REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ni10202502122117
Carolina Lacerda Gontijo1; Samara Luiza Alves de Queiroz Silva2; João Victor Duarte Silva3; Erica Elana dos Santos Correa4; Mariana Magalhães Cardoso5; Gabriela de Oliveira Santos6; Natália Guimarães de Melo7; Tiago de Abreu Amaral Salgado8; Gabriela da Silva Nascimento9
RESUMO
A Diabetes Mellitus é uma doença crônica que possui grande impacto na saúde pública, sobretudo brasileira. Dessa forma, o intuito é prevenir possíveis complicações crônicas que intensificam tal quadro, como a retinopatia, nefropatia e neuropatia diabética. Assim, o intuito do trabalho é avaliar a adesão ao rastreamento de complicações crônicas do DM entre pacientes atendidos por uma equipe de atenção primária em uma Clínica da Família na Zona Norte do Rio de Janeiro. A partir disso, o objetivo é a criação do “Cartão do Paciente Diabético”, proposta de intervenção que contribua com a Atenção Primária. Para tanto, foi realizado um estudo observacional retrospectivo baseado na análise de prontuários eletrônicos de pacientes diagnosticados com DM em uma das equipes de uma Clínica da Família na Zona Norte do Rio de Janeiro. Foram avaliados 139 pacientes quanto à realização dos exames recomendados pelo Ministério da Saúde nos últimos 12 meses: hemoglobina glicada, exame do pé diabético, microalbuminúria e fundoscopia. Dos pacientes analisados, foi solicitada a hemoglobina glicada de 72 (51,8%), 57 receberam a avaliação do pé diabético (41%), apenas 2 possuíam registro de fundoscopia (1,4%) e 111 (79,6%) realizaram o exame de microalbuminúria. Portanto, observa-se que os resultados apresentados nesse estudo demonstram um seguimento deficitário dos pacientes diabéticos, no que diz respeito ao rastreamento e prevenção de complicações referentes à doença. Assim, a manutenção da utilização do Cartão do Paciente Diabético é de importância para a continuidade do cuidado.
Palavras-chave: Diabetes; retinopatia; nefropatia; neuropatia; glicada; microalbuminúria; fundoscopia.
1. INTRODUÇÃO
2.1 Diabetes Mellitus
Como sabido, o Diabetes Mellitus (DM) é uma doença crônica de elevada relevância mundial. O aumento de sua prevalência está associado a diversos fatores, como: estilo de vida sedentário, acelerada urbanização, envelhecimento populacional, entre outros. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), estima-se que 46% dos casos de diabetes em adultos não sejam diagnosticados e que 83,8% de todos os casos de diabetes não diagnosticados estejam em países em desenvolvimento.
Ainda de acordo com a OMS, a glicemia elevada é o terceiro fator, quando relacionado à importância, da causa de mortalidade precoce, superada apenas pela pressão arterial aumentada e pelo uso do tabaco. Dessa forma, com o aumento da prevalência de diabetes, sobretudo no Brasil, já que o país ocupa a sexta posição entre os países com o maior número de pessoas com DM, o rastreio e acompanhamento do paciente diabético torna-se assunto de extrema relevância na atenção primária.
De acordo com a Associação Carioca dos Diabéticos (ACD), no Estado do Rio de Janeiro, estima-se que há 1.394.085 pessoas com diabetes e, deste total, 40% ainda desconhecem o próprio diagnóstico. Quando realizado o corte para a cidade do Rio de Janeiro, tal município aparece como a sexta capital brasileira com maior prevalência de diagnóstico de DM, segundo dados da Vigitel de 2023. Assim, a ACD anunciou que o diabetes é a doença mais cara do mundo, tendo em vista seus custos de longo prazo, sua enorme prevalência com elevada incidência, a sua incurabilidade e suas complicações que causam invalidez e sobrecarregam a previdência social.
2. 2 Complicações da doença
Sabidamente, a diabetes possui algumas complicações a longo prazo, dentre elas estão as microvasculares: retinopatia, nefropatia e neuropatia e as macrovasculares: doença cerebrovascular, doença arterial coronariana, entre outros. Tais complicações têm contribuído significativamente no prejuízo da qualidade de vida dos pacientes, com aumento da morbimortalidade. De acordo com a Sociedade Brasileira de Diabetes, fatores como a duração da doença e a sua interação com outros fatores de risco, como hipertensão arterial, dislipidemia e o fumo, estão diretamente relacionados ao curso das complicações micro e macrovasculares e, portanto, é necessário o controle rigoroso dos mesmos.
