ANÁLISE DO PERFIL FUNCIONAL DOS ADULTOS COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL : UM OLHAR ATENTO PARA O PROCESSO DE ENVELHECIMENTO

ANALYSIS OF THE FUNCTIONAL PROFILE OF ADULTS WITH INTELLECTUAL DISABILITIES: A LOOK AT THE AGING PROCESS

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th10249152033


Wellington Matheus Leite da Rosa1
Jéssica da Silva Lamp2
Daniele Gorsky3
Diogo Scalon4


RESUMO

Introdução: Adultos com Deficiência Intelectual tem o processo de envelhecimento precoce em relação à população em geral, com maior incidência de doenças crônicas e inatividade física. Pesquisas que busquem identificar as demandas específicas desta população facilitariam a elaboração de programas efetivos de prevenção e promoção da saúde. Objetivos: Identificar o perfil funcional dos adultos com deficiência intelectual frequentadores da APAE Sapucaia do Sul/RS. Métodos: Estudo transversal analítico observacional, realizado entre agosto e novembro de 2023. Foram avaliados 23 Indivíduos adultos e idosos com deficiência intelectual, no que se refere ao nivel de dependência nas AVD’s através do questionário Índice de Barthel Modificado, a capacidade funcional através do Teste de Sentar e Levantar, a mobilidade funcional com o teste Time Up and Go e a Força de Preensão Palmar através da dinamometria manual. Resultados: Observou-se que a deficiência intelectual predominante entre os participantes é moderada(52,2%), seguida pela severa(43,5%). Ademais, na escala de mobilidade funcional o grau de dependência apresentada pelos participantes foi leve (56,5%) e em relação à capacidade funcional, os indivíduos obtiveram desempenho médio de 10,2 repetições e apresentaram uma média de 19,8 Kg de força de preensão de palmar, refletindo uma moderada capacidade funcional dos membros inferiores e força muscular global. Conclusão: Adultos com Deficiência Intelectual (DI) apresentam capacidade física funcional reduzida, maiores índices de sobrepeso e obesidade associados ao grau de DI. Estes podem resultar em menor desempenho funcional, sendo necessária intervenção para prevenção de comorbidades, melhora da qualidade de vida e funcionalidade diante do processo de envelhecimento. 

Palavras-chave: Deficiência Intelectual. Funcionalidade. Capacidade Funcional.

ABSTRACT

Introduction: Adults with Intellectual Disabilities experience premature aging compared to the general population, with higher incidence of chronic diseases and physical inactivity. Research aiming to identify the specific needs of this population would facilitate the development of effective health promotion and prevention programs. Objectives: To identify the functional profile of adults with intellectual disabilities attending APAE Sapucaia do Sul/RS. Methods: This was an observational analytical cross-sectional study conducted between August and November 2023. Twenty-three adult and elderly individuals with intellectual disabilities were evaluated regarding their level of dependence in Activities of Daily Living (ADLs) using the Modified Barthel Index questionnaire, functional capacity with the Sit-to-Stand Test, functional mobility with the Time Up and Go test, and grip strength using manual dynamometry. Results: It was observed that moderate intellectual disability predominated among the participants (52.2%), followed by severe disability (43.5%). Additionally, in terms of functional mobility, participants showed mild dependency (56.5%), and in relation to functional capacity, individuals achieved an average performance of 10.2 repetitions and an average grip strength of 19.8 kg, reflecting moderate functional capacity of the lower limbs and global muscular strength. Conclusion: Adults with Intellectual Disabilities (ID) exhibit reduced functional physical capacity, higher rates of overweight and obesity associated with the degree of ID. These factors may lead to lower functional performance, necessitating interventions for comorbidity prevention, improvement of quality of life, and enhanced functionality during the aging process.

Keywords: Intellectual Disability. Functionality. Functional Capacity.

