REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7717164
Polyanna Pimentel Muniz1
Claudio Jannotti da Rocha2
RESUMO
Observa-se que diariamente são levadas à Justiça do Trabalho reclamações cuja causa de pedir, geralmente, é embasada no descumprimento espontâneo de normas trabalhistas e o pleito se limita a uma tutela rescisória – o que não impede que a norma continue sendo descumprida. Assim, sob a condução de José Roberto Freire Pimenta e, por meio de uma pesquisa eminentemente bibliográfica de abordagem qualitativa e método dedutivo, busca-se fornecer a visão de uma justiça restaurativa que, por meio da tutela inibitória, mostre-se capaz de proporcionar uma tutela efetiva a tempo e modo ao direito do trabalhador.
INTRODUÇÃO
O professor José Roberto Freire Pimenta (2004, p. 339-341) defende que a intervenção estatal no direito do trabalho e a alegada complexidade de suas normas não têm qualquer relação com o elevado número de demandas trabalhistas, esse número está relacionado com o descumprimento espontâneo do direito material trabalhista por seus destinatários. Aduz ainda que o descumprimento das normas trabalhistas é deveras vantajoso ao empregador, do ponto de vista econômico, afinal, a tutela jurisdicional trabalhista carece de efetividade.
A respeito, Marinoni (2012, p. 70) sustenta que o acesso à justiça está relacionado à garantia de técnica processual capaz de prestar a efetiva tutela dos direitos e não a tutela do direito propriamente dito, assim, não basta que o ordenamento jurídico afirme um direito, mas que lhe confira proteção. Contudo, verifica-se que as Reclamações Trabalhistas visam, geralmente, uma tutela rescisória – reparação pecuniária de um direito lesado, mas seria tal tutela efetiva frente a determinados direitos trabalhistas?
Como ensina José Freire Pimenta (2004, p. 342), enquanto não se tornar antieconômico o descumprimento das normas materiais trabalhistas, os processos continuarão repetitivos e inefetivos, ou seja, quanto mais efetiva a jurisdição, menos terá que ser acionada, quanto mais os empregadores souberem que só lhes restam cumprir a lei, maior eficácia e efetividade elas terão.
Assim, considerando o caráter preventivo da tutela inibitória que, direcionada para o futuro, visa impedir a prática, repetição ou continuidade de uma conduta ilícita, protegendo o direito material definido por lei e sua superioridade frente a tutela ressarcitória – voltada para o passado, busca-se uma justiça restaurativa despida de cunho patrimonial e, de fato, preocupada com o trabalhador, ou seja, que proporcione efetividade a tempo e modo à norma trabalhista.
Por fim, trata-se de instrumento disponível no processo civil, cuja aplicação subsidiária no processo do trabalho se dá com mais razão de ser devido a peculiaridade de seu objeto – tutelar a vida, a saúde, a segurança, a honra, o direito de não ser discriminado, dentre outros (PIMENTA, 2004, p. 391). Assim, por meio de uma pesquisa bibliográfica, cujo método é dedutivo e, a partir de uma abordagem qualitativa, busca-se a resposta ao seguinte questionamento: como alcançar a efetividade da tutela e, consequentemente, uma justiça restaurativa por meio do uso da tutela inibitória no direito do trabalho?
1 A BUSCA POR UM PROCESSO JUSTO CUJA TUTELA SEJA ADEQUADA E EFETIVA
Segundo Daniel Mitidiero (2014, p. 66), os direitos fundamentais processuais, por exemplo, o devido processo legal (art. 5, LIV, CF), o juiz natural (art. 5º, LIII, CF), a paridade de armas (art. 5º, caput, CF), o contraditório e ampla defesa (art. 5º, LV, CF), da fundamentação das decisões (art. 93, IX, CF), do acesso à justiça (art. 5º, XXXV, CF), dentre outros, compõem um processo justo.
Nesse sentido, aduz o Código de Processo Civil que o processo “[…] será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil […]” (art. 1º) assegurando o direito das partes à tutela jurisdicional adequada, efetiva e tempestiva (art. 3º e 4º).
