LIABILITY FOR THE LOSS OF A CHANCE IN THE NATIONAL LEGAL SYSTEM
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8017884
Julia Carolina de Aquino Campos1
Vinicius Alexandre Silva2
RESUMO
O presente artigo assevera acerca do instituto da responsabilidade civil pela perda de uma chance no ordenamento jurídico pátrio, este ocorre quando há perda da oportunidade de alcançar êxito esperado, que por conduta causada pelo ofensor, altera as chances do resultado pretendido. Diante desta situação, a perda da chance de concretização da oportunidade em questão, é dificultada ao estabelecer o nexo causal entre a conduta do ofensor e a perda da chance, por não poder afirmar com exatidão que se concretizaria. Não obstante, é visível que existia então a probabilidade e reais condições de êxito na conquista, acarretando na constituição de um bem jurídico independente do resultado final, sendo viável sua reparação. Depois de exposto a possibilidade da reparação do dano, buscou-se a demonstração e ocorrência do devido dano passível de ressarcimento, expondo ainda, a responsabilidade civil do ofensor em reparar o dano. Observando-se sobre o tema a aplicação na legislação pátria, com enfoque na responsabilidade civil pela chance perdida, fixando critérios para fixação do dano. Além de buscar uma forma detalhada e crítica, demonstrando acertos e desacertos, no intuito de melhorar o desenvolvimento do instituto da responsabilidade civil, causada pela perda de uma chance.
Palavras-chave: Perda de uma chance; Responsabilidade civil; Nexo causal; Dano material.
ABSTRACT
The present paper claims about the institute of civil responsibility for the loss of a chance in the legal order of the country, this occurs when there is loss of the opportunity to achieve expected success, which by conduct caused by the offender, changes the chances of the desired result. Faced with this situation, the loss of the chance of realizing the opportunity in question is made difficult by establishing the causal link between the conduct of the offender and the loss of chance, for not being able to state with accuracy that this would materialize. Nevertheless, it is evident that there was then the probability and real conditions of success in the conquest, resulting in the constitution of a legal asset independent of the final result, and its reparation is feasible. After the possibility of reparation of the damage was exposed, it was tried the demonstration and occurrence of the due damage that could be repaid, also exposing the civil responsibility of the offender in repairing the damage. Observing on the subject the application in the national legislation, focusing on the civil liability for the lost chance, setting criteria for fixing the damage. In addition to detailed and critical manner, the jurisprudential way, demonstrating correct and misleading, in order to help the development of the institute civil liability, caused by the loss of a chance.
Keywords: Loss of a chance; Civil responsibility; Causal link; Moral damage;
1 INTRODUÇÃO
Constitui objetivo geral da presente pesquisa analisar se deve ocorrer a suspensão dos processos individuais, em razão da existência de uma ação coletiva correspondente. O microssistema do processo coletivo não trata expressamente da litispendência entre ações coletivas, uma vez que a norma consumerista somente refere que tais ações não induzem litispendência para as ações individuais.
Assim, diante da lacuna normativa do novel sistema de acesso coletivo ao Judiciário brasileiro, é preciso averiguar outros diplomas legais, além das propostas legislativas sobre o assunto.
O presente artigo de conclusão de curso tem por objetivo investigar o instituto da Responsabilidade Civil em face da Teoria da Perda de uma Chance.
A teoria da perda de uma chance vem sendo centro de profundas discussões na Europa, e surge influenciando e revigorando o aspecto da responsabilidade civil Brasileira. Esta teoria no Brasil é definitivamente nova e vem ganhando muitos adeptos sendo assim motivada na doutrina e jurisprudência, uma vez que o Código Civil Brasileiro de 2002 não traz indicador quanto a sua determinação.
Parte-se da hipótese que a metodologia que conduz a Responsabilidade civil no Brasil, a fim de se estabilizar as relações sociais, nada mais é que, toda pessoa, seja ela física ou jurídica, que violar um dever jurídico através de um ato lícito ou ilícito, com imprudência, imperícia ou negligência, com ou sem dolo, tem o dever de reparar o dano causado, como ocorre na Teoria da Perda de uma Chance.
O objetivo primário é analisar como é abordada a Teoria da Perda de uma Chance no ordenamento jurídico pátrio, tendo em vista a ausência de critérios objetivos a sua configuração, visto que muitos doutrinadores discorrem sobre o valor no qual deverá ser feito a indenização pela perda de alcançar o resultado pretendido.
Onde grande maioria entende-se que a indenização será feita pela oportunidade perdida e não o prejuízo final, razão pela qual a indenização deve ser fixada seguindo os critérios de proporcionalidade e razoabilidade, com equivalência entre o dano sofrido e as consequências advindas do ato lesivo.
Os objetivos específicos são apresentar ao leitor os aspectos gerais do instituto da Responsabilidade Civil, verificar a Teoria da Perda de uma Chance e, por fim, relacionar esses dois temas na medida de suas respectivas aplicações e conflitos.
Será analisado o caso ocorrido na emissora SBT, programa “Show do milhão”, que ocorreu em 15/06/2000 com a apresentação de Silvio Santos. O referido programa tinha como objetivo realizar perguntas ao participante, até que o mesmo ao acertar as perguntas alcançasse o premio de 1 milhão em barras de ouro.
A participante Ana Lúcia Serbeto de Freitas Matos decidiu não responder a pergunta que lhe daria o referido premio, pois em sua visão a pergunta que lhe foi feita teria mais de uma resposta. O relator do processo proferiu decisão dizendo que houve culpa da empresa, sendo, portanto, cabível de indenização por perda de uma chance. O caso citado, será analisado no decorrer do trabalho, e exposto opiniões de autores e ministros.
2 RESPONSABILIDADE CIVIL
Prefacialmente, com o objetivo de importar o leitor para o tema proposta na presente revisão bibliográfica, será exposto neste primeiro capítulo conceitos indispensáveis à compreensão do instituto da Responsabilidade Civil, assim como sua respetiva evolução histórica. (GONÇALVES, 2016).
