ANÁLISE CRÍTICA SOBRE A TRIBUTAÇÃO DE ALIMENTOS E BEBIDAS PREJUDICIAIS À SAÚDE

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102412071735


Ismael Vagner Bezerra Pereira
Orientador: Paulo Victor Vieira Da Rocha


RESUMO

A discussão sobre a tributação de produtos e serviços nocivos à saúde ganhou destaque nas agendas de reformas tributárias em todo o mundo, especialmente considerando a saúde pública como uma prioridade emergente. O conceito de extrafiscalidade, que propõe o uso da tributação não apenas para arrecadação, mas também como ferramenta de intervenção em políticas públicas, se revela uma estratégia relevante para abordar o consumo de bens prejudiciais, como bebidas alcoólicas, tabacos e alimentos ultraprocessados. Neste contexto, a atual reforma tributária proposta no Brasil abre um espaço significativo para investigar como um novo modelo fiscal pode influenciar as decisões de consumo e ajudar a mitigar as externalidades negativas associadas a esses produtos. O presente trabalho tem como objetivo geral analisar as mudanças que um novo sistema tributário poderá trazer ao consumo de produtos prejudiciais à saúde, considerando as implicações práticas da reforma tributária em benefício da saúde coletiva. Os objetivos específicos incluem a avaliação dos impactos da reforma na sociedade, a identificação de seus potenciais benefícios e desafios, e a exploração das medidas legais que envolverão a implementação do novo imposto seletivo. A metodologia utilizada foi a revisão da literatura, com pesquisa qualitativa e exploratória, baseando-se em fontes acadêmicas confiáveis e abrangendo publicações de 2014 a 2024. Este estudo justifica-se pela importância de compreender as contribuições e limitações da extrafiscalidade na reforma tributária, uma vez que decisões informadas podem resultar em políticas públicas que promovam a saúde coletiva sem comprometer a arrecadação fiscal e o desenvolvimento econômico. Em suma, a reforma tributária e a implementação do imposto seletivo representam uma oportunidade valiosa para o Brasil alinhar seu sistema fiscal com políticas de saúde pública e ambientais mais robustas. Um futuro em que saúde e desenvolvimento econômico coexistam de maneira equilibrada não é apenas desejável; é uma necessidade.

Palavras Chave: Reforma Tributária; Imposto Seletivo; Imposto do Pecado

ABSTRACT

The discussion on the taxation of products and services that are harmful to health has gained prominence in tax reform agendas around the world, especially considering public health as an emerging priority. The concept of extrafiscality, which proposes the use of taxation not only for revenue collection but also as a tool for intervention in public policies, has proven to be a relevant strategy for addressing the consumption of harmful goods, such as alcoholic beverages, tobacco, and ultra-processed foods. In this context, the current tax reform proposed in Brazil opens up a significant space for investigating how a new tax model can influence consumption decisions and help mitigate the negative externalities associated with these products. The general objective of this paper is to analyze the changes that a new tax system could bring to the consumption of products that are harmful to health, considering the practical implications of tax reform for the benefit of public health. The specific objectives include assessing the impacts of the reform on society, identifying its potential benefits and challenges, and exploring the legal measures that will involve the implementation of the new selective tax. The methodology used was a literature review, with qualitative and exploratory research, based on reliable academic sources and covering publications from 2014 to 2024. This study is justified by the importance of understanding the contributions and limitations of extra-fiscality in tax reform, since informed decisions can result in public policies that promote public health without compromising tax collection and economic development. In short, tax reform and the implementation of the selective tax represent a valuable opportunity for Brazil to align its tax system with more robust public health and environmental policies. A future in which health and economic development coexist in a balanced manner is not only desirable; it is a necessity.

Keywords: Tax Reform; Selective Tax; Sin Tax

INTRODUÇÃO

A discussão sobre a tributação de produtos e serviços nocivos à saúde tem se tornado cada vez mais relevante nas agendas de reformas tributárias globalmente, especialmente em um cenário onde a saúde pública se estabelece como uma prioridade para governos e sociedade. O conceito de extrafiscalidade, que utiliza a tributação não apenas como uma ferramenta de arrecadação, mas também como um meio de intervenção em políticas públicas, surge como uma estratégia importante para abordar o consumo de bens que prejudicam a saúde (GUERRA, 2024).

Nesse contexto, evidenciou-se que a preocupação com os impactos negativos do aumento de peso da população global era inegável, com diversas causas subjacentes e várias iniciativas públicas e privadas sendo propostas para enfrentá-la. No entanto, o que causava estranheza era que o principal foco do debate político — em vez de reconhecer os esforços dos profissionais de saúde pública — estivesse direcionado para a criação de um novo imposto: visto como uma solução para salvar vidas e já implementado em alguns países: o imposto sobre bebidas açucaradas, o chamado soda tax (ANDRADE, 2024).

No entanto, a problematização desse tema perpassa a análise dos impactos diretos e indiretos que a mudança na legislação tributária pode causar na economia e na saúde pública. É imprescindível entender não apenas as implicações das políticas tributárias na escolha do consumidor, mas também os desafios e controvérsias que cercam a implementação de tributos extrafiscais.

