descrição, formato e meio, além de análise crítica e aprovação quanto à adequação e suficiência. (Bitencourt; Nepomuceno, 2022. p. 8).
Dois registros importantes adotados pelo laboratório de ensaios balísticos contemplam a qualificação dos integrantes e suas habilidades. No primeiro ficam registrados o cargo, escolaridade, experiência e cursos. No segundo registro fica definido seu nível de habilidade para as atividades que irá desempenhar no laboratório. Existe ainda um procedimento que trata sobre gestão de pessoal, onde é abordada a questão de treinamento dos colaboradores. Estes documentos atendem ao requisito “4. Pessoal”, do Anexo E da Portaria n° 189-EME que garantem a competência do pessoal, formação técnica, experiência e treinamento, como preconiza o item “7.2 Competência”, do Sistema de Gestão Integrada.
As três normas definem que a organização deve determinar a competência necessária das pessoas, bem como trabalhadores no caso da ISO 45001:2018, que afete ou possa afetar o desempenho, em termos de qualidade, meio ambiente e SST. Também é previsto nas três normas que a organização deve assegurar que essas pessoas sejam competentes, com base em educação, treinamento ou experiência apropriados e, onde aplicável, deve tomar ações para adquirir a competência necessária e avaliar a eficácia das ações tomadas. (Bitencourt; Nepomuceno, 2022. p. 8).
As acomodações e as condições ambientais do laboratório de ensaios balísticos precisam de atenção especial no sentido de garantir seu pleno funcionamento com segurança e eficácia. O requisito “5 Acomodações e condições ambientais”, do Anexo E da Portaria n° 189-EME, aborda as condições que tornam propícias às atividades laboratoriais e ensaios, garantindo assim, seus resultados. O subitem “7.1.4 Ambiente para operação dos processos” exige o provimento de recursos e cabe a correlação com o requisito supracitado. Porém, podemos recorrer à abordagem de riscos e oportunidades neste caso, para que o laboratório atenda este requisito plenamente, inclusive no âmbito de requisitos legais. Portanto, o item “6.1 Ações para abordar riscos e oportunidades”, do SGI poderá ser utilizado indiretamente para atender todas as exigências relacionadas às acomodações e condições ambientais do laboratório de ensaios balísticos.
Nas três normas é definido como requisito que a organização, ao planejar o seu sistema de gestão, deve considerar as questões referidas na subseção 4.1, que trata do contexto, bem como os requisitos referidos na subseção 4.2, que trata das necessidades e expectativas das partes interessadas. Além disso, também é previsto nas três normas que a organização deve determinar os riscos e oportunidades que precisam ser abordados, tanto para assegurar que o respectivo sistema de gestão possa alcançar seus resultados pretendidos, como para prevenir ou reduzir efeitos indesejáveis e também para alcançar melhoria. Também é definido nas três normas que a organização deve planejar ações para abordar esses riscos e oportunidades, integrar e implementar as ações nos processos do seu sistema de gestão e avaliar a eficácia dessas ações. (Bitencourt; Nepomuceno, 2022. p. 7).
Os equipamentos do laboratório de ensaios balísticos são mencionados no manual da qualidade onde existem instruções para a sua gestão. Formulários e procedimentos referentes à calibração, identificação e registro são exigidos e mantidos pelo laboratório. O requisito “6 Equipamentos e materiais de referência”, do Anexo E da Portaria n° 189-EME, determina que o laboratório possua todos os equipamentos necessários para realização de suas atividades, além disso, que estes equipamentos devam estar prontos para uso, registrados e identificados com informações suficientes que assegurem seu emprego, identificação, rastreabilidade, controle e calibração. Neste contexto, o subitem “7.1.3 Infraestrutura” da norma NBR ISO 9001:2015 é aplicável quando se trata das capacidades e recursos internos existentes no laboratório. As calibrações dos equipamentos, quando executadas fora do laboratório, podem ser consideradas como obtidas por provedores externos.
Todos os instrumentos e equipamentos do laboratório de ensaios balísticos que tenham efeito significativo sobre a qualidade dos seus resultados devem ser calibrados antes da execução dos ensaios. Um procedimento de manutenção e calibração é um procedimento de rastreabilidade de medição são os principais documentos adotados pelo laboratório para assegurar a existência de um programa periódico de calibração e manutenção, e também de um meio para garantir os critérios apropriados para a análise e aceitação dos certificados de calibração providos por laboratórios externos competentes. Desta forma, grande parte do requisito “7 Rastreabilidade das medições e calibrações”, do Anexo E da Portaria n° 189-EME, é atendida pela norma NBR ISO 9001:2015, em seu subitem “7.1.5.2 Rastreabilidade de medição”. Porém, quando se trata de laboratórios externos que emitem certificados para assegurar que os resultados de medição sejam rastreáveis, pode-se adotar o item “8.4 Controle de processos, produtos e serviços providos externamente”, também da norma NBR ISO 9001:2015 garantindo assim que os resultados obtidos por meios externos não afetem os resultados do laboratório.
