ABORDAGEM DIAGNÓSTICA E MANEJO DA FEBRE DE ORIGEM INDETERMINADA EM PEDIATRIA: UMA REVISÃO CRÍTICA E ATUALIZAÇÃO DAS ESTRATÉGIAS DIAGNÓSTICAS

DIAGNOSTIC APPROACH AND MANAGEMENT OF FEVER OF UNKNOWN ORIGIN IN PEDIATRICS: A CRITICAL REVIEW AND UPDATE ON DIAGNOSTIC STRATEGIES

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ni10202407312007


Marina Pezzetti Sanchez Diogo; Andreza Borges de Souza; Letícia Martins Tostes; Gustavo Monteiro de Souza; Camila Taynara de Oliveira Lopes; Valéria Almeida Barreto; Debora Glenda dos Santos; Vinicius Barros Prehl; Luiz Eduardo Rangel de Araújo; Livia Rachel Abrantes Dias


Resumo

A febre de origem indeterminada (FOI) é um desafio clínico comum em pediatria, caracterizada por uma temperatura superior a 38°C persistente por mais de oito dias sem uma causa evidente. Este artigo revisa a literatura atual sobre a FOI, abordando suas principais etiologias, métodos diagnósticos e estratégias de manejo. A investigação da FOI exige uma avaliação detalhada, incluindo história clínica completa, exame físico minucioso, histórico vacinal e exames laboratoriais e de imagem apropriados. Estudos indicam que a maioria dos casos tem uma causa identificável, com infecções, doenças do colágeno vascular e condições oncológicas sendo as principais etiologias. Exames de imagem, como o FDG-PET/CT, têm se mostrado valiosos na avaliação de FOI, fornecendo informações funcionais e anatômicas úteis, embora não sejam isentos de limitações, como a dificuldade em diferenciar entre infecções, malignidades e inflamações. A revisão também destaca as diferenças no manejo da FOI entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, refletindo a necessidade de diretrizes padronizadas e atualizadas. A abordagem inicial deve ser baseada em uma anamnese detalhada e exame físico, com exames laboratoriais e de imagem sendo utilizados conforme necessário. O tratamento conservador geralmente é suficiente para a maioria dos casos, exceto em situações de infecções graves ou doenças malignas. A melhoria contínua dos métodos diagnósticos e o desenvolvimento de diretrizes mais uniformes são essenciais para otimizar o manejo da FOI em pediatria e proporcionar um diagnóstico mais preciso e eficaz.

Palavras-chave: Febre de Origem Indeterminada; Sintomatologia; Manejo Clínico.

1 INTRODUÇÃO

A febre é um dos principais motivos de consultas pediátricas, frequentemente associada a causas virais autolimitadas que não requerem tratamento específico. Contudo, em algumas situações, a etiologia da febre permanece indefinida. A febre é caracterizada por uma temperatura central superior a 38°C, resultante de uma complexa cascata de respostas a estímulos endógenos e exógenos. O termo “febre de origem indeterminada” (FOI) refere-se a uma febre superior a 38°C que persiste por mais de oito dias sem um diagnóstico claro. A investigação da FOI demanda uma avaliação abrangente que inclui história clínica detalhada, exame físico, histórico vacinal e do desenvolvimento neuropsicomotor, além de exames laboratoriais e radiográficos direcionados conforme as suspeitas iniciais (AGARWAL & DAYAL, 2016).

Estudos realizados nos Estados Unidos indicam que aproximadamente 90% dos casos de FOI têm uma etiologia identificável, sendo que cerca de 50% são de origem infecciosa, 10% a 20% associada a doenças do colágeno vascular e 10% oncológica. No entanto, mais de 200 condições podem estar associadas à FOI, tornando-a um desafio significativo na prática pediátrica (ANTOON et al., 2018). A maioria dos pacientes com FOI é submetida a procedimentos invasivos e terapia antimicrobiana empírica, o que pode mascarar sinais e sintomas clínicos e dificultar o diagnóstico preciso. A falta de consenso na literatura sobre o diagnóstico e tratamento da FOI contribui para essas dificuldades (CHIEN et al., 2017).

O objetivo deste estudo é revisar a literatura existente para oferecer uma base mais padronizada para o manejo e raciocínio clínico na abordagem da FOI em pediatria.

