Autor: Ft. Pericles Weyne de Morais Silva
Graduado em Fisioterapia pela Universidade Estadual da Paraíba – UEPB
As Distrofias Musculares Progressivas (DMP) pertencem ao grupo de afecções musculares primitivas (Miopatias) que destroem a estrutura ou o funcionamento das fibras musculares esqueléticas independentemente do comprometimento nervoso; resultam da incapacidade de se manter, durante a vida, a estrutura diferenciada de fibras musculares estriadas e a degeneração de um número crescente de fibras no interior de cada unidade motora desenvolve uma diminuição do valor funcional dos músculos bem como as modificações aparentes do volume muscular (atrofia ou pseudo-hipertrofia) dependem das reações do tecido intersticial do músculo, da esclerose e da adipose, que são constantes, variáveis na sua intensidade, secundariamente à alteração primitiva das fibras.
Sendo a Distrofia Muscular de Duchenne (DMD) a forma mais comum da doença. Tendo incidência aproximada de 1 para cada 3500 nascimentos masculinos.
A DMD é uma miopatia geneticamente determinada, herdada por um caráter recessivo ligado ao sexo (cromossomo X), acomete, preferencialmente, os meninos nascidos de pais clinicamente normais e é transmitido pelas mulheres. São variantes do gene para a Distrofina que é uma grande proteína que fica sob a membrana sarcoplasmática e a sustenta, proporcionando estabilidade à membrana muscular, especialmente durante a contração e o relaxamento musculares impedindo a sua ruptura, encontrando-se ausente ou acentuadamente reduzida (‹ 5%) na distrofia de Duchenne. O gene é muito grande e estudos tem identificado uma parte dele que é funcionalmente capaz de produzir distrofina. Em 65% ocorre perda de uma parte do DNA (deleção), em 5% duplicação do gene e em 30% dos casos mutação de ponto.
O homem que apresenta um gene defeituoso irá desenvolver a doença visto que ele tem um cromossomo X e um Y. A mulher por ter dois cromossomos X, estará protegida da doença mesmo que um dos seus cromossomos tenha uma mutação, sendo ela portadora; este gene defeituoso poderá ser transmitido pela mulher aos seus filhos do sexo masculino, que desenvolverão a doença, ou as suas filhas que poderão ser portadoras.
Em 2/3 dos casos a mutação é adquirida da mãe e em 1/3 a mutação ocorre no próprio indivíduo afetado.
Os pacientes começam a apresentar fraqueza muscular proximal em torno dos 2-5 anos. Os primeiros músculos a serem afetados são os paravertebrais, iliopsoas, quadríceps e glúteos e, esta fraqueza resulta em lordose lombar, dificuldades em levantar-se e marcha anserina. Para ficar de pé a partir de uma posição sentada, o paciente flexiona o tronco, coloca as mãos nos joelhos e então se levanta, escalando a si mesmo com as mãos pelas coxas (Sinal de Gower). O acometimento dos membros inferiores coexiste com uma pseudo-hipertrofia das panturrilhas Com o progredir da doença ocorre comprometimento dos músculos dos membros superiores. A marcha é perdida entre os 9 e os 12 anos de idade e, manifestam-se, ao final da segunda década de vida, dificuldades respiratórias e miocardiopatia. Os pacientes com DMD têm uma evolução progressiva, falecendo geralmente antes da terceira década de vida.
As contraturas e deformidades posturais agravam a dificuldade funcional e faz da DMD uma enfermidade importante incompatível com uma vida social. As alterações sérias da coluna vertebral associada à perda muscular expõem a complicações graves, principalmente as respiratórias.
O diagnóstico da DMD pode ser feito pela história que proporciona as primeiras indicações para o diagnóstico; o quadro clínico típico; o nível sérico de CPK que se encontra em valores muito elevados; a eletroneuromiografia; exame do DNA para pesquisa da deleção no gene da distrofina; estudo do RNA realizado a partir dos linfócitos do paciente permite identificar o ponto em que ocorreu a mutação (mutação de ponto); biópsia muscular realizada para a pesquisa qualitativa e quantitativa da distrofina, especialmente útil nos pacientes que não apresentam deleção.
