THE SITUATION OF THE PRISON POPULATION IN THE INTERIOR OF AMAZONAS
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th10249131218
Araujo Vieira, Klewerton¹
RESUMO
O presente artigo tem por finalidade analisar e compreender a situação da população carcerária no interior do Estado do Amazonas. O tema apresentado busca apresentar informações situacionais de pesquisas, artigos, sites e outros, para entender o contexto prisional, suas deficiências, dificuldades e questões de melhoria no que tange as Pessoas Privadas de Liberdade (PPL). Por fim, este conteúdo buscará apresentar para o leitor a situação vivida pelos custodiados e também as dificuldades dos Agentes de Segurança Pública do Estado Amazonense no contexto do controle e espaço das pessoas cerceadas da liberdade.
Palavras–chave: Unidades Prisionais, Pessoas Privadas de Liberdade (PPL), Segurança Pública, Amazonas, Carceragem.
ABSTRACT
The purpose of this article is to analyze and understand the situation of the prison population in the interior of the State of Amazonas. The theme presented seeks to present situational information from research, articles, websites and others, to understand the prison context, its deficiencies, difficulties and improvement issues regarding Persons Deprived of Liberty (PPL). Finally, this content will seek to present to the reader the situation experienced by those in custody and also the difficulties faced by Public Security Agents in the context of the control and space of people restricted from their freedom.
Keywords: Prison Units, Persons Deprived of Liberty (PPL), Public Security, Amazonas, Prison.
1. INTRODUÇÃO
A crise carcerária vivida no Brasil é comumente noticiada nas grandes mídias, superlotações, rebeliões, fugas nas unidades prisionais são recorrentes. É sabido por todos que o nosso País caminha à passos lentos no contexto das Pessoas Privadas de Liberdade (PPL).
Nesse sentido, o Estado do Amazonas é uma das Unidades Federativas mais atípicas de nosso solo, por se tratar do maior em área territorial em seus mais de um milhão e quinhentos mil quilômetros quadrados, é mais extenso até que países como a Alemanha, Japão e outros.
No início do ano de 2017, a capital Manaus foi palco de uma rebelião e fuga em uma de suas unidades prisionais, em que membros de facções criminosas ceifaram a vida de seus rivais e além disso, muitos detentos se evadiram do espaço de privação. Passados mais de sete anos do fato, muito se foi feito após o ocorrido, porém, as ações foram somente privadas nas Unidades da Capital e de Itacoatiara, distante da sede cerca de duzentos e setenta quilômetros no modal terrestre.
Nessa senda, houve uma reestruturação no sistema prisional da Capital Manaus, empresas especializadas na coordenação e controle de presídios foram contratadas por processo licitatório em contratos milionários, e dessa forma, o Estado passou a terceirizar a mão de obra melhorando significativamente o contexto das Pessoas Privadas de Liberdade, inclusive dando oportunidades de emprego, dignidade e integração do interno.
Apesar da constante melhora nos estabelecimentos prisionais da capital, não há a mesma perspectiva quanto ao interior do Estado, dentre os 62 (sessenta e dois municípios) do grande Estado, apenas 7 (sete) possuem unidades para mais de cem pessoas (não considerando Manaus), conforme o exposto pela Secretaria de Administração Penitenciária do Amazonas (SEAP) em seu sítio eletrônico.
Do exposto, ainda sobram 55 (cinquenta e cinco) municípios e todos eles sem unidades de carceragem coordenadas pela SEAP. Esse é o grande cerne do tema, os custodiados que cometem infrações penais enquanto não tem o seu processo julgado, permanecem em Distritos Integrados de Polícia (DIP), sob a tutela do Delegado, Investigador, Escrivão fugindo da atribuição final do Agentes Policiais, enquanto os PPL seguem aguardando o seu julgamento, transferência e outras diligências.
É alarmante a situação crítica do interior do Estado do Amazonas no contexto da segurança pública, em certas Delegacias não há efetivo suficiente para o controle dos apenados, e em muitos dos casos é necessário solicitar apoio da Prefeitura Municipal, na figura dos Guardas Municipais para tentar dividir as tarefas no âmbito das Delegacias.
Dessa forma, como o tema é amplo e cheio de variações e detalhes, delimitou-se este artigo para o interior do Amazonas, que especialmente por sua vasta extensão territorial e peculiaridades vem sofrendo a crise em estado de atenção e vigilância.