2.2.1. Retinopatia Diabética
A retinopatia diabética (RD) é uma complicação microvascular muito comum do DM, sendo a principal causa de perda visual em idosos. Sabe-se que a hiperglicemia e as vias metabólicas alteradas levam ao estresse oxidativo e ao desenvolvimento de neurodegeneração na fase inicial da doença. Quanto maior o tempo de evolução do DM, maior o risco de RD, sendo encontrada em mais de 90% dos pacientes com DM tipo 1 e em 60% daqueles com DM tipo 2, após 20 anos de doença sistêmica. A gravidade da retinopatia aumenta com controle glicêmico inadequado e de acordo com o tempo de doença.
A maioria dos pacientes com retinopatia diabética desenvolvida não apresenta sintomas até o aparecimento de edema macular (EM) ou retinopatia diabética proliferativa (RDP). O desenvolvimento da retinopatia diabética está fortemente relacionado com uma maior duração do diabetes, maior hiperglicemia e hipertensão e, portanto, um nível mais elevado de HbA1c está significativamente associado à progressão da retinopatia diabética, sendo o controle glicêmico intensivo um importante fator na redução da incidência da retinopatia.
De acordo com as atuais diretrizes para o rastreio da retinopatia diabética, a doença passa por um período assintomático no qual se deve proceder ao diagnóstico e ao tratamento com o objetivo de evitar alterações irreversíveis. São recomendados exames periódicos e rastreamento de doenças oculares por médico oftalmologista, já que diagnóstico e tratamento precoces proporcionam melhores resultados visuais, menor custo econômico e social, além de melhor prognóstico em longo prazo. Para pacientes com DM2, o primeiro exame oftalmológico deve ser iniciado assim que houver o diagnóstico confirmado de diabetes, assim como para DM1, sendo o prazo estendido para 5 anos após início da doença.
Como a retinopatia diabética continua a ser a principal causa de deficiência visual, o rastreio da retinopatia diabética é importante para detectar precocemente a cegueira evitável. Contudo, apesar do progresso no tratamento do edema macular diabético e da RD, a dificuldade ao acesso de exames de fundo de olho atrasa o diagnóstico e o tratamento da doença.
Em relação ao tratamento, embora a panfotocoagulação a laser e a injeção intraocular de inibidor de VEGF sejam eficazes, eles se beneficiam mais na prevenção da perda visual do que na reversão da acuidade visual deteriorada. Desse modo, o rastreio faz-se imprescindível, com o intuito de ajudar os indivíduos com diabetes a preservar a sua visão.
2.2.2. Nefropatia Diabética
A nefropatia diabética (ND) é a principal causa de doença renal terminal em todo o mundo, sendo que a hiperglicemia crônica e a hipertensão arterial são os principais fatores de risco para o seu desenvolvimento. Em geral, o rastreio da microalbuminúria deve ser realizado anualmente, começando 5 anos após o diagnóstico na diabetes tipo 1 e no momento do diagnóstico e, posteriormente, anualmente na diabetes tipo 2.
A classificação atual da doença renal crônica (DRC), independentemente da etiologia, é baseada na taxa de filtração glomerular (TFG) e na excreção urinária de albumina (EUA). Há um amplo espectro de apresentações da doença renal do diabetes, inclusive o fenótipo da doença renal não albuminúrica e redução isolada da TFG. Portanto, o termo “nefropatia diabética” deve ser reservado somente para pacientes com proteinúria detectável persistente, em geral associada a uma elevação da pressão arterial.
A albuminúria pode ser medida usando urina pontual, medindo a relação albumina-creatinina ou urina de 24 horas, enquanto a função renal é recomendada usando uma base de creatinina sérica. Todo teste de albuminúria anormal deve ser confirmado em duas de três amostras coletadas em um intervalo de 3 a 6 meses, devido à variabilidade diária da excreção urinária de albumina. Alguns fatores como exercício durante o período de coleta de urina, febre, insuficiência cardíaca, hiperglicemia grave e hipertensão arterial não controlada podem elevar tais valores.
A terapia padrão é o controle da glicemia e da pressão arterial usando o bloqueio do sistema renina-angiotensina, visando A1c <7% e <130/80 mmHg. A regressão da albuminúria continua sendo um objetivo terapêutico importante.
