THE ABUSIVE PERFORMANCE OF LINGUAL FRENECTOMY IN NEWBORNS AS A TREATMENT FOR ANKYLOGLOSSIA
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ch10202410171058
Ana Carolina Melo de Oliveira Farias1;
Francilena Maria Campos Santos Dias2
Resumo
O presente trabalho aborda a realização abusiva da Frenectomia Lingual em recém-nascidos como tratamento para a Anquiloglossia, destacando os impactos que essa condição pode ter na vida do bebê. O objetivo é ressaltar a importância do diagnóstico precoce e do tratamento adequado, realizado por uma equipe multiprofissional, visando à saúde e ao bem-estar da criança e da mãe. O estudo investiga a banalização do procedimento, analisando as indicações e contraindicações da frenectomia, além de explorar os fatores que contribuem para essa prática, como experiências clínicas e a percepção dos pais sobre a anquiloglossia, ressaltando a preocupação com a realização indiscriminada da frenectomia, que, embora indicada em casos severos, tem sido frequentemente aplicada de forma desnecessária. O trabalho propõe a adoção de práticas baseadas em evidências e a educação dos pais como medidas essenciais para mitigar riscos e promover intervenções mais seguras. Recomenda-se o desenvolvimento de protocolos de avaliação padronizados, a formação de equipes multidisciplinares e o acompanhamento pós-operatório, sempre priorizando o bem-estar do recém-nascido.
Palavras-chave: Anquiloglossia. Frenectomia. Frênulo Lingual.
1. INTRODUÇÃO
A Anquiloglossia, popularmente conhecida como “língua presa”, é caracterizada pela presença de um frênulo lingual geralmente bem curto, que tem o potencial de reduzir o movimento da língua. Essa anomalia pode ser leve, parcial ou severa, e para todos os casos deve haver testes, análises e avaliações clínicas, que deverão direcionar o tratamento adequado (Brasil, 2018). A língua em sua natureza, é um órgão que faz parte do sistema estomatognático, e é responsável pela sucção, mastigação, deglutição e fonação, logo a presença de um frênulo lingual interfere na movimentação da língua, impedindo ou dificultando o bebê na amamentação (Machado, 2021). Em 2014, a presidente em exercício sancionou a Lei nº. 13.002 de 20 de junho de 2014, que obriga maternidades e hospitais a realizarem o Protocolo de Avaliação do Frênulo da Língua, ou “Teste da Linguinha”, em Bebês nascidos no país. (Brasil, 2014).
Baseado em diversos estudos, é relevante e evidente que o aleitamento materno exclusivo nos primeiros seis meses de vida é de extrema importância na vida do bebê, e para que haja uma boa amamentação, a distensão da língua do bebê e os movimentos de sucção, deglutição e respiração devem estar em perfeita sintonia. Todavia, quando o recém-nascido possui alteração no frênulo lingual, estes movimentos são prejudicados, tornando a amamentação dolorida para a mãe e insuficiente para o bebê (Azambuja, 2022). Algumas mães por não acertarem a pega correta da mamada, acabam culpando o frênulo, e este deve ser muito bem avaliado pelo profissional que acompanha, para que não haja uma exposição cirúrgica do bebê sem necessidade, pois atualmente alguns profissionais estão banalizando o procedimento e ignorando o Protocolo de Avaliação, achando que o mesmo não causará grandes intercorrências na vida do bebê.
O diagnóstico deve ser responsável e realizado por uma equipe multiprofissional, composta de odontopediatras, pediatras e fonoaudiólogo. Quando o bebê é diagnosticado corretamente de forma precoce, este deverá ser submetido a uma intervenção cirúrgica que irá devolver a mobilidade correta da língua e do lábio, garantindo uma amamentação satisfatória e significante, uma melhor qualidade de vida do bebê e da mãe, reduzindo a dor materna e promovendo o aleitamento natural (Bonatti, 2023). O diagnóstico preciso da Anquiloglossia, deve levar em consideração vários aspectos clínicos específicos e multidisciplinares, para então definir o tratamento. Desde que foi sancionada a Lei n. 13.002, em 2014, que obriga a Realização do teste da Linguinha em Bebês, observou – se um considerável aumento na quantidade de procedimentos realizados em bebês (Lopes et al. 2022).