Diante desses fatores, o estudo tem por objetivo geral explicitar de forma sucinta as mudanças que um novo sistema tributário trará ao consumo de produtos prejudiciais à saúde.

Como objetivos específicos o estudo buscou inicialmente entender a importância de um estudo jurídico sobre o consumo de bens prejudiciais a saúde, a intervenção estatal como forma de direcionamento do consumo, a tributação como forma de combate a externalidades negativas. Em um segundo momento buscou-se apontar as medidas legais que elucidarão o sistema tributário, entendendo o conceito e modificações que o imposto seletivo trará. E por fim, tratou-se em discorrer sobre as experiências concretas de tributação sobre bebidas com alto teor de açúcares.

METODOLOGIA

A metodologia se deu por meio de uma revisão de literatura, onde os materiais selecionados do direito tributário e econômico.

O foco central deste trabalho é questionar se a majoração da tributação, como forma de tributação do “pecado” ou da “saúde”, é uma solução eficaz para enfrentar questões como a obesidade e o sobrepeso.

Para tanto, considera-se, inclusive, a existência de mecanismos tributários já em vigor, como a diferenciação de alíquotas conforme a essencialidade dos produtos, que buscam evitar o incentivo ao consumo excessivo de alimentos potencialmente prejudiciais à saúde, levando em conta variáveis relevantes, como: (i) o perfil de consumo no Brasil dos produtos em questão; (ii) o custo público da saúde; (iii) a carga tributária atual; e (iv) a regressividade tributária.

1.   A IMPORTÂNCIA DE UM ESTUDO JURÍDICO SOBRE O CONSUMO DE BENS PREJUDICIAIS A SAÚDE

No decorrer das últimas décadas, aumento excessivo de peso na população mundial, correlato ao crescimento das doenças não transmissíveis e seu impacto nas finanças públicas, especialmente no orçamento da saúde pública, são questões que demandam atenção de todos aqueles que não compartilham da visão de um Estado que deve permanecer passivo e neutro em relação às consequências desta relação de consumo.

A literatura econômica que critica qualquer forma de intervencionismo estatal no que tange aos hábitos de consumo da população é extensa e consistente. Todavia, este trabalho não se propõe a endossar tais argumentos. Como também, não se defende a implementação de políticas intervencionistas contra a liberdade comercial da indústria alimentícia.

O objetivo principal deste estudo é examinar se o uso de instrumentos tributários de caráter específico, como o Imposto Seletivo – IS, sobre um número restrito de produtos, constitui a forma mais eficaz de induzir comportamentos mais saudáveis.

Além disso, busca-se investigar se existem fundamentos suficientes para acreditar que tal medida tenha como objetivo a criação de uma nova fonte de receita orçamentária para a saúde pública. Essa análise está voltada para o contexto brasileiro, cuja estrutura tributária pode apresentar características substancialmente distintas dos demais países que implementaram tal medida.

Vale ressaltar que há outras formas possíveis de alcançar tal objetivo, no entanto, a reforma tributária aprovada instituiu a criação de um novo imposto como o meio adequado a se chegar neste objetivo. Destaca-se que este estudo se encontra

direcionado à situação social brasileira, não podendo ser analisada sob a ótica de países com tributação substancialmente inferior a nossa quando o assunto é consumo.

A análise não se limitará a avaliar se a tributação isolada é a abordagem mais eficaz, mas considerará a tributação sobre produtos específicos como parte de um conjunto mais amplo de políticas. A hipótese central é que a tributação sobre itens, como bebidas açucaradas, por meio do Imposto Seletivo, é uma das principais tendências tanto no Brasil quanto internacionalmente, embora existam outros instrumentos interventivos.

A crítica proposta será feita dentro do contexto da escolha pública e democrática, focando no processo legislativo e adotando uma perspectiva de economia política.

2.      A REORGANIZAÇÃO NO SISTEMA TRIBUTÁRIO BRASILEIRO A PARTIR DA EC 132/2023.

Ao longo de mais de trinta anos, a questão da reorganização do sistema tributário tem sido uma constante no debate nacional. Esse período prolongado evidencia a complexidade do tema e as dificuldades para se alcançar acordos e consensos, dado que ele é marcado por diversas expectativas e interesses, muitas vezes opostos, da sociedade, além das suas repercussões econômicas, políticas e jurídicas (CADIP, 2024).

Segundo Diniz e Nabhan (2024) a carga tributária incide de forma desigual sobre certos setores da população, resultando em uma acentuada disparidade na tributação, com a classe média e os mais necessitados arcando com grandes ônus, enquanto alguns grupos favorecidos se beneficiam de isenções e incentivos fiscais. Uma reforma bem estruturada pode estimular investimentos produtivos, aliviando a pressão fiscal em determinadas áreas econômicas e criando um contexto mais propício para os negócios.

Nesse contexto, segundo Carvalho (2024) a proposta de reforma tributária busca reestruturar o complexo sistema tributário brasileiro, com o objetivo de simplificar e aumentar a eficácia da arrecadação, promovendo justiça fiscal e incentivando o desenvolvimento econômico.