2.2.3. Pé Diabético
De acordo com o International Working Group on the Diabetic Foot, o pé diabético pode ser considerado como “infecção, ulceração e/ou destruição de tecidos moles associadas a alterações neurológicas e vários graus de doença arterial periférica (DAP) nos membros inferiores”. Em países desenvolvidos, a DAP é o fator mais importante, enquanto que nos países em desenvolvimento, a infecção é o principal fator que resulta em amputações.
A avaliação do pé em risco de ulceração requer duas medidas extremamente simples: história clínica e exame dos pés. A partir da história clínica, pode-se avaliar fatores de risco, além do tempo de duração do DM, presença de outras complicações microvasculares, como a retinopatia e doença renal do diabetes. A avaliação ainda não é feita rotineiramente, como demonstra dados de estudo multicêntrico no Brasil, os quais mostram que apenas 58% (1.300) dos pacientes com DM2 atendidos em 14 centros especializados e não especializados tiveram registro de exame dos pés efetuado no ano anterior.
Ao exame físico, pode-se observar condições pré-ulcerativas, como: rachaduras, pele seca, lesões fúngicas interdigitais, calosidades, unhas hipotróficas, encravadas ou micóticas, ausência de pelos e alteração de coloração e temperatura. Dentre as ferramentas utilizadas, destaca-se o estesiômetro de Semmes-Weinstein, o qual é capaz de detectar alterações de fibras grossas, relacionadas com a sensibilidade protetora plantar.
A recomendação da American Association of Clinical Endocrinologists (AACE), adotada pela Sociedade Brasileira de Diabetes, é da realização do teste em quatro áreas plantares: hálux (região plantar da falange distal), primeira, terceira e quinta cabeças de metatarsos. A recomendação é que a avaliação do pé do paciente diabético seja realizada no diagnóstico e anualmente, com o intuito de prevenção de futuras complicações, como a amputação.
Figura 1: Áreas de teste de Aplicação do Monofilamento.

2. METODOLOGIA
Este estudo observacional retrospectivo foi realizado a partir do prontuário eletrônico VitaCare, com a seleção dos usuários diagnosticados com Diabetes Mellitus (DM). Para tal, a pesquisa foi realizada utilizando como filtro o acompanhamento dos pacientes diabéticos, por ano, possibilitando a seleção automática e a extração de dados de todos os usuários diagnosticados com DM e que foram acompanhados no último ano de 2023. Essa extração possibilitou a geração de uma planilha Excel com todos os usuários diabéticos de uma Clínica da Família localizada na Zona Norte do Rio de Janeiro. Como recorte de estudo, foram selecionados os pacientes de uma dentre as seis equipes pertencentes à clínica, totalizando 139 pacientes.
A partir do recorte citado, os dados dos pacientes foram descritos, por meio da coleta de dados de controle glicêmico, encaminhamento ao oftalmologista, pedido de microalbuminúria e teste de monofilamento do pé, dados presentes no próprio prontuário presente no programa VitaCare.
Dados utilizados
A partir da mesma pesquisa, uma segunda planilha foi gerada. Os dados utilizados e que foram usufruídos no presente estudo são baseados no programa “Previne Brasil”, o qual estabelece metas de desempenho que devem ser alcançadas pelas equipes da Clínica da Família. Os dados utilizados para análise do presente estudo foram:
1. Ter o diagnóstico de Diabetes Mellitus
2. Ter pelo menos um registro de resultado de hemoglobina A1C inferior ou igual a 9%, realizado durante os 12 meses que antecedem a data final do período em análise.
3. Ter ao menos uma avaliação dos pés registrada durante os 12 meses que antecedem a data final do período em análise.
4. Ter realizado pelo menos uma consulta com registro de fundoscopia no último ano (não necessariamente realizada pelo próprio médico da equipe).
A planilha em questão não consta o acompanhamento de microalbuminúria dos pacientes e, portanto, tais dados foram coletados individualmente, por meio do acesso de todos os pacientes diagnosticados com DM da equipe observada. Para tanto, ao analisar individualmente cada paciente, a verificação da solicitação de microalbuminúria foi realizada através da aba “histórico” – “solicitação de exames”.
Proposta de Intervenção
A proposta de intervenção foi baseada na criação de um “Cartão do Paciente Diabético”, constando a data da última HbA1c, do exame dos pés, da microalbuminúria e fundoscopia, bem como a presença de valores e possíveis alterações. Além disso, consta com o questionamento acerca de comorbidades associadas como hipertensão e dislipidemia; presença de complicações do diabetes como nefropatia diabética, retinopatia diabética e neuropatia diabética, além de hábitos de vida, como etilismo, tabagismo, sedentarismo ou atividade física regular. Para a execução da proposta, o cartão foi entregue aos pacientes diabéticos durante a consulta e orientado que o mesmo a levasse novamente a cada consulta, para que o profissional de saúde responsável pelo atendimento possa checar a eventual necessidade de um novo exame ou avaliação.
