REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7942042
Luciano Aquino Rodrigues
RESUMO
O estudo tem como temática: “A superlotação dos estabelecimentos penais brasileiros: Da gestão dos presídios às condições de segurança e qualidade de vida”. É importante mencionar que a desestruturação do sistema prisional evidencia o descaso da prevenção e da reabilitação do preso, contribuindo de maneira negativa no agravamento desse problema, impedindo qualquer tipo de ressocialização e atendimento à população carcerária. Dessa forma, a metodologia escolhida para a realização deste trabalho é de caráter descritivo e de natureza bibliográfica, com abordagem qualitativa. Fundamentalmente, levou-se em consideração ideias de autores que tratam do assunto embasamento e aprofundamento da temática. Diante de tudo exposto nesse estudo fica evidente que o direito à educação e ao trabalho, que estão vinculados à formação e ao desenvolvimento da personalidade do preso, são direitos sociais de grande significação. Por meio do relato das respostas fica possível perceber que a superlotação é um agravante para os problemas relacionados dentro da penitenciária, pois devido ao grande número detentos, eles ficam mais vulneráveis às doenças, principalmente, relacionados às doenças sexualmente transmissíveis e outras mazelas.
Palavras-chave: Prisão. Presídio. Sistema prisional. Direitos.
INTRODUÇÃO
A superlotação carcerária no Brasil é um problema muito expressivo dentro dos estabelecimentos de ressocialização, apesar de nossas leis ressaltarem direitos e garantias criadas especialmente para o preso e a melhor forma de cumprimento de sua pena, na maioria dos casos, essas leis não são efetivadas de forma positiva em favor do preso.
Dessa forma, a falta de investimento público é um grande fator que impede a solução da superlotação. Há necessidade de construção de novos estabelecimentos no Brasil com infraestrutura capaz de proporcionar a ressocialização do condenado e que o mesmo tenha condições de sobrevivência de forma digna e humana. Este porém, não é a única solução existente para resolver o problema da superlotação do sistema prisional. Outras são apontadas por especialistas conforme escreve Barbosa (PORTO, 2007, p. 20).
Dentro do processo de análise sobre a superlotação dos estabelecimentos brasileiros, fica evidente que a desestruturação do sistema prisional evidencia o descaso da prevenção e da reabilitação do preso, contribuindo de maneira negativa no agravamento desse problema, impedindo qualquer tipo de ressocialização e atendimento à população carcerária. Além disso, é notória a superlotação dos estabelecimentos, déficit de vagas, não ressocialização, crime versos pobreza.
Este estudo tem como objetivo principal: analisar as principais dificuldades e impasses do caráter reincidência em virtude do número de encarcerados no Brasil, bem como, parte de objetivos específicos: Refletir sobre as causas e as consequências da superlotação nos estabelecimentos brasileiros; Reconhecer o perfil do carcerário nos estabelecimentos brasileiros; Destacar as leis que regem sobre o sistema carcerário brasileiro e de que forma elas se efetivam na prática.
Este estudo é muito importante atualmente, pois dentro dessa análise acerca da superlotação dos estabelecimentos brasileiros, é de extrema importância que se destaque que o problema superlotação não pode ser questionado de forma única, tendo em vista que esse problema pode ser concebido como um fato gerador de diversos outros males, que aflige a população carcerária como doenças, rebeliões, motins, mortes, insalubridade, higiene, dentre outras.
A superlotação das celas, sua precariedade e sua insalubridade tornam as prisões num ambiente propício à proliferação de epidemias e ao contágio de doenças. Todos esses fatores estruturais aliados ainda à má alimentação dos presos, seu sedentarismo, o uso de drogas, a falta de higiene e toda a lugubridade da prisão, fazem com que um preso que adentrou lá numa condição sadia, de lá não saia sem ser acometido de uma doença ou com sua resistência física e saúde fragilizadas. Assim, os presos adquirem as mais variadas doenças no interior das prisões. As mais comuns são as doenças do aparelho respiratório, como a tuberculose e a pneumonia.
