ANÁLISE DA PREVALÊNCIA DE CASOS DE ESQUISTOSSOMOSE EM MUNICÍPIOS BAIANOS

REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.10173802


Cleiton Almeida Carneiro1
Daniele Ferreira Borges2
Kemilly Ferreira Cordeiro Carneiro3
Leonardo Inácio Flores Ribeiro4
Liza Hillary Pereira Santos5
Anny Carolinny Tigre Almeida Chaves6


RESUMO

INTRODUÇÃO: A esquistossomose é uma doença de caráter endêmico, de grande importância em saúde pública, encontrada em 54 países da África, Ásia e América do Sul. O Brasil é o país com maior número de casos nas Américas. Diretamente relacionada ao saneamento precário, qualquer pessoa, independentemente de sexo, faixa etária e raça é susceptível ao parasita da esquistossomose. OBJETIVO: Analisar a prevalência epidemiológica da esquistossomose mansônica nos municípios baianos de Entre Rios, Itapicuru, Jequié, Maragogipe e Ubaitaba, entre o período de 2010 a 2021. METODOLOGIA: O estudo foi desenvolvido por meio da coleta de dados secundários, obtidos através do Sistema de Informação de Agravos de Notificação, Sistema Informatizado do Programa de Controle da Esquistossomose, Programa de Controle da Esquistossomose e divulgados na plataforma eletrônica do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde, acerca dos casos confirmados e notificados de esquistossomose nos municípios supracitados. RESULTADOS: O número de indivíduos que receberam o recipiente para coleta do material foram 1.175.615 e, deste total, 68,9% aderiram ao exame. O número total de exames realizados foi de 810.178, dos quais 23.616 testaram positivos. Em relação ao tratamento dos infectados, o município de Itapicuru não apresentou ausentes. CONCLUSÃO: Para assegurar um controle eficaz e duradouro da esquistossomose, é essencial a implementação de políticas públicas voltadas para a melhoria das condições de vida das populações afetadas. Isso envolve a detecção e tratamento dos portadores da doença, bem como a redução de sua disseminação geográfica.

Palavras-chave: Esquistossomose mansoni. Saneamento básico. Programa de esquistossomose. Infecção por schistosoma. Barriga d’água.

1 INTRODUÇÃO  

A Esquistossomose, também conhecida popularmente como “doença dos caramujos”, “xistose”, ou “barriga d’água” é uma doença transmissível, parasitária, causada pelo trematódeo digenéico Schistossoma mansoni que tem o homem como seu principal hospedeiro e, como hospedeiro intermediário, os caramujos do gênero Biomphalaria.

Diretamente relacionada ao saneamento precário, qualquer pessoa, independentemente de sexo, faixa etária e raça é susceptível ao parasita da esquistossomose. Situações como o contato com água de lagoas, represas, valas de irrigação e córregos que contenham caramujos infectados e as moradias em regiões onde não há água potável ou saneamento básico são considerados grandes fatores de riscos para transmissão da infecção.¹³  

Vale destacar que a esquistossomose foi introduzida no Brasil por meio do tráfico de escravos vindos do continente Africano, que ingressaram no país principalmente pelos portos de Recife e Salvador para trabalharem nas lavouras de cana-de-açúcar. O primeiro registro de Schistosoma foi realizado pelo médico baiano Pirajá da Silva em 1908, em que ao analisar o sangue fresco de um jovem de Salvador, o médico observou a presença de hematozoários em forma crescente e ovos que, segundo ele, eram semelhantes aos do S. mansoni. Após observar mais dois casos, constatou-se a presença de ovos também em fezes.²,³,⁴  

Observa-se assim que as pessoas infectadas por essa parasitose eliminam ovos viáveis de S. mansoni pelas fezes, tornando-se fonte de infecção. Estes ovos trazem em seu interior uma larva ciliada, chamada miracídio, que após serem liberados dos ovos mediante contato com a água, penetram no caramujo do gênero Biomphalaria. De duas a três semanas, esses miracídios se multiplicam e se transformam em outras larvas, que começam a ser liberadas, em grande número, pelo caramujo e essa forma infectante larvária tem o nome de cercária.¹ O Brasil, como um país tropical, onde a temperatura tende a ser elevada, tem a esquistossomose como um problema endêmico, em vasta extensão do território e é considerada, ainda, um grave problema de saúde pública, porque acomete milhões de pessoas, provocando, anualmente, um número expressivo de casos.⁴,,⁶  