INTRODUÇÃO

A deficiência intelectual, também conhecida como transtorno do desenvolvimento intelectual, é uma condição que surge durante o período de desenvolvimento e afeta várias áreas funcionais, incluindo habilidades intelectuais, como raciocínio, planejamento, resolução de problemas e aprendizagem acadêmica, bem como habilidades adaptativas nos aspectos conceitual, social e prático (Santos et al., 2021). Como resultado desses déficits, os indivíduos com deficiência intelectual enfrentam dificuldades em alcançar os padrões de desenvolvimento e socioculturais esperados em termos de independência pessoal e responsabilidade social (Schwartzman; Lederman, 2017).

A AAID (2013), cita que a deficiência intelectual abrange cerca de 1% a 3% da população global.  No Brasil, conforme dados do Censo Demográfico de 2010, há pelo menos 2,6 milhões (1,4%) de pessoas com deficiência mental ou intelectual. No estado do Rio Grande do Sul, onde está situado o município em estudo, identificou-se uma proporção de 0,7% de indivíduos com DI, sendo o segundo com maior proporção no Brasil (IBGE, 2017). Assim como a população brasileira geral está constantemente envelhecendo, os adultos com DID também se encaixam nesta curva de envelhecimento (IBGE, 2022).

Embora, no Brasil tenha ocorrido, nos últimos anos, aumento significativo na preocupação e interesse pelas pessoas com deficiência, o envelhecimento desta população é referenciado como sendo uma temática recente e desafiadora considerando a baixa oferta de pesquisas diante das crescentes demandas deste público se comparado ao envelhecimento do restante da população(Cunha et al., 2022; Clemente et al., 2022) principalmente referente a capacidade funcional, a qual é diretamente associada com maiores expectativas e qualidade de vida(Silva et al., 2018). 

Por fim, diante da necessidade de maiores informações que possam colaborar para a elaboração de estratégias específicas e efetivas, voltados à prevenção e promoção da saúde e funcionalidade dos adultos com DI que estão em processo de envelhecimento, o objetivo desta pesquisa consistiu na identificação do perfil funcional dos adultos e idosos com deficiência intelectual que frequentam a APAE Sapucaia/RS.

MÉTODOS

Caracterização da Amostra

Um estudo do tipo transversal analítico observacional com amostragem por acessibilidade, realizado entre agosto a novembro de 2023, nas dependências da APAE da cidade de Sapucaia do Sul/RS, realizado em conformidade às diretrizes da resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde e foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Luterana do Brasil (ULBRA), sob o Parecer nº 6.465.606. Foram incluídos Indivíduos de ambos os sexos, com idade igual ou superior 18 anos, deambuladores, participantes dos grupos de integração, acolhimento e socialização recreativa da APAE Sapucaia do Sul/RS, com diagnóstico clinico de deficiência intelectual em conformidade com o estabelecido e contemplado pela Classificação Internacional de Doenças (CID10 e CID11) através dos códigos de identificação F70, F71, F72, F73, F78 e F79. 

Procedimento de coleta dos dados

Apresentação e Avaliação de Independência Funcional Referida

Foi realizada uma visita presencial na instituição concedente (APAE/Sapucaia), onde os participantes receberam uma descrição detalhada da pesquisa, os indivíduos que não possuíam interdição judicial assinaram o TCLE, em relação aos participantes que possuíam interdição judicial, foi feito contato telefônico com os pais e/ou responsáveis, para apresentação da pesquisa, objetivos, metodologia e aplicação do estudo. Após o contato, os participantes que tiveram o aceite prévio dos seus responsáveis legais, foram encaminhados por meio dos seus representados (sujeitos da pesquisa) o TCLE e assinado por ambos.

A avaliação da independência funcional referida, foi realizada com os pais/ou responsáveis, via contato telefônico, por meio do Índice de Barthel Modificado (IBM), neste questionário de entrevista o entrevistado pode ser o próprio indivíduo ou cuidador/responsável. Este questionário demonstra, confiabilidade e validade como uma ferramenta para a avaliação funcional, o que o torna valioso tanto na prática clínica quanto na pesquisa científica. As pontuações obtidas no teste abrangem uma escala de 0 a 100, onde pontuações mais baixas (0 a 50) indicam maior dependência funcional. 