Figura 2: Cartão do Paciente Diabético.

3. RESULTADOS
Foram obtidos dados de 139 pacientes com diagnóstico de Diabetes Mellitus acompanhados pela equipe no último ano de 2023. Destes, 84 (60,4%) eram do sexo feminino e 55 (39,6%) do sexo masculino.
Gráfico 1. Distribuição dos pacientes diabéticos de acordo com o sexo.

Em relação à faixa etária, 78 pacientes (56,1%) encontram-se acima dos 60 anos, 51 pacientes (36,7%) entre 40 e 59 anos e 10 pacientes (7,2%) entre 20 e 39 anos, sendo que o intervalo variou de 26 a 87 anos.
Gráfico 2. Distribuição dos pacientes diabéticos de acordo com a faixa etária.

Em relação ao rastreio das complicações da DM no último ano, o foco principal da pesquisa foi investigar a presença ou não dos pedidos de rastreio para as complicações da DM, bem como a realização do exame do pé. Observa-se que foi solicitada hemoglobina glicada de 72 pacientes (51,8%), 57 receberam a avaliação do pé diabético (41%), apenas 2 possuíam registro de fundoscopia (1,4%) e 111 pacientes (79,6%) realizaram o exame de microalbuminúria.
Desse modo, o rastreio menos realizado foi o encaminhamento para realização de fundoscopia, seguido pela avaliação do pé diabético, hemoglobina glicada e microalbuminúria, respectivamente.
Gráfico 3. Acompanhamento do rastreio das complicações da DM.

No que diz respeito ao “Cartão do Paciente Diabético”, o mesmo tem sido entregue durante as consultas com os pacientes portadores de DM e orientado que sempre o levem nas consultas seguintes. Pelo curto período de implementação da proposta, ainda não é possível analisar a efetividade da proposta, necessitando da continuidade da mesma.
4. DISCUSSÃO
Para a análise dos resultados, foram utilizados os parâmetros para a periodicidade de exames e avaliações no acompanhamento de pessoas com diabetes a partir das referências bibliográficas citadas, como a Secretaria Municipal de Saúde e Defesa Civil. Superintendência de Atenção Primária (Figura 3).
Figura 3: Periodicidade de Exames e Avaliações no Acompanhamento de Pessoas com Diabetes.

Um ponto a ser considerado ao analisar os resultados é que, no município do Rio de Janeiro, há uma relação de remuneração por desempenho. Essa relação é dada através do programa “Previne Brasil”, o qual é um modo de financiamento da Atenção Primária, que estabelece diversos critérios para que o município garanta o recebimento de recursos federais. Dessa forma, dentre os indicadores presentes no programa, encontram-se os que foram utilizados no presente estudo para acompanhamento do paciente diabético, como solicitação de hemoglobina glicada, fundoscopia e exame dos pé diabético. Assim, tais dados foram obtidos a partir de relatórios dos indicadores disponíveis no VitaCare, mas que não necessariamente estabelecem um corte mínimo de solicitação ideal de cada exame. Para tanto, é imprescindível dizer que, com o intuito de evitar as possíveis complicações em pacientes diabéticos, a periodicidade de tais exames deve seguir o estabelecido pelas Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes, bem como pela Secretaria Municipal de Saúde e, portanto, não há valores mínimos almejados. O intuito é um monitoramento eficaz que seja capaz de prevenir possíveis complicações.
A partir da análise dos resultados, observa-se que o perfil epidemiológico dos pacientes diabéticos da equipe é, principalmente, de mulheres acima dos 60 anos. Quando analisado o acompanhamento desses pacientes pela equipe, é possível inferir que o mesmo não segue à risca o preconizado pelas Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabéticas bem como pela Secretaria Municipal de Saúde e Defesa Civil demonstrados acima. Apesar da solicitação de microalbuminúria ter alcançado 79,6%, a fundoscopia, exame imprescindível para o acompanhamento da retinopatia diabética, encontra-se apenas em 1,4%.
