OPHTHALMOLOGICAL CHANGES WITH PATIENTS SUBMITTED TO COVID-19
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7810876
Breno Oliveira Gois1
Isabela Avila Fontes Carvalho1
Ana Carolina Matiotti Mendonça1
Cristiano de Queiroz Mendonça2
RESUMO
O objetivo deste estudo é avaliar o comportamento das repercussões oculares após a infecção pelo COVID-19 em indivíduos com diferentes graus de comprometimento pela doença através de uma avaliação oftalmológica. Trata-se de um estudo quantitativo, observacional, analítico, tipo caso-controle, envolvendo pacientes de ambos os sexos, acima de 18 anos de idade, que tiveram resultado de RT-PCR positivo para COVD-19 no período entre janeiro de 2020 e dezembro de 2022. Os pacientes foram avaliados do ponto de vista demográfico, separados em grupos quanto a gravidade da manifestação da doença: sintomas leves e que necessitaram de internação hospitalar. A avaliação oftalmológica consistiu em exames como Acuidade visual, Tonometria ocular, Biomicroscopia e Retinografia. Os pacientes elegíveis foram incluídos consecutivamente, após aceitarem realizar a pesquisa. Uma amostra total de 40 pacientes, dos quais 52,5% eram do sexo feminino, com idade média de 41,7 anos, todos com acuidade visual normal em ambos os olhos. Foram observadas alterações na biomicroscopia e na retinografia em 20% dos pacientes, cada. A média de tonometria ocular no olho direito foi de 13,9 (DP 2,1) e 13,9 (DP 2,2) no esquerdo, sendo que 25% tem PIO superior a 16 em ambos os olhos. Há um risco maior de alterações na biomicroscopia e retinografia em pacientes internados, apesar de não haver alterações significativas entre os grupos que necessitaram de intubação orotraqueal ou não.
Palavras-chave: Coronavirus. Técnicas de Diagnóstico. Oftalmológico.
ABSTRACT
The objective of this study is to evaluate the behavior of ocular repercussions after infection with COVID-19 in individuals with different degrees of impairment by the disease through an ophthalmological evaluation. This is a quantitative, observational, analytical, case-control study, involving patients of both sexes, over 18 years of age, who had a positive RT-PCR result for COVD-19 in the period between January 2020 and December 2022. The patients were evaluated from the demographic point of view, separated into groups according to the severity of the disease manifestation: mild symptoms and those that required hospitalization. The ophthalmological evaluation consisted of exams such as visual acuity, ocular tonometry, biomicroscopy and retinography. Eligible patients were included consecutively after agreeing to participate in the survey. A total sample of 40 patients, of which 52.5% were female, with a mean age of 41.7 years, all with normal visual acuity in both eyes. Changes in biomicroscopy and retinography were observed in 20% of patients each. The mean ocular tonometry in the right eye was 13.9 (SD 2.1) and 13.9 (SD 2.2) in the left eye, with 25% having IOP greater than 16 in both eyes. There is a greater risk of changes in biomicroscopy and retinography in hospitalized patients, although there were no significant changes between the groups that required orotracheal intubation or not.
Keywords: Coronavirus. Diagnostic Techniques. Ophthalmological.
INTRODUÇÃO
Em dezembro de 2019, iniciou na China o surto da doença do coronavírus (COVID-19) que rapidamente se propagou pelo resto do mundo. Em março de 2020, foi rotulada como pandemia pela Organização mundial da saúde (OMS) e até o presente momento mais de 470 milhões de casos e mais de 6 milhões de mortes. O novo betacoronavírus envelopado é membro da família Coronaviridae, trata-se de um patógeno causador da Síndrome Respiratória Aguda Grave 2 (SARS-CoV-2), dotado de um RNA de fita simples de sentido positivo (CORREIA et al., 2021; CHEN et al., 2021).
As manifestações clínicas nos pacientes dor de garganta pelo coronavírus variam desde sintomas comuns de um resfriado como odinofagia, tosse, febre, dor de cabeça, fadiga, até casos graves evoluindo para síndrome de desconforto respiratório, sepse e óbito. As manifestações mais conhecidas do SARS-CoV-2 estão diretamente ligadas ao sistema respiratório, mas o mesmo pode se apresentar em outros sistemas orgânicos como gastrointestinal, ocular e dermatológico (SILVEIRA et al., 2022).
