ANÁLISE DO EQUILÍBRIO FLUVIAL DO RIO PURUS ATRAVÉS DOS  DADOS DOS SATÉLITES SENTINEL-3A e SENTINEL-3B

ANALYSIS OF THE FLUVIAL BALANCE OF THE PURUS RIVER  THROUGH DATA FROM THE SENTINEL-3A and SENTINEL-3B  SATELLITE 

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7594652


Jean Carlo Ramalho da Rocha¹
Joecila Santos da Silva²


Resumo – A altimetria espacial surgiu com o propósito de determinar a topografia e a superfície dos oceanos, sendo uma técnica de sensoriamento remoto que tem como  objetivo obter o nível de água de um corpo hídrico. A utilização de dados de satélite  para estudos hidrológicos possibilita o alcance do conhecimento em áreas de difícil  acesso e/ou em locais com baixa quantidade de estações fluviométricas existentes. Por se tratar de uma região muito extensa e de difícil acesso, a coleta de dados na  região Amazônica é por muitas vezes complicada e ineficiente, por conta disso a  altimetria espacial se tornou uma alternativa à obtenção de dados hidrológicos. Este  trabalho tem como objetivo analisar o perfil longitudinal do rio Purus usando dados  altimétricos provenientes dos satélites Sentinel-3A e 3B e detectar anomalias em seu  curso aplicando o índice de Hack ou Relação Declividade-Extensão (RDE). Os  resultados denotam uma altitude máxima de 310,61m no início do canal e 27,61m  próximo da foz. Comprimento do canal igual a 3.619,3 km. O índice RDE total corresponde a 18,74 indicando que o curso fluvial se encontra em sua maior extensão  em equilíbrio apresentando anomalias somente de 2º grau. 

Palavras-chave: Altimetria, rio Purus, Sentinel-3A e 3B, índice RDE, análise do equilíbrio fluvial. 

Abstract – Spatial altimetry emerged with the purpose of determining the topography  and surface of the oceans, being a remote sensing technique that aims to obtain the  water level of a water body. The use of satellite data for hydrological studies makes it  possible to reach knowledge in areas of difficult access and/or in places with a low  number of existing fluviometric stations. Because it is a very extensive and difficult to  access region, data collection in the Amazon region is often complicated and  inefficient, because of this, spatial altimetry has become an alternative to obtaining  hydrological data. This work aims to analyze the longitudinal profile of the Purus River  using altimetric data from the Sentinel-3A and 3B satellites and to detect anomalies in  its course by applying the Hack index or Slope-Length Ratio (SLR). The results denote  a maximum altitude of 310.61m at the upstream and 27.61m at the downstream.  Channel length equal to 3,619.3 km. The total SL Ratio corresponds to 18.74,  indicating that the river course is in its greatest extent in equilibrium, presenting only  2nd degree anomalies. 

Keywords: Altimetry, Purus river, Sentinel-3A & 3B, SLR, analysis of the river’s fluvial balance. 

1. INTRODUÇÃO 

O rio Purus é um curso de água da Amazônia, que percorre o território do Peru e dos estados brasileiros do Acre e do Amazonas. É um rio muito sinuoso,  com águas brancas. Aproximadamente 40% do desembarque pesqueiro da  cidade de Manaus é proveniente de seus lagos de várzea. Existem grandes  reservas naturais nas suas margens: a Reserva Biológica do Abufari e a Reserva  de Desenvolvimento Sustentável do Piagaçu-Purus (ambas no estado do  Amazonas) e a Floresta Estadual do Chandless (no Acre). 

Por conta da falta de informações suficientes, o uso de medidas estimadas  por satélites altimétricos torna-se uma opção bastante relevante, podendo estas  serem obtidas em regiões extensas e remotas como as existentes na bacia  Amazônica. A altimetria espacial é caracterizada em alcançar tais regiões de  forma homogênea, contínua e frequente, possuindo detalhamento espacial e  temporal diferentes das redes de observações tradicionais (CALMANT e SEYLER, 2006). 

O estudo da declividade do rio quando aliado a geomorfologia pode ser  uma ferramenta muito importante para a compreensão não só dos fenômenos  hidrológicos que atuam em uma bacia hidrográfica, mas também dos  condicionantes que equilibram ou desequilibram os sistemas fluviais (DE  SOUZA, SOUZA e GOLDFARB, 2011).  

