REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7630037
João Batista Pereira de Oliveira
Vitória Régia de Barros Dantas Meira
Marília Regina Costa Castro Lyra
Rogéria Mendes do Nascimento
Sofia Suely Ferreira Brandão Rodrigues
RESUMO
Compreender o cenário da gestão dos resíduos sólidos no Brasil é decisivo para que o poder público, empresas e sociedade, em geral, se comprometam a debruçar-se sobre soluções e inovações que minimizem o impacto dessa problemática sobre o meio ambiente. Este trabalho tem como objetivo avaliar a evolução da gestão para a sustentabilidade de resíduos sólidos das principais capitais do Brasil, considerando os objetivos da Agenda 2030. Para isso, foi quantificado e analisado a geração dos resíduos sólidos urbanos e sua destinação, além da escolha das cinco principais capitais, considerando os Estados com maior densidade populacional. Entre 2017 e 2021 houve um aumento de 5,2% da geração de RSU, o equivalente a 4,1 milhões de toneladas. O índice de cobertura da coleta no período é de 92,52% do total de resíduos gerados anualmente no Brasil, tendo em média 62,97% destinados para aterro sanitário e 35,79% para aterro controlado ou lixão. As cinco cidades escolhidas foram São Paulo/SP, Curitiba/PR, Goiânia/GO, Salvador/BA e Belém/PA, considerando ordem, do maior para o menor, da pontuação geral no IDSC-BR. Considerando o ODS 12, nenhuma das cidades amostradas obtiveram alcance total do objetivo, sendo o fator limitante a ausência da coleta seletiva e recuperação dos resíduos dentro das cidades. Diante disso, é notório que a gestão para a sustentabilidade de resíduos sólidos no Brasil tenha um árduo caminho a percorrer e precise ser feita de forma integrada, no entanto, ela requer a atuação do cidadão, consciente, como principal meio para sua efetivação.
PALAVRAS CHAVE: SUSTENTABILIDADE, RESÍDUOS SÓLIDOS, AGENDA 2030
ABSTRACT
Understanding the solid waste management scenario in Brazil is decisive so that the government, companies and society, in general, are committed to address solutions and innovations that minimize the impact of this issue on the environment. This work aims to evaluate the evolution of management for the sustainability of solid waste in the main capital cities of Brazil, considering the goals of the 2030 Agenda. For this, the generation of urban solid waste and its destination was quantified and analyzed, besides the choice of the five main capital cities, considering the states with the highest population density. Between 2017 and 2021 there was an increase of 5.2% in MSW generation, equivalent to 4.1 million tons. The collection coverage index in the period is 92.52% of the total waste generated annually in Brazil, with an average of 62.97% going to landfills and 35.79% to controlled landfills or dumps. The five cities chosen were São Paulo/SP, Curitiba/PR, Goiânia/GO, Salvador/BA and Belém/PA, considering the order, from highest to lowest, of the general score in the IDSC-BR. Considering SDG 12, none of the cities sampled obtained full achievement of the goal, the limiting factor being the absence of selective collection and recovery of waste within the cities. Therefore, it is clear that the management for the sustainability of solid waste in Brazil has an arduous path to follow and needs to be done in an integrated manner, however, it requires the action of the citizen, conscious, as the main means for its effectiveness.
KEY WORDS: SUSTAINABILITY, SOLID WASTE, AGENDA 2030
1 INTRODUÇÃO
Embora a Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010) tenha trazido grandes avanços para a gestão de resíduos no Brasil, a maior e mais necessária mudança ainda é a transformação individual, onde o pensar globalmente e agir localmente se manifesta no entendimento da responsabilidade compartilhada que todos os envolvidos precisam ter nesse processo de metamorfose social (AMARAL E LOPES, 2018)
São as pessoas que ocupam espaços de liderança na sociedade, seja dentro do poder público, privado, em ONGs e instituições ou até mesmo dentro de casa, e são nesses espaços que a mudança precisa acontecer de fato, para traçarmos um caminho frente ao desenvolvimento sustentável. Não dá mais para voltar atrás ou estagnar a visão da sustentabilidade como uma definição de mérito apenas ambientalista.
