A UTILIZAÇÃO DAS PROVAS OBTIDAS ATRAVÉS DAS REDES SOCIAIS NO ÂMBITO PENAL

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102411181746


Elba Endrielle Cardoso Viana Matos[1]
José Lucas Teixeira Santos[2]
Rebeca Kelly Alves Guarino Matos[3]
Profª. Orientador: Me. Fadja Mariana Fróes Rodrigues[4]


RESUMO

A crescente digitalização da sociedade transformou as redes sociais em fontes relevantes de informação, impactando diretamente na obtenção de provas no direito processual penal. Diante disso, esse artigo tem como objetivo geral analisar a viabilidade e os desafios de validação e aceitação das provas obtidas através das redes sociais no sistema jurídico brasileiro, em especial nos processos criminais. Para alcançarmos o objetivo proposto, definimos os seguintes objetivos específicos: a) avaliar os critérios de admissibilidade e aceitação de evidências obtidas em redes sociais pelos tribunais e órgãos legais, considerando aspectos como autenticidade, integridade, relevância e competência; b) identificar a importância da coleta de evidências através das redes sociais, demonstrando o potencial de informações que podem ser obtidos com riquezas de detalhes, bem como, a facilidade que ela oferece, com custos baixos e em tempo real e c) demonstrar o impacto que essas provas podem gerar no tempo de duração do processo, devido à facilidade da coleta destas através das redes sociais. Para tanto, utilizamos a abordagem qualitativa, valendo-nos dos procedimentos bibliográfico e documental, fundamentando em dispositivos legais como o Código de Processo Penal (CPP), além de analisarmos decisões jurisprudenciais brasileiras nas quais as redes sociais são apresentadas como fontes de evidência. Os tribunais superiores têm estabelecido requisitos rigorosos para a aceitação dessas provas, exigindo que elas sejam coletadas de forma idônea e com garantia de integridade, evitando a nulidade processual e assegurando julgamentos legítimos. A era digital apresenta, contudo, desafios, como a possibilidade de adulteração das provas e a necessidade de proteção aos direitos fundamentais. Nesse sentido, é essencial que o uso das redes sociais, como fonte de prova, respeite o devido processo legal, garantindo a autenticidade das informações e evitando prejuízos aos envolvidos. A proliferação de evidências digitais impacta diretamente a celeridade dos processos, demandando uma adaptação contínua do sistema legal para assegurar que essas inovações tecnológicas colaborem com a justiça. Os resultados sugerem que, apesar dos avanços proporcionados pela possibilidade de uso de informações de redes sociais em investigações criminais, é preciso um equilíbrio cuidadoso entre tecnologia e direito. A utilização dessas provas pode contribuir significativamente para o aprimoramento da investigação e do sistema judiciário brasileiro, desde que respeitados os direitos constitucionais dos envolvidos. Conclui-se, portanto, que o uso de provas digitais no processo penal é uma realidade em evolução, que exige atualização contínua dos profissionais do direito para garantir que as novas tecnologias promovam a justiça sem comprometer as garantias legais e constitucionais.

Palavras-chave: provas digitais; redes sociais; processo penal; cadeia de custódia.

ABSTRACT

The growing digitalization of society has transformed social networks into relevant sources of information, directly impacting the gathering of evidence in criminal procedural law. This article aims to analyze the feasibility and challenges of validating and accepting evidence obtained through social networks in the Brazilian legal system, especially in criminal proceedings. To achieve this objective, we defined the following specific objectives: a) to assess the criteria for admissibility and acceptance of evidence obtained on social networks by courts and legal authorities, considering aspects such as authenticity, integrity, relevance, and competence; b) to identify the importance of evidence collection through social networks, demonstrating the potential of information that can be obtained in detail, as well as the ease it offers, with low costs and in real-time; and c) to demonstrate the impact such evidence may have on the duration of the proceedings, due to the ease of collection through social networks. For this, we used a qualitative approach, relying on bibliographic and documentary procedures, based on legal provisions such as the Brazilian Code of Criminal Procedure (CPP), and analyzing Brazilian judicial decisions in which social networks are presented as sources of evidence. Higher courts have established strict requirements for accepting this evidence, requiring it to be collected in a reliable manner and with integrity, avoiding procedural nullity and ensuring legitimate judgments. The digital era, however, presents challenges, such as the possibility of evidence tampering and the need to protect fundamental rights. In this sense, it is essential that the use of social networks as sources of evidence respects due legal process, ensuring the authenticity of the information and preventing harm to those involved. The proliferation of digital evidence directly impacts the speed of proceedings, requiring continuous adaptation of the legal system to ensure that these technological innovations contribute to justice. The results suggest that, despite the advances brought by the possibility of using social media information in criminal investigations, a careful balance between technology and law is necessary. The use of such evidence can significantly enhance criminal investigations and the Brazilian judicial system, provided that the constitutional rights of those involved are respected. It is concluded, therefore, that the use of digital evidence in criminal proceedings is an evolving reality, requiring the continuous updating of legal professionals to ensure that new technologies promote justice without compromising legal and constitutional guarantees.

Keywords: digital evidence; social media; criminal procedure; chain of custody.

I – INTRODUÇÃO

A crescente digitalização da sociedade transformou as redes sociais em importantes ferramentas de comunicação, interação e compartilhamento de informações. No entanto, essa revolução tecnológica também trouxe desafios ao campo jurídico, especialmente no âmbito do processo penal. Com o aumento da utilização das redes sociais, como Facebook, Instagram e WhatsApp, surgiram novas fontes de provas que podem influenciar diretamente o desfecho de ações penais.

A utilização de provas obtidas através das redes sociais no processo penal é um tema que envolve a interseção entre o direito penal, o direito à privacidade e o avanço de novas tecnologias. As redes sociais têm sido uma fonte crescente de informações, o que levanta questões jurídicas importantes sobre a admissibilidade dessas provas no contexto do processo penal. A análise desse tema envolve considerar aspectos como a legalidade da obtenção dessas provas, os direitos fundamentais dos envolvidos e as regras processuais aplicáveis.

Diante deste contexto surge, então, a seguinte indagação: de que maneira as informações obtidas nas redes sociais podem ser validadas e aceitas como provas em nosso sistema jurídico, e como essa proliferação de evidências digitais pode impactar a celeridade dos processos judiciais?