As perguntas que compõem o IBM são consideradas acessíveis e de fácil compreensão, sendo um facilitador no processo de avaliação e a atribuição de pontuações6. As perguntas corresponderam ao grau de dependência dos sujeitos para realização de atividades funcionais da vida diária referentes a higiene pessoal, banho, alimentação, toalete, subir escadas, vestuário, controle esfincteriano – bexiga, controle esfincteriano – intestino, deambulação. A interpretação do resultado final foi feita com base no somatório de todos os itens categorizados (1 a 9), aplicáveis a indivíduos que deambulam (higiene pessoal, banho, alimentação toalete, subir escadas, vestuário, controle esfincteriano – bexiga, controle esfincteriano – intestino, deambulação).

Previamente a realização dos testes de avaliação funcional, os sujeitos receberam instruções verbais e visuais por meio de demonstração dos pesquisadores, sobre como seriam realizados os testes de sentar e levantar e Time Up and Go, bem como realizaram simulações práticas dos testes propostos. Esta etapa foi realizada em pequenos grupos com os responsáveis por cada projeto da APAE/Sapucaia do Sul-RS(integração, socialização e acolhimento).

Avaliação da Capacidade Funcional

Primeiramente, coletou-se os dados de identificação, bem como os dados de peso e altura, para obter o valor do índice de massa corporal (IMC), em seguida foram verificados os sinais vitais iniciais, sendo estes a saturação periférica de oxigênio (SpO2) e a frequência cardíaca (FC).

Em seguida deu-se início a aplicação dos seguintes testes:

Teste de Sentar e Levantar (TSL): validado por Ricklie e Jones (1999), é uma ferramenta de desempenho funcional evidenciada para avaliação da força de membros inferiores, a qual é fundamental para tarefas básicas que envolvam ficar na posição de ortostase (como manter-se em pé durante o tomar banho) (Campos et al., 2022). Também, apresenta facilidade e praticidade de aplicação, com poucos requisitos de espaço, material e tempo. Foi registrado o número de repetições do ato de sentar e levantar de uma cadeira, sem apoio para os braços, durante 30 segundos(Alcazar et al., 2018).

Time Up and Go (TUG): iniciou com o sujeito partindo da posição sentado, em uma cadeira com as costas apoiadas, ao receber o comando verbal de “JÁ”,  deveria levantar-se (sem auxílio das mãos), caminhar o mais rápido possível e contornando um cone posicionado no solo a 3m de distância da cadeira, retornando a posição inicial (sentado com as costas apoiadas). O tempo de execução foi registrado, por um cronômetro. Duas tentativas foram feitas com intervalo de 3 minutos entre cada, sendo registrado o menor tempo(Vieira et al., 2017). 

Figura 1: Realização do teste Time Up and Go na APAE Sapucaia/RS.

Teste de preensão palmar (TPP): foi realizado com o dinamômetro manual, com o participante sentado em uma cadeira com encosto, com os pés apoiados no chão e cotovelo do membro superior dominante em flexão de 90º. Foi solicitado que o avaliado apertasse a haste do dinamômetro com a maior força possível e relaxasse logo em seguida. Foi dado 1 minuto de intervalo para descanso e o processo foi repetido por 3 vezes. O valor considerado foi a média obtida nas três repetições(Dumard et al., 2022).

ANÁLISE ESTATÍSTICA

Os resultados obtidos das variáveis nominais foram apresentados por meio de análises de frequência. Já, as variáveis contínuas foram descritas utilizando medidas de tendência central (média) e de variabilidade (desvio padrão), sendo todos esses resultados posteriormente analisados à luz do referencial teórico.