Para êxito nesse propósito e, com o precípuo objetivo de conferir a este artigo de Conclusão de Curso genuíno caráter de cientificidade, visitar-se-á obras de renomados doutrinadores pátrios. Demonstrando ainda, como tais premissas se entrelaçam e se manifestam em nosso ordenamento jurídico. (GONÇALVES, 2016).
2.1 BALIZAMENTOS HISTÓRICOS
Para Zaneti Jr. (2011), a teoria da tríplice identidade aventada no tópico acima possui insuficiência, devendo ser observadas duas regras quanto a ocorrência da litispendência. Primeiro, saber que ela não constitui um critério absoluto, mas sim uma “boa hipótese de trabalho”. Segundo, quando for inaplicável diante de um caso concreto, deve ser relegada a segundo plano, colocando-se em seu lugar, a teoria da identidade da relação jurídica.
Esse, inclusive, passou a ser o critério para a verificação da litispendência entre ações coletivas, pois, diante da possibilidade de que as várias entidades legitimadas no art. 5º da LACP c/c art. 82 do CDC venham a ajuizar demandas relacionadas à mesma relação jurídica, a teoria da tríplice identidade não seria suficiente para solucionar a controvérsia, acarretando a possibilidade de que decisões contraditórias pudessem ser proferidas para a mesma lide (TUCCI, 2001, apud DIDIER JR.; ZANETI JR., 2011, vol. 4, p. 174).
É importante considerar que na tutela de direitos ou interesses coletivos, ou de direitos individuais homogêneos, o autor da ação atua em nome próprio, mas em favor de terceiros, caracterizando a legitimação extraordinária ou substituição processual. Já na ação individual, é o próprio titular do direito que atua em nome próprio, caracterizando a legitimação ordinária. Essa peculiaridade do processo coletivo já se colocar como um grande entrave para a caracterização da litispendência, já que não há identidade de partes nos dois polos processuais.
Por outro lado, no caso da ação de defesa de direitos individuais homogêneos, na qual surgem maiores dúvidas, o pedido deve ser necessariamente genérico, assim como a condenação será genérica, conforme disposto no artigo 95 do Código de Defesa do Consumidor. Já no processo individual, a regra prevista no artigo 234 do Código de Processo Civil estabelece como regra o pedido determinado, cabendo sua forma genérica somente em situações excepcionais.
Outrossim, o mesmo dispositivo do CDC impede a análise de pedidos individuais dos substituídos, de forma que o processo coletivo só analisará a potencialidade de dano aos indivíduos considerados como uma sociedade afetada. Seus prejuízos individuais serão aferidos somente após a condenação, em fase ou em processo de liquidação ajuizado pela vítima do dano. Somente nesta última etapa poderia, em tese, haver litispendência ou coisa julgada em relação a ação individual.
Para analisar a existência ou não de litispendência entre ações coletivas e ações individuais, torna-se necessário traçar uma distinção entre os diferentes bens tutelados pelo processo coletivo: direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, de acordo com o art. 81 do Código de Defesa do Consumidor – CDC (BRASIL, 1990). Isso porque, enquanto os dois primeiros se referem a autênticos litígios coletivos, o terceiro se refere a direitos acidentalmente coletivos, pois, no caso, o legislador trouxe a possibilidade de tratamento dos litígios individuais de forma unificada, aproveitando a sistemática do processo coletivo.
Por outro lado, essas categorias criadas pelo legislador têm reduzida operatividade, uma vez que, na prática, direitos individuais e coletivos estão interligados e, por outro lado, não é uma tarefa fácil distinguir direitos coletivos e direitos difusos (VITORELLI, 2021, p. 45). Não obstante, é inegável sua importância conceitual, que possibilitou pela primeira vez a justiciabilidade de direitos coletivos, como reconhecem os responsáveis pelo anteprojeto do CDC:
O legislador preferiu defini-los para evitar que dúvidas e discussões doutrinárias, que ainda persistem a respeito dessas categorias jurídicas, possam impedir ou retardar a efetiva tutela dos interesses ou direitos dos consumidores e das vítimas ou seus sucessores. (GRINOVER; WATANABI; NERY JR, 2011, p. 70)
Desde o alvorecer da humanidade, a ocorrência de conflito entre os homens proporciona àqueles que sucumbem possibilidade de reparação pelo prejuízo sofrido. Esse fato, nas palavras da civilista Maria Helena Diniz, é tão antigo quanto à própria história do Direito, pois, conforme assevera, “nos primórdios da civilização humana, dominava a vingança coletiva, que se caracterizava pela reação conjunta do grupo contra o agressor pela ofensa a um de seus componentes” (DINIZ, 2015, p. 31).
Posteriormente, a vingança privada constitui marco originário da denominada Lei de Talião, conhecida pela frase “olho por olho, dente por dente”. Nesta fase, não se debatia questões pertinentes a dolo ou culpa, tampouco proporcionalidade. O corpo humano, nessas circunstâncias, poderia ser utilizado como mecanismo reparador, permitindo afirmar que se tratava de uma responsabilidade pessoal, ou objetiva (DINIZ, 2015).
Nesse sentido, Carlos Roberto Gonçalves leciona (2016, p. 24/25):
Nos primórdios da humanidade, entretanto, não se cogitava o fator culpa. O dano provocava a reação imediata, instintiva e brutal do ofendido. Não havia regras nem limitações. Não imperava, ainda, o direito. Dominava, então, a vingança privada, ‘forma primitiva, selvagem talvez, mas humana, da reação espontânea e natural contra o mal sofrido; solução comum a todos os povos nas suas origens, para a reparação do mal pelo mal. Se a reação não pudesse acontecer desde logo, sobrevinha à vindita imediata, posteriormente regulamentada, e que resultou na pena de talião, do ‘olho por olho, dente por dente. (Gonçalves, 2016, p. 36)
Logo após, a reparação econômica emerge como importante avanço na Pena de Talião. Ainda que não se falasse em culpa à época, foi conferida a vítima a faculdade pela postura da vendeta ou pela compensação. Nesse diapasão, […] “o prejudicado passa a receber as vantagens e conveniências da substituição da vindita, que gera a vindita, pela compensação econômica” (GONÇALVES, 2016, p.29).
