REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ch10202504241434
1Ana Cristina de Aquino Antero; 2Ernandes Martins Soares; 3Peter Abrante de Castro; 4Rodrigo Disconzi Nunes; 5Gabriela Brito Coelho; 6Samuel Cabral de Lima Ferreira; 7Vinicios Batista Monteiro Silva
RESUMO
A qualidade do sono tem papel fundamental na saúde e produtividade dos servidores universitários, profissionais frequentemente submetidos a jornadas extensas, alta carga cognitiva e pressão constante. Esta revisão sistemática buscou investigar, com base em literatura recente, a eficácia do sono nessa população, considerando os impactos fisiológicos, emocionais e comportamentais associados à privação ou má qualidade do sono. Foram analisadas publicações indexadas nas bases PubMed, Scopus, SciELO e Google Scholar, priorizando estudos dos últimos quinze anos e que abordassem servidores públicos no contexto acadêmico. Os resultados evidenciam a alta prevalência de distúrbios como a insônia, afetando até 72% dos trabalhadores brasileiros, com consequências diretas sobre a saúde mental, desempenho profissional e relações interpessoais. O ambiente universitário, caracterizado por múltiplas demandas e escasso suporte institucional ao bem-estar, agrava esse cenário. Estudos apontam prejuízos na memória, tomada de decisão, concentração e motivação entre os afetados. A revisão também destaca o papel das intervenções baseadas na higiene do sono, como a regularidade nos horários, redução de estímulos noturnos e práticas de relaxamento, como estratégias eficazes na mitigação dos impactos negativos. Conclui-se que o enfrentamento da ineficiência do sono entre servidores universitários demanda ações integradas, que vão além da esfera individual, envolvendo políticas institucionais de saúde ocupacional, campanhas de educação e mudanças culturais nas universidades. Dormir bem deve ser reconhecido como um direito e uma condição essencial ao desempenho e à saúde coletiva no ambiente acadêmico.
Palavras-chave: Sono, Servidores Universitários, Produtividade, Higiene do Sono, Saúde Mental.
1. Introdução
A qualidade do sono tem se destacado como um dos principais pilares da saúde integral, especialmente entre profissionais inseridos em ambientes de alta exigência cognitiva e emocional, como os servidores das instituições de ensino superior. A rotina universitária é marcada por jornadas prolongadas, múltiplas responsabilidades administrativas e acadêmicas, além de constantes pressões psicológicas. Esses fatores contribuem diretamente para a deterioração da eficácia do sono e, por consequência, para o comprometimento do bem-estar e da produtividade. A literatura científica já consolidou que a privação do sono tem impactos diretos na concentração, memória, humor e desempenho físico e mental (Hirshkowitz et al., 2015; Walker, 2017).
Além disso, dados nacionais indicam um cenário preocupante. De acordo com o Ministério da Saúde (2023), aproximadamente 72% da população brasileira apresenta distúrbios relacionados ao sono, sendo a insônia o mais comum. Dentro do contexto universitário, esse número tende a ser ainda mais expressivo, dado o perfil de trabalho intenso e a natureza das atividades desenvolvidas. Assim, torna-se urgente compreender os impactos da eficácia do sono sobre os servidores universitários e identificar estratégias eficazes de enfrentamento e prevenção.
2. Métodos
A busca foi orientada por perguntas norteadoras que envolviam as palavras-chave: “sono”, “eficácia do sono”, “qualidade do sono”, “servidores universitários”, “trabalho acadêmico” e “produtividade”. Os termos foram combinados por meio de operadores booleanos (AND, OR) para ampliar o escopo e refinar os resultados. As bases de dados recomendadas pela literatura — como PubMed, Scopus, SciELO e Google Scholar.
Foram adotados os critérios de inclusão baseados em evidências práticas e científicas. Assim, incluíram-se estudos publicados nos últimos quinze anos, que abordassem a relação entre qualidade ou distúrbios do sono e seus efeitos no contexto ocupacional e acadêmico. Artigos com população alvo composta por servidores públicos, trabalhadores da área da educação, docentes e demais profissionais vinculados a universidades foram priorizados. Foram aceitos artigos em português, inglês e espanhol. Os critérios de exclusão englobaram publicações com metodologia pouco clara, estudos voltados exclusivamente para populações clínicas (ex: pacientes com apneia do sono, distúrbios neurológicos ou psiquiátricos severos).