Na avaliação da associação entre a Deficiência Intelectual e as Variáveis Demográficas e Clínicas em adultos da APAE, aplicou-se o teste Qui quadrado ou o teste exato de Fischer para comparações envolvendo sexo e categorização nas escalas. Para a comparação dos resultados da deficiência com as escalas contínuas e a idade, recorreu-se ao teste ANOVA de uma via ou ao teste t para amostras independentes, conforme o número de categorias. Essas mesmas análises foram replicadas para examinar a associação com a Classificação do Índice de Barthel Modificado (IBM) e do teste Time Up and Go (TUG).

A correlação entre variáveis como o Índice de Barthel Modificado (IBM), Time Up and Go (TUG), Teste de Sentar/Levantar (TSL) e a média de repetições no teste de pressão palmar foi determinada utilizando a análise de correlação de Pearson.

A escolha dos testes estatísticos baseou-se em pressupostos e na verificação da normalidade dos dados por meio do teste de Shapiro-Wilk. Para todas as análises, estabeleceu-se um nível de significância de p < 0,05.

Os dados coletados na pesquisa foram inicialmente registrados em planilhas do Microsoft Excel e, posteriormente, exportados para o programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 23.0, para a realização das análises estatísticas.

RESULTADOS

A amostra investigada foi constituída por adultos e idosos com deficiência intelectual, ativamente engajados nos grupos de acolhimento da APAE de Sapucaia. O processo de coleta de dados foi meticulosamente estruturado, recorrendo-se a um leque variado de ferramentas metodológicas. 

Para uma compreensão detalhada da demografia e das características dos participantes, a Tabela 1,  apresentada na sequência, mostra a descrição do perfil da amostra estudada. Esta tabela fornece percepções sobre as variáveis demográficas e as especificidades funcionais dos indivíduos envolvidos, fundamentais para a análise e interpretação dos resultados obtidos nesta pesquisa. 

Tabela 1 – Perfil Funcional de Adultos com Deficiência Intelectual Participantes dos Grupos de Integração, Acolhimento e Socialização da APAE da Cidade de Sapucaia:

A Tabela 1 apresenta uma síntese descritiva das variáveis demográficas e clínicas de 23 indivíduos adultos com deficiência intelectual atendidos pela APAE de Sapucaia. A idade média da amostra é de 35,73 anos (±12,23), com uma distribuição que reflete maior concentração nas faixas mais jovens: 8 participantes (34,8%) têm entre 21 a 29,99 anos e outros 8 (34,8%) entre 30 a 39,9 anos. Entre 40 a 49,9 anos, encontram-se 4 indivíduos (17,4%), enquanto 2 (8,7%) estão na faixa de 50 a 59,9 anos e 1 (4,3%) tem 60 anos ou mais.

Em relação ao gênero, 13 participantes (56,5%) são do sexo feminino e 10 (43,5%) do sexo masculino. Essa proporção é um indicativo valioso para compreender o perfil do grupo e possíveis diferenças de gênero que podem influenciar as avaliações funcionais.

O perfil de IMC sugere uma prevalência de sobrepeso, com 8 participantes (34,8%) enquadrados nesta categoria. A obesidade é representada em dois graus: 5 indivíduos (21,7%) com obesidade grau 1 e outros 5 (21,7%) com obesidade grau 2. Baixo peso e eutrofia são observados em 2 indivíduos (8,7%) para cada categoria, e a obesidade extrema é identificada em 1 participante (4,3%).

A deficiência intelectual predominante entre os participantes é a moderada, com 12 indivíduos (52,2%), seguida pela severa em 10 (43,5%). Apenas 1 participante (4,3%) não teve o grau de deficiência especificado.

Esses dados são fundamentais para contextualizar as avaliações funcionais e para fundamentar as análises dos resultados do estudo. A diversidade encontrada reforça a necessidade de cuidados individualizados e estratégias de integração social adaptadas às necessidades específicas de adultos com deficiência intelectual. 

A tabela 2 apresenta dados descritivos com deficiência intelectual participantes do estudo, focalizando três escalas de avaliação funcional: o Índice de Barthel Modificado (IBM), o Time Up and Go (TUG) e o Teste de Sentar/Levantar (TSL), além da média de repetições no teste de pressão palmar.