Agora, percebe-se que a reparação dos danos se tornava regra. Contudo, a ideia de tarifação da pena, de certo modo, continua em evidência.
A distinção entre pena e reparação surgiu apenas no Direito Romano com instituição da denominada “Lex Aquilia de damno”, que concomitantemente afastou a ideia de vingança privada e assegurou que a pessoa causadora do dano a outrem deveria repara-la pela via patrimonial. (GONÇALVES, 2016).
Acerca do tema, Maria Helena Diniz aduz que:
[…] A Lex Aquilia de damno veio a cristalizar a ideia de reparação pecuniária do dano, impondo que o patrimônio do lesante suportasse os ônus da reparação, em razão do valor da res, esboçando-se a noção de culpa como fundamento da responsabilidade, de tal sorte que o agente se isentaria de qualquer responsabilidade se tivesse procedido sem culpa. Passou-se a atribuir o dano à conduta culposa do agente. A Lex Aquila de damno estabeleceu as bases da responsabilidade extracontratual, criando uma forma pecuniária de indenização do prejuízo, com base no estabelecimento de seu valor […] (DINIZ, 2015, p. 27).
Do advento da Lex Aquilia introduziu-se o que os romanos chamariam de damnun iniuria dantum, em outras palavras, “prejuízo causado a bem alheio, empobrecendo o lesado, sem enriquecer o lesante” (DINIZ, 2015, p. 27).
As diretrizes estabelecidas pela Lex Aquilia perduraram, proporcionando ao Estado que tomasse para si a responsabilidade de penalizar o culpado pelos prejuízos por ele provocados, por meio de reparação pecuniária, seja nos conflitos ocorridos na esfera pública ou privada, impedindo que à vítima exercesse sua vingança. (VENOSA, 2012).
Nesse sentido, enaltece Maria Helena Diniz (2015, p. 27) “O Estado passou, então, a intervir nos conflitos privados, fixando o valor dos prejuízos, obrigando a vítima a aceitar a composição, renunciando à vingança”.
Faz-se mister ressaltar também que, consoante Gilberto Andreassa Júnior, foi nesse lapso que se consolidaram os alicerces da do instituto da Responsabilidade Civil, sendo “damnum, ou lesão na coisa; a iniuria, ou ato contrário o direito; culpa, quando o dano resultava de ato positivo do agente, praticado por dolo ou culpa” (ANDREASSA JÚNIOR, 2018).
Transcorrida a aludida conjectura de nascimento da Lei Aquilia, inovações na responsabilidade civil surgiram apenas na alta idade média, mais especificamente após a Revolução Francesa, com o festejado Código Napoleônico, o qual objetivava, principalmente, a mínima interferência do Estado na esfera privada. (GONÇALVES, 2016).
A respeito do direito produzido nesse contexto, Carlos Roberto Gonçalves ensina:
O direito francês, aperfeiçoando pouco a pouco as ideias românicas, estabeleceu nitidamente um princípio geral da responsabilidade civil, abandonando o critério de enumerar os casos da composição obrigatória. Aos poucos, foram sendo estabelecidos certos princípios, que exerceram sensível influência nos outros povos: direito à reparação que houvesse culpa, ainda que leve, separando-se a responsabilidade civil (perante a vítima) da responsabilidade penal (perante o Estado); a existência da culpa contratual (a das pessoas que descumprem as obrigações) e que não se liga nem a crime nem a delito, mas se origina da negligência ou imprudência. (Gonçalves, 2016, p. 36)
Percebe-se que o direito Francês aderiu uma responsabilidade civil fundada na culpa. Da mesma forma em que delimitou critérios para reparação apoiada na mesma, sendo responsável, também, pela previsão da responsabilidade contratual, além da distinção entre responsabilidade penal e responsabilidade civil. (ROSÁRIO JUNIOR, 2018)
Posteriormente, a responsabilidade civil sem culpa foi incorporada. Veja-se:
Todavia, a responsabilidade civil também evoluiu em relação ao fundamento (razão por que alguém deve ser obrigado a reparar um dano), baseando-se o dever de reparação não só na culpa, hipótese em que será subjetiva, como também no risco, caso em que passará a ser objetiva, ampliando-se a indenização de danos sem existência de culpa. (DINIZ, 2015. p. 31)
Por conseguinte, não é forçoso reconhecer que o Código Civil Napoleônico, após receber influências fundadas no Direito constituído na Roma antiga, estabeleceu os preceitos correspondentes à responsabilidade subjetiva e objetiva, até então inexistentes. (GONÇALVES, 2016).
Tais diretrizes, para Gonçalves (2016), não obstante o fato de terem sofrido alterações de forma contextualizada aos ordenamentos jurídicos nos quais foram incorporadas, mormente na França e Portugal, conduziram as demais regras pertinentes à responsabilidade civil construídas ao longo da modernidade, sobretudo no Brasil, o que se demonstrará mais adiante neste trabalho, quando da análise das especificidades do instituto nos dias que correm.
Destarte, constatou-se que, além de estar em constante evolução, o instituto da responsabilidade civil, desde os seus primórdios, objetivou reestabelecer o equilíbrio em relações sociais perturbadas pelos danos causados por outrem. (GONÇALVES, 2016).