2.DESENVOLVIMENTO
2.1 A CRISE DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO:
Muitas são as fontes que tratam sobre a crise de nosso sistema prisional, é notório que o fato vem se alastrando quantitativamente em grande escala, dessa forma, é necessário entender o contexto nacional para que se possa trazer para a região interiorana do Amazonas.
A grande quantidade de delitos vem aumentando de forma rápida e contínua, e tem se tornando um grande problema para as nossas grandes cidades. Essa proporção é imediata, ou seja, enquanto aumenta a criminalidade consequentemente o número de internos em presídios cresce. Nesse sentido, é citável que já não é mais um problema do judiciário e sim um problema social, o criminoso passou a ver que de suas teorias que o crime está compensando e pelo o que estamos analisando do contexto atual, em certas proporções, não há tantas unidades prisionais sendo construídas e em um futuro tão imediato não haverá espaços para comportar tantos delituosos.
Conforme o exposto por Andrews de Medeiros F., em seu artigo Segurança Pública e a Crise no Sistema Prisional Brasileiro, “a Segurança Pública no Brasil apresenta falhas, as quais relacionam-se diretamente com o caos no sistema penitenciário, é necessário buscar compreender a ineficácia do sistema prisional brasileiro, pois há uma enorme quantidade de apreensões diariamente, mas contra a lógica esse fator não tem reduzido em nada a criminalidade no país”.
As falhas citadas por Andrews de Medeiros, são consequentemente iguais as desenvolvidas no Amazonas e conforme desenvolve (Andrews, 2023 apud Villegas, 2016) “ que a população carcerária cresce muito e poucos presídios são construídos para amenizar a situação da superlotação. Dentro das penitenciárias ocorre pouca ventilação, não existe iluminação, a água dura poucas horas por dia. Existem casos de presos dormindo em redes amarradas ou penduradas nas celas por não existir espaço para deitar. Doenças se proliferam rapidamente devido ao atendimento médico precário. Ou seja, a superlotação viola as normas e princípios constitucionais encontrados na Lei de Execução Penal (LEP), Art. 88 que estabelece que o condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório. São requisitos básicos da unidade celular: salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana; área mínima de 6,00m². ”
Das características citadas pelos autores, podemos chegar a um denominador comum que não é um problema do Estado do Amazonas, porém, as características das Unidades Prisionais são as mesmas, quanto ao espaço por custodiado, condições mínimas de higiene dentre outros.
2.2 A CRISE DO SISTEMA PENITENCIÁRIO DO AMAZONAS DE 2017:
No início do ano de 2017, os Amazonenses foram surpreendidos com os noticiários jornalísticos divulgando que havia acontecido o maior massacre e fugas no sistema prisional do Amazonas, no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj). Conforme noticiou o site G1, a ação foi uma cadeia de procedimentos adotados de maneira errônea que consequentemente resultou na rebelião.
Para sintetizar os fatos, a rebelião teve início na tarde do primeiro domingo de 2017. Conforme abordou a Secretaria de Segurança Pública (SSP-AM), tratou-se de uma possível briga entre facções. A movimentação no presídio começou ainda no início da tarde de domingo. De acordo com informações da SSP, os corpos de seis pessoas foram jogados para fora do presídio, sem as cabeças. Até a noite do mesmo dia a SSP-AM afirmou que 12 agentes carcerários foram mantidos reféns. Outros funcionários que estavam na unidade prisional conseguiram escapar.
A notícia se espalhou pelo mundo, (G1, Globo, 2017) conforme divulgado em jornais, como exemplo, no Reino Unido, a rede BBC falou da fuga de presidiários durante a rebelião e lembra que o Brasil tem a quarta maior população carcerária do mundo. Na Itália, o La Republica destacou a brutalidade do motim. O espanhol El País lembrou que a região Norte, onde fica o presídio, tem rotas importantíssimas para o tráfico de drogas no continente. A notícia também foi destaque fora da Europa. Na Argentina, o La Nación afirmou que o Brasil registra motins com frequência porque os presídios estão cheios e em péssimas condições. O Usa Today, o jornal de maior circulação dos Estados Unidos, traz a rebelião na capa da sua edição online. O também americano Washington Post descreveu o caso como um desastre sangrento e diz que grupos de direitos humanos criticam a violência e a superlotação das penitenciárias brasileiras.