Encontrada em 54 países da África, Ásia e América do Sul, a esquistossomose é uma doença de caráter endêmico, de grande importância em saúde pública. Segundo Santos (2020), o Brasil é o país com maior número de casos, nas Américas, estimando-se que mais de 200 milhões de pessoas estejam infectadas e que outras 779 milhões corram o risco de infecção em todo o mundo. Assim, por causar cerca de 200 mil mortes por ano mundialmente, é considerada a segunda infecção parasitária mais importante, ficando atrás apenas da malária.⁷

Diante disso, este estudo teve como objetivo analisar a prevalência epidemiológica da esquistossomose mansônica nos municípios baianos de Entre Rios, Itapicuru, Jequié, Maragogipe e Ubaitaba, entre o período de 2010 a 2021. 

  • METODOLOGIA
  • presente estudo caracteriza-se como uma pesquisa epidemiológica, de caráter descritivo. Segundo Prodanov e Freitas (2013), este tipo de pesquisa visa observar, descrever, analisar, classificar as características de determinada população ou fenômeno ou o estabelecimento de relações entre variáveis, sem que o pesquisador interfira neles. ⁸

A pesquisa foi desenvolvida por meio da coleta de dados secundários, entre o período de 2010 e 2021, acerca dos casos confirmados e notificados de esquistossomose nos municípios de Entre Rios, Itapicuru, Jequié, Maragogipe e Ubaitaba, ambos do estado da Bahia. Estes dados foram obtidos através do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN), Sistema Informatizado do Programa de Controle da Esquistossomose (SISPCE), Programa de Controle da Esquistossomose (PCE) e divulgados na plataforma eletrônica do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS).

A plataforma TABNET foi utilizada para a obtenção dos dados, os quais em sequência foram tabulados com auxílio do software Excel Microsoft Office 2016 para que fossem analisados, partindo da seleção dos seguintes indicadores: ações de controle (população trabalhada, exames realizados, tratamento e ausência) e

epidemiológicos (exames positivos).

Não foi necessário submeter o trabalho ao Comitê de Ética e Pesquisa em Seres Humanos (CEP), pois, as análises foram realizadas a partir de dados secundários obtidos no DATASUS. 

  • RESULTADOS
  • PCE tem como objetivo guiar os municípios no sentido do controle da doença, concentrando suas ações no diagnóstico e tratamento de infectados. Para o diagnóstico é realizado o exame laboratorial de coproscopia em que o material deve ser coletado em um recipiente específico. O número de indivíduos que receberam o recipiente para coleta do material foram 1.175.615 e, deste total, 68,9% (810.178) aderiram ao exame (coproscopia). Ao analisar a tabela identificou-se uma adesão superior a 50% em todos os municípios (Tabela I).

Tabela I. Número de população trabalhada e exames realizados entre 2010-2021. Bahia, Brasil.

MunicípioPopulação trabalhadaExames realizados  Prevalência
Entre rios80.92048.21859,6%
Itapicuru747.224498.27066,7%
Jequié195.728143.92773,5%
Maragogipe69.30359.90686,4%
Ubaitaba82.44059.85772,60%
Total 1.175.615810.17868,9%

Fonte: Programa de Vigilância e Controle da Esquistossomose – DATASUS. ⁹

De acordo com a tabela II, o número total de exames realizados no período de 2010 a 2021 foi de 810.178, sendo que 23.616 testaram positivos. Itapicuru e Jequié tiveram destaque em relação aos exames positivos, respectivamente 8.371 e 4.463, e com a prevalência de 1,7% e 3,1% (Tabela II).

Tabela II. Exames realizados, exames positivos e prevalência de esquistossomose entre 2010-2021. Bahia, Brasil. 