É importante destacar que um dos principais fatores que impede as complicações da DM é o controle glicêmico adequado. Para tanto, a avaliação periódica da hemoglobina glicada é de extrema importância. A equipe apresentou 51,8% de solicitação de hemoglobina glicada no último ano, um valor que poderia ser de maior expressividade, tendo em vista a importância do acompanhamento do controle glicêmico adequado. Isso por ser exemplificado ao compararmos com dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) de 2013, no qual dos 64.348 pacientes entrevistados em todas as regiões do Brasil, 5920 (9,2%) disseram ter o diagnóstico de DM. Destes, 70,1% alegam ter realizado hemoglobina glicada no último ano. No entanto, não somente a HbA1c se faz necessária nesse contexto, tendo em vista que as complicações elucidadas pelo trabalho podem ser evitadas e até mesmo controladas com um adequado acompanhamento. Dessa forma, o exame dos pés, solicitação de fundoscopia e microalbuminúria constituem pilares importantes no acompanhamento dos pacientes.
Apesar da microalbuminúria não ser um dos indicadores preconizados pelo programa “Previne Brasil”, observa-se uma maior prevalência da solicitação de tal exame quando comparado aos demais, tendo em vista os 111 (79,6%) solicitados dentre os 139 possíveis. Ainda comparando com os dados da Pesquisa Nacional de Saúde de 2013, 78,9% alegaram ter realizado exame de urina para rastreio de complicações no último ano. Apesar de não ter um valor ideal estabelecido para as equipes da APS, tal valor atingido pela equipe traz boas perspectivas quanto ao devido acompanhamento dos pacientes diabéticos, no que diz respeito à nefropatia diabética
Em relação à avaliação dos pés, os dados gerados levam em consideração apenas se a aba destinada ao exame dos pés tenha sido preenchida. Ainda analisando os dados da Pesquisa Nacional de Saúde de 2013, 33,6% afirmam ter os pés examinados por um profissional de saúde no último ano. Apesar de apenas 41% dos pacientes terem sido avaliados neste quesito, o valor pode estar subestimado, devido ao não preenchimento da aba correta no prontuário eletrônico e, consequentemente, a formação de valores errôneos. Vale ressaltar que a análise do pé de pacientes diabéticos é imprescindível para detecção precoce de possíveis lesões e/ou portas de entradas para infecções, bem como sinais precoces de neuropatia diabética. Mesmo que não haja o monofilamento presente durante a consulta, é importante que o pé seja avaliado anualmente, com a inspeção dos mesmos, com o intuito de identificar possíveis lesões, deformidades ósseas, infecções, rarefação de pelos, bem como a necessidade da palpação dos pulsos periféricos.
A fundoscopia apresentou o pior resultado quando comparado aos demais dados analisados. Apenas 1,4% dos pacientes tiveram a fundoscopia registrada no prontuário eletrônico. A PNS de 2013 demonstra que 41% dos pacientes diabéticos realizaram a fundoscopia no último ano, demonstrando um valor bem distante ao apresentado pela equipe. Sabe-se que tal exame deve ser realizado ao diagnóstico e após 5 anos de doença em pacientes com DM2 e DM1, respectivamente, e posteriormente, anualmente. Inicialmente, a retinopatia pode-se apresentar de forma silenciosa e, portanto, o rastreio é fundamental, com o intuito de evitar alterações irreversíveis. O baixo valor de solicitação de fundoscopia é um fator preocupante, tendo em vista a seriedade da doença, já que a retinopatia diabética continua a ser a principal causa de deficiência visual. O questionamento levantado é se tais pacientes realmente não foram encaminhados ao oftalmologista ou se não tiveram o resultado do exame registrado no prontuário eletrônico. As causas para o baixo rastreamento podem ser multifatoriais, como questões de sobrecarga laboral da equipe, com excesso de pacientes sob cuidado, bem como demora das consultas encaminhadas aos oftalmologista e falta de comunicação efetiva entre os membros da equipe para o cumprimento desse objetivo. Outro ponto que deve ser discutido é o fato do rastreio da retinopatia depender de uma articulação de redes, já que tal exame não é feito pela APS e, portanto, depende de outras unidades de saúde, o que pode dificultar o adequado acompanhamento do paciente.