3 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL
A responsabilidade civil vem sendo utilizada para conduzir a maioria dos conflitos patrimoniais e morais. A doutrina tem encontrado imensa dificuldade para conceituar a reponsabilidade civil, visto a grande repercussão que vem causando ao ordenamento jurídico. (DINIZ, 2012)
Segundo a autora Grácia Cristina Moreira do Rosário, no livro, a responsabilidade civil surge quando o dever jurídico primário é violado, gerando o dever jurídico secundário, que é indenizar o prejuízo causado à vítima. Ao se tratar das obrigações contraídas por uma pessoa, essas deverão ser cumpridas, ou nascerá então à responsabilidade. (DINIZ, 2012)
Maria Helena Diniz conceitua a responsabilidade civil, em um de seus livros, dizendo que:
É a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal. (DINIZ, 2012, pg. 48)
Conceito este que tem em sua estrutura, a ideia da culpa, no momento em que se cogita a existência do ilícito (responsabilidade subjetiva), e do risco, ou seja, da responsabilidade sem culpa (enquanto objetiva).
A responsabilidade civil está incluída à noção de que somos responsáveis pelos fatos decorrentes do nosso comportamento, isto é, não devemos nos conduzir na vida causando prejuízos as outras pessoas, pois se isso acontecer ficaremos sujeitos a reparar os danos causados, melhor dizendo, as pessoas têm o direito de não serem injustamente lesionadas, por força do nosso comportamento, pois caso isso aconteça elas têm o direito de serem indenizadas na proporção do dano que foi sofrido.
Dessa forma, ainda que não se possa reconhecer a existência de litispendência entre ações coletivas e ações individuais, a preferência pela resolução do litígio pelo processo coletivo deve impedir o prosseguimento de pretensões individuais, de forma a assegurar o efetivo acesso à justiça de toda a coletividade atingida, dando materialidade aos preceitos constitucionais que garantem a igualdade de direitos.
3.1 ORIGEM E EVOLUÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL POR PERDA DE UMA CHANCE
A responsabilidade por perda de uma chance também visa à reparação por um dano causado por outrem. Todavia, esse mal (dano) é pela perda da possibilidade de obtenção de lucro, e não, da efetiva perda do mesmo. (SAVI, 2012)
Não muito raro é ver como exemplo em doutrinas, o advogado perder prazo para recorrer, prejudicando assim o seu cliente. Diante do exposto, a maior preocupação acaba sendo a de analisar a chance do provimento de um recurso, por exemplo, devendo ser a mesma, real e seria. Vale lembrar que, diante desses casos, exigiam os Tribunais a prova de que se o recurso fosse interposto em tempo hábil, seria então, provido. (SAVI, 2012)
Entretanto, nos leva a pensar: “Como pode se ter certeza de que algo que não aconteceu, aconteceria de tal forma?” A respeito da pergunta citada, Sérgio Savi cita em sua obra: Responsabilidade Civil por Perda de Uma Chance:
(…) se fosse possível afirmar que o recurso seria provido pelo Tribunal, teríamos a prova da certeza do dano final e, com isso, o ofensor seria condenado ao pagamento de todos os benefícios que o cliente iria auferir com a vitória no processo judicial, Se, por outro lado, fosse possível demonstrar que o recurso não seria provido, teríamos a certeza da inexistência do dano final e, assim, o advogado negligente estaria liberado da obrigação de indenizar. (SAVI, 2012, pg. 2)
Demais exigência, era feita pelos Tribunais, sendo então correto dizer que a teoria da responsabilidade civil por perda de uma chance não era indenizada por haver impossibilidade probatória, sendo impossível provar que certamente algo que não aconteceu, aconteceria de tal maneira.
3.2 CONDUTA HUMANA
Inicialmente, ressalta-se que a responsabilidade civil é uma expressão aplicável tão somente à atividade humana e, como tal, exige uma conduta, positiva ou negativa. (DINIZ, 2015)
Assim, para Maria Helena Diniz (2015), como não há que se falar em responsabilização civil por fato da natureza, pois, ainda que este eventualmente ocasione danos, não decorrerá de uma conduta humana.
Apenas o ser humano, seja pessoalmente, através de uma pessoa jurídica ou até mesmo por coisa pela qual é responsável, poderá ser civilmente responsabilizado. Tendo em vista a necessidade de uma conduta humana, Rui Stoco sustenta:
[…] um comportamento do agente, positivo (ação) ou negativo (omissão), que, desrespeitando a ordem jurídica, cause prejuízo a outrem, pela ofensa a bem a direito deste. Esse comportamento (comissivo ou omissivo) deve ser imputável à consciência do agente, por dolo (intenção) ou por culpa (negligência, imprudência, ou imperícia), contrariando, seja um dever geral do ordenamento jurídico (delito civil), seja uma obrigação em concreto (inexecução da obrigação ou de contrato) (STOCO, 2007, p. 94).
No mesmo seguimento leciona Paulo Nader:
O ato ilícito pode ser praticado mediante ação ou omissão do responsável pela reparação. Em outras palavras, o ilícito pressupõe uma conduta do agente, violadora da lei ou de ato negocial e causadora de lesão ao direito alheio. Como o ato ilícito é modalidade de ato jurídico, deve ser manifestação da vontade. (Nader, 2016, p. 53):
Portanto, tal conduta humana poderá ser positiva (comissiva), pois decorrente de uma ação, ou negativa, igualmente denominada de omissiva, por dizer respeito a uma abstenção juridicamente relevante. (VENOSA, 2012)
O próprio Código Civil,no seu art. 186, possibilita tal raciocínio, ao impor a obrigação de indenizar a todo aquele que por ação ou omissão voluntária causar prejuízo a outrem. (VENOSA, 2012)
Por fim, vale lembrar que, tanto na ação, quanto na omissão, a conduta deve ser voluntária, pois a voluntariedade constitui o epicentro da conduta humana. Se não houver o domínio (controle) da vontade humana na conduta, não haverá de se falar em responsabilidade civil. Assim, não há dever de reparação por lesões decorrentes de forças naturais invencíveis, a exemplo do vento, ou das descargas elétricas (STOCO, 2007).