A partir desse contexto, os olhos do Brasil e do mundo foram voltados para a região amazônica com o intuito de resgatar a paz da população e do sistema prisional. Muitas foram as falhas até que se chegasse ao dia final da rebelião, haviam muitas regalias e facilidades para os custodiados, mesmo sendo uma empresa terceirizada à época, chamada UMMANIZARE, as situações das Unidades eram insalubres e o acontecimento era questão de tempo para acontecer.
2.3 A ADMINISTRAÇÃO PENITENCIÁRIA NO AMAZONAS:
Atualmente quem administra as Unidades Prisionais do Amazonas é a Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (SEAP), sendo as Unidades Prisionais da região Metropolitana de Manaus (possui mão de obra terceirizada, empresas New Life, Reviver e RH Multi); A Unidade Prisional de Tabatinga; Unidade Prisional de Itacoatiara (terceirizada); Unidade Prisional de Maués (em fase de entrega); Unidade Prisional de Parintins; Unidade Prisional de Tefé; Unidade Prisional de Coari e Unidade Prisional de Humaitá.
Os desafios são grandes para a SEAP, dentre a administração penitenciária, dos municípios que não possuem complexo prisional, e que os custodiados permanecem em DIP’s é de atribuição da Secretaria a alimentação de todas as PPL, compreendendo um desjejum, almoço, janta e ceia.
Conforme informado em seu sítio eletrônico, além da atribuição informada acima, o órgão possui a aplicação das normas de execução penal no âmbito estadual; a supervisão, coordenação e controle do sistema penitenciário e também do sistema socioeducativo através da reintegração social do apenado; implantação e implementação da execução das penas não privativas de liberdade e das medidas de segurança no Estado do Amazonas; articulação com o Poder Judiciário, Ministério Público e demais Órgãos ou entidades relacionados à Política Penitenciária Estadual; e elaboração de propostas de regulamentação de assuntos de sua competência.
Como fruto de aprendizados de anos passados sangrentos, no ano de 2019 a SEAP criou o Grupo Intervenção Penitenciária, para evitar os acontecimentos voltassem à tona, com a finalidade de minimizar o tempo de resposta em situações de crise. O GIP é fruto da parceria entre a SEAP e Polícia Militar do Amazonas (PM/AM), o Grupo é formado por policiais militares, dotados de técnicas e equipamentos especiais para realizar o primeiro reforço, em suplementação ao trabalho desenvolvido pela estrutura de proteção dos estabelecimentos prisionais, sempre que for necessário o restabelecimento da ordem, disciplina e segurança interna.
2.4 A POPULAÇÃO CARCERÁRIA NO INTERIOR:
Os municípios do interior do Amazonas possuem situações totalmente adversas quando são comparados a outros. A logística para se chegar é dificultosa, nem todos os locais possuem voos, em alguns locais só se chega por meio fluvial dentre outros fatores de complexidade.
No contexto, as dificuldades e desafios dos agentes policiais fora da capital são enormes, além de fazer a atuação policial, seja ela ostensiva ou administrativa, o mesmo ainda possui a atribuição de ter que cuidar das Pessoas Privadas de Liberdade.
Em um relatório do Conselho Nacional de Justiça, do ano de 2022, sobre as inspeções de estabelecimentos prisionais do Estado do Amazonas, é possível compreender de modo assertivo e preciso a atual situação da população cerceada de liberdade, “Conforme pontuado anteriormente neste relatório, vale destacar a situação peculiar de algumas pessoas privadas de liberdade que estão em Delegacias de Polícia no estado do Amazonas. No momento da visita, algumas já estavam sentenciadas e outras estavam sem mandado de prisão, pois foram detidas em flagrante e aguardavam a audiência de audiência de custódia”.
Ademais, o relatório realizou a inspeção em cerca de cinco delegacias interativas e foi constatado o disposto
[…] é importante pontuar acerca da inadmissibilidade de custódia de presos provisórios em carceragens de Delegacia de Polícia. Foi identificado por uma das equipes dessa missão, nas delegacias dos municípios de Iranduba e Manacapuru, uma situação de evidente ilegalidade nesse contexto, considerando o que estabelece a Lei de Execuções Penais, quando delimita legalmente quais são os estabelecimentos prisionais possíveis, divididos, inclusive, entre presos provisórios e definitivos, e, nesse último caso, também, por regime de cumprimento de pena.