MunicípioExames realizadosExames PositivosPrevalência
Entre rios48.2183.6107,4%
Itapicuru498.2708.3711,7%
Jequié143.9274.4633,1%
Maragogipe59.9063.6006%
Ubaitaba59.8573.5735,9%
Total810.17823.6172,9%

Fonte: Programa de Vigilância e Controle da Esquistossomose – DATASUS. ⁹

De acordo com o SISPCE, em relação ao tratamento dos infectados, no município de Ubaitaba, mais da metade dos indivíduos se ausentaram (96,19%) e, o inverso foi observado em Entre Rios, onde 0,11% dos parasitados se ausentaram, seguidos dos municípios de Maragogipe 0,2% (n=8), Jequié 10,36% (n=370) e o município de Itapicuru que, segundo o PCE, não apresentou ausentes (Tabela III).

Tabela III. Distribuição dos indivíduos infectados por Esquistossomose por municípios, segundo as variáveis, tratamento e ausência, no período de 2010-2021.

MunicípioTratadosAusentesPrevalência
Entre Rios2.54030,11%
Itapicuru3.838
Jequié3.56837010,36%
Maragogipe3.82480,2%
Ubaitaba2.3362.24796,19%
Total16.1062.62816,31%

Fonte: Programa de Vigilância e Controle da Esquistossomose – DATASUS. ⁹

  • DISCUSSÃO

No Brasil, a esquistossomose é uma doença endêmica de grande importância na saúde pública, com cerca de 43 milhões de pessoas vivendo em áreas de risco de infecção e 7 milhões de infectadas. As Regiões de maior destaque são Nordeste e Sudeste, onde existem áreas com prevalência superior a 15%, como nos Estados de Alagoas, Bahia, Pernambuco, Sergipe e Minas Gerais, encontrando ainda formas graves, o que leva a óbitos. ¹⁰ Presente em mais da metade das 417 cidades baianas, estima-se que a esquistossomose torna endêmicos 40% dos municípios. ¹¹

O nível socioeconômico familiar está associado às infecções pelo parasita Schistosoma mansoni, pois determina a pobreza, que está associada a necessidade de utilização de águas naturais contaminadas para o exercício da agricultura, trabalho doméstico e/ou lazer, por conta do baixo desenvolvimento econômico e ausência de saneamento básico. ¹²

Outros fatores que contribuem para a ocorrência da esquistossomose em uma região são a migração de pessoas de outras localidades endêmicas para áreas ribeirinhas e a expansão imobiliária desorganizada, que provoca alterações no habitat do molusco hospedeiro, consequentemente gerando o aparecimento de criadouros peridomiciliares, favorecendo a transmissão da doença, em maior ou menor intensidade, de acordo com a realidade local⁵. O saneamento básico é um instrumento de prevenção e promoção da saúde, a fim de proteger a população de doenças sanitárias e a falta dele constitui um problema de saúde pública, estando inserida nos deveres das políticas públicas. ¹³

O diagnóstico morfológico dos ovos de Schistosoma mansoni através do exame coproscópico em amostras de fezes é uma das linhas de base da execução dos programas de controle da transmissão da esquistossomose. A simplicidade e o baixo custo são os principais fatores que trazem vantagem para o uso do exame. ¹⁴

O PCE tem como principais ações para obtenção dos dados referentes ao exame coproscópico, a busca ativa e passiva, que compreende respectivamente, na realização abrangente do parasitológico de fezes na população de uma determinada localidade, pelo exame de Kato Katz, uma técnica executada no laboratório, capaz de identificar a presença de ovos do Schistosoma Mansoni nas fezes do suspeito, e a situação em que o indivíduo procura o serviço de saúde (geralmente a rede básica) para avaliação diante de algum sintoma apresentado. Entre os anos de 2010 e 2021, nota-se que houve maior captação de positivos pela busca passiva quando comparada a busca ativa. ¹⁴

De acordo com as Portarias do Ministério da Saúde de nº 204 de 17/02/2016 e da Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (SESAB) nº 1.411 de 03/11/2016, a esquistossomose é considerada uma doença de notificação compulsória. Nos municípios endêmicos e focais a notificação deverá ser no SISPCE através dos Formulários PCE 101 – Diário de coproscopia e Tratamento e PCE 108 – Casos notificados na Rede Básica. Nos municípios indenes, em que não corre transmissão, todos os casos deverão ser notificados utilizando a Ficha de investigação no SINAN.