Não há tratamento específico para a DMD. Há 10 anos atrás a única medida terapêutica era a fisioterapia. Inúmeras pesquisas têm sido feitas nos últimos anos para se obter a cura da doença. As linhas de pesquisa se voltam para a terapia genética ou para a terapia medicamentosa. A terapia genética se procederá com a transferência do gene da distrofina, ou em parte dele, para cada célula muscular, ou da correção do defeito genético por técnicas especializadas. A terapia medicamentosa realizar-se-á com drogas, que não tem ação sobre o gene, que atuariam na célula muscular bloqueando a sua degeneração. Muitos progressos tem sido feitos nas duas possibilidades de tratamento.
A fisioterapia contribui para prevenir contraturas e melhorar a qualidade de vida tendo um papel importante para manter a função músculo-articular na sua melhor potência e sobretudo na manutenção da função respiratória, na prevenção de complicações pulmonares e no retardo da falência ventilatória, que é a responsável pela causa mortis de mais de 80% dos pacientes, onde observamos insuficiência ventilatória e quadros infecciosos associados.
Indivíduos com DMD, de forma paralela ao enfraquecimento motor, tem progressivamente afetada sua musculatura respiratória. Daí, a importância de um acompanhamento periódico para que medidas adequadas possam ser tomadas em cada momento evolutivo da patologia.
O acompanhamento respiratório deveria iniciar-se tão logo fosse feito o diagnóstico. Assim, poder-se-ia ter um parâmetro inicial que fosse comparado com futuras observações. Sua freqüência deveria ser de uma a seis vezes ao ano, dependendo do tipo de distrofia muscular, da idade do paciente e de sua evolução clínica.
As avaliações periódicas do estado respiratório do paciente com DMD tendem ajudar a se determinar quando se deve começar o tratamento direcionado a função respiratória. Logo, uma revisão cuidadosa do exame físico e das provas de função pulmonar, orientará em um plano individualizado dos cuidados respiratórios para satisfazer as necessidades específicas do caso.
Para o seguimento são feitos testes de função pulmonar. Estes exames são não invasivos e quantificam o grau de comprometimento respiratório ao se comparar com valores pré-determinados.Este tipo de teste requer que o paciente tenha maturidade suficiente para o entendimento das instruções e cooperação com o profissional.
Os principais parâmetros analisados nos testes são os seguintes:
1) Medidas de fluxo pulmonar, capacidades e volumes.
Um teste freqüentemente usado é a medida da capacidade vital forçada – CVF, onde se mede a quantidade de ar que pode ser expelida, o mais rapidamente possível, após uma inspiração profunda. Freqüentemente há diferença significativa entre a espirometria na posição sentada e deitada: alguns portadores podem ter CVF normal no primeiro caso e alterada no segundo. Há, também, enormes diferenças se a avaliação for feita nas posições laterais entre um lado e o outro. Portanto, idealmente, os testes deveriam ocorrer em várias posições e situações.
2) Análise do padrão respiratório onde se avalia a coordenação entre caixa torácica e abdome.
3) Monovacuometria através das mensurações da Pi Máx. e Pe Máx. – os pacientes com DMD apresentam alterações nas duas medidas.
4) Capinografia
É a medida do CO2 exalado. Em pessoas com distrofia, antes do início da hipoventilação, o CO2 do final da expiração é essencialmente igual à concentração do CO2 sangüíneo.
5) Oximetria.
A saturação de oxigênio da hemoglobina, ou seja da oxihemoglobina (SO2), depende da concentração de O2 no sangue. As baixas SO2 resultam de hipoxia e a hipoxia pode ser resultante de um pulmão mal ventilado. A SO2 normal é de 95% ou mais e pode ser medida por um simples oxímetro de pulso. A oximetria é também importante para a monitorização noturna. Estando indicada nos seguintes casos:
5.1) Indivíduos com sintomas de hipoventilação;
5.2) Capacidade vital na posição supina muito menor que na posição sentada;
5.3) Necessidade de dois ou mais travesseiros para o sono;
5.4) Capacidade vital < 40% do normal em qualquer posição; 5.5) Capinografia indicando subventilação (pCO2 > 44% mmHg);
5.6) SO2 < 95% durante o dia, na ausência de doença pulmonar ou rolhas de muco.
6) Gasometria arterial com a análise dos valores dos gases sanguíneos.
7) Medida do fluxo da tosse
Pode ser feita através de um simples medidor de peak flow ou espirômetro.
8) Avaliação da escoliose
A escoliose é uma complicação comum da distrofia muscular e pode progredir rapidamente se não tratada, comprometendo de forma ainda mais intensa a capacidade vital. Portanto, durante o seguimento clínico, o grau de curvatura da coluna deve ser sempre avaliado através de exame radiológico. A cirurgia nunca deverá ser postergada, pois a correção tardia não será eficiente e se a capacidade vital estiver menor que 23% poderá ser alto o rico operatório.