De acordo com Mauro Schiavi (2015, p. 63), o processo do trabalho deve ser um “[…] instrumento célere, efetivo, confiável e que garanta, acima de tudo a efetividade da legislação […]”, ou seja, a eficiência é imprescindível diante da natureza alimentar dos créditos decorrentes da relação de emprego, em razão disso, o Código de Processo Civil se aplica ao processo do trabalho supletiva e subsidiariamente, nas omissões da legislação processual trabalhista, desde que compatível com seus princípios e peculiaridades (art. 769, CLT).
Para a obtenção de uma tutela estatal o indivíduo necessita exercer o seu direito fundamental de acesso à justiça obrigando o Estado a prestar tutela jurisdicional efetiva a toda e qualquer lesão ou ameaça à direito (voltando-se a reparar lesões ocorridas no passado ou visando evitar a consumação da ameaça) por meio do processo, cuja finalidade é instrumentalizar o direito material.
A partir da Constituição Federal e do Código de Processo Civil de 2015, passou-se a compreender o direito de ação não apenas como o direito de propor uma ação ou de se obter uma sentença, mas o direito à uma tutela jurisdicional adequada, efetiva e tempestiva, por meio de um processo justo.
Nesse sentido, para que a tutela seja adequada o processo deve ser capaz de promover o cumprimento do direito material – com o uso de técnicas processuais adequadas ligadas à situação fática levada à juízo – não significa, simplesmente, se valer das regras projetadas pelo legislador, mas compreendê-las à luz dos direitos fundamentais processuais e do direito ao acesso à justiça, a fim de viabilizar uma tutela efetiva (MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, 2017, p. 254-255).
Isso significa que, para alcançar uma tutela efetiva, o juiz deve adaptar o processo ao caso concreto, utilizando técnicas capazes de responder às necessidades do direito material, por exemplo, a distribuição adequada do ônus da prova, técnicas antecipatórias, tutela com executividade intrínseca, técnicas de execução idôneas, dentre outras (MARINONI, 2010, p. 112-114).
Desse modo, a garantia de uma tutela efetiva é extraída do modelo constitucional de processo destinado a assegurar instrumento equânime e justo para solucionar o conflito cuja tutela reflita o resultado almejado pelo direito material – valores e interesses tutelados pela norma (BEDAQUE, 2010, p. 49-80). Ou seja, a existência do direito material depende da efetividade do direito processual e da atividade jurisdicional para proporcionar sua satisfação (PIMENTA, 2004, p. 344).
Para melhor compreensão do tema proposto, faz-se necessário diferenciar, ainda que de forma superficial, sentença de tutela, já que a obtenção de uma tutela efetiva não tem relação com a procedência ou não do pedido. Sentença é técnica processual, enquanto a tutela é a proteção devida aos direitos (MARINONI, 2019, 11-12). Deste modo, a tutela não se confunde com o resultado do mérito contido na sentença, afinal, há tutela ainda que o pedido seja totalmente improcedente, pois, nesse caso, houve tutela ao direito do réu (POZZOLO, 2001, p. 37).
Pode-se, assim, concluir que o direito de acesso à justiça – em um processo alicerçado nos princípios constitucionais – não se limita apenas ao ingresso à jurisdição, mas, por meio de um processo justo e de mecanismos processuais adequados, obter-se uma tutela justa – que faça valer o disposto no direito material – que não se confunde com a procedência ou não da pretensão.
1 (IN)EFETIVIDADE DA TUTELA RESSARCITÓRIA FRENTE A DETERMINADOS DIREITOS TRABALHISTAS
Segundo Freire Pimenta (2004, p. 340-342) a inefetividade do direito material trabalhista possui relação com o seu descumprimento, já que, descumprir a lei é vantajoso ao empregador, do ponto de vista econômico. Assim, o problema do Direito do Trabalho estaria relacionado à falta de efetividade da tutela jurisdicional trabalhista – que só se tornará efetiva quando se tornar antieconômico o descumprimento das suas normas.
Pois bem, o parágrafo único, artigo 497, do CPC, aduz que na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que lhes assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, sendo irrelevante a ocorrência de dano e a existência de culpa ou dolo.