Portanto, com a concretização de tal estudo se espera que o mesmo contribua para que, não só os profissionais que atuam na área do Direito, mas também, todos aqueles que tiverem acesso a tal documento, a oportunidade de estarem constantemente revendo novas questões sobre o sistema carcerário brasileiro e as consequências da superlotação, contribuindo assim, para que novos debates e discussões sejam desenvolvidas, visando ampliar cada vez mais a análise e abordagem do tema proposto, apresentando soluções, por exemplo, a redução do número de presos nas celas, visando otimizar o processo ressocializador dos carcerários.
Inicialmente, no primeiro capítulo, apresenta-se algumas informações sobre o sistema prisional brasileiro, discorrendo sobre a legislação, direitos e garantias das quais os detentos possui e de que forma esses direitos são resguardados no Brasil.
Logo após, no segundo é feita uma abordagem constitucional da superlotação nos presídios brasileiros, evidenciando os principais problemas gerados a partir desse fenômeno e como isso afeta tanto o detento como os serviços prestados pela penitenciária.
O terceiro capítulo discorre sobre os procedimentos metodológicos que foram utilizados na construção da presente pesquisa.
Por fim, apresenta-se às considerações finais acerca do estudo desenvolvido, oportunizando para que novos estudos sejam desenvolvidos a fim de ampliar a temática aqui abordada.
1 O SISTEMA PRISIONAL NO BRASIL
O sistema prisional brasileiro é conhecido por não recuperar o condenado assim como é proposta a sua finalidade, além do mais, replica as habilidades dos indivíduos para o crime. A realidade é cruel e fere todos os princípios constitucionais exigidos.
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, inciso XLIX dispõe que é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral” e também proíbe em seu mesmo artigo, inciso XLVII a aplicação de penas cruéis e degradantes. É de salientar também que o artigo 1º da Lei de Execução Penal dispõe a necessidade de proporcionar condições favoráveis para a harmônica integração social entre os presos, evidenciando-se, assim, a total proibição de tratamentos desumanos que violem a dignidade da pessoa. (BITENCOURT, 2007, p.17).
A situação é caótica, os reclusos estão sujeitos a uma situação degradante, amontoados em celas minúsculas, sem dormitório para todos, em alguns casos o lavabo não dota de nenhuma privacidade, as celas são úmidas e insalubres e a ociosidade não contribui para o abandono ao crime. O que fica evidenciado é o total descaso e abandono por parte do Estado e a impossibilidade de ressocialização.
Frequentemente as penitenciárias são palco de rebeliões violentas entre gangues rivais que comandam o crime de dentro dos presídios. Algumas rebeliões também são ocasionadas pelo fato da população carcerária sobrepor ao número de vagas no presídio.
As penas deveriam servir como processo de mudança e reinserção social, entretanto, não é o que ocorre. O cárcere é degradante, não regenera, não educa, não cumpre nada além que tornar os reclusos mais revoltados e replicadores do crime. Assim Sérgio Salomão Shecaira elucida:
A pena é privativa de liberdade, e não privativa da dignidade, do respeito e de outros direitos inerentes à pessoa humana […] Ademais, é através da forma de punir que se verifica o avanço moral e espiritual de uma sociedade, não se admitindo, pois, em pleno limiar do século XX, qualquer castigo que fira a dignidade e a própria condição do homem, sujeito de direitos fundamentais invioláveis. (SALOMÃO, 2006, p.80).