As novas características do sistema, como uma base ampla e a não cumulatividade total, visam melhorar o ambiente de negócios, eliminando distorções e aumentando a segurança jurídica, o que estimulará a concorrência justa e resultará em produtos e serviços de qualidade e preços acessíveis. Além disso, a simplificação

permitirá que a carga tributária se reflita de maneira mais clara para os cidadãos, possibilitando que estes exijam melhores serviços públicos do Estado (MINISTÉRIO DA FAZENDA, 2023).

Para Mello (2024) o novo regime fiscal do Brasil promoverá melhorias consideráveis em diversos setores da economia, beneficiando também o consumidor final, ao atualizar o sistema vigente, conforme descrito em Tabela 01 a seguir:

Tabela 1: Principais Benefícios Da Reforma Tributária

  Simplificação da estrutura tributáriaA reforma tornará os processos tributários mais simples, diminuindo o tempo e os custos associados para as empresas.
  Maior segurança jurídicaA transparência e previsibilidade nas normas tributárias oferecem mais segurança jurídica para empresas e investidores
  Aumento da transparênciaA população terá acesso a informações mais claras sobre os impostos incluídos em produtos e serviços, promovendo maior transparência e consciência fiscal.

Fonte: Autor, adaptado de Mello (2024).

Quanto aos pontos que precisam de regulamentação na Reforma Tributária em 2024, de acordo com Mello (2024) existem vários aspectos que precisam ser discutidos no Legislativo e no Executivo nos próximos meses e até anos antes que a Reforma Tributária passe a ser efetiva em 2033, que é a data estimada para o término do período de transição.

Dentre os principais aspectos que ainda necessitam de regulamentação, de acordo com Mello (2024) consiste na definição da lista ou do alcance geral da aplicação do imposto seletivo sobre produtos açucarados e ultraprocessados.

Essas iniciativas, entre outras, serão estabelecidas através de leis complementares, em um processo que demandará colaboração entre o Governo e o Congresso. A escolha de implementar as mudanças de maneira gradual a partir de 2026, com todas as normas em vigor até 2033, evidencia a importância de examinar lacunas e fazer as adaptações necessárias (MELLO, 2024).

3.   A TRIBUTAÇÃO COMO FORMA DE INTERVIR NO CONSUMO DE BENS PREJUDICIAIS À SAÚDE.

A Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) identificou, entre 2013 e 2019, o aumento de 5,6% no número de pessoas com excesso de peso, e o percentual de pessoas com obesidade subiu de 18,5% para 20,1%. Sendo, portanto, este o ponto de partida para identificar que a necessidade de intervir o consumo da população brasileira de eventuais alimentos que são danosos à saúde.

Nessa perspectiva, a criação de um tributo seletivo e/ou benefício tributário é uma intervenção direta na vida dos contribuintes/consumidores destes bens. Sendo o objetivo deste tópico a limitação da tributação em produtos específicos como uma forma extrafiscal de atuação do poder público frente a problemática trazida.

Do Relatório do Banco Mundial (SHEKAR; POPKIN, 2020, extraído de ANDRADE, 2024) abstrai-se dois elementos principais para o aumento da obesidade:

(i) a diminuição do gasto calórico devido ao avanço das tecnologias e à transformação dos hábitos ao longo de todas as fases da vida; e (ii) fatores associados às mudanças nos padrões alimentares.

Como também, fatores como a crescente urbanização, que altera os costumes e estilos de vida, a globalização, que promove a difusão cultural e o acesso a alimentos industrializados, e as disparidades econômicas entre as nações também desempenham papel significativo nesse cenário.

Em vista disso, redirecionar o foco da tributação, com ênfase em sua extrafiscalidade, é uma medida, quando limitada a certos produtos, adequada.

3.1.   A EXTRAFISCALIDADE DOS TRIBUTOS E SUA APLICAÇÃO AO IMPOSTO SELETIVO

Afirmo que a função de um tributo é gerar receita ao Estado, esta se consolida ao observarmos que o a tributação ocorre deste antes do estabelecimento de Estados Democráticos de Direito. Sendo, portanto, o tributo um elemento autônomo de cada sociedade, seja ela organizada em Estado de direito, ou não.

Os tributos têm sua função fiscal (que se refere à arrecadação) e a extrafiscal (que busca influenciar comportamentos econômicos ou sociais). Como também, tais funções devem-se apoiar a cada norma tributária, podendo uma norma de natureza fiscal ter efeitos extrafiscais, ou normas extrafiscais terem efeitos fiscais.

Assim a tributação seletiva corretiva sobre produtos prejudiciais à saúde, como as bebidas açucaradas, ganhou destaque internacional como uma política pública voltada para o combate ao excesso de peso e doenças associadas, como a obesidade e diabetes. A ideia central desse tipo de tributação é desincentivar o consumo de bebidas que reforçam esse problema de saúde, como refrigerantes, energéticos e sucos artificiais adoçados. Embora, no debate internacional, a tributação não se refira a um sobrepreço generalizado sobre qualquer produto calórico ou não saudável, mas sim a um imposto direcionado especificamente a esses tipos de bebidas, ela busca corrigir um comportamento do consumidor, induzindo-o a escolhas mais saudáveis.