Complementando a integração das normas, o item “9.1 Monitoramento, medição, análise e avaliação de desempenho” das normas NBR ISO 14001:2015 e NBR ISO 45001:2018 deve ser observado e aplicado para estabelecer os critérios para os processos de rastreabilidade das medições e calibrações e ter controle desses processos no âmbito destas duas normas.
O laboratório de ensaios balísticos precisa assegurar o correto manuseio, a proteção e o armazenamento dos itens de ensaio, incluindo ainda todas as providências necessárias para a sua proteção e integridade. A identificação dos itens de ensaio deve ocorrer de forma unívoca para que não exista a possibilidade de troca de itens ou equívocos relacionados aos ensaios. Neste sentido, o laboratório analisou e elaborou um procedimento de manuseio, transporte e identificação dos itens de ensaio, o que atende aos requisitos “9 Manuseio dos itens; 10 Registros; e 11 Relatórios de ensaio”, do Anexo E da Portaria n° 189-EME. Ao tratar os itens de ensaio de forma controlada no que se refere à identificação, manuseio, proteção e transporte, o laboratório oferece todo o seu serviço realizado em condições controladas, desta forma, o item “8.5 Produção e provisão de serviço” da NBR ISO 9001:2015 é atendido.
A aquisição de serviços externos e equipamentos pelo laboratório de ensaios balísticos faz parte do seu cotidiano. O último requisito que o Anexo E da Portaria 189-EME cita, é o item “12 Serviços de apoio e fornecimentos externos”, demonstrando a preocupação com os registros dessas atividades, que podem afetar a qualidade, segurança e o ambiente laboratorial. Neste contexto, o atendimento ao item “8.4 Controle de processos, produtos e serviços providos externamente” do Sistema de Gestão Integrada se faz imperativo, visto que o não atendimento tornará crítico o funcionamento do mesmo.
5. Considerações finais
Conforme demonstrado na seção “4. Resultados e Discussão”, ao aplicar os requisitos de um Sistema de Gestão Integrada para verificar os requisitos presentes no Anexo E da Portaria n° 189-EME, o laboratório de ensaios balísticos poderá encontrar meios para melhoria contínua de seus processos. Cabe ressaltar que, quanto ao seu atendimento e aplicação, a Portaria n° 189-EME deve ser integrada ao SGI, pois a mesma é considerada um requisito legal que o laboratório de ensaios balísticos deve atender. Deste modo, um laboratório de ensaios balísticos, não acreditado, terá condições de ser avaliado por um Órgão Certificador Designado (OCD), que por sua vez irá avaliar se este laboratório poderá realizar ensaios de Produtos Controlados pelo Exército (PCE) seguindo o que especifica a Portaria n° 189-EME.
Considerando a abordagem utilizada neste trabalho verifica-se que a acreditação do laboratório pela norma NBR ISO/IEC 17025:2017 fica facilitada, visto que os seus requisitos serão verificados a partir dos requisitos das normas certificadoras NBR ISO 9001:2015, NBR ISO 14001:2015, NBR ISO 45001:2018, do Sistema de Gestão Integrada.
Existe também a possibilidade de aprofundar os estudos em busca de mais requisitos do SGI que atendam o Anexo E da Portaria n° 189-EME, porém como esse estudo se limitou a levantar apenas seções e itens diretamente relacionados com o SGI, existe a possibilidade de um estudo mais aprofundado, levantando os requisitos que não foram observados neste estudo.
Conclui-se então que é possível integrar os requisitos do Anexo E da Portaria n° 189-EME com um Sistema de Gestão Integrada, provendo assim melhorias significativas na entrega dos resultados laboratoriais aos clientes, melhorias na gestão organizacional e preparação para que posteriormente o laboratório inicie um processo de acreditação na norma NBR ISO/IEC 17025:2017 junto a Coordenação Geral de Acreditação do INMETRO (CGCRE).
Referências
ABNT NBR ISO 9000:2015 – Sistemas de gestão da qualidade – Fundamentos e vocabulário. ABNT. 59 p.
ABNT NBR ISO 9001:2015 – Sistemas de gestão da qualidade – Requisitos. ABNT. 32 p.
ABNT NBR ISO 14001:2015 – Sistemas de gestão ambiental – Requisitos com orientações para uso. ABNT. 41 p.
ABNT NBR ISO 45001:2018 – Sistema de gestão da segurança e saúde no trabalho. ABNT. 51 p.
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BITTENCOURT, R. P.; NEPOMUCENO, N. S. “Análise dos Requisitos Comuns às Normas ISO 9001:2015, ISO 14001:2015 e ISO 45001:2018”. Research, Society and Development, Disponível em: https://rsdjournal.org/index.php/rsd/article/view/27160. Acesso em: 14 out. 2023.
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