Para responder à indagação acima, definimos o seguinte objetivo geral:   analisar a viabilidade e os desafios de validação e aceitação das provas obtidas através das redes sociais no sistema jurídico brasileiro, em especial nos processos criminais.

Para alcançarmos o objetivo acima proposto, estabelecemos como objetivos específicos: a) Avaliar os critérios de admissibilidade e aceitação de evidências obtidas em redes sociais pelos tribunais e órgãos legais, considerando aspectos como autenticidade, integridade, relevância e competência. b) Identificar a importância da coleta de evidências através das redes sociais, demonstrando o potencial de informações que podem ser obtidos com riquezas de detalhes, bem como, a facilidade que ela oferece, com custos baixos e em tempo real. c) demonstrar o impacto que essas provas podem gerar no tempo de duração do processo, devido à facilidade da coleta destas através das redes sociais.

Para atingir os objetivos deste trabalho, desenvolvemos uma pesquisa de abordagem qualitativa, utilizando-nos dos procedimentos metodológicos de revisão bibliográfica e análise documental, vez que foram examinados dispositivos legais, como o Código de Processo Penal (CPP) e realizada análise da jurisprudência brasileira atual sobre o uso das redes sociais como evidência jurídica, além revisão bibliográfica feita a apartir da leitura de artigos acadêmicos e da doutrina pátria que tratam da temática.

A fim de realizar uma análise abrangente e atualizada do estado da arte, foram realizadas buscas nas plataformas Google Acadêmico, SciELO, Capes Periódicos e FGV Direito, abrangendo o período de 2010 a 2024. Este recorte temporal deu-se a partir da observação dos dados obtidos através do estudo que fizemos, o qual aponta que o uso crescente das redes sociais no Brasil começou significativamente a partir de 2010 (Pacete 2023). Utilizamos, nesta busca, as palavras-chave: “redes sociais”, “comprovações legais” e “processo penal”, com a finalidade de identificar trabalhos que dialogassem com o nosso, no entanto, não encontramos nenhum que obtivesse um questionamento próximo ao que fizemos.

Dessa forma, a pesquisa se propõe a avançar na análise do uso das redes sociais como evidência jurídica, com o intuito de fornecer uma compreensão mais aprofundada dos desafios e das possibilidades que surgem dessa prática no contexto do processo penal brasileiro.

II- PROVA NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO
2.1. CONTEXTO HISTÓRICO DAS PROVAS

Segundo Távora e Alencar (2015) a prova obtida em diversos processos penais brasileiros desempenha um papel fundamental na busca pela verdade dos fatos e na garantia de um julgamento justo, tanto para autor, quanto para o réu. Sua importância é ressaltada pela necessidade de equilibrar a proteção dos direitos fundamentais do acusado com a eficiência do sistema de justiça. Deste modo, entendemos que a prova é tudo que contribui para a formação do convencimento do magistrado, a fim de demonstrar com veracidade os fatos alegados pelas partes no processo.

O convencimento do julgador é o anseio das partes que litigam em juízo, que procurarão fazê-lo por intermédio do manancial probatório carreado aos autos. Assim, dada a importância desta temática para o contexto processual, faz-se necessário procedermos uma análise histórica, além de buscarmos um entendimento a respeito das práticas modernas da coleta de provas e da cadeia de custódia.

2.1.1. BREVE ORIGEM HISTÓRICA DA PROVA

O conceito de prova no processo penal, de acordo com Baldin e Corrêa (2014), tem raízes profundas na história da justiça. Inicialmente, a resolução de disputas era frequentemente baseada na força, no qual o mais forte prevalecia. Com o desenvolvimento social e o fortalecimento do Estado, surgiram os primeiros mecanismos formais de prova, especialmente com a introdução dos árbitros que passaram a intermediar as disputas.

Nas civilizações antigas, onde o Direito tinha uma origem divina, a religião desempenhava um papel central na prova. Os métodos utilizados para demonstrar a verdade tinham uma ligação direta com crenças religiosas, como os ordálios, juramentos e combates judiciários. Esses métodos primitivos representavam uma tentativa de buscar a verdade por meio da intervenção divina, em um sistema que misturava crueldade e incerteza.

Durante a Idade Média, os ordálios se tornaram uma prática comum na Europa. Alguns exemplos notórios incluem a prova da água fria, na qual o acusado era jogado na água: se afundasse, era considerado inocente; se flutuasse, era culpado. Outro exemplo era a prova do ferro em brasa, cujo réu deveria caminhar sobre ferro em brasa: se saísse ileso, era considerado inocente, mas se se queimasse, a culpa era evidente.

Essas práticas demonstram como a prova, ao longo da história, esteve sujeita a diferentes sistemas, variando conforme as crenças, costumes e regimes políticos de cada povo. Em Roma, durante a República, o julgamento era baseado na teoria legal das provas, na qual os juízes tinham liberdade para avaliá-las. No entanto, em alguns casos, como quando havia confissão, o acusado era imediatamente condenado.

Com o passar do tempo, o sistema da prova legal foi evoluindo, especialmente durante o Império Romano, quando surgiram regras mais definidas para a apreciação das provas, como a prova testemunhal. Durante esse período, figuras como Marco Túlio Cícero se destacaram, contribuindo para o desenvolvimento do Direito Romano.

Na Grécia antiga, o sistema também era popular, onde as questões judiciais eram decididas pelo povo, por meio de júris populares. Um dos exemplos mais notáveis foi o julgamento de Sócrates, que, mesmo com uma defesa eloquente, foi julgado e condenado pela pequena margem de 60 votos.

O sistema da prova legal, no qual, cada prova tinha um valor pré-determinado, limitava a atuação do juiz, que era obrigado a seguir a tabela de valor das provas sem poder expressar sua própria convicção. Segundo Baldin e Corrêa (2014, p. 70) “em tal sistema, o Juíz manifestava a verdade, não de acordo com a convicção resultante das provas, mas sim em conformidade com o valor”. Nesse contexto, o juíz é soberano e decide de acordo com sua convicção sobre as provas apresentadas, sem a obrigação de justificar a sua decisão. Em oposição ao sistema de livre convencimento, surge em Roma o sistema de persuação racional, que, conforme os apontamentos dos autores acima mencionados, assim era caracterizado:  

O sistema de persuasão racional, tudo indica, também surgiu em Roma, contra o sistema de livre convicção do Juíz, todavia ficou conhecido nos códigos napoleônicos. O Juíz age livremente na apreciação das provas, porém sua avaliação deve ser ajustada às regras científicas (jurídicas, lógicas e experimentais) préestabelecidas (Baldin; Corrêa, 2104, p. 70).