Falar de sustentabilidade é compreender o ônus que o passado nos deixou no presente e agir para que exista um futuro saudável para as presentes e futuras gerações. A sobrecarga da Terra influenciada pelo consumismo, o aumento da produção de resíduos, a contaminação do solo, lençóis freáticos e de águas superficiais além da possibilidade do desenvolvimento de doenças e surtos endêmicos, são alguns exemplos da omissão de responsabilidade vivida nos dias atuais (MARTINS et. all, 2019). A pandemia da Covid-19 é um reflexo disto.
A gestão dos resíduos no Brasil, principalmente o manejo dos Resíduos do Serviço de Saúde (RSS) sofreu grandes impactos que merecem significativa atenção considerando a gestão para a sustentabilidade de resíduos sólidos, mas ao passo em que deixou um rastro de devastação e dor pelas milhares de mortes que levou em todo mundo, a Pandemia da Covid-19 emitiu um alerta de que tudo está interligado: é impossível ficar saudável em um mundo doente. Existem fronteiras a nível planetário que estão sendo ultrapassadas sem que a humanidade consiga dimensionar seus reais e futuros impactos (ROCKSTRÖM, 2009).
No entanto, existe uma agitação social que converge para uma agenda em prol do desenvolvimento sustentável, voltada para a gestão de resíduos no Brasil. Aplicações de projetos em economia circular, logística e remanufatura reversa, novas tecnologias de tratamento e destinação de resíduos visando o reaproveitamento energético como a produção de combustíveis derivados de resíduos urbanos e industriais (CDRU e CDRI), estão sendo cada vez mais procurados e desenvolvidos por atores que entendem o impacto de nossas atividades no ambiente e/ou que são pressionados a adotar práticas mais sustentáveis.
Alcançar sustentabilidade a nível nacional pode ser representada pelo cumprimento das metas estabelecidas nos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável – ODS, da Agenda 2030, instituídos pela Organização das Nações Unidas em 2015, através do Índice de Desenvolvimento Sustentável das Cidades – Brasil (IDSC-BR), onde é possível acompanhar os desafios e avanços de todas as cidades brasileiras na Agenda 2030 (SDSN, 2022).
Dentre os 17 ODS, o objetivo 12 – Consumo e Produção Sustentáveis, traduz a necessidade de mitigar o impacto dos resíduos causados pelo consumo exagerado, através de 11 metas, sendo a quarta dessas:
12.4 Até 2020, alcançar o manejo ambientalmente saudável dos produtos químicos e todos os resíduos, ao longo de todo o ciclo de vida destes, de acordo com os marcos internacionais acordados, e reduzir significativamente a liberação destes para o ar, água e solo, para minimizar seus impactos negativos sobre a saúde humana e o meio ambiente (NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL, 2022).
Então, como entender dentro dessa agenda o cenário da gestão de resíduos sólidos no Brasil? Quais ações para a sustentabilidade já são realidade dentro das principais cidades visando a mitigação dos impactos do consumo sobre o meio ambiente? Como analisar essa evolução? Qual a influência da Pandemia da Covid-19 na gestão dos resíduos sólidos e no manejo dos RSS e quais impactos convergem para o cumprimento da Agenda 2030 no Brasil?
São sobre esses questionamentos que o presente trabalho tem por objetivo avaliar a evolução da gestão para a sustentabilidade de resíduos sólidos das principais capitais do Brasil, considerando os objetivos da Agenda 2030.
2 MATERIAIS E MÉTODOS
Este trabalho se enquadra na abordagem de pesquisa quali-quantitativa e nela, os resultados obtidos adveio pela análise dos dados coletados nos Panoramas dos Resíduos Sólidos do Brasil, da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais – ABRELPE e nos Relatórios e Inventários do Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos (SINIR), considerando os anos de 2017 a 2021.
O primeiro passo para compreender o cenário da gestão dos Resíduos Sólidos Urbanos no Brasil é quantificar sua geração e identificar se as etapas de manejo, da geração até disposição final, refletem a busca pela sustentabilidade em seus processos dentro das cidades. Para isso, foi elaborada uma tabela simplificada considerando a quantidade de geração anual, a massa de resíduos coletada, o índice de cobertura de coleta, bem como o percentual de destinação considerando Aterro Sanitário, Aterro Controlado e Lixão, além do Índice Nacional de Recuperação de Resíduos – IRR, sendo este último para demonstrar boas práticas relacionadas à destinação ambientalmente adequada de resíduos sólidos (reutilização, reciclagem e recuperação energética) informados pela ABRELPE e pelo SINIR durante o período amostral.