Porém, essa Lei não contemplava até então, alguns requisitos importantes, como as orientações de conduta na realização do procedimento, assim como, não estabeleceu padrões nem formas de registro específico. Em 2016, dois anos após o sancionamento da lei, passaram a existir orientações quanto aos profissionais indicados para o diagnóstico, bem como o fluxo dos lactentes no Sistema Único de Saúde (SUS), conforme observado por Lopes et al., 2022.
Frente a este panorama, o presente estudo leva em consideração os impactos que a Anquiloglossia pode causar na vida do bebê, considerando a importância do correto diagnóstico que deve ser realizado por uma equipe multiprofissional, e realização correta do tratamento, para que este seja o mais adequado para saúde e bem estar do bebê e da mãe. O objetivo desse trabalho é descrever a importância da frenectomia lingual quando diagnosticada precocemente, além de relacionar as indicações e contraindicações da realização deste procedimento lingual em recém-nascidos, destacando assim, o contexto atual da banalização em torno da Frenectomia Lingual em Recém-Nascidos. Ainda neste contexto, e objetivando um melhor estudo em torno do atual cenário, este trabalho objetiva também, em investigar os fatores que contribuem para a essa banalização, analisando a relação entre práticas clínicas, relatos de vivências e experiências clínicas, recomendações de profissionais de saúde e a percepção dos pais sobre a anquiloglossia e suas consequências.
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA OU REVISÃO DA LITERATURA
O principal órgão responsável por uma boa amamentação, é a língua. Ela está presente em diversas funções que pertencem à cavidade oral, dentre elas a sucção, funcionalidade essencial no processo de amamentação, a deglutição, a mastigação e a fala. Para que haja um bom funcionamento dessas funções, deve haver normalidade na anatomia da língua, pois nela há uma prega de membrana mucosa que a conecta ao assoalho da boca, chamada de frênulo lingual, e é este que garante o movimento da língua (Marcione et al, 2016).
Existem frênulos que no nascimento do bebê, ou até mesmo após anos do nascimento, são diagnosticados com alterações, isso ocorre no desenvolvimento embrionário, quando uma incompleta apoptose do frênulo, faz com que o tecido residual comprometa a mobilidade lingual e posteriormente as funções orais, e a esta alteração dar-se o nome de Anquiloglossia. A Anquiloglossia pode ser total ou parcial, e essa variação é o que vai definir os diferentes graus do movimento lingual (Marcione et al, 2016).
Conforme Marchesan (2014), foram realizados estudos anteriores que buscaram esclarecer a presença de alterações de frênulo nos bebês, contudo os autores são divergentes em suas condutas. Grande parte das observações feitas por autores no passado, são baseadas por relatos de vivências e experiências clínicas, que defendem que o frênulo do recém-nascido pode sofrer alterações durante o crescimento ósseo.
Dessa forma, estudiosos relatam que o frênulo posicionado desde o ápice da língua até a base do processo alveolar mandibular, pode alterar sua posição central e ocupar uma posição definitiva, à medida em que a criança progride em desenvolvimento. Ainda neste contexto, relatam que o frênulo pode sofrer alongamento ou ruptura durante o crescimento ósseo, e por este motivo o diagnóstico não deve ser realizado antes dos 5 anos de vida (Marchesan, 2014).
E por fim, Marchesan em seu estudo, relata que ainda durante o pré-natal, e por meio do exame de Ultrassom, é possível observar a existência de alterações no frênulo da língua. Inclusive, no ano de 2013, foi observado uma alteração no frênulo de um feto de 22 semanas durante o exame de Ultrassonografia, e tal alteração teve seu diagnóstico confirmado ao nascimento do bebê (Marchesan, 2014).
Diante dos fatos descritos acima, tem-se que a Anquiloglossia existe e é uma anomalia congênita caracterizada pela inserção curta do frênulo lingual. Essa anomalia pode resultar em uma postura lingual anormal, e mobilidade diminuída, prejudicando a deglutição, a fonação, a amamentação e a mastigação, podendo até mesmo provocar um diastema nos Incisivos Centrais (Lopes et al. 2022).