A indicação do momento cirúrgico também depende da capacidade vital. Em indivíduos normais há um platô de CV em torno dos 19 anos, com decréscimo de 1 a 2% ao ano. Pacientes com distrofia muscular de Duchenne tem pico em torno de 10 a 15 anos. Caso neste platô a CV tenha um volume de ar menor que 1500 ml, ocorre escoliose em 100% dos casos, com quadro severo. A cirurgia nestes casos tem indicação precoce. Por outro lado, quando no platô há capacidade vital com 3000ml de ar, acima de 25% dos pacientes com DMD não desenvolvem escoliose severa e, portanto, não requerem intervenção. Neste caso pode-se aguardar a curvatura chegar a 40 graus.
Sinais da hipoventilação
Para muitos pacientes com DMD, o começo de uma insuficiência respiratória começa lentamente e pode ser confundida com outros problemas. A dispnéia pode não ocorrer, especialmente quando a debilidade os impossibilita para as atividades diárias. Pelo contrário, os sintomas mais comuns da hipoventilação crônica são a astenia, insônia, pesadelos, terrores noturnos, cefaléia matinal, confusão mental, desorientação, ansiedade, anorexia, perda de peso, voz débil e tênue e tosse não produtiva, que são indicativos que os músculos respiratórios estão perdendo a função .
A falta de ventilação adequada durante a noite é usualmente o primeiro problema, não só porque a necessidade natural para respirar diminui quando se dorme, como também porque o conteúdo abdominal empurra o diafragma diminuindo sua incursão quando na posição deitada.
Na presença de debilidade da musculatura respiratória, tanto as infecções pulmonares bacterianas como as virais encontram um campo fértil para causar enfermidades mais severas. Devido à diminuição da capacidade inspiratória e da debilidade da tosse, os pacientes com DMD podem acumular mais secreções no trato respiratório; este muco se tornando denso devido a uma infecção pode obstruir as vias aéreas, causando o colapso de algumas aéreas pulmonares (atelectasias).
A família do paciente e os membros da equipe que o assistem podem evitar a maioria das complicações pulmonares, como episódios de pneumonias, mediante tratamento profilático antes que surjam complicações severas, com o início precoce da terapia respiratória que diminui a necessidade de hospitalizações e mantêm a estabilidade respiratória por mais tempo, visto que estes pacientes possuem disfunção restritiva da respiração (fraqueza muscular associada a alterações biomecânicas).
O resultado da debilidade da musculatura respiratória é que a capacidade vital diminui com o tempo. A capacidade normal é maior ou igual a 75% do esperado em uma pessoa normal com altura, peso e idade específicos, sendo a CVF importante para indicar a quantidade da reserva respiratória presente nos pulmões.
Ocasionalmente é necessário respirar profundamente para manter normais os níveis de O2 no sangue arterial. A respiração profunda previne o colapso das vias aéreas de pequeno calibre e mantêm uma tosse eficiente. Na DMD tanto o esforço inspiratório como o da tosse estão debilitados, o que dificulta a respiração de suspiro e a expulsão de muco durante uma infecção respiratória aguda.
O enfoque primário da fisioterapia respiratória aplicada aos pacientes com DMD deve ser em ajudar a reduzir a rapidez com que diminui a CV. Este se deve adaptar em etapas durante o curso da enfermidade mediante as necessidades do paciente.
Exercícios de reexpansão pulmonar e para os músculos respiratórios
Nas etapas inicias da DMD é útil a terapia de reexpansão pulmonar com modalidades de tratamento que objetivam manter e/ou aumentar os volumes e capacidades pulmonares, manter e/ou aumentar a complacência pulmonar, redistribuir a ventilação, evitar áreas de atelectasias e melhorar as trocas gasosas; podem ser feitos manualmente ou com o uso de aparelhos. Inicia-se esta terapia, preferencialmente, no máximo até quando a medida da CV cai abaixo de 75% do valor normal esperado.