Um trecho da CPI do sistema carcerário descreve de forma relevante a situação de superlotado:
[…] homens seminus gemendo diante da cela entupida com temperaturas de até 50 graus. Em outros estabelecimentos, redes sobre redes em cima de camas ou do lado de fora da cela em face da falta de espaço. Mulheres com suas crianças recém- nascidas espremidas em celas sujas. Celas com gambiarras, água armazenada, fogareiros improvisados, papel de toda natureza misturados com dezenas de homens. Celas escuras, sem luz, com paredes encardidas cheias de “homens- morcego”. Dezenas de homens fazendo suas necessidades fisiológicas em celas superlotadas sem água por dias a fio. Homens que são obrigados a receber suas mulheres e companheiras em cubículos apodrecidos. (ASSIS, 2007, p. 247)
Dentro desse contexto, Thompson (2002, p. 109/110) declara “quase inviável resolver esse problema, mesmo que se eleve o numero de terapeutas e guardas, além de qualificação para ambos, o autor não acredita que haja outro fim senão o fracasso”. Diante disso, pode-se ressaltar que a única forma de recuperar os estabelecimentos para este autor é começar as mudanças pelas estruturas sócio-político-econômicas.
Dessa forma, a falta de investimento público é um grande fator que impede a solução da superlotação. Há necessidade de construção de novos estabelecimentos no Brasil com infraestrutura capaz de proporcionar a ressocialização do condenado e que o mesmo tenha condições de sobrevivência de forma digna e humana. Este porém, não é a única solução existente para resolver o problema da superlotação do sistema prisional. Outras são apontadas por especialistas conforme escreve Barbosa (PORTO, 2007, p. 20).
Nessa perspectiva, a descriminalização das condutas de menor potencial ofensivo, a aplicação de penas alternativas (especialmente as que implicam na prestação de serviços à comunidade), o estímulo da “transação penal” nos juizados especiais (cíveis e criminais) e a suspensão condicional da pena (conhecida como sursis) são os caminhos mais aventados, no momento, para evitar o encarceramento.
Tendo em vista as importantes ressalvas, Fernando Capez aborda com seriedade em sua obra, que “o Estado Democrático de Direito não apenas pela proclamação formal da igualdade entre todos os homens, mas pela imposição de metas e deveres quanto à construção de uma sociedade livre, justa e solidaria”. (CAPEZ, 2010)
Desse modo, vale mencionar que o sentimento de impunidade que percorre todos os estratos sociais também estimula os tribunais a agir com rigor acentuado, muitas vezes maior que o próprio espírito da lei. A esse respeito, Assis (2007, p.88) que “a realidade, quanto ao sofrimento dentro dos presídios, é muito diverso da estabelecida em Lei”. Expressando ainda que:
Dentro da prisão, dentre várias outras garantias que são desrespeitadas, o preso sofre principalmente com a prática de torturas e de agressões físicas. Essas agressões geralmente partem tanto dos outros presos como dos próprios agentes da administração prisional. O despreparo e a desqualificação desses agentes fazem com que eles consigam conter os motins e rebeliões carcerárias somente por meio da violência, cometendo vários abusos e impondo aos presos uma espécie de disciplina carcerária que não está prevista em lei, sendo que na maioria das vezes esses agentes acabam não sendo responsabilizados por seus atos e permanecem impunes.
Diante desse pensamento, fica a certeza de que ocorrem várias ofensas à dignidade da pessoa dentro dos estabelecimentos prisionais, fugindo do controle dos órgãos responsáveis, ou até mesmo, a situação de ambos serem coniventes com o problema. Esse problema acarreta a várias consequências dentro do contexto social, psicológico e emocional.
O art. 85 da Lei de Execução Penal prevê que deve haver compatibilidade entre a estrutura física do presídio e a sua capacidade de lotação, entretanto, a superlotação tem como efeito imediato não só a violação das normas da LEP, mas também, de princípios constitucionais.
Referente à superlotação prisional expõe o autor Camargo (2006, p.55) que:
As prisões encontram-se abarrotadas, não fornecendo ao preso a sua devida dignidade. Devido à superlotação muitos dormem no chão de suas celas, às vezes no banheiro, próximo a buraco de esgoto. Nos estabelecimentos mais lotados, onde não existe nem lugar no chão, presos dormem amarrados às grades das celas ou pendurados em rede.