Além disso, é fato que as carceragens das Delegacias de Polícia não comportam essa custódia porque não possuem estrutura física e técnica a tanto, o que resulta, em certa medida, em desvio de função e de finalidade, o que é vedado pelo Direito Administrativo, considerando que as atribuições da Polícia Civil, constitucionalmente delimitadas, conforme artigo 144, não incluem a guarda de presos, sendo estes espaços destinados apenas a permanência destes detidos enquanto da conclusão dos atos policiais necessários a cada caso.
No caso das duas delegacias de Iranduba e Manacapuru, a permanência de presos provisórios, inclusive, sem possibilidade de melhor separação quando da prisão de mulheres e de adolescentes, encaminhados ao mesmo espaço de detenção, redunda em evidente ilegalidade por parte do Estado, podendo-se visualizar da violação de princípios constitucionais os quais, inclusive, são apontados enquanto improbidade administrativa.
Corroborando com o encontrado pela equipe de visita desta inspeção, em maio de 2022, a juíza da 1ª Vara da Comarca de Manacapuru e de Iranduba, Dra. Aline Kelly Ribeiro Marcovicz Lins e responsável pela concessão da tutela de urgência, atesta em sua sentença sobre a ACP da interdição da unidade prisional, aproximadamente 01 ano antes, em 20/04/2021, a situação desta Delegacia: “Os presos ficam alojados em celas junto à Delegacia de Polícia […] sem a observância de quaisquer dos requisitos mínimos para a manutenção da custódia. Há, assim, forte violação aos direitos fundamentais previstos no artigo 5º, III, VII, XLVIII, XLIX, L, da Constituição Federal, além do desrespeito ao disposto nos artigos 12, 13, 14, 16, §2º, 17 a 21, 22 e 23, 24, 25, 31, 36, da Lei de Execuções Penais, por deficiência ou inexistência de assistência de quaisquer naturezas aos detentos instalados na carceragem de Manacapuru/AM, além da violação de diversos dos direitos mencionados no artigo 41, da LEP”.
Imagem 1: Delegacia em Novo Airão/AM.
Fonte: relatório do CNJ de 2022.
É extremamente complicada e difícil a situação de carceragem do Amazonas, após dois anos decorridos do relatório do distinto CNJ, a situação em algumas cidades continua do mesmo patamar ou até pior. O Delegado ou o responsável pelo DIP tendo que desviar sua função constitucional, estabelecida no Artigo 144 de nossa Constituição Federal.
Dos apontamentos do CNJ nas cidades as quais demonstraram irregularidades, podemos dizer que são os melhores municípios a serem visitados, tendo em vista que ou possuem modal terrestre, são interligados por estradas ou possuem modal aéreo recorrente. Dessa forma, podemos concluir que das Delegacias apontadas estão relativamente em boas condições e que há municípios mais longevos e que estão em pior situação de infraestrutura, lotação e efetivo policial.
A alimentação das Pessoas Privadas de Liberdade se dá por meio de uma empresa terceirizada com contrato pactuado com a SEAP. São fornecidas 5 (cinco) refeições que devem ser consumidas de imediato pela ausência de local para armazenar a alimentação. Por vezes, a empresa que terceiriza os serviços chega a atrasar o pagamento dos terceirizados e dessa forma, os fornecedores ameaçam sustar a alimentação dos apenados, sendo o fato inadmissível, e novamente ressurge a figura do Delegado na função de Diretor Prisional, tendo que dialogar por vezes com a empresa fornecedora ou até mesmo tirar do seu próprio bolso e comprar a alimentação de seus custodiados.
No Amazonas nunca houve concurso para a polícia penal, em 2022, o Governador aprovou o concurso para pelo ao menos 2.500 (duas mil e quinhentas) vagas, todavia, nada seguiu e ainda permanece no papel. Em consulta ao Portal da Transparência da SEAP, na remuneração dos servidores, é possível encontrar vários policiais penais, entretanto muitos foram reconduzidos da extinta função de carcereiro para policial penal, inclusive alguns já estão com processo de aposentadoria.