Para manutenção e condicionamento da musculatura respiratória utilizamos técnicas fisioterapêuticas que ajudem a manter e/ou aumentar a eficácia da ventilação pulmonar, aumentando a eficiência de contração dos músculos respiratórios e retardando a sensação de dispnéia
Aerossolterapia
É um método para ministrar medicamentos e hidratar a via aérea, incluem o uso de:
-mucolíticos, que liquefazem secreções espessas;
-descongestionantes, que reduzem o edema da mucosa;
-antibióticos, que combatem infecções;
-broncodilatadores, que relaxam a musculatura lisa das vias aéreas;
-solução fisiológica, que hidratam a árvore traqueobrônquica.
Higiene brônquica
O clearence normal das vias aéreas se baseia em dois processos: a limpeza mucociliar e a tosse eficaz. Os pacientes com DMD tendem a disfunção do sistema de limpeza brônquico, levando a retenção de secreções.
Em quadros de acúmulos de secreções a desobstrução broncopulmonar deve ser iniciada para a limpeza do muco das vias aéreas através de medidas terapêuticas de higiene brônquica a fim de evitar infecções sérias do trato respiratório, manter a via permeável, manter homogênea a ventilação com a hematose, prevenindo a hipoxemia.
Uma tosse efetiva normalmente requer uma insuflação inicial de cerca de 85 a 90% da capacidade pulmonar. Este ar é momentaneamente aprisionado pelo fechamento da glote devido ao aumento das pressões intratorácicas e intra-abdominais acima de 200 cm de água. Repentinamente há abertura glótica e cerca de 2500 ml de ar é expelido forçadamente. O pico normal de fluxo de tosse oscila entre 6000 e 17000ml/seg.
A musculatura respiratória de pacientes com DMD freqüentemente não tem poder para criação de um fluxo adequado para a expulsão das secreções. Pacientes com capacidade vital < 1000-1500 ml ou pico de fluxo de tosse < 4,5 litros por/segundo necessitam auxílio para atingir um fluxo adequado de tosse. Este auxílio pode ser manual, com a aplicação de pressões intra-abdominais logo no início da fase de expulsão do ar ou através de aparelhos. Quando o pico de fluxo de tosse cai abaixo de 2,7 litros por segundo, já não é mais possível nenhum tipo de tosse. O auxílio mecânico à tosse envolve aparelhagem que promove uma insuflação profunda (cerca de 30 a 50 cm de água) seguida de uma exsuflação com uma pressão negativa da mesma monta. O aparelho pode ajudar a tornar mais eficaz um reflexo debilitado da tosse para expulsar secreções. Existem vários modelos de aparelhos de tosse e tais dispositivos podem ofertar um volume de ar para os pulmões e rapidamente extrair este mesmo volume ofertado, imitando um esforço de tosse forte. Ciclos de insuflação e exsuflação podem ser repetidos até o clearence completo das secreções e retorno da saturação de oxigênio até os níveis normais. Ventilação não invasiva Infelizmente, a estratégia diante de uma insuficiência ventilatória decorrente da fraqueza muscular nem sempre é a correta. Muitas vezes só é introduzida ajuda ventilatória nos episódios de falência aguda, quando geralmente torna-se necessária a intubação e, subseqüentemente, a traqueostomia. Outras vezes, são tomadas medidas mais céticas, por se acreditar que não vale a pena investir em pacientes com tão pobre qualidade de vida. Ou ainda, em determinados centros, não se dispor do conhecimento nem do maquinário responsável pela ventilação não invasiva. Assim, a grande maioria dos pacientes não tem acesso à ventilação não invasiva. E aqueles pacientes com DMD que não recebem ou recusam o tratamento profilático, invariavelmente, evoluem mais rapidamente para a falência respiratória aguda. Alguns tratamentos conservadores incluem medicações normalmente usadas para pneumopatas crônicos. Entre elas tem-se a teofilina, que na presença de hipercapnia e hipoxia, pode agravar a fadiga diafragmática. Broncodilatadores beta2 agonistas freqüentemente causam ansiedade pelo aumento da freqüência cardíaca e podem exacerbar uma disfunção cardíaca já instalada. Os músculos respiratórios podem ser auxiliados por aplicação de forças, de forma manual ou mecânica, no corpo ou por pressões intermitentes na via aérea. Entre os respiradores que atuam no corpo estão os VPNs (ventiladores de pressão negativa), que fazem uma pressão negativa intermitente ao redor da parede torácica ou abdominal, facilitando a entrada do ar pela via aérea. Outros aparelhos atuam aplicando pressões positivas nas vias