A seletividade de itens considerados mais essenciais à vida humana, como água, alimentos e energia elétrica, devem ter uma carga tributária reduzida. Em contrapartida, produtos que são menos essenciais enfrentam uma tributação mais elevada. Assim, bens menos fundamentais, como cigarros (80% de imposto), cachaça (81%), casacos de pele (81%), videogames (72%) e revólveres (71%), estão sujeitos a taxas altas de incidência tributária (LOURENÇO, 2018).

Em termos práticos, esse imposto seletivo pode ser visto como uma equiparação de bebidas açucaradas às bebidas alcoólicas, no sentido de que ambas são tributadas não apenas pela sua função fiscal, mas também pelo potencial de causar danos à saúde pública. O imposto seletivo, portanto, atua de forma extrafiscal, não só arrecadando recursos, mas também buscando a mudança de comportamento dos consumidores e reduzindo os custos de saúde associados ao consumo excessivo de produtos prejudiciais à saúde.

No entanto, uma questão importante que surge ao se adotar esse tipo de tributação é a efetividade da política pública. Em um primeiro momento, espera-se que o aumento do preço dessas bebidas, causado pelo imposto, tenha um impacto sobre as vendas e, consequentemente, sobre o consumo. A ideia é que a arrecadação gerada seja direcionada para o enfrentamento do excesso de peso e para políticas de saúde pública, mas, como apontado no exemplo internacional e na reforma tributária brasileira, existe uma separação entre a arrecadação e os gastos, o que pode enfraquecer a eficácia da medida, caso a receita gerada não seja devidamente aplicada na área da saúde.

Diante desses desafios, é crucial que o efeito extrafiscal do imposto seletivo, voltado para a desestimulação ao consumo de produtos prejudiciais à saúde, seja devidamente monitorado e controlado. O efeito do imposto sobre a saúde pública, ao tentar reduzir o consumo de bebidas açucaradas, precisa ser acompanhado por políticas públicas eficazes que realmente destinem a arrecadação para a melhoria das condições de saúde. A separação entre arrecadação e gastos, como observada em outros países e também na reforma tributária brasileira, é uma questão que precisa ser resolvida para garantir que os recursos gerados pelo imposto sejam efetivamente aplicados no combate ao excesso de peso e em outras políticas de saúde pública.

Em última análise, o imposto seletivo sobre bebidas açucaradas e outros produtos prejudiciais à saúde deve ser visto como uma ferramenta que precisa de um controle contínuo para avaliar sua efetividade. Isso inclui o monitoramento de seus efeitos sobre os direitos fundamentais, bem como o acompanhamento da aplicação dos recursos arrecadados, para garantir que realmente sirvam para enfrentar os problemas de saúde públicas associadas ao consumo excessivo desses bens.

4.  O IMPOSTO SELETIVO À LUZ DA EC 132/2023
4.1  PRINCÍPIO DA SELETIVIDADE

Para adentrar no foco deste estudo, qual seja o “imposto seletivo”, importa entender o conceito de seletividade tributária. A Seletividade Tributária é um Princípio Constitucional presente na Constituição Federal que determina que a tributação sobre produtos e serviços varia conforme a sua essencialidade (LOURENÇO, 2018).

O princípio da seletividade propõe que os produtos considerados menos indispensáveis sejam tributados com alíquotas mais elevadas, enquanto os itens essenciais devem ter impostos reduzidos (MELLO, 2024). A Seletividade Tributária está intimamente ligada ao Princípio da Proteção à Dignidade da Pessoa Humana, que estabelece que o Estado deve atuar para salvaguardar os direitos mais essenciais à vida (LOURENÇO, 2018)

Um dos fundamentos de um sistema tributário justo é que indivíduos com maior capacidade econômica devem contribuir em proporção maior. Essa capacidade é frequentemente avaliada com base em três indicadores principais: renda, patrimônio e consumo. No que diz respeito à tributação de bens e serviços, o princípio da seletividade é uma forma de garantir que aqueles com maior capacidade financeira sejam mais taxados (MELLO, 2024).

Conhecido também como Princípio da Essencialidade, esse princípio é aplicado unicamente a dois impostos: o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados). Segundo a Seletividade, itens considerados mais essenciais à vida humana, como água, alimentos e energia elétrica, devem ter uma carga tributária reduzida. Em contrapartida, produtos que são menos essenciais enfrentam uma tributação mais elevada. Assim, bens menos fundamentais, como cigarros (80% de imposto), cachaça (81%), casacos de pele (81%), videogames (72%) e revólveres (71%), estão sujeitos a taxas altas de incidência tributária (LOURENÇO, 2018).

4.2    IMPOSTO SELETIVO

No contexto tributário brasileiro, discute-se há décadas a utilização de desonerações fiscais como uma estratégia de incentivo a práticas que favorecem a preservação ambiental, por meio da chamada extrafiscalidade ou tributação regulatória, que se diferencia da fiscalização tradicional, cujo único objetivo é a arrecadação. Além disso, mencionam-se os chamados “impostos verdes” ou “taxas ambientais”, que são instrumentos fiscais destinados a desencorajar comportamentos prejudiciais ao meio ambiente, penalizando aqueles que poluem e promovem a degradação ambiental (ABRAHAM, 2020; APUD ABRAHAM; LANNES, 2024).