De acordo com Teori Zavascki (2014, p. 164-165), a tutela preventiva se postula antes da ocorrência da violação do direito e para evitar que ela ocorra, já a tutela repressiva (reparatória) se postula quando o direito foi violado e para que seja aplicada a sanção correspondente. A respeito, sustenta Marinoni (2010, p. 459) que a ideia de “ressarcimento pelo equivalente deita raízes de que o dinheiro tudo pode apagar”.
Salienta-se que, em razão da natureza extrapatrimonial de determinados direitos trabalhistas, a tutela meramente ressarcitória se torna inefetiva, já que, incapaz de refletir o que foi garantido por lei, por exemplo, a obrigação patronal de não discriminar, não contratar menores fora da condição de aprendiz, não adotar práticas e métodos ofensivos à honra, intimidade ou privacidade, de manter um ambiente de trabalho saudável e seguro, dentre outros.
Nesse sentido, segue a lição de Marinoni, verbis:
[…] A tutela ressarcitória pelo equivalente não se importa com as diferentes necessidades e espécies de bens ou mesmo pressupõe qualquer programa de proteção das posições sociais mais frágeis. Esta forma de tutela jurisdicional, na medida em que desejava apenas conservar em funcionamento o mercado na perspectiva do princípio da igualdade formal, ignorava as características e as necessidades socialmente diversificadas, limitando-se a exprimir a equivalência das mercadorias (MARINONI, 2015, p. 83).
Aduz Paulo Ricardo Pozzolo (2001, p. 83-88), que os direitos trabalhistas devem ser classificados como absolutos3, pois, pertencem aos direitos e garantias fundamentais do homem e, têm natureza alimentar e, além disso, as leis trabalhistas são de ordem pública cogentes e irrenunciáveis, demonstrando o relevo que merecem. Ademais, os direitos não-patrimoniais, como por exemplo, a proteção à saúde e os ligados à personalidade, devem ser objeto de inibitória, já que não podem ser objeto de transação.
Para a efetiva proteção das normas que objetivam garantir a proteção de direitos fundamentais, é indispensável a tutela contra ato contrário ao direito, vista como tutela jurisdicional destinada a inibir a violação da norma (MARINONI, 2019, p. 20). Afinal, a tutela inibitória visa a incolumidade do ordenamento jurídico, enquanto a ressarcitória se destina a recompor o dano ocorrido (POZZOLO, 2001, p. 50).
Conforme supracitado, o descumprimento das obrigações de fazer e não fazer, provenientes da norma trabalhista, é vantajosa ao empregador e, diante monetização dos direitos trabalhistas, cria-se uma justiça efetiva, incapaz de promover a afirmação dos direitos contidos na norma jurídica, favorecendo, desta forma, o aumento da litigiosidade. Corroborando, seguem os dados da Justiça em Números do CNJ4, coletados entre os anos de 2010 a 2017, demonstrando um movimento ascendente de ajuizamento de ações na Justiça do Trabalho.
Desse modo, frisa-se que tutela específica – nesse caso, decorrente da tutela inibitória – é um tipo de tutela jurisdicional cujo resultado, decorrente de um processo, propicia a quem tem razão exatamente aquilo a que o sujeito tem direito – desse modo, o resultado do processo coincide com o direito material e não com o equivalente (DIDIER JUNIOR, 2014, p. 3).
Portanto, quando se fala na restauração da efetividade da norma – valores e interesses tutelados pela norma, nota-se que a natureza específica das obrigações de fazer e não fazer contidos na tutela preventiva reafirmam os direitos trabalhistas consagrados na legislação, de modo contrário, a tutela reparatória não tem o condão de fazer cumprir a norma jurídica, mas, fornecer o seu equivalente pecuniário o que a torna inefetiva e fomenta o descumprimento das obrigações e da legislação trabalhista.
2 A TUTELA INIBITÓRIA NO PROCESSO DO TRABALHO
Além da previsão constitucional (art. 5º, XXXV), a tutela inibitória possui aparato no Código de Processo Civil, artigo 4975 e seguintes, e no Código de Defesa do Consumidor, artigo 846. Para a sua concessão não se faz necessária a comprovação de dano e, tampouco, culpa ou dolo, afinal, trata-se de tutela voltada, exclusivamente, contra o ilícito podendo ser concedida de forma antecipada, desde que comprovada a probabilidade de ameaça da prática, repetição ou continuação de conduta antijurídica.