Tabela 2 – Avaliação da Independência e Mobilidade em Adultos com Deficiência Intelectual da APAE Sapucaia

 No Índice de Barthel Modificado (IBM), que mensura o grau de independência dos indivíduos, a média pontual foi de 91 ± 8,03. Isso sugere um alto nível de independência funcional na amostra, onde 82,6% dos indivíduos apresentaram dependência leve e apenas 4,3% dependência moderada.

Quanto ao Time Up and Go (TUG), que avalia a mobilidade e o risco de quedas, 43,5% dos participantes exibiram um desempenho normal para adultos saudáveis, com baixo risco de quedas, enquanto 56,5% se enquadraram na categoria de normal para idosos frágeis ou com alguma debilidade, mas ainda mantendo independência na maioria das atividades diárias.

O Teste de Sentar/Levantar (TSL) revelou uma média de 10,22 com um desvio padrão de 2,13, refletindo a capacidade funcional dos membros inferiores dos participantes em termos de força e resistência. Adicionalmente, o teste de pressão palmar, que mensura a força de preensão, resultou em uma média de 19,81 repetições e um desvio padrão de 6,46. 

A Tabela 3 consolida as variáveis demográficas e clínicas em relação ao grau de deficiência intelectual dos participantes atendidos pela APAE de Sapucaia. Os resultados são apresentados juntamente com os valores de p para determinar a significância estatística das associações observadas. Ademais, detalha a associação entre o grau de Deficiência Intelectual e variáveis como sexo, idade e os escores obtidos nos testes de IBM, TUG, TSL e o teste de pressão palmar, fornecendo insights valiosos sobre como essas variáveis interagem e potencialmente impactam a funcionalidade dos indivíduos avaliados.

Tabela 3: Análise Estatística das Associações entre Deficiência Intelectual e Variáveis Demográficas e Clínicas em Adultos da APAE Sapucaia

No tocante ao sexo, observa-se uma distribuição quase equiparável entre os gêneros nos grupos com deficiência moderada e severa, com valores de p indicando que as diferenças não são estatisticamente significativas (p=0,5). As idades médias dos participantes são comparáveis entre os diferentes graus de deficiência, também sem significância estatística (p=0,67).

Em relação ao Índice de Massa Corporal (IMC), as categorias variam de baixo peso a obesidade extrema, sem diferenças significativas entre os graus de deficiência (p=0,67). Essa ausência de significância estatística sugere que o IMC é independente do grau de deficiência intelectual na amostra analisada.

A pontuação média no Índice de Barthel Modificado (IBM) mostra uma diferença estatisticamente significativa entre os grupos com deficiência moderada e severa (p=0,02**), indicando que a independência funcional pode estar associada ao grau de deficiência intelectual. A classificação do IBM, no entanto, não apresentou diferenças significativas (p=0,67).

O tempo médio no Teste Time Up and Go (TUG) e sua classificação não revelaram diferenças significativas, com valores de p de 0,07 e 0,32, respectivamente. Isso implica que a mobilidade, conforme avaliada por este teste, não está associada significativamente ao grau de deficiência intelectual dentro desta amostra.

Na avaliação realizada pelo Teste de Sentar/Levantar (TSL), os resultados demonstraram uma uniformidade no desempenho entre os grupos, sem uma diferença estatisticamente significativa (p=0,49). Analogamente, a força de preensão palmar, avaliada através do teste de pressão palmar, não indicou uma correlação estatisticamente significativa com o grau de deficiência intelectual (p=0,11).

Os resultados obtidos são essenciais para um entendimento mais aprofundado da condição física e das habilidades funcionais dos participantes, oferecendo uma base sólida para a elaboração de programas de reabilitação e suporte personalizados. A análise estatística aprimora nossa compreensão das interações entre as variáveis analisadas e os diferentes níveis de deficiência intelectual. 