A principal via de transmissão da COVID-19 é através de gotículas respiratórias, mas estudos recentes relatam o envolvimento ocular, como manifestações de conjuntivite folicular em alguns pacientes infectados, com alguns casos demonstrando a presença de RNA viral em amostras conjuntivais ou lágrimas coletadas desses pacientes. Em contrapartida, as implicações do envolvimento ocular no curso e no prognóstico da doença não são completamente conhecidas. Se faz necessária uma investigação científica para se determinar a ocorrência e a natureza das manifestações oculares associadas ao coronavírus com o intuito de prevenir ou curar possíveis danos às estruturas do olho humano (DAVIS et al., 2019; KONUK et al., 2019; CHEN et al., 2021, VESELY et al., 2022).
O presente estudo tem como intuito de identificar possíveis alterações tardias oculares após a infecção pelo COVID-19 comparando indivíduos com diferentes graus de comprometimento pela doença através de uma avaliação oftalmológica pelos seguintes exames de rastreio Acuidade visual, Tonometria ocular, Biomicroscopia e Retinografia.
MÉTODOS
Trata-se de um estudo quantitativo, observacional, analítico, tipo caso-controle, em que foram avaliados os achados oftalmológicos dos exames de Acuidade visual, Tonometria ocular, Biomicroscopia e Retinografia. A amostra utilizada foi composta por dois grupos de pacientes, um dos que tiveram COVID-19 e não desenvolveram sintomas graves, logo sem critérios para internação hospitalar, e outro com sintomas graves com necessidade de internação. O grupo dos internados foi dividido em dois subgrupos, os que tiveram a necessidade de intubação orotraqueal durante o período de internação e os que não. Por não haver estudos prévios de prevalência, foi adotado inclusão de 40 pacientes, para posterior cálculo amostral específico.
Analisou-se no período de vigência do estudo, um montante de quatro exames: tonometria, acuidade visual, ocular, biomicroscopia e retinografia, a pressão intraocular (PIO) aferida por tonometria de aplanação com anestesia local de 0,5% de proparacaine e corante de fluoresceína, após calibração prévia do aparelho (TOCINO, CALVO, CORTINAS, 2005). PIO foi considerada como normal quando seus valores aferidos por Tonometria foram abaixo de 21mmHg.
O teste de acuidade visual foi criado pelo médico oftalmologista alemão Heinrich Kuechler, no século XIX. O procedimento consiste em posicionar o paciente a uma distância de 6 metros (20 pés) do quadro de Snellen, para a partir disso realizar uma leitura com cada olho separadamente. A biomicroscopia é realizada em um aparelho denominado lâmpada de fenda ou biomicroscópio, que oferece uma ampliação de 6 a 40 vezes e permite a obtenção de cortes ópticos de diferentes formas, inclinações e intensidades, o que possibilita a observação das estruturas transparentes (YAMANE, 1992; RODRIGUES, 1992).
A retinografia permite observar e fotografar a retina, o nervo ótico e o fundo do olho. No exame de retinografia ocular as imagens obtidas estão a cores e em alta resolução, permitindo desta forma ver com detalhe todo o fundo ocular (RODRIGUES, 1992). Assim, foi utilizado como instrumento de coleta de dados um formulário virtual que irá conter o nome, data de nascimento do paciente voluntário, grupo amostral o qual irá encaixar-se e o laudo dos exames feitos por único examinador e pesquisador (C.Q.M.).