Sobre a voluntariedade da ação, explica Rui Stoco:
Não se deve confundir a exigência da voluntariedade com o dolo. O dolo traduz o propósito ou consciência do resultado danoso. É intenção deliberada de causar prejuízo. Já a voluntariedade é a consciência daquilo que se está fazendo. Exemplifica-se com o cidadão que, voluntariamente, engata a marcha ré no seu carro e, por imprudência, colide com outro veículo. Há voluntariedade na conduta, porém desacompanhada de dolo. (STOCO, 2007, p. 99)
Superada a questão da conduta e seguindo na análise acerca dos elementos gerais da responsabilidade civil, prossegue-se na investigação do dano ou prejuízo, contudo, tão somente conceituando-o e elencando os requisitos para sua configuração, a fim de evitar desnecessária tautologia. (STOCO, 2007)
3.3 DANO
Entende-se por dado ou prejuízo a lesão a um interesse/patrimônio (patrimonial ou extrapatrimonial) juridicamente tutelado, em virtude de uma conduta humana. (DINIZ, 2015)
Assim aduz Maria Helena Diniz (2015, p. 140): “O dano é lesão (diminuição ou destruição) que, devido a um certo evento, sofre uma pessoa, contra sua vontade, em qualquer bem ou interesse jurídico, patrimonial ou moral”.
Carlos Alberto Bittar em basilar dissertação acerca do dano, não destoa:
[…] o dano é configurado pela lesão, ou redução patrimonial, sofrida pelo ofendido, em seu conjunto de valores protegidos no direito, seja quanto à sua própria pessoa – moral ou fisicamente – seja quanto a seus bens ou aos seus direitos. É a perda ou diminuição, total ou parcial, de elemento, ou de expressão, componente de sua estrutura de bens psíquicos, físicos, morais ou materiais (BITTAR, 1994, p. 102),
Contudo, alertam Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2012) que nem todo dano se torna indenizável. Com efeito, para que o dano seja indenizável far-se-ão necessários à presença de requisitos essenciais e cumulativos, quais sejam: a) Violação a um interesse juridicamente tutelado; b) Certeza do dano e c) Subsistência ou atualidade do dano.
Quanto ao primeiro requisito, registra-se que além da autonomia entre o dano extrapatrimonial e patrimonial já abordada no presente capítulo, o Código Civil confere às pessoas jurídicas a proteção inerente aos direitos da personalidade. Por esta razão, nossa jurisprudência pacificou o entendimento de que a pessoa jurídica também podem sofrer danos morais. Veja-se o prescrito na súmula 227 do STJ: “A pessoa jurídica pode sofrer dano moral”. (FILHO, GAGLIANO, 2012).
Logo, mesmo a pessoa jurídica pode ajuizar ação pleiteando danos patrimoniais e/ou morais. Já o segundo requisito, observa Diniz (2015), é aquele que busca vedar a indenização do dano hipotético ou abstrato. O dano há de ser certo quanto a sua existência (é exatamente este pensamento clássico que ensejará grande debate teórico nas linhas pertinentes a teoria da perda de uma chance).
Por fim, o requisito da subsistência ou atualidade do dano remete ao prejuízo experimentado que ainda não foi reparado, o que, por razões de ordem lógica, diz respeito a um dano carente de reparação.
Por esta razão, é permitido afirmar que, “se o dano já foi reparado, perde-se o interesse da responsabilidade civil” (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2012, p. 68).
Sendo assim, o dano ou prejuízo, desde que preenchidos esses três requisitos básicos a sua configuração, é elemento indispensável para configuração da responsabilidade civil. (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2012)
3.4 NEXO DE CAUSALIDADE
Averiguando o terceiro elemento da responsabilidade civil: o nexo de causalidade, conceitua-o nos seguintes termos:
É a relação de causa e efeito entre a ação ou omissão do agente e o dano verificado. Vem expressa no verbo “causar”, utilizado no art. 186. Sem ela, não existe a obrigação de indenizar. Se houve o dano, mas sua causa não está relacionada com o comportamento do agente, inexiste a relação de causalidade e também a obrigação de indenizar. (Gonçalves, 2016, p.96)
Tal elemento objetiva perquirir uma relação de causa e efeito entre a conduta e o dano. Consoante Gagliano e Pamplona Filho (2012, p. 69). “trata- se, pois, do elo etiológico, do liame, que une a conduta do agente (positiva ou negativa) ao dano.”
Na busca por esclarecimentos, tanto a doutrina quanto a jurisprudência construíram diversas teorias a cerca desse pressuposto dentre as quais se destacam: a) Teoria da Equivalência das Condições; b) Teoria da Causalidade Adequada e c) Teoria da Causalidade Direta ou Imediata. (VENOSA, 2012)
A Teoria da Equivalência das Condições, segundo Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2012), instaurou a fórmula de eliminação hipotética, sendo causa todo o antecedente que, caso eliminado, faria com que o resultado desaparecesse. Todo ato do autor que, de alguma forma, contribuiu para o dano trata-se de causa.
A Teoria da Causalidade Adequada entende como causa apenas o antecedente abstratamente idôneo à produção de um resultado danoso. Nas palavras de Carlos Roberto Gonçalves (2016, p. 79): “insere-se neste mundo apenas a condição apta, por si só, a produzir o dano”.
A Teoria da Causalidade Direta ou Imediata, consoante prelecionam Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2012), advoga que causa é apenas o antecedente tático que, ligado por um vínculo de necessariedade ao resultado danoso, determine este último como uma consequência direta e imediata.
Não há unanimidade entre os doutrinadores em estabelecer qual teoria é adotada pelo Código Civil brasileiro. Flávio Tartuce (2015) defende que a teoria aplicada no Brasil é da causalidade adequada. Afirma seu posicionamento com base na redação dos artigos 944 e 945 do Código Civil, bem como no Enunciado 47 CJF, segundo o qual o Código Civil não exclui a teoria da causalidade adequada.