2.5 PROCEDIMENTO DE TRANSFERÊNCIA DOS CUSTODIADOS:
Dado o problema, algumas são as possibilidades de amenizar a superlotação carcerária no interior do Estado, o qual se pode citar a transferência (sendo a movimentação dentro do próprio Estado de distrito da culpa do réu) e recambiamento (transferência de uma unidade federativa para outra) de custodiados.
Em junho de 2017 foi disposto o Provimento n.º 309/2017- CGJ da Corregedoria-Geral de Justiça do Amazonas, que versou sobre a comunicação, autorização e movimentação das pessoas privadas de liberdade provisoriamente e condenados. O Provimento se deu após a grande crise no sistema prisional Amazonense, momento em os poderes buscaram soluções para apaziguar os ânimos dos internos do Estado.
Em uma de suas considerações do documento, já era possível destacar que os estabelecimentos carcerários apresentavam população excedente ao limite previsto e suportado, circunstância que dificultava o oferecimento de condições dignas ao apenado, em formas previstas na Constituição Federal, na LEP e outros dispositivos.
O provimento elenca uma série de procedimentos quanto às transferências e recambiamentos, o qual em seu Artigo 1° diz que: “Estabelecer aos juízes de 1ª Entrância que somente remetam para o cumprimento de pena privativa de liberdade em Manaus aqueles condenados em regime fechado, que tenham sido submetidos a uma pena de no mínimo 12 (doze) anos de reclusão, nos casos de crime comum, e a 8 (oito) anos de reclusão, nos casos de crime hediondo […]”.
No que tange aos internos de estão em Delegacias e Distritos Integrados no interior, o parágrafo único do artigo 1°, o documento frisa que: “Parágrafo único. Nas comarcas que possuam apenas Delegacia ou Distrito Integrado de Polícia (DIP), os condenados em regime fechado, que tenham sido submetidos a uma pena de no mínimo 8 (oito) anos de reclusão, nos casos de crime comum, e a 06 (seis) anos de reclusão, nos casos de crime hediondo, deverão, os mesmos, serem remetidos às unidades prisionais mais próximas do distrito da culpa, levando–se em consideração, primeiro, a Comarca Polo mais próxima […]”.
Pois bem, há a necessidade de que o apenado seja transferido para uma unidade mais próxima de onde se cumpre a pena, e em muitos dos casos não é possível, a grande maioria é transferida para Manaus, porém, em desacordo no que dispõe a Lei de Execução Penal, nos artigos 41, X; 42; e 103, em suma, é de que o apenado cumpra e permaneça próximo os seus familiares.
Atualmente, as transferências e recambiamentos estão se dando da seguinte forma:
1.solicitação de transferência/recambiamento por parte da autoridade, o que é elencando de maneira unânime, a falta de condições nas Delegacias e DIP’s e a superlotação de encarcerados;
2. Deferido o pedido pelo Juiz Competente, este deve encaminhar um pedido de autorização de transferência de apenado ao Juiz da Execução Penal da Comarca destinatária, e caso defira, deve a SEAP providenciar no prazo de 24 (vinte e quatro) horas a locomoção do custodiado.
A partir daí, logra-se uma outra jornada de procedimentos internos da Secretaria de Administração Penitenciária, desde o recebimento da decisão da Vara de Execução Penal até a firmada transferência, é um longo caminho, em linhas mais resumidas, o procedimento se faz da seguinte forma:
- Recebimento via malote da decisão de transferência do apenado, expondo os motivos;
- Tramitação interna de Secretários Executivos, Adjuntos e chegada a Coordenadoria do Sistema Prisional (COSIPE);
- COSIPE é responsável por escalar e designar os Agentes Policiais responsáveis pela transferência do custodiado, sendo 2 (dois) policiais para 1 (um) apenado.
- Nova tramitação para a autorização do Ordenador de Despesas (O.D) para a compra das passagens e pagamento das diárias aos servidores;
- Chegada ao Setor de Diárias e Passagens para o prosseguimento na aquisição das passagens dos servidores e do apenado;
- Entrada na fila de processos mais prioritários ou que estão seguindo o rito normal.
Dos procedimentos elencados acima, ainda é importante frisar a enorme dificuldade logística na Amazônia. Em certos locais, a chegada é somente por lancha rápida, em outros somente por avião, é o caso dos municípios de Eirunepé, Envira, Guajará e outros.