A Tabela 4 complementará estas informações ao expor a relação destas variáveis com o Índice de Barthel Modificado (IBM), permitindo uma visão mais integrada das capacidades funcionais dos participantes.

Tabela 4: Análise Estatística da associação entre IBM  e Variáveis Demográficas e Clínicas em Adultos da APAE Sapucaia

De acordo com a tabela 4, dentro da dimensão de gênero, todas as mulheres avaliadas foram categorizadas como totalmente independentes, contrastando com os homens, que se distribuíam entre independência leve e ausência de dependência moderada. Este contraste, apesar de aparente, não se traduz em significância estatística (p=0,15), sugerindo que a independência funcional no IBM não difere significativamente entre homens e mulheres.

Quando observamos a idade em relação ao IBM, nota-se uma tendência à maior independência em idades mais avançadas, com uma média de idade mais elevada nos totalmente independentes em comparação com os outros grupos. No entanto, esta tendência não é estatisticamente significativa (p=0,32), indicando que a idade, dentro desta amostra, não é um preditor claro da independência funcional.

Analisando a associação do IMC com o IBM, a distribuição do estado nutricional parece não variar significativamente com os níveis de independência, dado que o valor de p de 0,32 reflete uma falta de associação estatística entre as categorias de IMC e o grau de independência.

A classificação da deficiência intelectual, da mesma forma, não demonstra um padrão comparativo significativo em relação aos escores do IBM (p=0,67), indicando que o nível de independência é relativamente homogêneo entre os diferentes graus de deficiência intelectual.

Em relação ao desempenho no TUG e sua classificação, não foram encontradas diferenças estatísticas que sustentassem uma comparação significativa entre os tempos de teste e os níveis de independência do IBM (p=0,35 para o TUG e p=0,31 para a classificação do TUG).

A constatação de que tanto o Teste de Sentar/Levantar (TSL) quanto o teste de pressão palmar não apresenta diferenças significativas nos resultados (com valores de p de 0,58 e 0,59, respectivamente) sugere uma homogeneidade nas capacidades físicas entre os grupos avaliados. Isso aponta para uma similaridade na função motora grossa e na força de preensão entre os indivíduos, independentemente do seu grau de independência funcional.

Embora as associações estatísticas não tenham sido significativas, essas métricas oferecem uma perspectiva comparativa importante que pode ser explorada em conjunto com as variáveis demográficas e clínicas já coletadas.

A análise apresentada na Tabela 5 explorou as correlações entre as variáveis idade, Índice de Barthel Modificado (IBM), Time Up and Go (TUG), número de repetições de sentar/levantar e média de repetições no teste de pressão palmar.

Tabela 5 – Análise de correlação entre os resultados do testes e idade 

Para a idade, não foi encontrada correlação significativa com o IBM (r = 0,09; p = 0,69), TUG (r = 0,19; p = 0,39), número de repetições de sentar/levantar(r = -0,15; p = 0,51) e média de repetições no teste de pressão palmar (r = 0,527; p = 0,01). Este último apresenta uma correlação negativa moderada, sendo a única medida a ter uma associação significativa com a idade, sugerindo que maior idade pode estar associada a uma menor força de preensão palmar.

O IBM não mostrou correlação significativa com TUG (r = -0,05; p = 0,83) ou com o número de repetições de sentar/levantar (r = 0,02; p = 0,92), e uma correlação negativa não significativa com a média de repetições no teste de pressão palmar (r = -0,08; p = 0,70).

Interessante notar, o TUG teve uma correlação negativa forte e significativa com o número de repetições de sentar/levantar (r = -0,609; p = 0,02), indicando que melhores desempenhos no TUG tendem a estar associados a um maior número de repetições de sentar/levantar. No entanto, o TUG não se correlacionou de maneira significativa com a média de repetições no teste de pressão palmar (r = -0,32; p = 0,14).

Finalmente, não foi observada uma correlação significativa entre o número de repetições de sentar/levantar e a média de repetições no teste de pressão palmar (r = 0,19; p = 0,38).