Neste sistema, o juiz tem a responsabilidade de valorar todas as provas de forma honesta e leal, sem hierarquia entre elas. Todas as provas são consideradas relativas, e o juiz deve fundamentar sua decisão, rejeitando a ideia de que uma única testemunha não é suficiente para a condenação.

Desta forma, o sistema que vigora na justiça brasileira é o de livre convencimento motivado conforme menciona o art. 155 do Código de Processo Penal (CPP), que diz:

Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas (Brasil, 1941 ).

Lopes Júnior (2019) argumenta que o princípio do livre convencimento motivado exige que o juiz fundamente sua decisão com base nas provas apresentadas ao longo do processo, rejeitando qualquer forma de decisionismo. Neste sentido ele afirma:

Como sistema intermediário em relação ao radicalismo dos dois anteriores, o livre convencimento motivado ou persuasão racional é um importante princípio a sustentar a garantia da fundamentação das decisões judiciais, estando previsto no art. 155 do CPP (Lopes Júnior, 2019, p. 444).

O princípio do livre convencimento motivado estabelece então, que o juiz deve formar sua convicção a partir de uma análise fundamentada e imparcial das provas apresentadas no processo, conforme determinado pelo art. 155 do Código de Processo Penal. Esse sistema, ao valorizar todas as provas, sem hierarquia, e exigir uma decisão justificada, impede qualquer forma de decisionismo e garante uma fundamentação sólida. Assim, fica clara a relevância desse princípio vigente no sistema de justiça brasileiro, o que nos leva a considerar o próximo aspecto fundamental do processo penal: a coleta de provas.

2.1.2. COLETA DE PROVAS

A coleta das provas no processo penal brasileiro é regida por princípios que procuram assegurar a veracidade e a legitimidade das informações obtidas. Entre os principais meios da aquisição das provas está o depoimento das testemunhas, a perícia, a confissão, os documentos, e os indícios. Cada um desses meios possui regras específicas para sua obtenção, sendo essencial que sejam respeitados os direitos e as garantias fundamentais do acusado, como por exemplo, o contraditório e a ampla defesa. Dessa forma:

A prova é o instrumento jurídico vocacionado a demonstrar a ocorrência ou não de determinado fato, e, em caso positivo, delimitar todas as suas características e circustâncias, respondendo não só à pergunta se o fato ocorreu ou não, mas como ocorreu e quais sujeitos estão a ele atrelados ativa ou passivamente. Alguém, reponsável por conferir a leitura jurídica sobre o fato, precisa saber se o fato ocorreu ou não e, se sim, todas as suas circustâncias. A prova, em linhas gerais, é o meio pelo qual é formada a convicção desse alguém em relação a fato específico (Thamay e Tamer, 2022, p. 20-21).

A prova deve ser colhida de forma legal e lícita, sob pena de ser considerada nula. Isso significa que a coleta das provas deve respeitar os direitos constitucionais e processuais do investigado ou acusado, conforme menciona a Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, inciso LVI, dispõe que:  “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos” (Brasil, 1988), com isso é vedada a utilização de provas obtidas por meios ilícitos, como tortura, coação, ou invasão de privacidade sem autorização judicial. Esse dispositivo constitucional tem ligação direta com as disposições constantes do Código de Processo Penal.

Existem vários meios de obtenção da prova, tais como:  a perícia, prevista nos artigos 158 a 184 do Código de Processo Penal (CPP), definida como uma investigação técnica conduzida por especialistas, podendo ser requerida no inquérito ou no processo, e sendo obrigatória em crimes não transeuntes; o interrogatório do acusado, regulado pelos artigos 185 a 196, serve tanto para a coleta de provas, quanto para o exercício da autodefesa; a confissão, prevista nos artigos 197 a 200, que, conforme o sistema de apreciação da prova adotado no Brasil, qual seja, o do convencimento fundamentado, não tem valor absoluto, devendo ser analisada em conjunto com os demais elementos probatórios constantes do processo e pode ser retratada; oitiva do ofendido, regulamentada no art. 201 do CPP; depoimento das testemunhas arts. 202 a 225 que prestam esclarecimentos sobre fatos do caso, salvo exceções; reconhecimento de pessoas e objetos arts. 226 a 228 que deve seguir procedimentos formais; acareação arts. 229 e 230 que promove o confronto de declarações conflitantes; prova documental arts. 231 a 238 podendo ser estes públicos ou privados e servem como prova; e, por fim, os indícios art. 239 que são circunstâncias as quais levam à dedução de outros fatos, sendo aceitos como prova.

Segundo Avena, pode-se afirmar que:

O Código de Processo Penal, a partir do Título VII, contemplou um conjunto de regras que regulamentaram a produção de provas no âmbito do processo criminal. Para tanto, estabeleceu normas gerais relacionadas aos critérios a serem utilizados pelo magistrado na valoração dos elementos de convicção carrreados ao processo e ao ônus probante, bem como, disciplinou determinados meios específicos de prova, ou seja, elementos trazidos ao processo capazes de orientar ao juiz na busca da verdade dos fatos (Avena, 2023, p.435 ).

Todos esses meios de obtenção da prova já mencionados anteriormente, exigem um tratamento cuidadoso para garantir sua validade e legitimidade no processo penal, sendo todos mencionados no Código de Processo Penal (CPP). Nesse contexto, é essencial assegurar que as provas sejam obtidas, preservadas e apresentadas de forma adequada, respeitando procedimentos formais e legais. Compreendendo essa construção da coleta de provas importante abordarmos sobre a cadeia de custódia, a fim de analisar a abrangência dos mecanismos e dos cuidados necessários para garantir a integridade e a autenticidade dos elementos probatórios, desde a sua coleta até a utilização em juízo.