Entre as várias ferramentas disponíveis para a formulação de políticas fiscais ambientais, destaca-se a alteração de alíquotas e bases de cálculo, a concessão de créditos tributários, além de subsídios, isenções e diferimentos (ABRAHAM; LANNES, 2024).

A justificativa apresentada na proposta original da PEC n. 45/2019 defendeu a implementação de impostos seletivos, no plural, com o objetivo de desincentivar o consumo de produtos prejudiciais à saúde, como cigarros e bebidas alcoólicas, utilizando uma incidência monofásica. A versão inicial estabelecia esses impostos seletivos dentro da competência tributária residual da União, conforme o artigo 154, mas não especificava uma finalidade clara ou critério para sua criação: “Art. 154. […] III – impostos seletivos, com finalidade extrafiscal, destinados a desestimular o consumo de determinados bens, serviços ou direitos” (ABRAHAM; LANNES, 2024).

Após várias emendas na Câmara dos Deputados, essa redação foi modificada para: (i) incluir a saúde e o meio ambiente como critérios; (ii) limitar a aplicação do imposto às atividades de produção, comercialização e importação de produtos a serem definidos; (iii) estabelecer que sua instituição seria por meio de lei ordinária; e, por fim, (iv) posicioná-lo dentro das competências tributárias ordinárias da União, no artigo 153. Art. 153. […] VIII – fabricação, venda ou importação de produtos e serviços que causem danos à saúde ou ao meio ambiente, conforme estabelecido pela legislação.

Após a tramitação no Senado Federal, o parecer final da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) ressaltou a importância da criação do imposto seletivo no contexto das políticas de enfrentamento às mudanças climáticas. Além disso, no

Senado, foram propostas (i) uma redação que expressasse a extrafiscalidade e (ii) a inclusão das atividades de extração entre aquelas que estarão sujeitas à aplicação do imposto. Como condição, (iii) foi estabelecido um limite de 1% sobre o valor de mercado do produto extraído. Finalmente, (iv) foi adicionada a exigência de uma lei complementar para regular a questão.

O termo “imposto seletivo” refere-se a um tributo que opera com base no princípio da seletividade, que visa ajustar a alíquota de acordo com a essencialidade do bem sobre o qual incide o imposto. Isso está relacionado ao princípio da essencialidade, que determina que o imposto deve variar conforme a importância do produto para o contribuinte, permitindo a satisfação de suas necessidades básicas e penalizando mais intensamente bens considerados desnecessários ou de consumo restrito. No entanto, esses princípios têm sido alvo de críticas por especialistas, pois envolvem subjetividades ao estabelecer as graduações de essencialidade, que podem variar de acordo com a perspectiva individual de cada pessoa (ABRAHAM; LANNES, 2024).

O Imposto Seletivo é um tributo federal aplicado ao consumo de produtos que são nocivos à saúde e ao meio ambiente, sendo uma parte do novo modelo de Imposto sobre Valor Agregado (IVA) a ser implementado com a Reforma Tributária. Essa reforma também traz a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) no nível federal, que vai substituir o PIS e a Cofins, além do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) em âmbito subnacional, que assumirá o lugar do ICMS e do ISS. (MELLO, 2024).

4.3.      O IMPOSTO SELETIVO E A REFORMA TRIBUTÁRIA: CONTROVÉRSIAS, DESAFIOS E IMPLICAÇÕES ECONÔMICAS E SOCIAIS

Existem alguns pontos, que na visão de muitos são controversos no que concerne ao imposto Seletivo, ou o “Imposto do Pecado” que é assim chamado, por impor taxas adicionais sobre produtos que são nocivos à saúde, como tabaco e bebidas alcoólicas, bem como aqueles que impactam negativamente o meio ambiente como visto anterior.

Segundo Marcos Pestana (2024) o intuito da reforma tributária, é tornar a tributação no país mais simples de maneira que aborde diversos problemas que impactam o crescimento, a produtividade e a eficiência da economia brasileira, pois segundo o autor, o sistema atual não é nem simples, nem justo, nem eficaz.

De acordo com Observatório Brasileiro Do Sistema Tributário, (2024) a discussão no Brasil sobre o Imposto Seletivo (IS) – um tributo criado pela EC 132/2023 em favor da União – representa uma nova manifestação de uma antiga controvérsia global no âmbito do sistema tributário, que remonta à década de 1960 e envolve a função dos tributos na regulação da economia e na conduta dos agentes econômicos. Nas últimas décadas, uma ampla variedade de teorias, modelos, estudos empíricos e análises sobre o assunto foi publicada. Entretanto, essa vasta produção acadêmica não resultou em consensos ou em uma diretriz clara sobre como o Estado deve proceder em relação a impostos que têm como objetivo principal a regulação ou a indução de comportamentos.