Lado outro, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, bem como Carlos Roberto Gonçalves (2015), defendem a aplicação da teoria da causalidade direta e imediata, exigindo uma causalidade necessária. Mencionam como embasamento codificado para tanto a redação do artigo 403 do Código Civil, que fala em efeitos direto e imediato. (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2012)
Cita-se: “Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual”. (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2012, p.87)
Sendo assim, vencidos os pressupostos teóricos a compreensão do nexo de causalidade, assim como os estudos essenciais pertinentes ao instituto da Responsabilidade Civil, avançamos na pesquisa proposta no presente trabalho. (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2012)
3.5 CASO SHOW DO MILHÃO
A teoria da perda de uma chance era vista com hesitação pela doutrina brasileira, mas ganhou um impulso em 2005, em um Recurso Especial 788.459/BA, julgado pelo Superior Tribunal de Justiça. Onde envolvia uma ex – participante do programa “Show do Milhão”, programa esse que oferecia um prêmio de R$ 1.000.000,00 em barra de ouro a quem acertasse uma determinada quantidade de perguntas corretamente. (ROSÁRIO, 2018)
No referido julgado acima, após sucessivos acertos a participante, conquistou a chance de responder a derradeira pergunta do milhão. A pergunta formulada foi a seguinte: “A Constituição reconhece direitos aos índios de quanto do território brasileiro? Resposta: (a) 22%; (b) 2%; (c) 4%; (d) 10%;” (ROSÁRIO, 2018).
Pela organização do programa a alternativa correta seria a última dez por cento. Mas, entretanto, a pergunta formulada possui um equívoco, pois a Constituição não reserva qualquer percentual do território nacional aos povos indígenas. (ROSÁRIO, 2018)
Diante a má formulação da pergunta a participante desistiu de oferecer uma resposta, deixando o programa com a premiação que já havia acumulado que era de meio milhão. (ROSÁRIO, 2018)
Todavia, ela propôs uma ação indenizatória, com o objetivo de obter o meio milhão restante, visto que por um erro da produção do programa ela perdeu a chance de acertar a pergunta e levar a premiação total. (ROSÁRIO, 2018)
A sentença deferiu o pedido da autora sobre danos materiais e condenou a empresa a pagar a totalidade do valor pactuado, acrescido de honorários advocatícios, após concluir que não houve, de fato, resposta ao questionamento formulado. A parte que fez o recurso alegando que a questão colocada não teria uma resposta. (ROSÁRIO, 2018)
O Tribunal do Estado da Bahia indeferiu o pedido de disposição sem prejuízo do estado civil do recorrente. Estabelece um percentual específico que é destinado aos indígenas brasileiros. (ROSÁRIO, 2018)
Dessa forma, o artigo 231 da Magna Carta é incorporado. Houve embargos de declaração de oposição que também foram rejeitados. Com alegação de violação dos artigos 118 e 1.059 do Código Civil de 1916.
“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PLEITO DE REFORMADA SENTENÇA SOB ARGUMENTO DE COMPORTAR RESPOSTA A ÚLTIMA PERGUNTA FORMULADA À APELADA NO PROGRAMA DE TELEVISÃO DO SBT – “SHOW DO MILHÃO”. ARGÜIÇÃO DE POSSIBILIDADE VERSUS PROBABILIDADE DO ACERTO DA QUESTÃO. ALEGAÇÃO DE IMPOSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃODA APELANTE NO PAGAMENTO DO VALOR COMPLEMENTAR AOPRÊMIO (R$ 500.000,00), À TÍTULO DE LUCROS CESSANTES, COM BASE NO “CRITÉRIO DA PROBABILIDADE” DO ACERTO. ARGÜIÇÃO DE CARÊNCIA DE PRÊMIO PORQUE NÃO VERIFICADA ACONDIÇÃO SUSPENSIVA COM ARRIMO NO ART. 118, DO CÓDIGO CIVIL/1916. MATÉRIA NÃO VENTILADA NO PRIMEIRO GRAU. NÃO CONHECIMENTO. CONSTATADA A IMPROPRIEDADE DA PERGUNTA EM RAZÃO DE APONTAR COMO FONTE A CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INEXISTÊNCIA DE CONSIGNAÇÃO NA CARTA MAGNA DE PERCENTUAL RELATIVO A DIREITO DOS ÍNDIOS SOBRE O TERRITÓRIO BRASILEIRO. EVIDENCIADA A MÁ FÉ DA APELANTE. CONDENAÇÃO EM REPARAÇÃO DE DANOS COM BASE NO INADIMPLEMENTO DA OBRIGAÇÃO. IMPROVIMENTO DO RECURSO. Reza o art. 231, caput, da Constituição Federal: “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens. (AgInt no REsp n. 1.923.907/PR, relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 20/3/2023, DJe de 23/3/2023.)