A análise de conteúdo seguiu abordagem qualitativa e interpretativa, categorizando os achados em três eixos temáticos principais: (1) causas da ineficiência do sono em trabalhadores acadêmicos; (2) impactos sobre a saúde física, emocional e cognitiva; e (3) intervenções eficazes para a promoção de higiene do sono.
3. Resultados
A revisão sistemática revelou um quadro alarmante quanto à prevalência de distúrbios do sono entre trabalhadores brasileiros, refletindo com ainda mais intensidade entre servidores universitários. De acordo com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o Ministério da Saúde (2023), 72% dos brasileiros relatam alterações no padrão de sono, sendo a insônia o distúrbio mais frequentemente citado. Essa estatística, por si só, já aponta para uma situação de vulnerabilidade generalizada que certamente afeta profissionais do ambiente acadêmico, tradicionalmente expostos a longas jornadas de trabalho, múltiplas funções simultâneas e exigências cognitivas elevadas.
A Associação Brasileira do Sono (ABS, 2023) acrescenta que, nos casos crônicos, a insônia pode se estender por até três anos, com um número expressivo de indivíduos enfrentando episódios frequentes. Os dados indicam que entre 56% e 74% dos afetados experimentam quadros de insônia ao longo do ano, e 46% convivem com o distúrbio de forma contínua. Esses números sugerem que, entre os servidores universitários, uma proporção significativa convive com dificuldades regulares para adormecer, manter o sono ou obter um repouso restaurador.
Além disso, observou-se, nas fontes analisadas, uma correlação direta entre a baixa qualidade do sono e prejuízos à produtividade. Oliveira (2024) constatou que trabalhadores com padrão de sono inadequado apresentavam maior índice de absenteísmo, menor rendimento e maiores dificuldades nas relações interpessoais. Esses achados são reforçados pelos estudos de Roth e Roehrs (2010), que relacionam a privação do sono com aumento da irritabilidade, fadiga crônica e perda de motivação.
Do ponto de vista fisiológico, Haddad (2023) detalha que alterações no padrão do sono — especialmente no equilíbrio entre as fases NREM e REM — prejudicam processos fundamentais como a consolidação da memória, o raciocínio lógico e a capacidade de tomada de decisões. Esses elementos são essenciais no contexto universitário, onde os servidores precisam lidar com planejamento, execução de tarefas simultâneas e interações contínuas com estudantes, colegas e superiores.
Práticas inadequadas de vida, como o uso indiscriminado de estimulantes, horários irregulares para dormir e a ausência de momentos de relaxamento, também se mostraram fatores agravantes. Ao mesmo tempo, a literatura apontou para a eficácia de intervenções baseadas em higiene do sono, como manutenção de horários fixos para dormir, controle de estímulos luminosos à noite e práticas de relaxamento, conforme descrito pela Clínica da Mente (2024) e por Nardi et al. (2021).
4. Discussão
A análise dos resultados desta revisão demonstra de forma inequívoca que a eficácia do sono entre servidores universitários é comprometida por uma série de fatores interligados, incluindo aspectos fisiológicos, comportamentais e contextuais. O ambiente acadêmico, tradicionalmente marcado por alta competitividade, pressão por produtividade, cobrança institucional e acúmulo de responsabilidades, configura-se como um dos mais suscetíveis à degradação do sono entre os profissionais.
Estudos como os de Jenkins et al. (2011) indicam que a privação de sono reduz significativamente a capacidade de retenção de informações, o desempenho em tarefas cognitivas e a eficiência no processamento de dados complexos. Essas habilidades são centrais para a atuação de servidores universitários, sobretudo aqueles diretamente envolvidos em atividades didáticas, administrativas e científicas. A falta de sono adequado compromete, portanto, a capacidade crítica, a criatividade e até mesmo a segurança no desempenho das funções profissionais.
Adicionalmente, a privação crônica do sono tem sido relacionada a um ciclo vicioso que compromete não apenas a saúde do servidor, mas também o funcionamento institucional. Trabalhadores privados de sono adoecem com maior frequência, apresentam menor engajamento com suas atividades, demandam afastamentos por problemas psiquiátricos e, muitas vezes, tornam se fontes de tensão no ambiente de trabalho devido à irritabilidade, desatenção e apatia (Roth & Roehrs, 2010; Oliveira, 2024).
O aspecto comportamental também é relevante. A rotina universitária frequentemente ultrapassa os limites físicos e mentais dos profissionais, e não raro, servidores levam trabalho para casa, estendendo jornadas para além do aceitável. O uso de tecnologia à noite, a ausência de pausas para descanso durante o dia e a desvalorização institucional do bem-estar contribuem para a perpetuação de um modelo de trabalho nocivo. Assim, a análise crítica da eficácia do sono entre servidores universitários ultrapassa o campo da medicina do sono e passa a exigir uma abordagem institucional e sistêmica, com a criação de políticas de saúde ocupacional, campanhas de conscientização e ambientes de trabalho mais acolhedores.