A seca que assolou o Amazonas em 2023, produziu impactos no que tange as transferências, as tradicionais lanchas rápidas pararam de trafegar e os barcos recreios da mesma forma, incapacitando a alta demanda de transferências da SEAP, e no ano corrente os sinais já se aproximam de uma nova seca histórica.
Além das dificuldades logísticas, o Estado também possui dificuldades financeiras. Os contratos com as empresas de passagens são anuais, porém, situação verídica aconteceu no ano de 2023. O exercício financeiro encerrou-se em meados de outubro de 2023, ou seja, não foi mais possível a emissão de empenhos, pagamentos de notas fiscais e outras operações no sistema orçamentário do governo. Dessa forma, houve a postergação do pagamento das faturas mensais das empresas para o exercício financeiro no ano de 2024, na modalidade de exercícios anteriores. Sabendo disso, algumas empresas reduziram a quantidade de emissões de passagens, prejudicando o andamento das transferências por parte da SEAP.
2.6 A SITUAÇÃO DOS DISTRITOS INTEGRADOS DE POLÍCIA (DIP) NO INTERIOR DO AMAZONAS:
Os estabelecimentos policiais do interior do Estado também enfrentam grandes dificuldades estruturais, sendo que em muitas das vezes não oferece o mínimo de condições de vivência no âmbito carcerário.
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), possui em seu sítio eletrônico os dados das inspeções nos estabelecimentos penais de todo o Brasil. No que tange os estabelecimentos penais do Amazonas, esses são os dados representados no sistema:
Imagem 2: quadro resumo dos estabelecimentos penais do Amazonas Disponível em: https://www.cnj.jus.br/inspecao_penal/mapa.php
Na ferramenta disponibilizada pelo CNJ, é possível ter a dimensão de quão precário estão os internos que cumprem suas penas no Estado do Amazonas, apenas dois municípios possuem situações boas de instalação e o mais impressionante, nenhum estabelecimento possui a situação excelente.
Imagem 3: Delegacia em Benjamin Constant/AM
Disponível em: https://mpam.mp.br/slides-noticias
As condições estruturais podem ser potenciais facilitadores de eventuais fugas dos internos, além do que, o efetivo policial em vários municípios não suporta a demanda de controlar, conduzir para atendimentos médicos as PPL que necessitam, conduzir a refeição e outras funções de um Gestor Penitenciário, dessa forma, realizando funções que são totalmente diferentes do emanado, deixando a essência principal como dispõe a nossa Constituição Federal de 1988 em seu artigo 144.
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
– polícias civis;
– polícias militares e corpos de bombeiros militares.
– polícias penais federal, estaduais e distrital.
§ 4º Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares. § 5º Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil.
§ 5º-A. Às polícias penais, vinculadas ao órgão administrador do sistema penal da unidade federativa a que pertencem, cabe a segurança dos estabelecimentos penais. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 104, de 2019).
2.7 AS UNIDADES CARCERÁRIAS NA CAPITAL NOS DIAS DE HOJE:
Conforme um expediente publicado por Fábio Magalhães Candotti (2023), Articulador da Frente Estadual pelo Desencarceramento do Amazonas e do Coletivo de Familiares e Amigos de Presos e Presas no Amazonas, o atual Sistema Penitenciário encontram mudanças na gestão prisional da SEAP-AM, dentre elas passou a ser gerenciada por diretores policiais militares, a partir de 2017.
Uma das mudanças significativas foi o controle de aparelhos de celular. “Por isso não tem mais mortes” – foi o que disse um gestor em conversa durante uma inspeção em 2021. Desde a chacina de 2019, ocorrida em quatro prisões de Manaus, a fiação elétrica foi retirada da maioria dos pavilhões – aqueles chamados pelas pessoas presas de “pavilhões do sofrimento”. A justificativa formal foi impedir o carregamento de aparelhos de celular. Medida “legalizada” pela Resolução nº 16, de 10 de junho de 2021, do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) – que contraria as Regras de Mandela, que, por sua vez, tem força de lei.