2.1.3. A CADEIA DE CUSTÓDIA

No Brasil, a Lei 13.964/2019, conhecida como “Pacote Anticrime”, trouxe inovações importantes para a regulamentação da cadeia de custódia, estabelecendo normas mais rigorosas para o controle das provas, especialmente aquelas de natureza pericial. Entende-se por cadeia de custódia, o conjunto de procedimentos que visa assegurar a integridade e a autenticidade das provas coletadas, a começar do momento em que são obtidas até a sua apresentação em juízo. Conforme cita Avena:

O estabeleciomento da cadeia de custória tem por objetivo, enfim, a preservação de todas as etapas da cadeia probatória de modo a possibilitar, em cada uma delas, o rastramento das que lhe antecederam e a verificação da legalidade e da licitude dos procedimentos adotados (Avena, 2023 p. 509).

Neste contexto, entendemos que a cadeia de custódia atua como um mecanismo de proteção das provas no sistema penal brasileiro, garantindo que apenas aquelas que foram obtidas e mantidas de forma lícita e segura sejam utilizadas para fundamentar decisões judiciais.

A prova no processo penal brasileiro é um elemento essencial para a justiça criminal, equilibrando a busca pela verdade com a proteção dos direitos individuais. A evolução histórica da prova, a complexidade na coleta destas e a importância da cadeia de custódia, são aspectos que demonstram a sofisticação do sistema de produção probatória.

Conforme Coutinho (2024) a preservação da cadeia de custódia é crucial para evitar a contaminação, perda ou adulteração das provas. Esse controle rigoroso garante que as provas apresentadas no processo penal sejam confiáveis e que possam ser utilizadas de forma legítima pelo juiz na formação de sua convicção.

Nesse sentido, cita-se o artigo 158-A do CPP que define a cadeia de custódia como “O conjunto de todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais ou em vítimas de crimes, desde sua obtenção até o descarte” (Brasil, 1941).

Do mesmo modo, Coutinho (2024, p.1) afirma que “(…) a cadeia de custódia serve para assegurar que a prova digital não seja alterada, substituída ou destruída desde o momento de sua coleta até sua apresentação em juízo”. Deste modo então, entendemos que, para garantir toda integridade e autenticidade das provas obtidas em todos os procedimentos da cadeia de custódia, é necessário a utilização do conjunto de provas sem que haja alteração destas.

Os procedimentos envolvem a identificação, armazenamento, transporte e registro de todas as movimentações do material, garantindo que ele não seja alterado ou contaminado. Esses procedimentos são essenciais para que a prova seja válida e confiável no processo penal, evitando questionamentos futuros no decorrer do processo sobre sua legitimidade.

Coutinho (2024, p.3) menciona que “(…) a integridade da cadeia de custódia é crucial para se evitar nulidades processuais e garantir, assim, o direito ao devido processo legal; protegendo os justos interesses acusatórios e defensivos”. Diante disso, esse controle é fundamental para seja respeitada a vericidade do devido processo legal.

Nesse contexto, as provas obtidas por meio das redes sociais, denominadas de provas digitais, apesar de não estarem previstas expressamente no Código de Processo penal, gozam da mesma importância dentro do standart probatório, devendo obedercer os procedimentos rigorosos da cadeia de custódia, a fim de que sejam consideradas lícitas. Neste sentido, Coutinho afirma que:

Provas digitais no processo penal brasileiro representa um avanço significativo, refletindo a realidade tecnológica atual. No entanto, a eficácia dessas provas depende de um rigoroso controle sobre a cadeia de custódia, conforme explicitado. Além disso, a quebra da cadeia de custódia gera dúvidas quanto à veracidade das provas e afeta diretamente a credibilidade do material probatório apresentado em juízo (Coutinho, 2024, p.3).

Esse procedimento deve ser respeitado, seguindo o controle da cadeia de custódia, conforme mencionado acima. Nesse caso, tanto as provas físicas, quanto as provas digitais obtidas e que são utilizadas em diversos processos no país, devem respeitar referidos procedimentos, a fim de que haja a integridade e licitude do conjunto probatório acostado aos autos e que será utilizado para embasar a decisão judicial.

III. PROVA OBTIDA NO CONTEXTO DAS REDES SOCIAIS
3.1. CONTEXTUALIZAÇÃO DO QUE VEM A SER REDE SOCIAL

Segundo a Revista Forbes (2023), o surgimento das redes sociais está atrelado ao desenvolvimento da internet e à necessidade da comunicação global. Nesse contexto, surgem com maior intensidade no início dos anos 2000, com a criação de redes como: Friendster, MySpace, Orkut e Hi5, Linkedln, Facebook, Twiter, dentre outras, e se difundem ainda mais a partir de 2010, com a popularização dos smartphones.

Segundo Pacete (2023), as redes sociais são plataformas digitais as quais conectam pessoas que compartilham dos mais diversos interesses, dos diferentes lugares do mundo, ultrapassando barreiras geográficas e culturais. Elas permitem que até mesmo desconhecidos se comuniquem instantaneamente, compartilhem ideias e mantenham contato regular.

Em reportagem publicada pela Revista Forbes (2023), o Brasil é o terceiro maior consumidor das redes sociais do mundo, e o maior da América Latina, ficando atrás apenas da Índia e da Indonésia, e à frente de países como Estados Unidos, México e Argentina. O Brasil se destaca mundialmente no uso de redes sociais e, conforme pesquisa realizada pela Forbes (2023), existem 131,5 milhões de usuários conectados no Brasil, que passam cada vez mais tempo navegando nas redes. A esse respeito, Pompei, Gouveia e Ramos (2022, p. 97) assinalam que:

Numa sociedade que cada vez mais estabelece relações entre pessoas, em ambiente virtual, as redes sociais, passaram a ser instrumentos que influenciam e formam opiniões, buscam (re)formar identidades, marcam os diferentes e permitem que o indivíduo adentre, sistematicamente na vida do outro, sem medir consequências. Os efeitos são paradoxais, pois, ao mesmo tempo em que rompem fronteiras, valores tradicionais, permitem liberdade de criatividade e de expressão, ilimitadamente, em todos os sentidos.