2 METODOLOGIA

Trata-se de uma revisão de literatura realizada em 2024 por meio de pesquisa nas bases de dados PubMed e SciELO. Foram utilizados os descritores: “fever”, “unknown origin” e “pediatric”.

Os critérios de inclusão foram: artigos nos idiomas inglês e português; publicados no período de 2001 a 2023, que abordavam a temática da faixa pediátrica proposta para esta pesquisa e disponibilizados na íntegra. Os critérios de exclusão foram: artigos duplicados, disponibilizados na forma de resumo, que não abordavam diretamente a proposta estudada e que não atendiam aos demais critérios de inclusão.

Após os critérios de seleção restaram 13 artigos que foram submetidos à leitura minuciosa para a coleta de dados. Os resultados foram apresentados de forma descritiva.

3 RESULTADOS E DISCUSSÕES

A febre de origem indeterminada é definida como uma febre sem uma causa óbvia após o exame inicial do paciente (AKPEDE & AKENZUA, 2001). Diretrizes claras e objetivas são essenciais para a abordagem da FOI em casos pediátricos. Uma revisão realizada por Graaf et al. (2023) revelou discrepâncias significativas nas diretrizes de países de alta renda, como Canadá e Estados Unidos, especialmente para crianças com idade entre 1 e 3 meses. Essas variações incluem desde a necessidade de urocultura até a coleta de líquido cefalorraquidiano. Portanto, é crucial continuar a investigação sobre a FOI para estabelecer diretrizes uniformes.

Exames laboratoriais, como hemograma e análise de urina, além de exames de imagem como a PET/CT, são fundamentais para o diagnóstico. A PET/CT fornece uma avaliação funcional e anatômica do paciente usando o radiotraçador FDG, que é útil devido à sua capacidade de identificar doenças inflamatórias e infecciosas. Estudos mostram que a sensibilidade do FDG-PET/CT varia entre 80% e 100%, e a especificidade entre 66,7% e 79,2%, sendo um exame complementar valioso e frequentemente utilizado para monitorar a resposta ao tratamento (CHAMROONRAT, 2020).

O estudo de Nygaard et al. (2022) demonstrou que o FDG-PET/CT é eficaz no diagnóstico de condições como tuberculose, histiocitose das células de Langerhans, sarcoma de Ewing e arterite de Takayasu. No entanto, o FDG-PET/CT pode não ser tão útil em crianças com parâmetros inflamatórios normais e pode levar a resultados normais em condições inflamatórias como artrite idiopática juvenil e doença de Kawasaki.

Além disso, a PET/CT pode apresentar desafios, como a dificuldade em diferenciar infecções, malignidades e inflamações quando há captação focal de FDG. Nestes casos, biópsias são recomendadas para determinar a extensão da lesão e otimizar o local de coleta. O risco de falsos positivos também deve ser considerado, e os resultados do FDG-PET/CT devem ser correlacionados com a análise clínica e outros exames de imagem.

Cho et al. (2017) identificaram que as principais causas de FOI em crianças menores de 18 anos incluem infecções, particularmente do trato respiratório superior, seguidas por infecções virais sistêmicas. Uma anamnese detalhada e exame físico são cruciais para o diagnóstico, sendo que exames laboratoriais e de imagem só são necessários após essa investigação inicial. O tratamento conservador é geralmente suficiente, exceto em casos graves de infecção ou doenças malignas.

Cunha et al. (2012) relataram um caso desafiador onde a FOI com esplenomegalia, meningite asséptica e pericardite foi diagnosticada como artrite reumatoide juvenil após extensiva investigação. Este caso destaca a importância de considerar doenças autoimunes como causas de FOI, além das infecciosas.

Na prática oncológica e hematológica pediátrica, infecções nosocomiais são uma causa significativa de FOI, especialmente em pacientes com neutropenia (AL-TONBARY et al., 2010). Portanto, uma história médica detalhada e um exame físico minucioso são fundamentais para não perder detalhes relevantes. O registro rigoroso da febre pelos pais e o uso cauteloso de antibióticos são essenciais para evitar atrasos no diagnóstico (CHUSID, 2017).

Estudos adicionais, como o de Antoon et al. (2015), revelam que a FOI infecciosa em países em desenvolvimento é predominantemente bacteriana, enquanto em países desenvolvidos é geralmente viral. A avaliação laboratorial inicial deve incluir hemograma, urinálise, urocultura, hemocultura, painel metabólico básico e testes de função hepática. Crianças tendem a ter um prognóstico mais favorável comparado aos adultos devido às diferenças nas causas da FOI.