Dado a convergência e importância da pandemia da Covid-19 na gestão de resíduos e nos impactos socioambientais no Brasil e no mundo, também se elaborou uma tabela para análise da geração e disposição final dos Resíduos do Serviço de Saúde (RSS).
Com interesse de avaliar o contexto da gestão para sustentabilidade dos resíduos sólidos urbanos das cidades brasileiras, considerou a capital do Estado de cada região político-administrativa do Brasil com maior quantidade de habitantes, através da projeção da população do IBGE, e identificou qual respectivo Índice de Desenvolvimento Sustentável das Cidades (IDSC-BR). Através da avaliação atual da cidade escolhida disponibilizada na plataforma, foi escolhido o ODS 12 – produção e consumo responsáveis, a fim de identificar se há desafios para atendimento dos objetivos relativos à gestão de resíduos e quais indicadores refletem o resultado de cada cidade em direção à Agenda 2030 da ONU.
3 RESULTADOS
Considerando os anos entre 2017 e 2021, exceto 2020 devido ausência de informações sobre a gestão de resíduos no país, houve um aumento de 5,2% da geração de RSU, o equivalente a 4,1 milhões de toneladas. O índice de cobertura da coleta no período é de 92,52% do total de resíduos gerados anualmente no Brasil, tendo em média 62,97% destinados para aterro sanitário e 35,79% para aterro controlado ou lixão. Dos resíduos coletados, apenas 1,70% foram passíveis de reutilização, reciclagem ou recuperação energética.
O ano de 2020 sofreu com a ausência de informações nos bancos de dados sobre a gestão de resíduos sólidos no país, podendo atribuir responsabilidade ao período mais extremo da pandemia da covid-19 vivido pela sociedade mundial.
Tabela 1 : Análise da geração de RSU no Brasil de 2017 à 2021.
Diante da problemática ambiental refletida pela covid-19 e da própria natureza dos Resíduos do Serviço de Saúde (RSS), os dados coletados são de extrema importância para entender a gestão de resíduos perigosos no Brasil e o impacto de seu manejo.
Dessa forma, foi possível identificar que os anos de 2019 e 2020 tiveram um expressivo aumento de sua geração, devido ao evento epidemiológico, chegando a mais de 42 milhões de toneladas ao ano, em comparação com anos anteriores. Dentre as tecnologias de tratamento para RSS, a incineração tem a maior porcentagem, exceto nos anos especificados acima, chegando a 82% com destinação sem tratamento prévio, em aterros, valas sépticas ou lixão.
Tabela 2 : Análise da geração de RSS no Brasil de 2017 à 2021.
A gestão para sustentabilidade de resíduos sólidos a nível nacional teve como critério a escolha das principais capitais, considerando maior densidade populacional por região político-administrativa do Brasil, associando o ODS 12 do Índice de Desenvolvimento Sustentável Das Cidades (IDSC-BR) encontrado na plataforma do Programa Cidades Sustentáveis.
Tabela 3 : Escolha das cidades a serem analisadas considerando o Estado com maior densidade populacional por região.
Das cinco cidades escolhidas, São Paulo/SP tem a melhor pontuação geral com 62,1 de 100, porém quanto ao ODS 12, tem desafios significativos na recuperação de resíduos coletados seletivamente, para atingir o objetivo.
A capital com menor pontuação foi Belém/PA, com 42,6 de 100, tendo grandes desafios para atingir o ODS 12, principalmente pela ausência de atendimento à população com serviços de coleta seletiva.
Quadro 1 : Avaliação do ODS 12 de acordo com o IDSC-BR
4 CONCLUSÕES
A gestão para sustentabilidade de resíduos sólidos no Brasil está caminhando a passos curtos quando comparamos as métricas estipuladas na Política Nacional de Resíduos Sólidos e no alcance da Agenda 2030 através dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.