aéreas durante a fase inspiratória, auxiliando esta musculatura. Por sua praticidade, preço, portatibilidade, os aparelhos que aplicam pressões sobre as vias aéreas (ou VPPI – ventiladores por pressão positiva intermitente) levam grande vantagem sobre os VPNs. Entre os aparelhos de VPPI, existem dois grandes grupos: os ventiladores a pressão e os ventiladores a volume. Os ventiladores a pressão deixariam disponível um volume de ar até o ponto em que a pressão limite seja atingida. Por outro lado, nos ciclados a volume, só o volume determinado está disponível, não importando a pressão com que atinja os pulmões. Em ambos os tipos há ar disponível apenas na fase inspiratória. Nos dois modos a ventilação não invasiva poderá ser administrada por máscaras nasais, bucais ou oronasais na via aérea. Na literatura há defensores de ambas modalidades, mas nos últimos anos os ventiladores a pressão do tipo BiPAP (Bilevel positive pressure airway) tem se tornado mais populares devidos serem de manipulação simples, inclusive feita pela própria família ou pelo paciente, e mais baratos. Nas máquinas BiPAP a pressão positiva é ajustada separadamente nas fases ins e expiratória, porém na falência ventilatória de pacientes miopatas apenas a fase inspiratória é necessária. A ventilação não invasiva inicialmente pode ser necessária apenas nos episódios de infecções menos graves do trato respiratório (gripe e resfriados). Mas com o evoluir da fraqueza da musculatura respiratória, seu uso passa a ser necessário no período noturno e progressivamente o número de horas vai aumentando até atingir às 24 horas do dia. As indicações para o uso de ventilação não invasiva são as seguintes: 1) Sintomas como fadiga muscular respiratória, dispnéia, cefaléia matinal. 2) Critérios fisiológicos: 2.a PaCO2 > ou = 45mmHg;
2.b Oximetria noturna demonstrando saturação de oxigênio < ou = 88% por 5 minutos consecutivos;
2.c Pressão inspiratória máxima < 60 cmH20;
2.d Capacidade vital forçada < 50% do predito1.
(1) CVF < ou = 40% do valor predito indica auxílio ventilatório noturno. Aos 30%, a indicação é de ventilação por 24 horas.
Insuficiência da ventilação X Falência de oxigenação
O oxigênio (O2) e o dióxido de carbono (CO2) precisam estar em níveis normais no sangue. A pressão normal do CO2 no sangue oscila entre 35 e 44 mmHg. Valores acima destes (hipercapnia), na ausência de patologia pulmonar primária, indicam hipoventilação alveolar e geralmente ocorrem em decorrência da fraqueza da musculatura respiratória. Clinicamente se pode observar respiração mais superficial e aumento da freqüência respiratória.
A situação de hipoxemia na DMD, onde a saturação sangüínea de oxigênio decresce abaixo de 90%, é geralmente decorrente da hipercapnia da hipoventilação. Há um bloqueio da membrana de trocas gasosas quando secreções mucosas obstruem as vias aéreas. Como resultado podemos encontrar processos atelectásicos ou pneumonias.
Existem enfoques diferentes entre indivíduos com musculatura respiratória normal e processos pulmonares daqueles com doenças musculares. No primeiro caso a hipoxia ocorre devido ao processo pulmonar. Esta hipoxia faz com que o controle respiratório cerebral instrua a musculatura respiratória para que trabalhe mais efetivamente e numa freqüência maior. Os pulmões tornam-se melhores ventilados e os níveis de CO2 caem abaixo do normal. O tratamento para pessoas com hipoxia devida à doença pulmonar é a administração de oxigênio, pois nestes casos a hipoxia resulta da falência da oxigenação.
A falência primária de oxigenação raramente ocorre em pacientes miopatas, exceto naqueles onde haja doença pulmonar concomitante. No segundo grupo há falência muscular e conseqüentemente não ocorre ventilação adequada e clearence de secreções. A musculatura inspiratória enfraquecida faz com que ocorra hipercapnia, hipoventilação pulmonar e, como decorrência, tem-se hipoxia. Assim, pessoas nestas condições têm primariamente falência na ventilação.
Fatos importantes devem ser ressaltados: nestes casos, onde a hipoxemia é secundária a hipercapnia, a suplementação de oxigênio é ineficaz pois a ventilação pulmonar ainda está deficiente e, apesar da normalização dos níveis de O2, a hipercapnia vai tornando-se mais grave. O paciente torna-se comatoso (narcose pelo CO2) e, seqüencialmente há parada respiratória.
O que é, então, falência ventilatória e quando ela ocorre?