As celas não há sequer lápis e papel. Cartas são proibidas, mesmo para quem não recebe visitas. A grande maioria das pessoas privadas de liberdade sobrevivem em uma espécie de regime disciplinar diferenciado (RDD) com superlotação: 22 horas de confinamento em celas sem ventiladores (numa cidade cuja temperatura máxima média supera 32º); racionamento severo de água e produtos de higiene e limpeza; revezamento de banho de sol entre pavilhões; e, ainda, revezamento para visitas de familiares, que, de semanais, passaram a ser quinzenais. Familiares que, como se pode imaginar, também não podem entrar e sair com papéis, incluindo os documentos do processo.
As chamadas “regalias” para “lideranças” deixaram de existir, uma vez que estão separadas e perigosamente misturadas em um pavilhão chamado pela própria administração de “RDD”. Os “privilégios”, como ventiladores e celas sem superlotação, são reservados às pessoas inscritas em “programas” de trabalho, selecionadas justamente pela ausência de vínculos com “facções”, como por exemplo presos e presas provisórios (para quem trabalhar não implica remição de pena) e homens acusados de estupro e feminicídio.
O autor salienta ainda que a imagem que recai na população é de que, parece não haver muitas dúvidas de que, hoje, quem “manda” no sistema carcerário do Amazonas, sobretudo na capital, onde se concentra a maioria da população carcerária, é a SEAP, o mesmo citou que a Polícia Militar detém a administração dos Presídios, porém, esse encargo é da Secretaria de Administração Penitenciária.
Conforme ainda, o autor, “a contagem da população carcerária do Amazonas não se limita a cerca de 13 mil pessoas. Ela deve ser multiplicada. Considerando uma estimativa baixa de quatro familiares por pessoa presa, esse número salta para 65 mil em um estado com pouco menos de 4 milhões de habitantes. Nessa nova contagem, não temos mais uma taxa de 337 pessoas presas por 100 mil habitantes, mas de 1.684 por 100 mil […]”.
No contexto das privatizações das Unidades de Privação, há quem defenda o modelo adotado no Amazonas, todavia, o alto custo da modalidade é uma das questões mais adotadas nos questionadores do sistema.
Em 2019, o defensor público paulista Mateus Moro criticou o modelo adotado, afirmando a seguinte tese: “ Em entrevista à Rádio Brasil Atual, avalia que o assassinato de 55 detentos em quatro penitenciárias administradas por uma empresa no Amazonas são um atestado de que a privatização de presídios, modelo defendido pelo governador de São Paulo,
João Dória (PSDB), à época, são uma falácia. “Apresentam um monte de argumentos que não convencem, inclusive o de redução de custos, para privatizar as unidades prisionais. E quando você transforma o ser humano em mercadoria, pode acontecer o que vem acontecendo no Amazonas”, afirmou.
Conforme publicado no Instituto Humanitas Unisinos (2019), o defensor lembrou que nos Estados Unidos o modelo de privatização de presídios vem sendo substituído pela gestão do Estado. Além disso, o Brasil já tem a terceira maior população carcerária do mundo e o segundo maior aumento de presos. Apenas em São Paulo, são 170 unidades prisionais com 270 mil pessoas presas. “Enquanto os dois primeiros, Estados Unidos e China, estão reduzindo o aprisionamento, Brasil e Indonésia estão aumentando. É um caminho que pode não ter volta. Nos Estados Unidos, durante décadas, a privatização dos presídios trouxe um superencarceramento gigantesco. Esse super-encarceramento já existe no Brasil. ”
METODOLOGIA
pesquisa parte do método dedutivo, de tipo bibliográfica e documental e de caráter qualitativo. Com o objetivo de explicar e descrever o fenômeno estudado através de artigos científicos documentados, estudos, relatórios realizados por órgãos federais, estaduais e municipais, além da experiência do autor na vivência e exposição dos fatos por ter atuado na Secretaria de Administração Penitenciária. Ademais, para maior fortalecimento das informações as notícias de jornais, documentários e sites que abordam os temas envolvidos, auxiliaram de forma concisa e fundamental, tais fontes deram ênfase sobre os temas que estão ao entorno do tema principal.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conclui-se que as problemáticas enfrentadas pela população carcerária no interior do Amazonas é um problema antigo que depende de diversos fatores e influências políticas para que se chegue a uma melhora futura para o nosso sistema penitenciário.