Contudo, a superlotação prisional no Brasil é diversa do artigo 85 da Lei de Execução Penal, o qual prevê, “O estabelecimento penal deverá ter lotação compatível com a sua estrutura e finalidade”.
Nas expressões de Assis (2007, p.67), em relação ao descaso nos presídios, diz que:
A superlotação das celas, sua precariedade e sua insalubridade tornam as prisões num ambiente propício à proliferação de epidemias e ao contágio de doenças. Todos esses fatores estruturais aliados ainda à má alimentação dos presos, seu sedentarismo, o uso de drogas, a falta de higiene e toda a lugubridade da prisão, fazem com que um preso que adentrou lá numa condição sadia, de lá não saia sem ser acometido de uma doença ou com sua resistência física e saúde fragilizadas.
Por tudo isso, a Lei de Execução Penal em seus artigos 12 e 14 o preso ou internado, terá assistência material, em se tratando de higiene, a instalações higiênicas e acesso a atendimento médico, farmacêutico e odontológico. No entanto, a realidade atual não é bem assim, pois muitos dos presos estão submetidos a péssimas condições de higiene.
É importante destacar ainda o pensamento do jurista Fernando Capez, que acredita que a solução para o sistema penitenciário brasileiro seria a privatização do sistema penitenciário, seria a melhor solução para melhora das condições de vida dos detentos, vejamos em (CAPEZ, Fernando. Entrevista concedida a revista DATAVENI@, ano VI, Nº 55, março de 2002):
É melhor que esse lixo que existe hoje. Nós temos depósitos humanos, escolas de crime, fábrica de rebeliões. O estado não tem recursos para gerir, para construir os presídios. A privatização deve ser enfrentada não do ponto de vista ideológico ou jurídico, se sou a favor ou contra. Tem que ser enfrentada como uma necessidade absolutamente insuperável. Ou privatizamos os presídios; aumentamos o número de presídios; melhoramos as condições de vida e da readaptação social do preso sem necessidade do investimento do Estado, ou vamos continuar assistindo essas cenas que envergonham nossa nação perante o mundo. Portanto, a privatização não é a questão de escolha, mas uma necessidade indiscutível é um fato.
Esses problemas nos levam a refletir sobre a dignidade humana e a qualidade de vida encontrada nos presídios brasileiros, destacando aspectos que contribuem de maneira positiva na qualidade de vida do encarcerado.
A superlotação dos presídios é, certamente, um dos problemas mais graves que contribui para sucatear o sistema penitenciário. Cada vez mais a população carcerária cresce e um número insuficiente de presídios é construído para atender à demanda das condenações. A demora na concessão de benefícios aos condenados, o abandono dos mesmos por parte do Estado e demais operadores do Direito, sobretudo os advogados, acaba sendo uma das principais variáveis que contribui com o problema da superpopulação carcerária. (RABELO, 2011)
2 A SUPERLOTAÇÃO DOS ESTABELECIMENTOS PENAIS BRASILEIROS
O sistema prisional é parte do conjunto de mecanismos de controle social que uma sociedade mobiliza para punir a transgressão da lei. Nesse sentido, o significado ideológico do sistema prisional brasileiro muitas vezes é utilizado como instrumento de exclusão ao definir condutas que objetivam conter as classes sociais inferiores. Resolve-se o problema da (in)segurança pública encarcerando indivíduos das classes subalternas, os mais pobres, os desprovidos das políticas públicas e injustiçados pelo sistema econômico e social (WACQUANT, 2001).
Dessa forma, é importante mencionar que são vários os direitos e garantias fundamentais elencadas na Constituição Federal de 1988. No caso em estudo, a Carta Magna em seu artigo 5º, XLVII e XLIX, proíbe as penas cruéis, garante ao cidadão-preso o respeito à integridade física e moral (BRASIL, 2011).