Os perfis longitudinais consistem na relação entre as variações  altimétricas e o comprimento do rio desde a nascente até a foz (DE SOUZA,  SOUZA e GOLDFARB, 2011). É esperado que os perfis longitudinais  apresentem uma forma côncava com aumento da sua concavidade para  montante (IBANEZ et al., 2013). Qualquer variação ou anomalia nesta formação  indica que a drenagem encontra-se desajustada (MONTEIRO et al., 2014). A análise do perfil longitudinal proposta por Hack (1973) refere-se a um plano  cartesiano, onde no eixo das ordenadas são inseridos os valores da altimetria e  no eixo das abcissas os valores referentes ao comprimento dos trechos do rio  analisado. 

Quando se trata de cursos fluviais em equilíbrio (estado estacionário)  apresentam morfologia com declividades maiores à montante e gradativamente  menores à jusante. Quando essa condição é alterada é possível detectar essas  variações por anomalias ao longo do perfil longitudinal e índices de gradiente  que indicam a intensidade da anomalia, um deles é o índice de Hack ou Relação  Declividade-Extensão (RDE), (CREMON, 2014). 

Este trabalho propõe-se a analisar o equilíbrio do rio Purus através do  perfil longitudinal elaborado com dados altimétricos provenientes da missão  altimétrica SENTINEL. Para tal análise será aplicado o índice RDE buscando  detectar e quantificar zonas anômalas ao longo de seu curso principal que  possam identificar atividade neotectônica e/ou imposição litológica. 

2. MATERIAL E MÉTODOS 

2.1. Área de Estudo 

A bacia do rio Purus, mostrada na figura 1, possui uma área de drenagem  de 63.166 km² e vazão de 11.000 m³/s. Este tem sua nascente nas colinas do  Arco Fitzcarrald, situado na floresta baixa Peruana dos departamentos de  Ucayali e Madre de Dios (UNEP, 2004). A nascente se dá no Peru, entrando no  Brasil pelo estado do Acre, no município de Santa Rosa do Purus, passando pelo  município de Manoel Urbano e entra no estado do Amazonas pelo município de  Boca do Acre, onde recebe as águas do Rio Acre. Segue pelo estado do  Amazonas até desaguar no rio Solimões, ponto B da figura 1. É um rio  constituído de águas brancas, mais conhecidas por águas barrentas, devido à  expressiva carga de sedimentos em suspensão, formada principalmente por  material de granulometria silte e argila, mineralogicamente constituída de  quartzo, feldspato e argilominerais (esmectita, caulinita, ilita) e moscovita. Em  características gerais, é um rio rico em peixes e sais minerais (FREITAS et al.,  2013).

Figura 1 – Rio Purus e suas estações virtuais plotadas no Google Earth Pro Fonte: Rocha, 2023. 

Fonte: Rocha, 2023.

2.2. Dados Altimétricos 

Nesta pesquisa foram utilizados os dados dos satélites altimétricos  Sentinel-3A e Sentinel-3B, compreendendo os períodos de 2016 a 2022 e 2018  a 2022, respectivamente, empregando o algoritmo standard de tratamento de FO  Ice-1 e o modelo de ondulação geoidal EGM2008, desenvolvido por Pavlis et al.  (2008). Os dados altimétricos adotados fazem parte da Rede de Monitoramento  Altimétrico do Laboratório RHASA disponíveis na base de dados Hidroweb, da  plataforma THEIA-CNES. 

2.3. Métodos 

2.3.1. Obtenção dos dados altimétricos  

Uma Estação Virtual (EV) baseia-se na convergência de um traço do  satélite altimétrico com o corpo hídrico na superfície terrestre, sendo  eventualmente possível a obtenção de uma série temporal da altura do plano de  água (SILVA, 2010; CALMANT, 2006). Para esta pesquisa, as EVs para o  Sentinel 3A e 3B já estão prontas e disponíveis na Plataforma THEIA-CNES  (https://hydroweb.theia-land.fr/?lang=en&). No site é possível filtrar os dados e  selecioná-los por bacia, rio ou lago. O formato do arquivo baixado é txt (Documento de texto).

2.3.2. Mapeamento das estações virtuais 

Para a realização do mapeamento das estações altimétricas, foi utilizado  o software Google Earth Pro, versão 7.3. Primeiramente foi necessário realizar  a instalação de alguns complementos no programa, como: contornos de perfil da  bacia hidrográfica e os traços dos satélites Sentinel 3A e 3B, exibido na figura 1.  Após esse procedimento iniciou-se o mapeamento das EVs. Este procedimento  é manual e deve ser realizado através das coordenadas da EV. 