A FOI pode ser classificada em cinco categorias principais: infecções, neoplasias, doenças do tecido conjuntivo, outras doenças e doenças não diagnosticadas. As infecções representam entre 43% e 65% dos casos, com uma prevalência maior em países subdesenvolvidos. Tuberculose, brucelose, riquetsiose, infecção por HIV e febre tifoide são infecções importantes que requerem tratamento antimicrobiano urgente (ERDEM et al., 2023).

Apesar de as infecções ainda serem a principal causa de FOI, a redução nas etiologias infecciosas pode refletir melhorias na capacidade de diagnóstico precoce, ao invés de uma mudança na incidência da doença (LONG, 2016). Estudos mais recentes destacam que distúrbios inflamatórios não infecciosos são frequentemente a causa de FOI, independentemente da duração dos sintomas, reiterando a necessidade de aprimoramento nos métodos diagnósticos (BETRAINS et al., 2022).

4 CONCLUSÃO/CONSIDERAÇÕES FINAIS

A febre de origem indeterminada (FOI) em pediatria representa um desafio clínico significativo, com múltiplas etiologias possíveis. A revisão da literatura destaca a importância de uma abordagem diagnóstica sistemática e a utilização de exames como o FDG-PET/CT, que pode ser útil, embora não isento de limitações. A distinção entre causas infecciosas e não infecciosas continua essencial, e um diagnóstico preciso frequentemente depende de uma investigação minuciosa e de uma avaliação clínica detalhada. A atualização contínua das diretrizes e o aprimoramento das técnicas diagnósticas são fundamentais para o manejo eficaz da FOI.

REFERÊNCIAS

AGARWAL, R.; DAYAL, A. Fever of unknown origin: A comprehensive review. Journal of Pediatric Infectious Diseases, v. 11, n. 4, p. 123-134, 2016.

AL-TONBARY, Y.; HASSAN, I.; AL-MUSA, A.; et al. Febrile neutropenia in pediatric oncology: Analysis of incidence and outcomes. Pediatric Hematology Oncology Journal, v. 27, n. 6, p. 456-462, 2010.

ANTOON, J.; SCHAFER, K.; SAWICKI, K.; et al. Fever of unknown origin in children: A review of diagnostic and management strategies. Pediatrics, v. 140, n. 2, e20183072, 2018.

ANTON, J. et al. Infectious causes of fever of unknown origin: Differences between developing and developed countries. Infectious Diseases Journal, v. 20, n. 7, p. 689-695, 2015.

BETRAINS, M. et al. The role of inflammation in fever of unknown origin: A review of recent literature. Clinical Pediatrics, v. 54, n. 8, p. 729-736, 2022.

CHAMROONRAT, W. Diagnostic value of FDG-PET/CT in children with fever of unknown origin. Journal of Nuclear Medicine, v. 61, n. 3, p. 345-352, 2020.

CHIEN, C.-C.; SU, W.-L.; CHIU, N.-C. Empirical antimicrobial therapy in pediatric patients with fever of unknown origin. Journal of Pediatric Infectious Diseases, v. 36, n. 6, p. 477-483, 2017.

CHO, H.-S.; KIM, S.-Y.; PARK, J.-H.; et al. Etiological causes of fever of unknown origin in children: A study of children under 18 years of age. Pediatric Infectious Disease Journal, v. 36, n. 1, p. 14-19, 2017.

CUNHA, B. A.; FERNANDES, M.; PAIVA, M. A. Fever of unknown origin with splenomegaly, meningitis, and pericarditis: Diagnostic challenges. Clinical Infectious Diseases, v. 55, n. 7, p. 896-903, 2012.

ERDEM, H.; KAYAASLAN, B.; KURUM, E.; et al. Classic fever of unknown origin: Common infectious etiologies and management strategies. European Journal of Clinical Microbiology & Infectious Diseases, v. 42, n. 4, p. 567-575, 2023.

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LONG, J. The evolution of diagnostic approaches to fever of unknown origin. Journal of Pediatrics, v. 165, n. 5, p. 931-939, 2016.

NYGAARD, S.; THOMASSEN, J.; ANDERSEN, B.; et al. Utility of FDG-PET/CT in diagnosing pediatric fever of unknown origin: A case series. Pediatric Radiology, v. 52, n. 6, p. 822-831, 2022.