Desta forma, entendemos ser inegável que as redes sociais tornaram-se parte do dia a dia das pessoas, sendo utilizadas não apenas para entretenimento, como também para incontáveis fins, dentre eles negócios, relacionamento, divulgação de produtos e serviços, network, entre outros. As redes sociais moldaram a forma como a sociedade interage e se comunica, tornando-se parte do cotidiano de bilhões de pessoas pelo mundo, com impactos profundos na educação, na política, na cultura e na economia.

Muito mais do que ferramentas triviais de conversação, tais sites produzem efeitos e questionamentos relevantes sobre: interação social em ambientes mediados pela internet; vigilância, monitoramento e utilização de dados pessoais por empresas; ciberbullying; modos de nos apresentarmos enquanto sujeitos em plataformas onde não podemos contar com nossos corpos físicos […] (Polivanov, 2019, p. 104).

Entendendo esse contexto, podemos afirmar que com a crescente utilização das redes sociais em todos os âmbitos da vida de muitas pessoas, e com a popularização destas plataformas, surgiu um interesse crescente em analisar como elas podem influenciar os métodos investigativos. Desse modo, desponta também uma preocupação no campo jurídico, pois, exige que os profissionais da área do direito se atualizem e adaptem aos novos métodos de apuração de fatos nessa realidade digital.

Essas plataformas passaram a desempenhar um papel central na comunicação diária, permitindo que os seus usuários compartilhem suas rotinas de maneira detalhada e pública. Diante disso, nota-se que essas informações compartilhadas, mostram um retrato detalhado das vidas dos usuários, tais como: modos de pensar, vestir, comportamentos e interações com outros indivíduos, expondo assim, uma rica fonte de evidências, como por exemplo, fotos, textos publicados, conversas e gravações, que poderiam ajudar fornecer informações cruciais para identificação de evidências e entender o contexto de casos investigativos.

“As plataformas não devem ser vistas tão somente como máquinas de encaminhar e de traduzir informações, mas sim como espaços de compartilhamento de dados na intenção de entender melhor seus usuários finais” (D’Andréa, 2020, apud Pessoa; Rosado, 2024, p. 212). Esse entendimento destaca a importância das plataformas digitais como espaços dinâmicos de interação, que ultrapassam a simples função de transmitir informações.

Analisando esse contexto construtivo das novas formas de utilização das redes é que surge as provas digitais, demandando dos profissionais da área do direito expertise no tratamento destas provas, a fim de torná-las válidas no âmbito processual, é o que veremos de forma mais aprofundada a seguir.

3.2. AS PROVAS OBTIDAS POR MEIO DAS REDES SOCIAIS E A RELEVÂNCIA DA UTILIZAÇÃO DAS REDES SOCIAIS COMO EVIDÊNCIAS LEGAIS

Existem vários desafios que já foram enfrentados e muitos ainda a serem superados com o desenvolvimento da era digital, na área do direito, conforme Albeche (2023). Quando falamos em prova digital, significa que, são informações armazenadas e extraídas de aparelhos tecnológicos ou aplicativos de internet, como tablet, celular, computador, redes sociais, entre outros, que substanciam a comprovação de fatos criminosos ocorridos em meio físico ou digital. Pensando nisso, podemos analisar que existem situações que podem estar atreladas ao meio digital, bem como surgirem diretamente deste meio.

Quando se diz que a prova é digital, os fatos a que ela se refere, ocorreram no âmbito virtual, e as provas situam-se neste mesmo ambiente, ou os fatos ocorreram em meio físico, no entanto, as circunstâncias foram registradas em meio digital. Segundo  os autores Thamay e Tamer, duas acepções de prova digital podem ser apresentadas:

Uma primeira, segundo a qual a prova digital pode ser entendida como a demonstração de um fato ocorrido nos meios digitais, isto é, um fato que tenha como suporte a utilização de um meio digital. E, uma segunda, em que, embora o fato em si não tenha ocorrido em meio digital, a demonstração de sua ocorrência pode se dar por meios digitais (Thamay; Tamer, 2020, p. 32).

Assim, podemos dizer que uma prova digital, são informações, registradas e obtidas por meio de âmbitos cibernéticos, eletrônicos, que comprovam a existência ou inexistência, de fatos e circunstâncias, ocorridas neste ambiente ou não. O uso destas informações levanta questões como a privacidade e direitos constitucionais, relacionado com a admissibilidade das provas.

O artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal de 1988 assegura que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação” (BRASIL, 1988). Nesse sentido, a análise de provas digitais deve ser conduzida com cautela para evitar a violação desses direitos fundamentais.

Ao mesmo tempo, o inciso IV do mesmo artigo dispõe sobre a liberdade de expressão, garantindo que “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato” (Brasil, 1988). Contudo, vale ressaltar que essa liberdade não é absoluta, uma vez que seu exercício não pode implicar em dano ou abuso que fira os direitos de outros. Assim, é necessário equilibrar o direito à liberdade de expressão com a proteção à intimidade e à honra, especialmente quando lidamos com provas digitais em contextos jurídicos.

Com a implantação da Lei 12.965 de 23 de abril de 2014, conhecida como o Marco Civil da Internet, o art. 3º disciplina o uso da internet no Brasil através de princípios, que dentre eles determinam a liberdade de expressão na forma de lei, bem como a proteção à privacidade, demonstrando assim, que no âmbito da era digital, devemos observar seus limites entre direitos e deveres a serem cumpridos.

Desta maneira, a era digital trouxe inovações que ultrapassam as relações físicas, na qual afastam as pessoas presencialmente, mas aproximam virtualmente, criando assim, um novo meio de convivência, mais rápido, mais desinibido, mais interativo, mais informativo e muito profissionalizado. Estas atualizações tecnológicas, incorporam o dia a dia das empresas, trazendo funcionalidades e sendo na maioria das vezes responsável pela divulgação de suas informações.

Diante do contexto, a utilização das provas coletadas por meio das redes sociais, podem ser satisfatórias, devendo ser analisada a natureza jurídica das declarações coletadas por meio idôneo, sendo admitidas provas lícitas, que estando no meio virtual, disponível na internet, ao alcance de todos, possibilita a sua utilização como meio de comprovar determinado fato jurídico que necessite de maiores esclarecimentos. Essas informações podem ser obtidas pelo Facebook, Instagram, Twiter, e várias outras redes em que o próprio usuário alimenta com informações de seu cotidiano.