A empresa BF Utilities Domestics LTDA interpõe recurso especial com base nos Alinhamentos “a” e “c”, Inc. III, do artigo 105 do art. CF de 1988.No recurso excepcional, a recalcitrante disse que não estaria sujeita a punição, uma vez que a recalcitrante optou por não responder à pergunta. (ROSÁRIO, 2018)
Além disso, foi acrescentado que mesmo com uma pergunta pertinente, um membro do programa tinha apenas a chance de responder corretamente. Assim, a pena deve ser reduzida a condenação foi reduzida ao montante de R$125.000 (cento e vinte e cinco mil reais), conforme abaixo:
Presidente, primeiro, afasto a invocação da Súmula 283 do Supremo Tribunal Federal, porquanto não vejo, na espécie, fundamento autônomo do acórdão recorrido que não tenha sido abordado no recurso especial. Na verdade, pelo que depreendi, a fundamentação é una; não há, portanto, mais de um fundamento suficiente, e o recurso não tenha abrangido todos eles. Considero, ainda, que na questão de mérito, enfocada na decisão recorrida, não há necessidade, também, do reexame de matéria fático-probatória, uma vez que a Turma está, neste momento, apanhando os fatos tal como delineados pelas Instâncias Ordinárias. Estou de acordo com V. Exa., já abordando a questão de fundo, entendendo que, realmente, a indenização não pode ser tal como pretende a autora, ou seja, o prêmio total de 1 milhão de reais, porque isso somente ocorreria se ela tivesse acertado a pergunta formulada no programa. A lei estabelece claramente que os lucros cessantes abrangem o que razoavelmente o interessado deixou de lucrar. É a regra do art. 1.059 do Código Civil de 1916. Então, a meu ver, está bem claro que os 500 mil restantes não são devidos. A solução que V. Exa. propõe, admitida de maneira alternativa pela ré, é a que me parece a mais correta e adequada. Penso que compõe, neste quadro todo, a indenização que a parte faz jus, proporcional à perda que ela teve com a má elaboração da pergunta, uma vez que na verdade, o que ocorreu foi a pergunta mal formulada. Por essas razões, estou de pleno acordo com o voto de V. Exa. 3. Conheço do recurso especial e dou-lhe parcial provimento para reduzir a indenização a 125 mil reais. (RECURSO ESPECIAL Nº 788.459 – BA (2005/0172410-9) – STJ- relator VOTO O SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO – 2ª Turma).
O seguinte curso de ação foi decidido pelo Ministro Fernando Gonçalves. Em primeiro lugar, alegar que a pergunta foi realmente fruto da atitude dissidente do entrevistado, pois a CF de 1988 não especifica o percentual de território brasileiro que é garantido aos indígenas. (ROSÁRIO, 2018)
O Ministro Fernando Gonçalves entendeu, de forma consonante com as instâncias ordinárias, que a recorrida deixou uma resposta à pergunta feita por causa do recorrente que formulou de forma inviável a se ter uma resposta. (ROSÁRIO, 2018)
No entanto, o referido ministro afirmou que não há como garantir que um participante do jogo, caso seja indiciado por uma pergunta e resposta, responda corretamente de forma categórica e ganhe o prêmio de R$ 1.000.000.000 (um milhão de reais). (ROSÁRIO, 2018)
Isso é causado por uma variedade de fatores, incluindo a dificuldade das perguntas feitas durante a conclusão do jogo e a ansiedade do participante ao receber uma pergunta que, se respondida incorretamente, faria com que ele fosse removido do programa sem qualquer compensação. (ROSÁRIO, 2018)
O ministro Fernando Gonçalves considerou que havia a exigência de um comunicado de imprensa que indicasse a condenação do arguido na íntegra, tal como tinha feito o tribunal de segunda instância, o que prova que a viagem teria respondido à questão colocada. (ROSÁRIO, 2018)
No entanto, apesar de não ter essa certeza porque a questão que poderia ter tornado o jogador milionário ficou em aberto, ainda é preciso reconhecer que houve um prejuízo. Desta forma, o ministro Fernando Gonçalves confirmou que se perdeu a oportunidade do retorno. (ROSÁRIO, 2018)
Para reduzir a indenização para R$ 125.000 (cento e vinte e cinco mil reais), foi conhecido e parcialmente provido o recurso especial fornecido pela empresa BF Utilidades Domésticas LTDA. Isso foi feito com o entendimento de que, dadas quatro alternativas, apenas uma estaria correta e resultaria na atribuição do prêmio. (ROSÁRIO, 2018)
À luz do prejuízo para os lucros decrescentes, decidiu-se que a única quantia pela qual a viagem deixou de ser lucrativa era aquela soma. Torna-se necessário explicar as características da teoria da “perda de uma chance” ao analisar o caso especificamente mencionado. (ROSÁRIO, 2018)
A responsabilidade civil pela perda de uma oportunidade resulta da perda da chance de obter uma vantagem ou evitar um dano que é tirado da vítima por uma ação praticada por outra pessoa. No caso presente, é a perda da chance de perder uma vantagem no futuro, o que seria nesta hipótese econômica. Dessa forma, o tema será discutido especificamente em relação a esse tipo de perda de chance. (ROSÁRIO, 2018)
Para reconhecer a teoria da perda de uma chance, deve-se observar a perda da oportunidade e não do resultado. A oportunidade que a vítima perdeu deve ser séria e real e não o próprio resultado, uma vez que, como esse deixou de ocorrer, jamais haveria como fazer uma afirmação nesse sentido. (ROSÁRIO, 2018)
No caso em contento, a participante do programa deixou de auferir a quantia de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) devido à má-fé exclusiva do programa de televisão na formulação de uma pergunta que não havia resposta. (ROSÁRIO, 2018)
O dano decorrente da perda de uma chance é diverso do dano material e do lucro cessante, ou seja, é como uma terceira espécie de dano. O dano material é realmente o que a vítima já possuía quando ocorreu o evento danoso e lhe foi retirado. O lucro cessante é algo que já ocorria na vida da vítima, de forma comum, rotineira, e, principalmente, certa. (ROSÁRIO, 2018)
Por outro lado, a perda de uma chance não é uma vantagem que, com certeza, aconteceria na vida da pessoa, uma vez que ainda não existia, mas foi a perda da oportunidade de auferir essa vantagem que tinha grande possibilidade de ocorrer. (ROSÁRIO, 2018)
A decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a perda de uma chance da participante, no entanto, não distinguiu do lucro cessante, ou seja, deu mais ênfase ao resultado. No entanto, entende-se que a perda de uma chance é a perda da oportunidade de se obter um resultado favorável e não o resultado propriamente dito. (ROSÁRIO, 2018)
Portanto, no caso em contento realmente houve a perda da oportunidade de se obter R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais). Essa oportunidade era séria e real, uma vez que a participante obtinha um brilhante desempenho no decorrer do programa e, por má-fé na elaboração de uma pergunta sem resposta, Ana Lúcia deixou de auferir a vantagem econômica esperada. (ROSÁRIO, 2018)
Alguns doutrinadores, em especial Sérgio Savi (2012), entendem que a chance perdida contundente à reparação deve representar mais de 50% na probabilidade que a vítima tinha de auferir a vantagem. Entretanto, considera-se que houve uma interrupção no limiar normal dos eventos, cujos quais poderiam gerar uma grande vantagem ao lesado. Um fato alheio interrompeu a expectativa que uma pessoa tinha em relação a algo.