Vale ressaltar que, os dados analisados foram do último ano, levando em conta tanto as consultas agendadas quanto em demanda livre e, portanto, diversas vezes os pacientes procuram à Clínica para a resolução de queixas agudas e não necessariamente para o acompanhamento da DM. Dessa forma, não é rotina que tais exames e acompanhamento sejam realizados em demanda livre, o que pode ter contribuído para os resultados negativos apresentados, já que muitos pacientes não dão continuidade às consultas destinadas ao acompanhamento da diabetes em si. Somado a isso, o fato dos mesmos pacientes serem atendidos por diferentes profissionais ao longo do ano pode ter contribuído para as falhas no acompanhamento desses pacientes, dificultando a continuidade do cuidado.
5. CONCLUSÃO
Como já elucidado, a Diabetes Mellitus constitui uma doença de grande impacto para o Sistema de Saúde do Brasil, o que urge a necessidade de políticas públicas para a prevenção de agravos e continuidade do cuidado aos pacientes. Sob esse ponto de vista, observa-se que os resultados apresentados nesse estudo demonstram um seguimento deficitário dos pacientes diabéticos, no que diz respeito ao rastreamento e prevenção de complicações referentes à doença. Os procedimentos não estão sendo aplicados na frequência desejada, como é preconizado pelo Ministério da Saúde. Portanto, tais resultados indicam a necessidade de maior vigilância desta população.
A partir da necessidade de melhorias no acompanhamento dos pacientes diabéticos, o “Cartão do Paciente Diabético”, criado no presente trabalho, tem o intuito de contribuir com a manutenção do cuidado e prevenção de possíveis complicações associadas à doença, garantindo um processo eficaz de longitudinalidade. Desse modo, a continuidade da utilização do material previamente confeccionado é de importância para a continuidade do cuidado, contribuindo para resultados mais próximos aos preconizados pelo Ministério da Saúde.
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. ANAD – Associação Nacional de Atenção ao Diabetes. Disponível em: <https://www.anad.org.br/>. Acesso em: 17 nov. 2023.
2. ARTIGO EDITORIAL – Setembro de 2022. Prevalência do Diabetes no Estado do Rio de Janeiro em 2022. ACD: Associação Carioca dos Diabéticos. [s.l: s.n.]. Disponível em: <https://www.diabetes-rio.org>. Acesso em: 17 nov. 2023.
3. Diretriz da Sociedade Brasileira de Diabetes. Disponível em: <https://diretriz.diabetes.org.br/>. Acesso em: 17 nov. 2023.
4. Lin KY, Hsih WH, Lin YB, Wen CY, Chang TJ. Update in the epidemiology, risk factors, screening, and treatment of diabetic retinopathy. J Diabetes Investig. 2021 Aug;12(8):1322-1325. doi: 10.1111/jdi.13480. Epub 2021 Jan 14. PMID: 33316144; PMCID: PMC8354492.
5. Muzy J, Campos MR, Emmerick I, Silva RS, Schramm JMA. Prevalência de diabetes mellitus e suas complicações e caracterização das lacunas na atenção à saúde a partir da triangulação de pesquisas. Cadernos de Saúde Pública 2021; 37(5):e00076120 doi: 10.1590/0102-311×00076120
6. Rio de Janeiro Ocupa Topo do Ranking de Casos de Diabetes e Hipertensão. Disponível em: <https://www.saude.rj.gov.br/noticias/2017/11/rio-de-janeiro-ocupa-topo-do-ranking-de-casos-de-diabetes-e-hipertensao>. Acesso em: 17 nov. 2023.
7. Samsu N. Diabetic Nephropathy: Challenges in Pathogenesis, Diagnosis, and Treatment. Biomed Res Int. 2021 Jul 8;2021:1497449. doi: 10.1155/2021/1497449. PMID: 34307650; PMCID: PMC8285185.
8. SBD – Sociedade Brasileira de Diabetes. Disponível em: <https://diabetes.org.br/>. Acesso em: 17 nov. 2023.
9. SBEM – Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia. Disponível em: <http://endocrino.org.br>. Acesso em: 17 nov. 2023.
10. Taxa de incidência de diabetes cresceu 61,8% nos últimos 10 anos. Disponível em: <https://portal.fiocruz.br/noticia/taxa-de-incidencia-de-diabetes-cresceu-618-nos-ultimos-10-anos>. Acesso em: 17 nov. 2023.
11. Thipsawat S. Early detection of diabetic nephropathy in patient with type 2 diabetes mellitus: A review of the literature. Diab Vasc Dis Res. 2021 Nov-Dec;18(6):14791641211058856. doi: 10.1177/14791641211058856. PMID: 34791910; PMCID: PMC8606936.
1Universidade Federal Do Rio de Janeiro, Departamento de Medicina, Brasil