Nos últimos anos, diversos tribunais têm se deparado com casos que envolvem evidências das redes sociais. O reconhecimento dessas plataformas como fontes válidas de prova está se consolidando, criando precedentes que podem moldar o futuro das investigações e do próprio conceito de evidência legal.

Na justiça, é levado em consideração vários fatores para a utilização de uma prova digital. Deste modo, é preciso ter cautela em sua análise, tendo em vista que um dos principais problemas são as adulterações nas provas digitais, sendo de extrema importância a identificação de sua autoria para se utilizar como meio comprobatório.

As interações nas redes sociais são frequentemente datadas e localizadas, permitindo que investigadores estabeleçam uma linha do tempo dos eventos. Isso pode ajudar a contextualizar ações e intenções, fornecendo uma narrativa mais clara do que aconteceu em determinado momento.

As provas obtidas por meio de redes sociais desempenham um papel crucial em investigações e processos judiciais, refletindo a complexidade da interação humana no mundo digital. Embora sejam uma fonte valiosa de evidências, seu uso deve ser conduzido com rigor ético e legal, assegurando que os direitos dos indivíduos sejam respeitados enquanto se busca a justiça.

Na esfera penal, o desenvolvimento da era digital trouxe grandes avanços, mas também desafios complexos em relação ao uso de provas digitais. A prova digital, que se refere a dados armazenados em dispositivos eletrônicos ou redes sociais, apresenta-se como um instrumento poderoso para comprovar fatos criminosos, sejam eles ocorridos no ambiente físico ou digital. Entretanto, seu uso levanta questões significativas sobre privacidade, direitos constitucionais e a autenticidade das provas apresentadas.

Como evidenciado por Thamay e Tamer (2020), a prova digital pode ser compreendida de duas formas: primeiro, como a comprovação de fatos ocorridos diretamente em meio digital; segundo, como a utilização de registros digitais para demonstrar eventos que, embora tenham ocorrido em meio físico, foram documentados em plataformas digitais. Essas definições enfatizam a abrangência da prova digital no direito penal e sua relevância para comprovar a materialidade e autoria dos delitos.

No Brasil, o artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal de 1988, protege a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem dos indivíduos, reforçando a necessidade de que provas digitais respeitem esses direitos fundamentais. Adicionalmente, o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014) estabelece princípios para o uso da internet, garantindo liberdade de expressão e proteção à privacidade. No entanto, é essencial lembrar que a liberdade de expressão, ainda que assegurada pela Constituição, possui limites legais, especialmente quando se trata de investigações criminais.

Com o aumento de interações e compartilhamentos nas redes sociais, o direito penal encontra novas fontes de prova que podem corroborar os relatos de vítimas e testemunhas. Com essa interação, diversas provas são obtidas por meio de conversas e imagens que podem demonstrar informações importantes em um processo criminal. No entanto, as provas digitais exigem análise criteriosa devido ao risco de adulteração, conforme já decidido no STJ, o que torna a perícia digital indispensável para garantir a integridade e autenticidade do material coletado.

Os tribunais vêm reconhecendo a validade das provas obtidas em plataformas digitais, estabelecendo precedentes importantes que impactam o futuro das investigações nos processos penais. No entanto, o uso dessas evidências exige cuidados éticos e legais para assegurar que os direitos dos envolvidos sejam preservados e a idoneidade da prova obtida, a fim de que não seja anulada posteriormente. Dessa forma, as provas digitais, enquanto elementos indispensáveis à investigação de crimes na era digital, devem ser tratadas com rigor e respeito aos princípios constitucionais e processuais, de modo a garantir o equilíbrio entre a eficácia da justiça e a proteção dos direitos fundamentais.

3.3 ABORDAGEM METODOLÓGICA PARA COLETA E ANÁLISE DE EVIDÊNCIAS NAS REDES SOCIAIS

A coleta e análise de evidências nas redes sociais requerem uma abordagem metodológica rigorosa para garantir a validade e a legalidade dos dados obtidos. Há diversas formas que podemos utilizar estas abordagens.

Vale salientar que uma investigação pode iniciar através de uma definição de objetivos e a partir disso, iniciar a sondagem, escolhendo as redes a serem analisadas em busca de alguma prova específica, como também o inverso, pode-se identificar alguma prova divulgada em alguma rede especifica ou conversa e a partir disto, virar objeto de investigação e provas.

No primeiro caso, para a investigação ser iniciada, deve definir o objetivo, esclarecendo qual crime ou ato ilícito está sendo investigado e como as evidências das redes sociais podem contribuir. A partir desta definição, é necessário que sejam especificadas as plataformas a serem alvos da coleta, como o Instagram e Facebook, e os tipos de dados, como postagens, mensagens e coletas de dados.

Estas informações, podem ser adquiridas utilizando métodos de coletas com ferramentas de extração de dados por órgãos especialidados para esse fim, como forma de estudo de casos na coleta de evidências. Para a coleta de dados, deve ser respeitado o devido processo legal e também uma analise criteriosa na extração da prova.

Toda essa coleta deve ser documentada e registrada, demonstrando como foi feita e o contexto de suas integrações, bem como, a armazenagem deve garantir a integridade da informação para que esteja o mais próximo possível da realidade ou melhor, 100% idêntico à realidade, como no caso de imagens e sons.

Pode ser utilizada a análise qualitativa para a percepção de padrões, comportamentos e intenções, e a análise quantitativa, para realizar análise sobre a frequência de certos comportamentos, palavras, entre outros. Para ser validada, deve ser realizada a verificação forense, aplicando técnicas de análise forense digital com o intuito de garantir que as evidências não foram alteradas e a corroboração, comparando as evidências de redes sociais com outras fontes de informação, como testemunhos e documentos físicos.

Sempre necessário observar a legalidade da coleta, lembrando das normas legais como a Lei nº 13.709/2018, denominada de Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD e quando necessário, obter consentimento para a coleta de dados, especialmente se envolver informações pessoais sensíveis.