DISCUSSÃO

Os resultados deste estudo fornecem uma visão integrada das interações entre as capacidades funcionais dos indivíduos, sua idade e outras variáveis clínicas, de modo que a compreensão e discussão dessas relações é fundamental para promover o envelhecimento funcional de adultos e idosos com deficiênica intelectual.

A cerca dos dados demográficos, houve uma prevalência do sexo feminino na amostra. Em contrapartida, os dados do IBGE, destacam, dentre a população brasileira, que apresenta DI, a maioria representada pelo sexo masculino, corroborando a Silva et al., (2021), que investigou o perfil sociodemográfico e clínico de 77 sujeitos com DI, em um munícipio de pequeno porte do RS, onde 59,74% eram do sexo masculino (Silva et al., 2018). No entanto, diferente dos nossos achados, ambas pesquisas citadas, não limitaram a faixa etária, sendo incluídas na amostra, também crianças e adolescentes, podendo então, este fator ter impacto na prevalência do sexo feminino para esta pesquisa.

A média de idade dos adultos com DI, participantes desta pesquisa, foi de 36 anos. Para fins legais, no Brasil, a pessoa com deficiência, é considerada idosa, quando atinge idade ≥ 45 anos12. Bonatelli et al., (2010), destaca que os déficits associados ao processo de envelhecimento, para esta população, iniciam em torno dos 30 anos de idade, em razão, do longo tempo, de uso constante, de medicamentos. Indo ao encontro destes autores, nesta pesquisa, percebeu-se que, a maioria da amostra, fazia uso de pelo menos um medicamento constante, principalmente anticonvulsivantes. Destaca-se como consequência destas medicações, a predisposição à problemas de saúde, que comprometem a força e a mobilidade secundários(Acharya et al., 2016;Bonatelli et al., 2022).

Embora não tenham sido encontradas diferenças estatísticas significativas em relação ao sexo e à idade nos testes funcionais, essas descobertas fornecem uma base para o desenvolvimento de programas de reabilitação e exercícios físicos adaptados, que contribuam para a melhoria da qualidade de vida e da autonomia dos indivíduos com deficiência intelectual. As intervenções devem ser personalizadas para atender às necessidades específicas de cada indivíduo, considerando a complexidade das suas condições e o ambiente em que vivem.

Delinocente et al., (2021), que tinha por objetivo identificar pontos de corte para identificação de limitação funcional, por meio da força de preensão palmar, em 5.783 sujeitos, com idade ≥ 60 anos, estimaram maior probabilidade de limitação de mobilidade para os homens, que apresentaram ≤ 31 kg, e valores ≤ 21 kg para mulheres. Neste estudo, os valores de preensão palmar, foram menores do que os estimados para idosos, embora os participantes fossem mais jovens. Tal resultado, poderia predispor um envelhecimento funcional precoce, associado a limitação de mobilidade, nos participantes desta pesquisa. No entanto, a limitação de estudos que relacionem o TPP em sujeitos com DI, não permite tal afirmação. Sendo assim, para a população desta pesquisa, estima-se que, a dificuldade de compreensão da tarefa, por causa do déficit cognitivo, pode ter influenciado o resultado do teste de preensão palmar, já que, nenhum dos participantes apresentava DI classificada como leve. Além disso, a força de preensão palmar diminuiu com a idade, apontando para a necessidade de exercícios que preservem e melhorem a força da mão e do antebraço, essenciais para a realização de tarefas diárias e para a manutenção da autonomia, já que está  parece estar sendo pouco explorada em tarefas funcionais e sim de autocuidado(Souza et al., 2016).