Frisa-se, a tutela inibitória possui relação com a ameaça de ilícito – enquanto ainda não ocorreu o resultado prejudicial ao indivíduo, trata-se de dano futuro e não presente, afinal, existindo prejuízos, a tutela adequada seria a ressarcitória, sendo cabível a inibitória para evitar a continuação ou repetição da conduta ilícita (POZZOLO, 2001, p. 95-96).
Ressalta-se que a natureza da decisão que concede a tutela inibitória é mandamental a ser cumprida prontamente, sob pena de aplicação ao reclamado, de forma cumulativa ou não, de multa diária com o propósito de convencê-lo ao adimplemento da obrigação e de outras medidas coercitivas que se façam necessárias, em caso de descumprimento da ordem judicial – a coerção direta, a prisão7, dentre outras (PIMENTA, 2004, p. 392).
Corroborando com esse entendimento, Luiz Guilherme Marinoni (2019, p. 190) sustenta que a tutela inibitória é prestada por sentença que impõe a obrigação de um fazer ou de um não fazer 1) ordenando um fazer ou não fazer sob pena de multa, ou 2) determinando uma medida de execução que iniba um ilícito, independentemente da vontade do reclamado. Tratando-se, respectivamente, 1) de uma sentença mandamental e 2) de uma sentença executiva.
Insta salientar que, geralmente, a tutela inibitória no âmbito trabalhista é requerida em sede de ação coletiva cuja legitimidade para propositura é do sindicato da categoria e do Ministério Público do Trabalho – tendo em vista a natureza dos direitos que se pretende tutelar, afinal, os direitos trabalhistas atingidos pelo descumprimento de obrigações de fazer ou não fazer decorrem diretamente das normas de ordem pública e são, todos eles, direitos fundamentais não patrimoniais (PIMENTA, 2004, p. 378) – contudo, é pouco utilizada em ações individuais.
Nesse sentido, destaca-se que o empregado, embora faça parte de uma coletividade atingida, por exemplo, pelo descumprimento de normas referentes ao meio ambiente do trabalho, possui legitimidade e interesse para, por meio de ação individual, impedir a lesão ou sua continuação, no exemplo citado, obrigar o empregador a cumprir com as regras de segurança e medicina do trabalho (ROCHA, 2017, p. 163).
A respeito, Bruno Gomes Borges da Fonseca e Carlos Henrique Bezerra Leite (2014, p. 782-783), aduzem que, nesse caso, surgem as chamadas ações pseudoindividuais, formalmente individuais e materialmente coletivas – propostas por pessoas físicas, sob a roupagem individual, deduzem pretensão metaindividual, já que a relação jurídica que a sustenta é inseparável e, seu pedido, se acolhido, gerará efeitos erga omnes.
Face ao exposto, a aplicação da tutela inibitória no direito do trabalho se dá com mais razão, diante da natureza dos direitos tutelados nesse ramo do Direito, quais sejam: a vida, a saúde, a privacidade, a intimidade, a honra, o direito a não discriminação, dentre tantos outros (PIMENTA, 2004, p. 391), ou seja, o trabalhador possui direito à prevenção de ameaça, repetição ou continuação de conduta antijurídica que viole os seus direitos8.
3 A BUSCA PELA JUSTIÇA RESTAURATIVA: A EFETIVIDADE DA TUTELA INIBITÓRIA
Como visto, o processo deve ser um método de atuação do Estado que conceda ao jurisdicionado tutela jurisdicional que coincida com o direito que lhe é assegurado pela norma jurídica. Portanto, a tutela específica deve ser a padrão em um Estado Democrático de Direito, pois, prima pelo cumprimento exato da norma jurídica, proporcionando respeito e credibilidade à esta e porque há direitos que, se não exercidos da forma que estão previstos, causam mal irreparável (ABELHA, 2016, p. 670).