Na apresentação dos resultados, o relatório deve conter detalhadamente todo o processo de coleta e análise, incluindo as técnicas utilizadas, apresentar as evidências de maneira clara, referenciando o contexto em que foram coletadas, utilizar gráficos ou infográficos que ajudem a ilustrar as evidências e facilitar a compreensão. Para finalizar, após a conclusão da investigação, revisar a metodologia utilizada para identificar possíveis melhorias e acompanhar mudanças nas tecnologias e legislações pertinentes à coleta de dados em redes sociais.

No segundo caso, como mencionado anteriormente, a investigação se inicia através de algo já identificado pelas redes sociais, sendo assim, a etapa de escolha das redes para iniciar a investigação, basicamente já ocorreu, no entanto todo o restante do processo de investigação, pode ocorrer da mesma forma, respeitando cada passo, para produção de provas idôneas.

A coleta e análise de evidências de redes sociais para uso no processo penal exige uma abordagem metódica que garanta a validade e a legalidade das informações. Ao seguir essas etapas, os investigadores e profissionais do direito podem maximizar a efetividade das provas digitais, respeitando os direitos dos indivíduos e contribuindo para a justiça.

IV – UTILIZAÇÃO DAS REDES SOCIAIS COMO EVIDÊNCIAS JURÍDICAS.

Com uma era tecnológica em constante avanço, o uso das redes sociais como provas tem crescido constantemente. Essa utilização é efetiva desde que sejam analisadas a natureza jurídica das provas obtidas como meio comprobatório, as quais devem ser colhidas por meio idôneo. Segundo Barbalho:

A revolução tecnológica resultou no desenvolvimento de uma sociedade interligada digitalmente, conectada, que vivencia a Cibercultura. Esta evolução tecnológica influenciou a sociedade, como também o meio jurídico que está em frequente evolução. Sendo assim, possibilitando o uso de fontes virtuais na constituição do conjunto probatório processual (Barbalho, 2020, n.p).

A sua publicação trata da influência da revolução tecnológica sobre a sociedade e, especificamente, sobre o meio jurídico. Ela menciona a “Cibercultura”, que é a integração da tecnologia digital no cotidiano, transformando as formas de comunicação, interação e até de gestão de informações. No campo jurídico, essas mudanças tecnológicas têm impacto direto nos processos judiciais, permitindo o uso de fontes virtuais como parte das provas apresentadas em processos.

4.1 A UTILIZAÇÃO DAS PROVAS OBTIDAS ATRAVÉS DAS REDES SOCIAIS NO PROCESSO PENAL.

A utilização de provas obtidas por meio de redes sociais no processo penal é um tema que reflete a crescente digitalização da vida, e a sua influência sobre o sistema jurídico. Com o aumento do uso de plataformas como Facebook, Instagram, WhatsApp, Twitter, entre outras, essas redes se tornaram fontes ricas de informação e, consequentemente, de possíveis provas em investigações e julgamentos criminais, como menciona Coutinho (2024).

Em outras palavras, essa utilização de provas digitais é uma espécie de informação em formato eletrônico, no qual é extraído o material para que seja demonstrado a materialidade dos fatos que sejam supostamente criminosos em um processo penal.

Para uma coleta de provas efetiva, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, no acórdão do RHC 143.169 de 2022, que são inadmissíveis no processo penal as provas obtidas de celular sem a adoção de procedimentos que garantam a idoneidade e a integridade dos dados extraídos.

Essa confiabilidade nas provas obtidas por meios de redes sociais no processo penal, depende de um controle efetivo na cadeia de custódia, a qual teve um destaque e inovação no pacote anticrime em 2019. Todo esse processo, conforme anteriormente descrito, serve para que seja assegurada a integridade da prova obtida.

Coutinho (2024, p. 2) ao falar sobre a inovação da cadeia de custódia, afirma:

[…] elenca-se o artigo 158-B do Código de Processo Penal, devidamente inovado em face do “pacote anticrime”. De maneira breve e didática, são eles: o reconhecimento (identificação do vestígio que será submetido a exame pericial); isolamento (medidas para preservar o local do crime e evitar a contaminação da prova); fixação (documentação detalhada do local do crime e das condições do vestígio); coleta (recolhimento do vestígio, garantindo que não haja alteração de suas características); acondicionamento (armazenamento adequado do vestígio para evitar deterioração ou alterações); transporte (transferência segura do vestígio para o local onde será analisado); recebimento (registro da chegada do vestígio no local de análise); processamento (análise técnica do vestígio); armazenamento (guarda segura do vestígio após a análise); por fim, o descarte (destruição ou devolução do vestígio, conforme o caso).

Cada uma dessas etapas deve seguir padrões que deve ser documentado para que seja assegurado a rastreabilidade das provas obtidas por meio de redes sociais no processo penal, onde não respeitando essas etapas, podem perder a credibilidade e confiabilidade das provas obtidas, acarretando nulidade no processo, conforme menciona o art. 157 do CPP, que diz: “São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais” (Brasil, 1941).

Sendo assim, é inadmissível as provas obtidas por meio ilícito, sendo uma violação dos princípios encartados Constituição Federal de 1988. Por fim, esse avançar da utilização das provas obtidas por meio de rede sociais nos processos penais do Brasil, é um marco importante e revolucionário, pois vivemos uma era onde a utilização da tecnologia vem aumentando de forma rápida, e as pessoas estão cada vez mais conectadas umas com as outras através de redes sociais, e essa convivência faz com que algumas pessoas tendem a praticar “crimes” também no mundo tecnológico.

4.2 O POSICIONAMENTO DOS TRIBUNAIS SUPERIORES EM RELAÇÃO AO USO DE PROVAS OBTIDAS POR MEIO DE REDE SOCIAIS.

O posicionamento dos Tribunais Superiores sobre o uso de provas obtidas por meio de redes sociais é que elas devem obrigatoriamente ser colhidas com metodologia adequada para garantir a sua idoneidade e integridade, e não ter ao final de um processo, uma nulidade por conta de erros.

O STJ já declarou a nulidade de uma prova por conta da quebra da cadeia de custódia, onde Vital menciona:

Esse entendimento, a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso em Habeas Corpus para anular provas obtidas pela polícia em investigação sobre uma organização criminosa especializada em furtos eletrônicos contra instituições financeiras. Essas provas são digitais e foram coletadas em medida de busca e apreensão autorizada pela Justiça, com a consequente quebra do sigilo dos dados armazenados nos aparelhos eletrônicos apreendidos. As máquinas foram periciadas primeiro pelos bancos vítimas dos furtos e, depois, pela polícia.