Alguns defendem que os tributos, especialmente os de consumo, devem ser “neutros”, com sua função primária sendo apenas a arrecadação para a administração pública, sem influenciar o comportamento dos agentes econômicos ou a dinâmica de mercado. Essa visão, apoiada por intelectuais da Sociedade de Mont Pèlerin, argumenta que as transações devem ocorrer sem distorções fiscais, permitindo que as partes cheguem a soluções eficientes independentemente da distribuição inicial de direitos de propriedade. A promoção de comportamentos ou a manipulação de preços por meio de impostos é considerada ineficaz nessa perspectiva (OBSERVATÓRIO BRASILEIRO DO SISTEMA TRIBUTÁRIO, 2024).

José Maria Arruda Andrade, (2024) entende o Imposto Seletivo como um tributo com natureza extrafiscal, destinado a desestimular o consumo de bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, e enfatiza que o Imposto Seletivo deve ser interpretado dentro do contexto da reforma tributária e que sua função principal é regular comportamentos indesejados, como o consumo de produtos nocivos, em vez de apenas arrecadar recursos.

Ainda segundo o supramencionado autor defende que a incidência deste tributo deve ser limitada a um número restrito de produtos claramente identificados como nocivos, exigindo critérios objetivos para a seleção desses bens. Além disso, destaca a importância de reavaliações periódicas para garantir que o imposto continue eficaz em suas funções.

Andrade (2024) também aborda a importância de uma interpretação cuidadosa da legislação que estabelece a competência para a instituição desse imposto, destacando que a tributação deve ser seletiva e focada em bens que realmente geram externalidades negativas, e argumenta que essa abordagem é fundamental para garantir a eficácia do imposto e sua aceitação social, além de contribuir para a promoção da saúde pública e da proteção ambiental, e observa que o tema ainda é novo na doutrina e jurisprudência, sugerindo espaço para debates e aprimoramentos na sua aplicação.

Paulo Victor Vieira da Rocha (2014) analisa a categorização das normas tributárias, questionando a separação tradicional entre normas fiscais e extrafiscais, e argumenta que essa divisão é inadequada para captar a complexidade das normas tributárias e seus efeitos reais.

Rocha (2024) enfatiza que se deve levar em consideração a “vontade do legislador” e os objetivos que sustentam as normas, além de evidenciar a necessidade de uma abordagem que considere a capacidade contributiva dos cidadãos, e entende que a classificação clássica das normas tributárias em fiscais e extrafiscais apresentam falhas e limitações.

Além disso, o referido autor acredita que em vez de se concentrar em uma categorização abstrata, é mais pertinente analisar os efeitos das normas tributárias e seu impacto na capacidade econômica dos contribuintes, e sugere que a praticidade e a prevenção ao abuso devem ser integradas à fiscalidade, em vez de serem vistas como funções extrafiscais, propondo uma revisão da abordagem tradicional, visando uma interpretação mais justa e eficaz do Direito Tributário, que considere a equidade e a capacidade de contribuição dos indivíduos.

A teoria de Arthur C. Pigou sugere que os agentes econômicos, ao firmar contratos, podem gerar externalidades que requerem intervenção do Estado. Isso ocorre porque o preço acordado nem sempre reflete o custo social da transação, resultando em ônus para indivíduos não envolvidos, como poluição e riscos à saúde pública, que são externalizados. Para corrigir essas falhas de mercado e promover o bem-estar social, é necessária uma resposta regulatória, especialmente através do Direito Tributário. A discussão evoluiu, ressaltando que a regulação de mercados e o uso de instrumentos tributários podem oferecer soluções promissoras para esses desafios. (OBSERVATÓRIO BRASILEIRO DO SISTEMA TRIBUTÁRIO, 2024).

Sob o prisma de Rocha et al., (2024) embora o termo “Imposto Seletivo” tenha se tornado frequente para referir-se a esse novo tributo, acredita o autor que essa nomenclatura não seja a mais apropriada.

No Brasil, a seletividade é uma abordagem legislativa nos impostos sobre consumo, diferenciando a aplicação do tributo com base na essencialidade do consumo. Como esses tributos enfrentam desafios para usar a capacidade contributiva como critério, a essencialidade se torna uma forma de diferenciação. O imposto mencionado no artigo 153 não é seletivo, pois a seletividade avalia os consumos por sua essencialidade, enquanto o novo imposto considera a nocividade à saúde ou ao meio ambiente. Embora possa haver consumos essenciais que sejam prejudiciais ao meio ambiente, é inadequado pensar em um imposto que seja seletivo isoladamente, já que a seletividade deve ser vista como um critério dentro do próprio tributo (ROCHA, 2024).

Em uma manifestação anterior, discutiu-se a natureza do Imposto Extrafiscal como uma ferramenta regulatória para tributar bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente. Durante a tramitação da PEC 45 no Senado, foi inicialmente incluído que esse imposto teria caráter extrafiscal, mas essa menção foi removida na EC 132. Esta emenda trouxe inovações significativas, como a inclusão do princípio da justiça tributária, que se concentra na distribuição equitativa da carga tributária, destacando a capacidade contributiva dos indivíduos (ROCHA, 2024).