O ressarcimento à violação de um direito fundamental dificilmente corresponde ao efetivo “prejuízo” causado. Assim, o descumprimento das normas trabalhistas se torna verdadeiramente vantajoso ao empregador, do ponto de vista econômico, ao passo que, conforme acima mencionado, a tutela rescisória é incapaz de proporcionar efetividade à norma jurídica. Desse modo, enquanto não se tornar antieconômico os processos continuarão inefetivos, ou seja, apenas quando o empregador compreender que só lhe resta cumprir as normas terão eficácia e efetividade (PIMENTA, 2004, p. 341-342).
Desse modo, a tutela inibitória deve ser prioridade frente a tutela repressiva – meramente ressarcitória – pois, a tutela específica das obrigações de fazer ou não fazer reforça a existência dos direitos consagrados no ordenamento jurídico laboral e de recuperação do sistema processual como instrumento de atuação do direito objetivo (PIMENTA, 2004, p. 355-357).
Nesse sentido, Freire Pimenta aponta três efeitos do uso da tutela inibitória – em caráter antecipado ou não – na esfera trabalhista: 1) eliminação ou redução das vantagens práticas, econômicas e jurídicas do descumprimento das obrigações trabalhistas; 2) controle da autotutela empresária via jurisdicional; 3) eliminação de “vazios de tutela” de normas trabalhistas e direitos sociais que nunca foram respeitados por falta de instrumentos processuais idôneos para coação em caso de violação (PIMENTA, 2004, p. 380).
Assim, nota-se que é inerente à personalidade humana não ter que suportar a lesão para recorrer à tutela jurisdicional (art. 5º, XXXV, CF), ou seja, deve ser garantido ao jurisdicionado o direito à prevenção da lesão dos direitos tutelados pela norma jurídica por meio de instrumento hábil de prevenir o dano, exigindo-se do provável autor que se abstenha da prática de qualquer ato capaz de produzi-lo, ou, então, que faça algo para evitá-lo (POZZOLO, 2001, p. 90).
Portanto, a tutela inibitória representa um instrumento capaz de efetivar os direitos fundamentais à prevenção, principalmente ao meio ambiente de trabalho equilibrado, à vida, à saúde e dignidade do trabalhador (CARVALHIDO; SALIBA, 2016, p. 260), reforçando o conteúdo da norma jurídica e restaurando a efetividade da justiça, já que, despida de cunho patrimonial, preocupa-se com o efetivo cumprimento da legislação trabalhista, proporcionando efetividade a tempo e modo ao direito do trabalhador.
4. CONCLUSÃO
A partir da Constituição Federal de 1988 e, posteriormente, do CPC de 2015, o direito de ação passou a ser compreendido não apenas como o direito de ingressar com uma ação judicial ou de se obter uma sentença, mas como o direito à uma tutela jurisdicional adequada – uso de técnicas processuais adequadas ligadas ao fato levado em juízo e efetiva, uso de instrumento équo e justo capaz de assegurar os valores da norma jurídica, obtida por meio de um processo justo – alicerçado nos princípios constitucionais.
Com efeito, verificou-se que a inefetividade da Justiça do Trabalho está relacionada ao descumprimento das obrigações de fazer e não fazer contidas na legislação trabalhista. Nesse sentido, o número de novos processos ajuizados na justiça do trabalho, levantados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) nos anos de 2010 a 2017, corroboram com essa afirmação, afinal, nota-se nesses dados o aumento progressivo de demandas trabalhistas.
Acredita-se que o hábito da prática forense trabalhista de monetizar os direitos do trabalhador, ou seja, ajuizar ações repressivas, auxilia no descumprimento das normas trabalhistas pelos empregadores, ao passo que a tutela ressarcitória proveniente dessas ações não tem a capacidade de tornar antieconômico o seu descumprimento, pelo contrário, a fomenta, já que o equivalente em pecúnia jamais corresponderá ao cumprimento das obrigações contidas em lei quando diante de direitos de cunho extrapatrimonial.
Em razão disso, considerando a natureza extrapatrimonial de determinados direitos trabalhistas – honra, imagem, saúde, intimidade, dentre outros, defende-se a utilização da tutela inibitória no Processo do Trabalho, com a finalidade de atribuir efetividade à norma, já que, nas ações cujo objeto seja a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que lhes assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.