Diversos fatores, tais como bancos de areia, ilhotas, vegetação interfluvial  entre outros podem interferir no resultado das medidas altimétricas que não são  necessariamente medidas válidas para o estudo (SILVA et al., 2010). Portanto,  inicialmente, foi necessária uma revisão mais apurada dos dados para se obter  informações apropriadas, eliminando os pontos espúrios. Em seguida foram  geradas as séries temporais altimétricas de níveis d’água no software Excel 365,  excluindo-se as medições espúrias que estejam muito fora do regime hidrológico  obtido. 

2.3.3. Perfil longitudinal 

Os perfis longitudinais são formados pela relação entre as cotas  (variações altimétricas) e a extensão total do rio, desde a nascente até a foz (DE  SOUZA et al., 2015). Os dados referentes às cotas máximas para cada mês  foram extraídos a partir das séries temporais altimétricas. Em seguida, através  do uso do software Google Earth Pro, versão 7.3, foi possível obter-se as  distâncias entre EVs e de cada EV até a nascente do rio Purus. 

Os dados obtidos foram passados para o software Excel, onde foram  elaborados os perfis longitudinais do rio Purus e plotados em gráficos, onde o  eixo das ordenadas corresponde às cotas máximas em relação ao EGM2008 (m)  e o eixo das abscissas a extensão do curso do rio Purus (km). 

2.3.4. Índice de Hack ou Relação-Declividade- Extensão (RDE) 

A obtenção do índice de Hack ou RDE para um trecho do curso d’água foi  feita pela relação entre a diferença altimétrica entre dois pontos extremos de um  segmento de drenagem (Δh) e o comprimento da projeção horizontal da extensão do segmento considerado (Δl) multiplicada pelo comprimento do  curso de água entre o ponto inferior do segmento considerado até a nascente  (L), conforme Equação 1.  

Já o RDE para o curso total foi calculado através da diferença altimétrica  total do curso (ΔH) dividida pelo logaritmo natural da extensão total (ln L),  conforme as Equação 2 e Figura 02. 

Figura 2 – Parâmetros necessários para o cálculo do índice RDE. 

Fonte: Adaptado de HACK,1973. 

2.3.5. Análise do equilíbrio do rio Purus 

A análise do equilíbrio do rio Purus, no que diz respeito à sua capacidade  de erosão, transporte e deposição foi realizada por meio das anomalias  calculadas para cada trecho entre as EVs, obtidas dividindo-se o RDE do trecho  pelo RDE total, de acordo com a equação 3 e analisadas conforme tabela 1. 

Tabela 1 – Classificação das anomalias. 

Fonte: Adaptado de GOLDFARB, 2012.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO 

Foram obtidas 44 estações virtuais sob varredura dos satélites Sentinel 3A e 3B ao longo da extensão do rio Purus, com um comprimento total de  3.619,3km, no intervalo configurado pelas estações virtuais  R_AMAZONAS_PURUS_KM4925 (mais próxima à nascente) e  R_AMAZONAS_PURUS_KM1511 (mais próxima à foz), conforme a Tabela 2.  

A cota máxima encontrada foi de 310,61 metros e a cota mínima de 27,61  metros, sendo identificada a maior variação de altitude entre as EVs (∆h) como 40,41 metros. 

Seu perfil revela que o curso fluvial se encontra em sua maior extensão  em equilíbrio, da nascente à foz. Nele podem-se distinguir áreas em ascensão  (convexas) e subsidências (côncavas), cujo RDE Total corresponde a 18,74, ilustrado na Figura 03.

Figura 3 – Perfil longitudinal do rio Purus. 

Fonte: Rocha, 2023. 

Tabela 2 – Variáveis morfométricas do rio Purus. RDEtotal = 18,7395. Parte 1. 

Fonte: Rocha, 2023.

Tabela 2 – Variáveis morfométricas do rio Purus. RDEtotal = 18,7395. Parte 2.

Fonte: Rocha, 2023.

Tabela 2 – Variáveis morfométricas do rio Purus. RDEtotal = 18,7395. Parte 3.

Fonte: Rocha, 2023.

Dos trechos analisados no rio Purus, 5 foram identificados como em  equilíbrio, ou seja, apresentam índice RDE menores que 2. Os demais trechos  apresentaram anomalias de 2ª ordem (RDE maior que 2 e menor que 10) e  nenhum apresentou anomalia de 1ª ordem (RDE maior que 10). A figura 4  representa os valores das anomalias. 

Figura 4 – Distribuição dos valores RDEtrecho/ RDEtotal ao longo da extensão do rio Purus.

Fonte: Rocha, 2023. 