¹⁵

Segundo o PCE, no estado da Bahia, durante o período de 2010 e 2021, os municípios que apresentaram maior ocorrência da esquistossomose foram: Entre rios, Itapicuru, Jequié, Maragogipe e Ubaitaba, apresentando no total em média, 2.147 casos ao ano. Dentre os municípios analisados, Itapicuru foi o que apresentou maior taxa de infecção, em que, dos 498.270 exames realizados, 8.371 equivalente à (1,7%) foram positivados.

A canalização das águas e dos dejetos provenientes dos sanitários podem estar ligados à rede pública de esgoto ou pode ser inexistente, sendo despejados diretamente no solo e cursos d’água. Segundo o IBGE, as formas mais comuns de esgotamento no município de Itapicuru são fossas rudimentares, fossas sépticas, valas, rede geral de esgoto ou pluvial e, lançamento em corpos d’agua. As fossas rudimentares também conhecidas como fossas absorventes, são definidas pelo Manual de Saneamento da Fundação Nacional de Saúde (FUNASA) como unidades de tratamento que continuam sendo muito empregadas no meio rural e eventualmente em zonas suburbanas de regiões com solos de características favoráveis,

representando assim, 5.083 domicílios urbanos e rurais. ¹⁶

Analisando a tabela III, identificou-se que a prevalência de ausentes em Ubaitaba foi de 96,19%, uma taxa considerada elevada em comparação com os demais municípios em questão, mostrando uma resistência da população para aderir a realização do exame. Um dos principais motivos que podem ser atribuídos a não entrega do material fecal é o desconforto e constrangimento, devido ao recipiente ser translucido, o que deixa a amostra exposta, o odor das fezes, a irregularidade do hábito intestinal, além do horário de coleta, que ocorre pela manhã e neste período, muitos estão exercendo as atividades laborais fora do domicílio ou estão na escola. ¹³ Vale ressaltar que se descoberta na fase inicial, a doença pode ser tratada com facilidade. Entretanto, é comum a pessoa contaminada não apresentar qualquer sintoma; assim, na maioria dos casos a esquistossomose leva anos para se manifestar ¹⁷. Por isso, fazer com que as pessoas se sintam diretamente envolvidas na luta contra a doença, se torna, uma questão imprescindível para o controle desta infecção. 

  • CONCLUSÃO 

Diante dos resultados encontrados, é evidente que a esquistossomose é um problema de grande relevância nos municípios analisados. A falta de uma vacina contra a doença e as dificuldades enfrentadas pelo governo no seu combate destacam a necessidade de ações concretas. O controle eficaz da esquistossomose requer, sobretudo, a expansão das iniciativas de saneamento básico, especialmente nas comunidades de baixa renda. 

Para assegurar um controle eficaz e duradouro da esquistossomose, é essencial a implementação de políticas públicas voltadas para a melhoria das condições de vida    das populações afetadas. Isso envolve a detecção e tratamento dos portadores da doença, bem como a redução de sua disseminação geográfica. Além disso, o estudo destaca a importância da vigilância contínua do Programa de Vigilância e Controle da Esquistossomose (PCE) e da adaptação constante das estratégias dos serviços de atenção básica de saúde do estado. A promoção de atividades de educação em saúde, destinadas à população, é fundamental para minimizar ou eliminar os fatores de risco, impedindo que a esquistossomose continue a representar um grave problema de saúde pública. ¹⁷,¹⁸

É fundamental considerar o papel dos profissionais de saúde como educadores, estabelecendo vínculos e comunicação com os membros da comunidade. A educação em saúde, aliada a medidas de tratamento e saneamento, representa uma estratégia eficaz no controle da esquistossomose. Nesse sentido, o Ministério da Saúde recomenda diversas ações abrangentes, incluindo a delimitação epidemiológica, o tratamento de infectados, o controle do agente etiológico, medidas de saneamento ambiental, vigilância epidemiológica e o aprimoramento contínuo do sistema de informação do programa de controle da esquistossomose. Em suma, esse estudo destaca a urgência de ações coordenadas e eficientes para combater a esquistossomose e alcançar um impacto significativo na saúde das comunidades afetadas. ¹⁹

REFERÊNCIA  

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https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/202306/vacinacontraesquistossomoseestaradisponivelnosusem2025. Acesso em: 25/10/23.