A EC 132 também incorporou a proteção ambiental como um princípio do Sistema Tributário Nacional. O “Imposto Seletivo” estabelecido pela emenda tem um enfoque fiscal, limitado a bens e serviços que causam danos, e deve ser aplicado de forma a considerar a capacidade econômica dos contribuintes. Assim, de acordo com Rocha (2024) a análise da legalidade e constitucionalidade da lei complementar que cria o imposto deve seguir as diretrizes do artigo 153, inciso VIII, e não ser baseada em justificativas indutoras.

Guilherme de Almeida Henriques (2024) explica que o Imposto Seletivo será aplicado de forma monofásica, significando que será cobrado somente uma vez sobre o bem ou serviço. No entanto, ele não poderá incidir sobre as exportações (exceto na fase de extração) nem sobre setores considerados essenciais, como energia elétrica e telecomunicações. Além disso, esse imposto poderá ser aplicado nas mesmas operações e bases de cálculo de outros tributos, podendo até mesmo integrar essas bases (imposto sobre imposto).

No entanto, o autor menciona que, conforme o provérbio alemão afirma: “O Diabo está nos detalhes”, é importante examinar cuidadosamente as repercussões das ações para evitar arrependimentos futuros.

Assim, considera Henriques (2024) importante analisar o que menciona ser os “sete pecados capitais” que podem surgir em decorrência desse novo imposto. E nesse ínterim destaca alguns desafios, o qual para melhor exemplificação expusemos em tabela 3:

Tabela 3: Sete pecados capitais do Imposto Seletivo

SELETIVIDADEA falta de previsão na Constituição para a aplicação desse princípio ao IS compromete sua definição. O ideal é que a tributação seja proporcional à essencialidade dos bens e serviços, o que gera dificuldades similares às enfrentadas pelo ICMS, levando anos para uma conclusão judicial.
COMPLEXIDADEA reforma visa simplificar o sistema tributário, mas a definição do que é prejudicial à saúde ou ao meio ambiente complica essa simplificação, como demonstrado pelo prolongado debate sobre  agrotóxicos  no  STF,  que  pode resultar em novas disputas classificatórias.
NEUTRALIDADEA proposta de tributar segundo o teor alcoólico de bebidas exemplifica como a tributação pode influenciar decisões de mercado, o que vai contra o princípio de que os tributos devem ser neutros em relação a escolhas econômicas.
REGRESSIVIDADEA carga tributária do IS tende a pesar mais sobre as camadas sociais mais vulneráveis, como observado no tabagismo e no consumo de alimentos ultraprocessados. Isso contraria a ideia de progressividade tributária, que busca que os ricos contribuam mais.
EXTRAFISCALIDADEOs tributos têm funções fiscais e     extrafiscais.    Apesar    da      promessa governamental  de  que  a  reforma não aumentará a carga tributária, não há justificativas claras ou estudos que respaldem essa afirmação, especialmente com a continuidade de tributos similares.
CUMULATIVIDADEO IS deve ser monofásico, mas a Emenda Constitucional nº 132 permite exceções, levantando dúvidas sobre a justificação da tributação em casos como a extração mineral para uso em equipamentos médicos ou energia sustentável.
UTILIDADEOs impostos não têm destinação específica, o que significa que não é garantido que a arrecadação do IS atenda à compensação de gastos com externalidades  negativas,  podendo  ser utilizada para outras finalidades.

Fonte: Autor, adaptado de Henriques (2024).

Em resumo, Henriques (2024) alerta para os desafios e contradições da aplicação do IS no contexto da reforma tributária, enfatizando a necessidade de uma análise cuidadosa para evitar erros do passado.

Pois segundo supramencionado autor, o Imposto Seletivo não cumpre os princípios que fundamentaram a reforma tributária e, provavelmente, não será eficaz no combate às externalidades negativas que busca enfrentar, especialmente sem uma base ideológica clara, tornando-se assim vulnerável a diversos lobbies e interpretações (HENRIQUES, 2024).

Na visão de Souza (2024) um ponto que deve ser observado diz respeito à distribuição de competências tributárias entre a União (CBS), estados e municípios (IBS). E nesse contexto, alguns dos entes federativos podem ter dificuldades para se adaptar, uma vez que haverá a atuação do Comitê Gestor do IBS, que pode complicar a situação devido à complexidade da proposta para suas decisões.

Já Abraham, Lannes, (2024) argumentam que os setores que podem ser impactados pelo novo imposto seletivo manifestam preocupação quanto à possibilidade de sua aplicação também sobre exportações. Essa questão se baseia no artigo 153, § 6º, VII, da Constituição Federal de 1988, que estipula que “o imposto será cobrado independentemente da destinação”. Contudo, entendem que a interpretação do termo “destinação” sugere que se refere a “finalidade” ou “uso”, e não a “local”, o que indicaria países estrangeiros.

O Código Tributário Nacional (CTN) apoia essa interpretação, utilizando “destinado” com o sentido de “usado” em diversos artigos, associando a palavra a propósitos específicos, como no caso de “papel destinado exclusivamente à impressão”. Embora o artigo 11 do CTN mencione “destino” em um contexto espacial, essa interpretação geralmente é seguida de uma comparação com “procedência”. Adicionalmente, o inciso I do mesmo artigo da Constituição afirma que o imposto não incidirá sobre exportações. Portanto, não há respaldo constitucional para aplicar o imposto seletivo sobre operações de exportação de bens (ABRAHAM, LANNES, 2024).