É aceitável impor que o sistema prisional Amazonense está dentro de um “Estado de Coisas Inconstitucionais (ECI) ” em que o assunto em pauta já foi reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal através da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) de número 347, que aduz a violação massiva dos direitos fundamentais no sistema penal brasileiro.
ADPF é recente, e o Tribunal determinou o prazo de 6 (seis) meses, a partir de outubro de 2023, para que o Governo Federal elaborasse um plano de interventor para sanar a superlotação, o número de internos provisórios e a permanência em regime mais severo ou por tempo superior ao da pena.
Para melhor entendimento, o Estado de Coisas Inconstitucionais aqui citado, é a dependência de vários poderes, órgãos e outros, para que seja resolvido a atual crise prisional, porém, há uma grande problemática social e cultural. O político não se faz tanto presente nas causas do sistema penitenciário e abre mão de projetos que possam melhorar as condições e instalações dos custodiados, sob as vistas da população, é sempre provável o seguinte pensamento: “ O político A, só faz as coisas voltadas para os presos e nada pela saúde, educação, saneamento básico”. Dessa forma, o político tem grande receio de perder votos e até mesmo a eleição, e nesse trilhar o nosso sistema punitivo é encarado como um “ponto cego”.
Uma das sugestões de diminuição dos encarcerados, desde o ano de 2015, foi a audiência de custódia, que reduziu consideravelmente o quantitativo de apenados nos estabelecimentos de privação. Em suma, a audiência é a apresentação da pessoa privada de liberdade junto ao juízo, com a participação do ministério público e do advogado da pessoa privada. O Magistrado (a) avaliará a legalidade da prisão e concederá a liberdade ou até mesmo se o representado deva seguir privado de forma preventiva.
Diante do exposto, muitas são as coordenações a serem feitas. Somente a SEAP e o poder Executivo não resolverão tantos problemas de maneira individual, é um esforço coletivo (Executivo, Legislativo e Judiciário) e órgãos da administração direta e indireta para que se alcance a um objetivo comum, o de melhorar as condições da população carcerária no interior do Amazonas.
Ademais, além dos esforços mútuos, o Executivo Estadual poderia realizar estudos de viabilidade técnica para a reforma das unidades policiais e presídios por meio de licitação e prestação de serviços de maneira continuada, agindo preventiva e corretivamente. No contexto das transferências, seria salutar que a SEAP possuísse meios próprios de transporte intermunicípios, de tal maneira, facilitaria de modo significativo o desafogo para os Distritos Integrados de Polícia no interior.
4. REFERÊNCIAS
ADNEISON SEVERIANO, SUELEN GONÇALVES E CAMILA HENRIQUES, G1AMAZONAS, Atualizado em 03/01/2017 11h54 ‘Maior massacre do sistema prisional do AM’, diz secretário sobre rebelião. Disponível em:<https://g1.globo.com/am/amazonas/noticia/2017/01/maior-massacre-do-sistema-prisionaldo-am-diz-secretario-sobre-rebeliao.html/>. Acessado em: 10 de agosto de 2024.
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PROVIMENTO Nº 309/2017 – CGJ, dispõe sobre a comunicação, autorização e movimentação de presos provisórios e condenados (Transferência e recambiamento) no âmbito do Estado doAmazonas. Disponível em: <https://www.tjam.jus.br/index.php/phoca-atoscorregedoria/file/12156#:~:text=Disp%C3%B5e%20sobre%20a%20comunica%C3%A7%C3 %A3o%2C%20autoriza%C3%A7%C3%A3o,ambito%20do%20Estado%20do%20Amazonas >. Acessado em: 11 de agosto de 2024.
REDE BRASIL ATUAL – RBA, 29-05-2019, Massacre em penitenciárias no Amazonas mostra que privatização de presídios é falácia. Disponível em: <https://www.ihu.unisinos.br/categorias/589574-massacre-em-penitenciarias-no-amazonasmostra-que-privatizacao-de-presidios-e-falacia>. Acessado em: 11 de agosto de 2024.
SECRETARIA DE ESTADO DE ADMINISTRAÇÃO PENITENCIÁRIA, UNIDADESPRISIONAIS. Disponível em: < https://www.seap.am.gov.br/unidades-prisionais/ >. Acessado em: 10 de agosto de 2024.
¹ Graduado em Tecnólogo em Segurança Pública, pela universidade Estácio de Sá, e-mail: klewertonarauji@gmail.com