As variáveis categóricas foram descritas por meio frequência absoluta e relativa percentual, já as contínuas por média e desvio padrão. A hipótese de independência de variáveis categóricas foi testada por meio teste Exato de Fisher. A hipótese de aderência das variáveis contínuas a distribuição normal foi testada por meio do teste de Shapiro-Wilks. Se confirmada, a hipótese de igualdade de médias foi testada por meio de teste t para duas amostras independentes, caso contrário, a hipótese de igualdade de medianas foi testada por meio de teste de Mann-Whitney para duas amostras independentes. Foram calculados tamanhos de efeito D de Cohen (0,2=pequeno; 0,5=médio; 0,8=grande), h de Cohen (0,2=pequeno; 0,5=médio; 0,8=grande) e Correlação Rank-Bisserial (<0,4=pequeno; 0,4-0,7=médio; >0,7=grande) para avaliar diferenças entre médias, proporções e medianas respectivamente. O nível de significância adotado foi de 5% e o software utilizado foi o R Core Team 2022 (Versão 4.2.2).
A coleta de dados só foi iniciada após aprovação do projeto de pesquisa pelo Comitê de Ética e Pesquisa, 65100022.4.0000.5371. A coleta de dados e a realização da investigação científica foram de acordo com as Resoluções da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) e do Conselho Nacional de Saúde (CNS), que determinam as normas a serem seguidas nesses estudos (CNEP, 2016).
RESULTADOS
Dos 40 pacientes avaliados, 52,5% eram do sexo feminino, com idade média de 41,7 (DP: 13,1) anos, todos com acuidade visual normal tanto no olho esquerdo quanto no direito. Na biomicroscopia, 20% apresentaram alguma alteração, o mesmo percentual foi observado na retinografia. Já a média de tonometria ocular no olho direito foi de 13,9 (DP 2,1) e no esquerdo de 13,9 (DP 2,2), sendo que 25% dos participantes tiveram PIO superior a 16 em ambos os olhos (Tabela 1).
Tabela 1. Características clínicas e oftalmológicas dos pacientes estudados.
Legenda: n – frequência absoluta. % – frequência relativa percentual. DP – Desvio Padrão. IIQ – Intervalo Interquartil. Fonte: dados da pesquisa, 2023.
Observa-se resultados significativos para idade (50,5 [43-56,5] vs 28,5 [26,5-44,5]; p=0,001; RB: 0,577), em que os pacientes internados eram mais velhos (média), biomicroscopia (40% vs 0%; p=0,003; h=1,37) e retinografia (40% vs 0%; p=0,003; h=1,37), visto que todos os casos alterados ocorreram em pacientes internados (grande). A tonometria ocular OD (14,8 (DP: 2) vs 13,1 (DP: 2,1),p=0,013; D=0,795) e OE (14,7 (1,9) vs 13,2 (2,1); p=0,027; D=0,726) com maior média para pacientes internados (médio), o percentual de pacientes com PIO superior a 16 dos internados foi de 35%, enquanto dos não internados foi 15% (p=0,273). As demais variáveis não apresentaram evidência de diferenças significativas (Tabela 2).
Tabela 2. Características clínicas e oftalmológicas em função do paciente ter ou não sido internado.
Legenda: n – frequência absoluta. % – frequência relativa percentual. DP – Desvio Padrão. IIQ – Intervalo Interquartil. F – Teste Exato de Fisher. T – Teste t para amostras independentes. M – Teste de Mann-Whitney. Fonte: dados da pesquisa, 2023.
A partir da Tabela 3, observa-se que não há evidência de diferença significativa entre as variáveis.
Tabela 3. Características clínicas e oftalmológicas em função do interno ter ou não sido intubado.
Legenda: n – frequência absoluta. % – frequência relativa percentual. DP – Desvio Padrão. IIQ – Intervalo Interquartil. F – Teste Exato de Fisher. T – Teste t para amostras independentes. M – Teste de Mann-Whitney. Fonte: dados da pesquisa, 2023.
Na análise clínica dos pacientes, foi identificado alterações apenas nos pacientes em que necessitaram de internação, entre estas a mais comum foi lesões puntiformes amareladas difusas na retina (n=6), seguida por olho seco (n=4) (Tabela 4).
Tabela 4. Alterações na análise clínica dos pacientes internados e com sintomas leves/sem internação.
Fonte: dados da pesquisa, 2023.