Insuficiência ventilatória é a presença de hipercapnia devido à falência de ventilação normal nas membranas de trocas gasosas. Inicialmente ela ocorre em pacientes com DMD no sono profundo e, progressivamente, atinge outras etapas do sono e na vigília. O comprometimento do diafragma pode fazer com que os pacientes não consigam manter a ventilação na posição supina, mas possam faze-lo sentado.
Os sintomas de hipoventilação nem sempre são perceptíveis. Entretanto, como já citados alguns deles, o profissional de saúde deve estar atento quanto às queixas do paciente e o que relata a sua família.
Na falência ventilatória há uma superficialização progressiva da respiração, com altos níveis de CO2 e baixos de O2. O CO2, sendo ácido, faz aumentar estes radicais no sangue, levando a uma compensação renal através da reabsorção de bicarbonato. O bicarbonato circulante atua no controle cerebral de forma negativa, permitindo a progressão da hipercapnia e piora do ritmo respiratório. Com a diminuição da amplitude respiratória, algumas áreas pulmonares passam a não serem expandidas, resultando, então, em atelectasias. A piora torna-se mais intensa, a hipercapnia mais importante e o coma torna-se cada vez mais próximo.
Os pacientes, apesar da patologia muscular, conseguem manter uma situação estável por um bom período. Sendo assim, a falência ventilatória não ocorre repentinamente. A presença de infecções do trato respiratório é responsável por 85% dos casos de falência. Nesta situação, a musculatura é obrigada a trabalhar mais intensamente, podendo ocorrer a fadiga. A presença de secreções e a dificuldade de clearence pela impossibilidade de uma tosse efetiva corroboram com o quadro. Há um bloqueio da via aérea, diminuição da capacidade vital e dos volumes respiratórios. A multiplicação bacteriana é o passo seguinte, resultando em infecções severas do trato respiratório, hospitalização, intubação e necessidade de suporte ventilatório invasivo.
Nos episódios de insuficiência respiratória aguda, o paciente com DMD chega aos departamentos de emergência onde, algumas vezes, tendem a ser tratados dos sintomas com administração de oxigênio, broncodilatadores e sedativos. Isto pode levar a uma exacerbação da hipoventilação e falência súbita com conseqüente necessidade de intubação e até o óbito. Nestes casos, deve-se lembrar que a disfunção é ventilatória por incapacidade muscular sendo importante ventilar e não só oxigenar o paciente.
A falência respiratória resultante da hipoventilação e acúmulo de secreções pode ser prevenida. É importante o profissional de saúde conhecer esta prevenção para poder oferece-la a seus pacientes.
Considerações Finais
1) Todos os estudos demonstram que a intervenção da fisioterapia respiratória diminui significativamente a incidência de hospitalização devido a complicações respiratórias, proporciona uma melhor qualidade de vida e prolonga a sobrevida do paciente com distrofia muscular em pelo menos 10 anos.
2) A não realização da fisioterapia respiratória faz com que a capacidade vital diminua 20% ao ano e a sua intervenção em associação com a ventilação não invasiva proporciona diminuição da queda da CV para apenas 5% ao ano, aumentando a sobrevida.
3) Ainda que tanto a traqueostomia como a ventilação não invasiva – VPPI possam prolongar a vida, a VPPI por traqueostomia é associada a numerosas complicações, além de ser dispendiosa. Há necessidade de profissionais especializados com muito mais freqüência do que a ventilação não invasiva, geralmente controlada pelo próprio paciente ou familiares. Além disso, pacientes traqueostomizados tem custos associados a cateteres e outros objetos para sua manipulação, e ainda são hospitalizados muito mais freqüentemente que o grupo em ventilação não invasiva.
4) A maioria dos pacientes são beneficiados com os cuidados da ventilação não invasiva em relação a invasiva (intubação ou traqueostomia), pela segurança, conveniência, aparência, conforto para dormir, deglutir, manutenção da fala, melhor aceitabilidade e maior adaptação.
5) Finalmente, o oxigênio deve ser usado em pacientes com DMD com bastante critério, e sempre associado a medidas ventilatórias.
Prezado editor,
Estou enviando este artigo de minha autoria para apreciação dessa renomada revista e possível interesse de vocês em publicá-lo.
No aguardo de uma resposta, sem mais para o momento e agradecendo a apreciação,
Dr. Pericles Weyne de Morais Silva(*)
(*)Graduado pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB)
Contatos através do email: pweyne@aol.com
Fone: (83) 9999-6087
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