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS 

Este estudo foi uma proposta para análise de um rio muito importante,  para a região Amazônica, o rio Purus. Utilizando-se dados provenientes das  missões Sentinel-3A e Sentinel-3B, pode-se afirmar que a altimetria espacial é  eficaz e pode ser aplicada na elaboração e estudo do perfil longitudinal do rio  Purus, bem como de outros rios. Destacando-se que durante as análises dos  dados, surgiram alguns dados que precisaram ser excluídos, demonstrando, assim, a necessidade de atenção e cuidado em sua utilização. 

Através do gradiente de anomalia constatou-se que o curso fluvial se  encontra em sua maior extensão em equilíbrio apresentando 5 trechos em  equilíbrio, bem como 39 com presença de anomalias de 2ª ordem relacionadas  principalmente a mudanças litológicas, modificações abruptas na carga  sedimentar, estrutura topográfica, convergência de canais/ encontro de afluentes que causam aumento da vazão. 

A missão altimétrica SWOT (Surface Water Ocean Topography), lançada  em 16/12/2022 utilizando a altimetria interferométrica e um altímetro radar,  fornecerá imagens de elevação de superfície de água, o que possibilitará  aprimorar o monitoramento dos níveis de água, favorecendo a análise espacial  no estudo da variabilidade hidrológica. 

AGRADECIMENTOS  

Este estudo se insere nos projetos de pesquisa SWOT for South America (CENS) e FOAM (CNES/TOSCA). Os autores agradecem ao Centre National  d’Études Spatiales (CNES) pelos dados altimétricos dos satélites Sentinel 3A e  3B e à European Space Agency (ESA) pela garantia do uso dos dados da missão  SENTINEL disponibilizados para a pesquisa.  

5. REFERÊNCIAS  

CALMANT, S. e SEYLER, F. 2006. Continental surface water from satellite  altimetry. Comptes Rendus Geosciences. 338(14-15), 1113-1122, doi:  10.1016/j.crte.2006.05.012.

CREMON, E. H. Índices de gradiente e anomalias morfoestruturais em rios  extensos: exemplo dos rios Uraricoera-Branco-RR. Revista Geonorte, Ed.  Especial 4, v. 10, n. 6, p. 146-152, 2014. 

DE SOUZA, R. B., SOUZA, J. B., GOLDFARB, M. C. Determinação e análise  do perfil longitudinal do rio Una – PE. In Anais do XIX Simpósio Brasileiro de  Recursos Hídricos. Maceió : 2011, p. 11-12. 

FREITAS, L. G.; SILVA, J. S.; CALMANT, S.; SEYLER, F. Aplicações da  altimetria espacial para monitoramento hidrológico da bacia do rio Purus.  In Anais do XVI Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto- SBSR, Foz do  Iguaçu, Abr. 2013.  

GOLDFARB, M. Contribuição para modelagem de perfil longitudinal: bacia  do rio Una. In: Congresso de matemática aplicada e computacional, 2012. 

HACK, J. T. Stream-profile analysis and stream-gradient index. Journal  Research of the U. S. Geol. Survey, v. 1, n. 4, p. 421-429, 1973. 

IBANEZ, D. M.; MIRANDA, F. P.; ALMEIDA FILHO, R. Controle de estruturas  do embasamento sobre o relevo da porção central da Bacia do Parnaíba  evidenciado pela análise dos perfis longitudinais de rios. Foz do Iguaçu: XVI  Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto – SBSR, 2013. 

LEON, J.G.; CALMANT, S.; SEYLER, F.; BONNET, M.P.; CAUHOPÉ, M. Rating  curves and average water depth estimation at the upper Rio Negro from  altimetric spatial data and calculated remote discharges. Journal of  Hydrology 328:481-496, 2006. 

MONTEIRO, K. A.; TAVARES, B. A. C.; CORREA, A. C. B. Aplicação do índice  de Hack no rio Ipojuca para identificação de setores anômalos de drenagem  e rupturas de relevo. São Paulo: UNESP- Geociências, v. 33, n. 4, p. 616-628,  2014. 

SILVA, J. S. Altimetria Espacial em Zonas Úmidas da Bacia Amazônica:  aplicações hidrológicas. Sarrebruck: Éditions Universitaires Européennes,  2010, 360p.

UNEP. BARTHEM, R. B. et al. Amazon Basin, GIWA Regional assessment 40b.  University of Kalmar, Kalmar, Sweden, 2004.


¹Universidade do Estado do Amazonas – UEA: jcramalho96@hotmail.com  
²Universidade do Estado do Amazonas – UEA: jsdsilva@uea.edu.br