A mobilidade funcional, nesta pesquisa foi avaliada com o teste TUG, sendo o tempo médio, de 11,16 segundos, superior ao estimado na revisão sistemática com meta-análise, realizada por Bohannon (2016), para pessoas saudáveis, com 70 anos, as quais apresentaram 9,20s no TUG15. Breelan et al., (2016), que tinham por objetivo identificar valores normativos para sujeitos com idade ≤50 anos, em 200 sujeitos, separados por grupos de décadas etárias (20,30,40,50), encontrou para o grupo com idade média de 33,88 anos, o tempo médio de 8,56 segundos, sendo tempos mais lentos (9,90), associados ao aumento da idade, maiores valores de IMC, piores percepções de saúde física e/ou mental, e capacidade física reduzida (Kear, Guck, Mcgaha, 2017). Nesta pesquisa, não foi avaliado a percepção de saúde dos participantes, porém, os resultados apontam obesidade grau I, para os DI severos (33,08), que apresentaram maior média de tempo no desempenho do TUG (12,57s), e sobrepeso (28,06), para os com DI moderada, com TUG de 10,31s (tabela 3).

Sendo assim, sugere-se que, na população em estudo, maiores níveis de DI e IMC, poderia predispor pior mobilidade funcional, avaliada com o TUG.  

No que diz respeito ao TUG e TSL, identificou-se uma correlação negativa significativa, indicando que melhores desempenhos em um podem estar relacionados a melhores resultados no outro. Essa relação destaca a importância de intervenções que incluam exercícios de fortalecimento e coordenação para melhorar o equilíbrio e reduzir o risco de quedas. A partir da comparação dos resultados obtidos nas Tabelas 3, 4 e 5, observa-se que a independência funcional, medida pelo IBM, não apresentou correlações significativas com as outras variáveis funcionais, sugerindo que a independência pode ser influenciada por uma gama mais ampla de fatores, talvez ambientais ou de suporte social, além das capacidades físicas mensuradas. A independência funcional referida pelos responsáveis, avaliada com IBM, demonstrou que todos os sujeitos deste estudo, apresentavam grau de dependência leve para tarefas do dia-a-dia, sendo que, o grupo com DI severa apresentou uma pontuação maior (≈8 pontos). Contudo, faz-se necessário o desenvolvimento de outros instrumentos para a detecção mais fidedigna das limitações apresentadas pelos adultos e idosos com DI(Girondi et al., 2018).

Limitações do estudo

Escassez de estudos referente a capacidade funcional e valores normativos dos testes funcionais, para sujeitos com deficiência intelectual.

CONCLUSÃO

Em conclusão, de modo geral, os participantes do projeto de integração e acolhimento da APAE-Sapucaia do Sul/RS, apresentam leve dependência funcional referida, redução da capacidade física associada ao desempenho do teste TUG e a obesidade. Este estudo sublinha a necessidade de uma abordagem multidisciplinar e holística no atendimento dessa população com deficiência intelectual em processo de envelhecimento.  Sendo assim, sugerese a continuidade das investigacões referente ao perfil funcional de adultos e idosos com deficiência intelectual para responder às necessidades emergentes de saúde e mobilidade desta população, promovendo seu bem-estar e inclusão social.

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1Acadêmico de Fisioterapia – Universidade Luterana do Brasil – ULBRA – Canoas. Av. Farroupilha, 8001. Bairro São José, Canoas / RS, Brasil CEP: 92425-900 – E-mail: w.matheuslr@gmail.com

2 Docente do Curso de Fisioterapia da Universidade Luterana do Brasil – ULBRA – Canoas. Av. Farroupilha, 8001. Bairro São José, Canoas / RS, Brasil CEP: 92425-900 – Email: jessica.lamp@ulbra.br

3 Fisioterapeuta – Mestre em Ciências da Saúde da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre – UFCSPA -Porto Alegre / RS, Brasil, CEP: 90050-170. E-mail: danigorski@icloud.com

4 Orientador / Docente do Curso de Fisioterapia da Universidade Luterana do Brasil – ULBRA – Canoas. Av. Farroupilha, 8001. Bairro São José, Canoas / RS / Brasil CEP: 92425-900. E-mail: diogo.scalon@ulbra.br

Endereço para correspondência:
Diogo Scalon, (51) 99869550
Av. Farroupilha, 8001
Bairro São José – Canoas / RS / BR