A meta número 12.4 do ODS Consumo e Produção Sustentáveis, sugere o ano de 2020 como diretriz para atingir o manejo saudável dos resíduos, perigosos ou não, a fim de que minimize seu impacto no ambiente e na saúde humana. No entanto, os dados atuais da plataforma do IDSC-BR indicam uma realidade muito oposta da meta estabelecida, sendo a principal problemática das grandes capitais a ausência do serviço de coleta seletiva e da recuperação de resíduos sólidos, dois anos após diretriz para alcance do objetivo.
A pandemia da Covid-19 no Brasil, mostrou como reagimos a um problema sanitário de magnitude planetária. A ausência de informações sobre o manejo dos resíduos sólidos no período mais crítico desse evento, pode inferir em impactos futuros além dos esperados, quando consideramos a porcentagem de resíduos urbanos e do serviço de saúde destinados a lixões.
Como um dos instrumentos da Política Nacional de Resíduos Sólidos, a coleta seletiva, embora de simples execução, ainda é um problema sério a ser tratado em nível nacional, visto que em vários Estados do Brasil ainda haja a deficiência ou ausência desse programa instituído em seus alinhamentos. Investir em tecnologias de ponta para recuperação de resíduos na etapa final, como em plantas automatizadas em aterros sanitários que realizem a separação de resíduos por tipologia e produzem combustíveis derivados de resíduos urbanos para recuperação energética, pode ser uma alternativa eficaz ao passo em que a cultura ambiental deva ser investida e cultivada na sociedade, como caminho principal para alcançar a linha de chegada no que chamamos hoje de sustentabilidade.
A plataforma do Programa Cidades Sustentáveis é uma ferramenta indispensável para gestão pública, extensível a todo e qualquer cidadão, que permite ter em mãos diretrizes sólidas para que gestores municipais e estaduais possam identificar os caminhos que faltam percorrer e atuem em suas frentes alinhados ao desenvolvimento sustentável, além da comunidade em geral, sendo um banco de dados ímpar para mensurar o papel das cidades brasileiras na Agenda 2030. Além do ODS 12, olhar para os demais 16 objetivos da agenda é essencial para caminharmos rumo à sustentabilidade. Afinal, tudo em nossa volta está interligado e precisamos agir conforme Gaia e seus processos, de forma cíclica e integrada.
Diante disto, cabe-nos questionarmos até que ponto a responsabilidade do outro rompe a barreira do eu? Embora a gestão para a sustentabilidade de resíduos sólidos no Brasil tenha um árduo caminho a percorrer e precise ser feita de forma integrada em cada cidade, ou cada ambiente organizacional, por exemplo, ela perpassa e requer a atuação do cidadão, consciente, como principal meio para sua efetivação.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMARAL, C.P.; LOPEZ, D.A.R. Impactos sociais e ambientais: a vulnerabilidade do sistema de gerenciamento dos resíduos sólidos urbanos. Revista Eletrônica de Gestão e Tecnologias Ambientais (GESTA), v.6, n.2. página 13-26, 2018. Disponível em: <https://periodicos.ufba.br/index.php/gesta/article/view/23967/16686>; Acesso em 17 de setembro de 2022.
MARTINS, M. F., TEODORO, F.R., ARAÚJO, I. C., PASCHOALINI, R. B., MACEDO, M. J. A. & ARAÚJO, E. M. Descarte inadequado de lixo e seu impacto no meio ambiente e na saúde da comunidade. IV Colóquio Estadual de Pesquisa Interdisciplinar. UNIFIMES, Centro Universitário de Mineiros, Goiás. 2019. Disponível em: <https://publicacoes.unifimes.edu.br/index.php/coloquio/article/view/642/761>; Acesso em 17 de setembro de 2022.
SDSN, Sustainable Development Solutions Network. Índice de desenvolvimento sustentável das cidades – Brasil. Disponível em: <https://www.sdgindex.org/reports/indice-de-desenvolvimento-sustentavel-das-cidades-brasil/>; Acesso em 18 de setembro de 2022.
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ROCKSTRÖM, J. et al. A safe operating space for humanity. Nature, v. 461, p. 472-475, 2009.
IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Projeção da população do Brasil e das Unidades da Federação. Disponível em: <https://www.ibge.gov.br/apps/populacao/projecao/index.html>; Acesso em 25 de setembro de 2022.