Para Abraham, Lannes, (2024) a discussão sobre a aplicação dos princípios de essencialidade e seletividade na exploração de petróleo e recursos minerais é complexa, dado o impacto ambiental e a importância dessas atividades para indústrias como a construção civil e automotiva. A Política de Apoio ao Licenciamento Ambiental (Pró-Minerais Estratégicos), lançada em 2021, busca facilitar a extração de minerais estratégicos. A Emenda Constitucional n. 132/2023 introduziu, pela primeira vez, um limite máximo de alíquota de 1% sobre a tributação da extração de bens minerais e petróleo, além das limitações já existentes. A extração desses recursos é significativa para o PIB brasileiro, representando entre 2,5% e 4%, mas levanta preocupações sobre possíveis efeitos negativos da tributação seletiva, como perda de competitividade e inflação interna (ABRAHAM, LANNES, 2024).

Os argumentos contrários ao imposto seletivo nas atividades de mineração e petróleo incluem a existência de obrigações fiscais já existentes, como royalties, contribuições especiais e taxas de fiscalização, além da preocupação com a sobrecarga nas cadeias produtivas, afetando insumos industriais. No entanto, a aplicação desse imposto é vista como benéfica devido ao foco em proteção ambiental. A carga tributária efetiva no setor mineral é de apenas 15,8%, e no setor de petróleo, de 15,6%, valores considerados baixos em relação aos custos ambientais significativos. Adicionalmente, as empresas petrolíferas gozam de incentivos fiscais, e a extração é isenta de ICMS. A maior parte da produção mineral destinada à exportação também é beneficiada por isenções tributárias, resultando em desafios para a arrecadação federal (ABRAHAM, LANNES, 2024).

Esclarecem ainda os autores que, embora a lei complementar que estabelecerá oficialmente o imposto seletivo ainda não tenha sido publicada, as propostas apresentadas pelos parlamentares indicam algumas decisões que diminuem o potencial protetivo desse imposto. Por exemplo, insumos, produtos agrícolas e itens de higiene e limpeza foram isentados de sua aplicação.

Por outro lado, é uma decisão acertada incluir os mercados de extração e produção de minerais e petróleo, uma vez que, atualmente, as cargas tributárias efetivas são baixas em relação ao impacto ambiental e ao lucro gerado por essas atividades. Por fim, considerando que se trata de um imposto com efeitos regressivos, seria recomendável que o imposto seletivo fosse integrado à sistemática de cashback prevista na EC n. 132/2023, seguindo o exemplo de outros países que já adotaram soluções semelhantes (ABRAHAM, LANNES, 2024).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise da reforma tributária proposta no Brasil, especialmente sob o olhar do imposto seletivo, revela um cenário complexo que busca equilibrar a arrecadação fiscal com a promoção da saúde pública e a proteção ambiental.

O estudo fez uma ampla explanação sobre a extrafiscalidade, demonstrando que a tributação não deve ser vista apenas como um meio de arrecadar recursos, mas também como uma ferramenta para influenciar comportamentos e escolhas de consumo. A estrutura do novo sistema tributário, evidenciada pela Emenda Constitucional n. 132/2023 e pela Proposta de Emenda à Constituição n. 45/2019, busca desestimular o consumo de bens nocivos à saúde, como cigarros e bebidas alcoólicas, por meio de alíquotas diferenciadas.

O objetivo geral deste estudo foi entender como essas transformações no sistema tributário poderiam impactar o consumo de produtos prejudiciais à saúde, e a resposta é clara: as mudanças têm um potencial significativo para promover uma sociedade mais saudável, incentivando a adesão a hábitos de consumo mais conscientes. No entanto, é crucial reconhecer os desafios que essa proposta enfrenta, incluindo a resistência da indústria, as questões de desigualdade no impacto de tais tributos e a complexidade de um sistema que vise a equidade fiscal.

Além disso, os objetivos específicos, que incluíram a avaliação da reforma tributária, a análise do imposto seletivo e a identificação de seus impactos, foram alcançados com a clareza das implicações legais e práticas que surgirão. A melhor compreensão do funcionamento e da aplicação do imposto seletivo é essencial para garantir que as mudanças sejam efetivas e não resultem em cargas desproporcionais sobre os consumidores de classes sociais mais baixas.

Em suma, a reforma tributária e a implementação do imposto seletivo representam uma oportunidade valiosa para o Brasil alinhar seu sistema fiscal com políticas de saúde pública e ambientais mais robustas. Um futuro em que saúde e desenvolvimento econômico coexistam de maneira equilibrada não é apenas desejável; é uma necessidade.

Portanto, é fundamental que os formuladores de políticas considerem as evidências e as análises críticas apresentadas neste estudo ao tramar o caminho a seguir, assegurando que o sistema tributário se torne não apenas mais justo, mas também efetivamente eficiente na promoção de uma saúde coletiva aprimorada e sustentável.

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