DISCUSSÃO
Nesse estudo, nenhum paciente apresentou alteração da acuidade visual durante a infecção pelo COVID-19, apesar de ter sido observado durante a obtenção dos dados e eventual análise clínica dos pacientes, lesões puntiformes amareladas difusas na retina e retinopatia diabética, além de olho seco. Em 38 casos avaliados por Wu et al. (2020a) não houve queixas de visão turva, apesar de outras manifestações como conjuntivite, quemose, epífora e secreção ocular. A revisão sistemática e meta-análise de Nasiri et al. (2021) apresentou uma prevalência de sintomas oculares de aproximadamente 11%, sendo que os mais comuns foram olho seco ou sensação de corpo estranho (16%) e vermelhidão (13,3%), enquanto que apenas 8,2% relação visão turva ou diminuição da visão em uma amostra de 932 indivíduos. A diferença, provavelmente, seja por conta da avaliação tardia dos pacientes e não na vigência da afecção sistêmica pelo coronavírus nesse estudo.
Referente a retinografia, 20% (n = 8) dos pacientes avaliados apresentaram alteração, um percentual inferior ao resultado no estudo de Pereira et al. (2022), em que 55,6% tiveram alguma anormalidade, o que corresponde a 10 dos 18 pacientes. Ressalta-se que foram avaliados apenas casos de infecção por SARS-CoV-2 grave, sendo que nesse estudo foi observado uma relação entre alteração na retinografia e a gravidade dos pacientes, sendo observado com maior frequência nos internados, contudo não houve correlação com intubação orotraqueal. Entre os achados encontrados por Pereira et al. (2022) os mais comuns foram hemorragias em gorma de chama e manchas algodonosas. A retina pode ser lesionada na infecção pelo coronavírus de forma direta ou indireta, pelas complicações trombóticas ou pela lesão imunológica (WU et al., 2020b).
No estudo, 20% dos pacientes apresentaram alteração na biomicroscopia, sendo que houve maior frequência em indivíduos internados, apesar de que não constatou correlação com intubação orotraqueal. Em Pirraglia et al. (2020) foram avaliados 46 pacientes com infecção por SARS-CoV-2 internados em Unidade de Terapia Intensiva, sendo observado 3 casos de conjuntivite bilateral com secreção serosa, hiperemia conjuntival bulbar e tarsal, mas não houve nenhuma alteração do segmento posterior ocular relacionado à infecção. O estudo de Boz et al. (2021) realizou exame oftalmológico em 50 pacientes após 2 semanas da infecção por COVID-19, houve 25 achados, o mais comum foi conjuntivite folicular (n = 9), seguida por blefarite (n = 4) e blefaroconjuntivite (n = 4), além disso também foi observado uveíte anterior e conjuntivite papilar.
Costa et al. (2021) observaram maior associação de sintomas e diagnóstico de olho seco em indivíduos com idade mais avançada, de forma similar foi constatado que a idade avançada estava relacionada a alterações na biomicroscopia e retinografia.
Nesse estudo, 35% dos pacientes internados tinham PIO superior a 16, enquanto apenas 15% dos não internados apresentaram PIO superior a 15 (p=0,273), constata-se uma associação entre aumento da PIO e gravidade da infecção pelo COVID-19, apesar de não haver evidências definitivas sobre a causa do aumento da PIO, há a possibilidade de relação com uso de corticoterapia sistêmica nos casos mais críticos ou com a síndrome de liberação de citocinas causada pela infecção pelo SARS-CoV-2 (COSTA et al., 2021; LIN et al., 2023; COPERCHINI et al., 2020).
CONCLUSÃO
Esse estudo observou um risco maior de alterações na biomicroscopia e retiniana em pacientes internados por COVID-19. Não houve alterações significativas entre os grupos que necessitaram ou não de intubação orotraqueal. Houve um maior número de pacientes internados com elevação da PIO acima de 16 mmHg ao comparar com os não internados, apesar de clinicamente esse achado ser insignificante, é preciso uma maior atenção ao monitoramento da PIO em internados com coronavírus.
REFERÊNCIAS
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1Granduando de Medicina da Universidade Tiradentes, Aracaju- Sergipe, Brasil.
2Professor de Oftalmologia da Universidade Tiradentes, Aracaju- Sergipe, Brasil.