Contudo, não há mais como afirmar com toda a certeza se o lucro ocorreria ou não. Dessa forma, a indenização é pela certeza de que, pelo menos, a oportunidade foi perdida. (SAVI, 2012)
Com isso, não é necessário estabelecer um percentual mínimo para ser possível a indenização pela perda de uma chance. Deve-se analisar o caso concreto e ser atento quanto à caracterização da chance perdida ser séria e real e não apenas uma mera probabilidade. (SAVI, 2012)
Assim, entende-se que o arbitramento do valor da indenização feito pelo STJ levou em consideração apenas o resultado, entendendo que a participante possuía apenas 25% de chance de acertar a resposta, visto que eram quatro alternativas e apenas com uma ela sairia vencedora. (SAVI, 2012)
Então, foi arbitrado o valor de R$ 125.000,00 (cento e vinte e cinco mil reais). Ocorre que atribuir essa porcentagem é deixar de lado a perda da oportunidade que ela tinha de auferir o montante de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais). (SAVI, 2012)
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conclui-se que não há como afirmar com veemência qual a porcentagem exata que a participante tinha em acertar a resposta, no entanto, foi totalmente retirada sua oportunidade de tentar acertar ao ser elaborada uma pergunta que não havia alternativa nenhuma como certa.
Portanto, arbitrar o valor de R$ 125.000,00 (cento e vinte e cinco mil reais) pode ser considerada uma quantia ínfima, uma vez que a perda da chance é a indenização correspondente à retirada da oportunidade de auferir alguma vantagem, e essa foi inteiramente extraída.
A perda de uma chance ocasionou uma lesão no participante do programa, ao qual poderia acertar a pergunta e ganhar a premiação prometido, não obstante foi frustrada sua oportunidade, de forma a prejudicá-lo, ocasionando assim o dever de indenizá-lo.
Ademais, nos moldes do Código Civil toda ação ou omissão que causar dano a outrem deve ser reparado, ocasionando a lesão material. Que na sociedade nos dias atuais está ocorrendo bastante isso, sendo muito importante em estudar os impactos que reverberam nas pessoas e o que pode ser feito.
Outro ponto que faz-se necessário estudar a perda de uma chance e a responsabilidade civil de que ocasiona, é que muitas pessoas desconhecem do direito em situações cotidiana, o que leva a diversos impactos sociais, carecendo de medidas politicas e dos juristas para resguardar os direitos das pessoas.
Outrem, é fundamental que os juristas busquem sempre medidas para resguardar as garantias constitucionais que estabelecem direitos e deveres para todos, principalmente, no que tange a obrigação da reparação civil por lesão ou ameaça a direitos.
È importante ressaltar ainda, que para caracterização da reparação material pela perda de uma chance é essencial que ela seja evidenciada a probabilidade de que se ocorra, demonstrando por meio de provas aa possibilidade de que poderia ocorrer.
O grande problema que ocupa os tribunais nas ações que versam acerca da perda de uma chance com pleito de indenização moral e material pelo dano ocasionado, é a dificuldade na produção de provas que possam corroborar na demonstração do direito.
Isto porque, muitas vezes há dificuldades por parte lesada em conseguir meios que assegurem que poderia conseguir se não fosse prejudicado pela interferência ou erro de terceiros que influenciaram substancialmente no resultado ao qual poderia ser outro se não houvesse aquela.
Desta forma, este trabalho é muito importante na construção de mecanismos para serem estudados por juristas e políticos na implementação, verificação da perda de uma chance e qual a responsabilidade dos provocadores de tais ações e omissões.
Além do mais, os estudos acerca da perda de uma chance impactará toda sociedade de forma positiva, principalmente, colaborando para uma sociedade mais justa e igualitária, bem como assegurar a aplicação dos direitos e garantias fundamentais que toda pessoa possui direito.
Permitindo assim, penalizar condutas causadoras de perdas consubstanciais, e assegurando que a pessoa lesada possa ser ressarcida por seus prejuízos, restabelecendo o equilíbrio e a ordem das obrigações.
Referências
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidadecivil, 2015.
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso dedireitocivil: responsabilidade civil, 2012.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: responsabilidadecivil. 2010.
NÁDER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. 22a ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016.
ROSÁRIO, Grácia Cristina Moreira do. A perda da chance de cura naresponsabilidadecivilmédica. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009.
SAVI, Sergio Savi. Responsabilidade Civil e Enriquecimento sem causa. 2012.
SAVI, Sergio. A Perda de uma Chance. 2012.
STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. 2007.
Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial. REsp 788459/BA. Quarta Turma. Rel. Min. Fernando Gonçalves. Brasília, 08 de novembro de 2005. Disponivel em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sSeq=592103&sReg=200501724109&sData=20060313&formato https://www.conjur.com.br/2005nov10/pergunta_mal_feita_show_milhao_indenizacao. Acesso em: 15 de abr. 2023.
Superior Tribunal de Justiça. AgInt no REsp n. 1.923.907/PR. 2ª Turma. Relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 20/3/2023, DJe de 23/3/2023. Disponível em: < https://processo.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=202100525628&dt_publicacao=23/03/2023>.Acesso em: 15 de abr. 2023.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: parte Geral. 2012.
1Estudantes do curso de Direito na faculdade UNA – Bom Despacho.
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