Além disso, a literatura reforça que, embora as causas do sono ineficaz sejam multifatoriais, intervenções relativamente simples podem produzir resultados expressivos. A implementação de boas práticas de higiene do sono, como manter horários regulares, evitar exposição à luz azul à noite, controlar o consumo de estimulantes e praticar atividades físicas leves, têm eficácia comprovada. Essas ações podem ser incorporadas ao cotidiano universitário por meio de campanhas educativas, oficinas, acompanhamento psicológico e incentivo à autorresponsabilidade com o próprio bem-estar.
5. Conclusão
A presente revisão sistemática permite afirmar que a eficácia do sono é um dos determinantes mais importantes da saúde, produtividade e qualidade de vida dos servidores universitários. A prevalência significativa de distúrbios do sono nessa população, evidenciada pelas estatísticas nacionais e estudos clínicos analisados, revela um problema estrutural que transcende o indivíduo e afeta diretamente o funcionamento das instituições de ensino superior.
A associação direta entre má qualidade do sono e redução de desempenho, aumento do estresse, falhas cognitivas e doenças crônicas é amplamente documentada na literatura consultada. A ausência de políticas institucionais voltadas à promoção da saúde do sono tende a agravar esse quadro, gerando um ciclo de esgotamento que repercute negativamente tanto na vida dos trabalhadores quanto na missão das universidades.
No entanto, a revisão também revela que existem caminhos viáveis e eficazes para reverter essa realidade. A educação em saúde, a promoção da higiene do sono e a valorização do descanso como elemento indispensável ao desempenho profissional devem ser pautas prioritárias nas universidades. Instituições que desejam manter um corpo técnico-administrativo e docente saudável, motivado e produtivo precisam investir de forma contínua em ações preventivas e acolhedoras, capazes de transformar a cultura organizacional e valorizar o bem-estar de seus colaboradores.
Em última instância, dormir bem deve deixar de ser visto como luxo ou sinal de fraqueza e passar a ser reconhecido como um direito, uma necessidade fisiológica básica e um componente estratégico da produtividade e da saúde coletiva. A eficácia do sono, portanto, não é apenas uma questão de saúde individual, mas uma responsabilidade compartilhada entre o trabalhador e a instituição em que atua.
REFERÊNCIAS:
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ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DO SONO (ABS). Estudo sobre a insônia e suas implicações. 2023.
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CLÍNICA DA MENTE. Dormir bem para viver melhor: A ligação entre sono e saúde mental. 2024. Disponível em: https://www.clinicadamente.com
HADDAD, Fernanda Louise M.; GREGÓRIO, Luis C. Manual do residente: medicina do sono. Barueri: Editora Manole, 2023.
HIRSHKOWITZ, M. et al. National Sleep Foundation’s Sleep Time Duration Recommendations: Methodology and Results Summary. Sleep Health, 1(1), 40–43, 2015.
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SADOCK, Benjamin J.; SADOCK, Virginia A.; RUIZ, Pedro. Compêndio de Psiquiatria: Ciência do Comportamento e Psiquiatria Clínica. Artmed Editora, 2016.
WALKER, M. P. Why We Sleep: The New Science of Sleep and Dreams. Scribner, 2017.
1Graduanda em Medicina, Instituição: Universidade de Gurupi (UNIRG), E-mail: ana.c.a.antero@unirg.edu.br;
2Graduando em Medicina, Instituição: Universidade de Gurupi (UNIRG), E-mail: ernandes.soares@hotmail.com;
3Graduando em Medicina, Instituição: Universidade de Gurupi (UNIRG), E-mail: peter.a.castro@unirg.edu.br;
4Médico. Professor Adjunto II da Universidade de Gurupi, Instituição: Universidade de Gurupi (UNIRG), E-mail: rodrigodisconzi@unirg.edu.br;
5Graduanda em Medicina, Instituição: Universidade de Gurupi (UNIRG), E-mail: Gabriela.b.coelho@unirg.edu.br;
6Graduando em Medicina, Instituição: Universidade de Gurupi (UNIRG), E-mail: Samuel.c.l.ferreira@unirg.edu.br;
7Graduando em Medicina, Instituição: Universidade de Gurupi (UNIRG), E-mail: viniciosmonteiro889@gmail.com