Com isso, são dispositivos que têm eficácia e aplicabilidade imediata, e estão baseados no princípio da dignidade humana, que além de compor um dos princípios basilares do direito pátrio, trata-se de um dos fundamentos da Lei do Maior. Também, a Lei de Execução Penal, em seus incisos I a XV do artigo 41, dispõe sobre os direitos infraconstitucionais garantidos ao sentenciamento no decorrer da execução penal. (RABELO; VIEGAS; RESENDE, 2011)
Segundo o artigo 10 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, “toda pessoa privada de sua liberdade deverá ser tratada com humanidade e respeito à dignidade inerente à pessoa humana”. Para MORAES (2000, p. 50-51), o princípio fundamental consagrado pela Constituição Federal da dignidade da pessoa humana apresenta-se em uma dupla concepção:
Primeiramente, prevê um direito individual protetivo, seja em relação ao próprio estado, seja em relação aos demais indivíduos. Em segundo lugar, estabelece verdadeiro dever fundamental de tratamento igualitário dos próprios semelhantes. Esse dever configura-se pela exigência do indivíduo respeitar a dignidade de seu semelhante tal qual a Constituição federal exige que lhe respeitem a própria. A Concepção dessa noção de dever fundamental resume-se a três princípios do direito romano: honestere (vive honestamente), alterum nonlaedere (não prejudique ninguém) e suum cuique tribuere(dê a cada um o que lhe é devido).
Nesse sentido, enquanto, SARLETE (2005, p. 124) conceitua o princípio da dignidade da pessoa humana, como sendo:
O reduto intangível de cada indivíduo e, neste sentido, a última fronteira contra quaisquer ingerências externas. Tal não significa, contudo, a impossibilidade de que se estabeleçam restrições aos direitos e garantias fundamentais, mas que as restrições efetivadas não ultrapassem o limite intangível imposto pela dignidade da pessoa humana.
Segundo SARLETE (2005, p. 125), muitas vezes o preso deixa de ser visto como “cidadão que tem assegurado todas as garantias constitucionais, pelo simples fato de estar privado de sua liberdade, o que não pode mais ser tolerado”. O cidadão-preso precisa ser reconhecido como ser dotado de dignidade, entendendo-se esta como qualidade inerente à essência do ser humano, bem jurídico absoluto, portanto, inalienável, irrenunciável e intangível.
Vale mencionar que CARVALHO (2001, p. 192-193) considera que é preciso compreender que o preso conserva os demais direitos adquiridos enquanto cidadão, que não sejam “incompatíveis com a “liberdade de ir e vir”, à medida que a perda temporária do direito de liberdade em decorrência dos efeitos de sentença penal refere-se tão-somente à locomoção. Isso, invariavelmente, não é o que ocorre”.
Desse modo, ressalta DEMARCHI (2008, p. 1), não se pretende um exagerado endeusamento do réu, […] mas apenas o reconhecimento de que direitos e garantias fundamentais devem ser reconhecidos, protegidos e concretizados. Que não significa aprovação e tampouco tolerância com o que por vezes é intolerável, dos acertos e erros de nossos pares. Os direitos fundamentais estão postos e estendem-se a todos os cidadãos, inclusive ao preso, mas estão longe de serem (re) conhecidos.
Vale mencionar também que como também, ressalta DEMARCHI (2008, p. 2), não há dúvida de que a sociedade está “se tornando mais complexa, buscando interesses dos mais diversos, ante as inúmeras possibilidades existentes, para o reconhecimento dos direitos fundamentais”. Porém, somente a previsão legal não é suficiente para a mudança de comportamentos; por si só não resolve problemas sociais, embora permite a criação de políticas conscientes objetivando a realização do seu conteúdo.
Além do já citado 5º, XLVII, da Constituição Federal de 1988. “o direito dos presos à integridade física e moral, encontra-se também previsto no Código Penal, artigo 38: “o preso conserva todos os direitos atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral” (BRASIL, 2011).