Outrossim, defende-se que, nesses casos, a tutela inibitória também seja utilizada em Reclamações Trabalhistas individuais, ou seja, ainda que pertencente a uma coletividade, o empregado é legítimo para ingressar com ação inibitória individualmente, visando a prevenção de ameaça, repetição ou continuação de conduta antijurídica que viole os seus direitos, mesmo que sob a aparência de ação individual deduza pretensão metaindividual, visto que, o acolhimento de seu pedido gera efeitos para erga omnes.
Por fim, acredita-se que a adoção da tutela preventiva deve ser prioridade frente a repressiva, visto que, como supramencionado a tutela inibitória reforça os direitos contidos na norma jurídica, prima por seu cumprimento exato e restaura sua efetividade, ao passo que reflete o direito material, representando instrumento capaz de tutelar direitos não patrimoniais do trabalhador e restaurar a efetividade da justiça. Assim, a referida tutela, desprovida de cunho patrimonial, preocupa-se com a vida do trabalhador – em sentido amplo – e com o efetivo cumprimento das normas trabalhistas, proporcionando efetividade a tempo e modo aos seus direitos.
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3A tutela inibitória pode tutelar direitos absolutos e relativos (MARINONI, 2019, p. 182).
4Justiça em números 2011: ano-base 2010. p. 248; 2012: ano-base 2011. p. 252; 2013: ano-base 2012. p. 153; 2014: ano-base 2013. p. 252; 2015: ano-base 2014. p. 252; 2016: ano-base 2015. p. 43; 2017: ano-base 2016. p. 71; 2018: ano-base 2017. p. 78.
5Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente. Parágrafo único. Para a concessão da tutela específica destinada a inibir a prática, a reiteração ou a continuação de um ilícito, ou a sua remoção, é irrelevante a demonstração da ocorrência de dano ou da existência de culpa ou dolo. Art. 498. Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cumprimento da obrigação. Parágrafo único. Tratando-se de entrega de coisa determinada pelo gênero e pela quantidade, o autor individualizá-la-á na petição inicial, se lhe couber a escolha, ou, se a escolha couber ao réu, este a entregará individualizada, no prazo fixado pelo juiz. Art. 499. A obrigação somente será convertida em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente. Art. 500. A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa fixada periodicamente para compelir o réu ao cumprimento específico da obrigação.
6Art. 84. Na ação que tenha por objeto o cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento. § 1° A conversão da obrigação em perdas e danos somente será admissível se por elas optar o autor ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente. § 2° A indenização por perdas e danos se fará sem prejuízo da multa (art. 287, do Código de Processo Civil). § 3° Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu. § 4° O juiz poderá, na hipótese do § 3° ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando prazo razoável para o cumprimento do preceito. § 5° Para a tutela específica ou para a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz determinar as medidas necessárias, tais como busca e apreensão, remoção de coisas e pessoas, desfazimento de obra, impedimento de atividade nociva, além de requisição de força policial.
7A vedação de prisão por dívida não se aplica, uma vez que, a interpretação do art. 5º, LXVII da CF deve ser elevada a um nível que considere os direitos fundamentais. Não permitir a prisão como forma de coerção indireta é consentir que o ordenamento jurídico apenas proclame direitos que não podem ser efetivamente tutelados (MARINONI, 2019, p. 245-246)
8Por exemplo, direito a um meio ambiente de trabalho saudável, o direito a não ser discriminado, o direito a não sofrer assédio moral no ambiente de trabalho, o direito a não sofrer revista íntima, dentre outros.
1Pós-graduanda em Direito Individual e Processual do Trabalho pela Faculdade de Direito de Vitória – FDV. Advogada.
2Professor Adjunto da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) na Graduação e no Mestrado. Doutor e Mestre em Direito e Processo do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas). Membro do Colegiado do Curso de Direito da UFES. Coordenador e Pesquisador do Grupo de Pesquisa Trabalho, Seguridade Social e Constitucionalismo: diálogos e críticas (UFES-CNPq). Membro da Rede Nacional de Grupos de Pesquisas e Estudos em Direito do Trabalho e da Seguridade Social (RENAPEDTS). Membro do Instituto de Ciências Jurídicas e Sociais (ICJS). Pesquisador. Autor de livros e artigos publicados no Brasil e no Exterior. Advogado.