Para a defesa, isso representa a quebra da cadeia de custódia da prova digital, pois, por causa do descuido dos investigadores, não há meios de garantir que os dados usados para embasar a denúncia são exatamente os mesmos que foram retirados dos aparelhos (Vital, 2023, p. 1).

O Superior Tribunal de Justiça (STJ), decidiu por unanimidade que, provas digitais que não forem adotadas os devidos procedimentos legais, não podem ser consideradas válidas e quebra a cadeia de custódia, portanto, devem ser anuladas, pois não fica assegurado a idoneidade e integridade desses dados que foram obtidos, sendo que, o material colhido deverá ser tratado mediante alguns critérios pré-definidos.

No Agravo Regimental no Habeas Corpus (HC) 828.054 julgado em 14 de maio de 2024, pela 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que “A falta de procedimentos para garantir a idoneidade e integridade dos dados extraídos de um celular apreendido resulta na quebra da cadeia de custódia e na inadmissibilidade da prova digital” (STJ, 2023, p. 24). A corte decidiu, por unanimidade, que as provas extraídas por meio digital, podem ser burladas até mesmo de forma imperceptível.

Nesse caso, o juiz de primeiro grau validou as provas obtidas por meio de prints de celulares e condenou o réu. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN), confirmou a sentença e manteve a condenação. A defesa impetrou um Agravo Regimental no Habeas Corpus perante o STJ no qual foi demonstrado que a extração das provas por meio do celular do réu foi feita pelo Departamento de Investigações sobre Narcóticos (DENARC), e que na verdade deveria ter sido colhido pelo  Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (GAECO), sendo necessário cumprir o rito para assim, ser garantida a legitimidade da prova colhida. Segundo o relator, Ministro Joel Ilan Paciornik :

[…] o material epistemológico digital de interesse à persecução penal seja tratado mediante critérios bem definidos, que possibilitem a sua preservação, na maior medida possível, notadamente com explícita indicação de quem foi responsável pelo seu reconhecimento, coleta, acondicionamento, transporte e processamento, que deverá ser formalizado em laudo produzido por perito, notadamente com indicação da metodologia empregada e das ferramentas eventualmente utilizadas (STJ, 2024, p. 25).

Nesse julgado, foi destacado que as provas foram obtidas direto do celular do réu, sem o uso da máquina de extração e análise dos dados digitais. Em sua decisão, o ministro relator ressalta que neste caso, não tem como garantir a idoneidade da prova. Desta forma, observamos que as provas obtidas por meios digitais devem ser tratadas de uma forma minuciosa, para que seja respeitado todo o devido processo legal e que as provas digitais sejam validadas nos processos penais.

O Supremo Tribunal Federal (STF), fixa um posicionamento de que o acesso aos dados das redes sociais depende de ordem judicial. O Ministro Ricardo Lewandowski no Habeas Corpus 222.141 julgado em 2022, anulou provas obtidas sem autorização judicial. A decisão foi tomada com base na Constituição e no Marco Civil da Internet.

Por fim, os tribunais superiores reconhecem que as redes sociais de fato vêm se tornando uma peça-chave para aquisição de provas para diversos processos criminais no país. O STJ tem declarado a nulidade de provas quando há quebra da cadeia de custódia, enquanto o STF exige expressamente autorização judicial para acessar dados dessas plataformas. Esse cuidado é fundamental para evitar nulidades processuais e garantir a lisura no processo penal brasileiro.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A crescente digitalização da sociedade transformou as redes sociais em fontes relevantes de informação, impactando diretamente a forma como o direito processual penal lida com a obtenção de provas. A análise das redes sociais como fontes de evidências jurídicas demonstra a necessidade de uma adequação contínua do sistema legal às novas tecnologias. O uso dessas provas no processo penal brasileiro representa um avanço significativo, mas também exige que sejam observadas rigorosas normas legais, como a preservação da cadeia de custódia e a obtenção de autorização judicial para o acesso a dados privados.

Os desafios impostos pela era digital, como a adulteração de provas e a proteção dos direitos fundamentais, devem ser enfrentados com cautela. O uso de informações obtidas por meio das redes sociais só será efetivo e legítimo se realizado dentro dos limites legais, respeitando o devido processo legal e as garantias constitucionais, como a privacidade e a inviolabilidade da intimidade.

Os tribunais superiores brasileiros têm se posicionado de maneira clara sobre a admissibilidade dessas provas, exigindo que sejam obtidas de forma idônea e que a integridade delas seja preservada. Esses cuidados são fundamentais para evitar nulidades processuais e garantir a legitimidade dos julgamentos.

Assim, conclui-se que o uso de provas provenientes de redes sociais no processo penal brasileiro é um tema em evolução, que exige a contínua atualização dos profissionais do direito para garantir que as inovações tecnológicas contribuam para a justiça, sem comprometer os direitos dos envolvidos. A era digital trouxe novos desafios, mas também oportunidades valiosas para o aprimoramento da investigação criminal e do próprio sistema de justiça. Essas considerações reforçam a importância do equilíbrio entre tecnologia e direito, com foco na preservação das garantias legais e constitucionais.

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[1] Discente do curso de Direito da Faculdade Independente do Nordeste (FAINOR). E-mail: elbacviana@gmail.com

[2] Discente do curso de Direito da Faculdade Independente do Nordeste (FAINOR). E-mail: lukaaoox3@gmail.com

[3] Discente do curso de Direito da Faculdade Independente do Nordeste (FAINOR).E-mail: rebecakellymatos@gmail.com

[4] Doutoranda e Mestre em Memória: Linguagem e Sociedade pelo Programa de Pós Graduação em Memória: Linguagem e Sociedade pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB). Especialista em Ciências Criminais pela UESB; Especialista em Novas Metodologias do Ensino Superior pela FASAVIC; Graduada em Direito pela Faculdade Independente do Nordeste (FAINOR). Advogada. Docente do Curso de Direito da Faculdade Independente do Nordeste (FAINOR).E-mail: fadjafroes.ffv.adv@gmail.com