No entanto, em seu artigo na Revista Jurídica Consulex, n. 346, MATOS (2011, p. 59), afirma com propriedade que:
Embora a insistência do legislador em defender tal garantia, os responsáveis por torná-la efetiva têm se furtado ao cumprimento dos comandos constitucionais e infraconstitucional, não importa se se trata de atribuição conferida ao Poder Judiciário ou ao Poder Executivo, ou ainda de dever inerente à coletividade em geral. Não faltam leis. Muito pelo contrário, sobram leis. O que falta é conscientização acerca do seu necessário cumprimento.
Dessa forma, a superlotação dos presídios mostra a realidade brasileira; locais sem ventilação e insalubres, carcereiros violentos e despreparados exercendo a função punitiva de modo arbitrário; a prática de torturas e abuso sexual pelos detentos tidos como “chefões” contra seus colegas de cela; a falta de estabelecimentos prisionais distintos, para cumprimento da pena de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado, viola a garantia fundamental prevista na CF/1988 (MATOS, 2011).
Portanto, o que se constata diante das condições carcerárias no Brasil, afirma PRACIANO (2007, p. 81-82) é que:
A punição não consiste tão somente na privação de liberdade do criminoso, e sim em estar encarcerado em uma prisão com condições inabitáveis para um ser humano, visto que o criminoso fica preso no estabelecimento prisional para receber a pena, mas não somente para cumprir a pena.
Dentro desta perspectiva, o Estado se sente cumpridor do seu papel, por amontoar os presos nos estabelecimentos prisionais, assim a sociedade se sente “protegida”. Na verdade, a sociedade livre encontra-se separada, por muralhas e trancas, daqueles que violaram o contrato social. E para isso não importa quantos criminosos estejam nas prisões e em que condições eles estejam inseridos; não importa se o estabelecimento prisional excedeu a sua capacidade de lotação, muito menos se há limite ao número de excedentes.
Nesse contexto, fica comprovada se “as condições da prisão já são precárias, o excessivo contingente carcerário contribui sobre maneira para acentuar as mazelas na vida dos presos, violando direitos mais elementares, como o de dormir” (PRACIANO, 2007, p. 83).
Ressalta TOURINHO NETO (2009, p. 57), “a falta de vagas faz com que os presos, como é de todos sabido, se amontoem em pequenos espaços, vivendo como animais”. Daí a importância de um olhar compassivo sobre encarcerados nos presídios brasileiro. A esse respeito, NEDER (2009, p. 1) sustenta que:
Os reclames pelo aumento do número de vagas nos presídios, modernização, reaparelhamento do sistema de justiça criminal vêm acompanhados de uma indecisão pendular que atravessa toda a história republicana brasileira, e cujas implicações devem ser buscadas num tempo histórico bem anterior: exige-se modernização técnica e de procedimentos para punição, seguindo os ventos das inovações aplicadas pelas políticas liberalizantes relativas aos direitos (de cidadania e direitos humanos) nas formações históricas das duas margens do Atlântico,desde fins do século XVIII; e, ao mesmo tempo, quer-se uma política de controle e disciplinamento das classes populares rígida, autoritária e altamente repressiva.
Nessa perspectiva, o Brasil carece de novos presídios para aliviar a superlotação, pois, selas com poucos metros quadrados chegam a ter vários presos tornando assim, uma situação gravíssima, para não dizer deprimente, “contribuindo ainda mais para desenvolver o caráter violento do indivíduo e seu repúdio à sociedade que ele acusa de tê-lo colocado ali” (DROPA, 2003, p. 5).
Uma medida para amenizar a superlotação dos presídios seria a realização de mutirões para verificar a situação dos detentos, fazer uma reavaliação dos processos criminais, com objetivo de averiguar aqueles que fazem jus a concessão benefícios como a progressão de regime ou liberdade condicional. No entanto, essa alternativa seria apenas um paliativo ante a inexistência de projetos de ressocialização, pois os detentos, uma vez soltos, acabam retornando para a criminalidade e assim para o sistema penitenciário, na forma de um círculo vicioso (RABELO; VIEGAS; RESENDE, 2011).
3 METODOLOGIA
O presente estudo baseou-se em uma pesquisa bibliográfica, elaborada a partir de material já publicado, constituído principalmente de livros, artigos de periódicos e materiais disponibilizados na Internet e de uma pesquisa de campo, com objetivo de oferecer maior contato com o público-alvo e aproximação com o fenômeno estudado. Este tipo de pesquisa segundo Minayo (2021, p.75), “buscam retratar a realidade de forma complexa e profunda”.
Em relação à sua natureza, será desenvolvida uma pesquisa qualitativa que de acordo com Minayo (2021, p.61 e 22) “caracteriza-se como tentativa de uma compreensão detalhada dos significados e características situacionais apresentadas pelos entrevistados”. Nesse sentido, nos permite trabalhar com os sentimentos e falas dos envolvidos no estudo.
A pesquisa bibliográfica é uma etapa fundamental em todo trabalho científico que influenciará todas as etapas de uma pesquisa, na medida em que o referencial o teórico serve de base para a fundamentação desse trabalho, uma vez que consistem no levantamento, seleção, fichamento e arquivamento de informações relacionadas à pesquisa. Dessa forma, a metodologia escolhida para a realização deste trabalho é de caráter descritivo e de natureza bibliográfica, com abordagem qualitativa.
Nesse sentido, para que o estudo em foco fosse realizado de maneira consciente, responsável e respeitando os princípios éticos, desenvolveu-se a pesquisa utilizando como instrumento de coleta de dados livros, revistas, dicionários, artigos científicos, apostilas, Internet e outras fontes, levando-se em consideração obras de autores pertinentes ao tema.
Logo após consulta e análise de bibliografias, procedeu-se à elaboração do artigo científico, dando ênfase à opinião dos autores mencionados, bem como, a relevância de fatores e aspectos relacionados aos objetivos propostos neste trabalho.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante de tudo exposto nesse estudo fica evidente que a superlotação carcerária no Brasil é um problema muito expressivo dentro dos estabelecimentos de ressocialização. Entretanto, é importante mencionar que apesar de nossas leis ressaltarem direitos e garantias criadas especialmente para o preso e a melhor forma de cumprimento de sua pena, na maioria dos casos, essas leis não são efetivadas de forma positiva em favor do preso.
Dentro do processo de análise sobre a superlotação dos estabelecimentos brasileiros, fica evidente que a desestruturação do sistema prisional evidencia o descaso da prevenção e da reabilitação do preso, contribuindo de maneira negativa no agravamento desse problema, impedindo qualquer tipo de ressocialização e atendimento à população carcerária. Nesse sentido, é de extrema importância a superlotação dos estabelecimentos, déficit de vagas, não ressocialização, crime versos pobreza.
Nessa perspectiva, ficou evidente ao longo do trabalho que o direito à educação e ao trabalho, que estão vinculados à formação e ao desenvolvimento da personalidade do preso, são direitos sociais de grande significação. Nesse sentido, é importante mencionar que as oportunidades educacionais e de treinamento também são escassas, fazendo com que os presos tenham poucas atividades construtivas para canalizar suas energias.
Por meio do relato das respostas fica possível perceber que a superlotação é um agravante para os problemas relacionados dentro da penitenciária, pois devido ao grande número detentos, eles ficam mais vulneráveis às doenças, principalmente, relacionados às doenças sexualmente transmissíveis e outras mazelas.
Deve-se pensar em políticas públicas que contribuam de forma relevante na promoção de ações e estratégias que sejam desenvolvidas dentro do espaço presidiário para que possa assegurar a promoção de um ambiente favorável as boas condições de vida e que os direitos previstos na legislação sejam assegurados.
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