A Lei nº 13.002, que torna obrigatória a realização do teste da linguinha foi sancionada no Brasil em 2014, e tornou obrigatória a aplicação do Protocolo de Avaliação do Frênulo da Língua em Bebês – “Teste da Linguinha” em todos os recém-nascidos nas maternidades do Brasil. Este teste deve ser realizado nas primeiras 48 horas após o nascimento do bebê. Essa avaliação pode diagnosticar ainda na Maternidade a existência ou não da Anquiloglossia no bebê. Caso haja dúvida, o bebê deve ser reavaliado aos 30 dias de vida. O profissional deve orientar os pais quanto a possíveis dificuldades na amamentação, pega do mamilo e se houver ciclo contínuo de amamentação com intervalos pequenos, que podem ou não ser decorrentes das alterações do frênulo da língua (Martinelli, 2016).
O Teste da Linguinha é realizado por meio da aplicação do Protocolo de avaliação do frênulo lingual com escores para bebês (Martinelli, 2013). Este protocolo é dividido em história clínica, avaliação anatomofuncional e avaliação da sucção não nutritiva e nutritiva. O protocolo tem pontuações independentes e pode ser aplicado por partes, até o 6º mês de vida.
A literatura ainda não entrou em consenso de qual seria o melhor teste diagnóstico, portanto, no Brasil a escolha do protocolo a ser usado nas maternidades levou em consideração alguns itens como: praticidade de aplicação, validação por vários profissionais e problemas apresentados na amamentação. Para isso, foi desenvolvido o Protocolo Bristol (Brasil,2018).
Conforme a figura 1, o protocolo Bristol fornece uma medida objetiva e de execução simples da gravidade da Anquiloglossia, auxiliando na seleção dos lactentes que possam ser tratados através da Frenectomia. Os parâmetros avaliados são: Aparência da ponta da língua; Fixação do frênulo na margem gengival inferior; Elevação e Projeção da língua. As pontuações obtidas para estes itens são somadas e podem variar de 0 a 8, sendo que escores de 0 a 3 indicam potencial redução mais grave da função da língua (Brasil, 2019).
Figura 1: Protocolo Bristol de Avaliação da Língua
Fonte: Ministério da Saúde – Brasil 2018
Quando a Anquiloglossia é visível e facilmente diagnosticada, todos os profissionais envolvidos são favoráveis ao mesmo procedimento corretivo. No entanto, quando a alteração não é tão aparente, e exige um exame estrutural e funcional da cavidade oral, começa então a se abrir lacunas que dão lugar a controvérsias e confusões em torno do diagnóstico.
Segundo Martinelli (2020), existem várias propostas para avaliação do frênulo lingual, em bebês, crianças, adolescentes e adultos publicadas por profissionais de diferentes áreas, como odontólogos, consultores de amamentação, parteiras, fonoaudiólogos.
A maioria deles recomenda a elevação da língua para diagnóstico da anquiloglossia, outros, em um número menor, propõem a protrusão da língua, e apenas um estudo relata que os sintomas referidos pela mãe e a observação clínica da relação entre a mãe e o bebê durante a amamentação podem ser suficientes para diagnosticar a Anquiloglossia, descartando um exame físico na boca do bebê (Martinelli, 2020).
De acordo com Silva (2020), em recente estudo realizado, ele levantou autores que, propuseram um protocolo de avaliação de diagnósticos no frênulo, conforme as variações anatômicas e os formatos da língua do bebê nas primeiras 48 horas de vida. Através de uma criteriosa triagem neonatal, foi realizada a avaliação anatomofuncional, cuja a mesma deve avaliar a função da postura do lábio em repouso, a posição da língua durante o choro, o formato da ponta da língua, frênulo da língua, fixação do frênulo na face sublingual da língua, fixação do frênulo no assoalho da boca, sucção e deglutição durante a amamentação (Silva, 2020).
A língua fisiologicamente, possui uma elevada importância em seus movimentos para a realização das funções orofaciais. Assim tem-se que a posição de elevação da língua é necessária para posicioná-la de forma correta no palato quando em repouso, favorecendo a respiração nasal, bem como, para deglutir adequadamente e produzir corretamente os sons. Contudo, destaca-se que a posição de protrusão, caracterizada pela língua se estendendo sobre o lábio inferior não participa das funções de sugar, deglutir, respirar, mastigar e falar (Martinelli, 2020).
No que diz respeito ao frênulo lingual, quando avaliado clinicamente por diversos profissionais, as condutas quanto à intervenção cirúrgica se divergem. Entretanto, a literatura apresenta características anatômicas e funcionais que leva ao diagnóstico da Anquiloglossia. Assim, tem-se que, quando a avaliação do frênulo lingual e a conduta adotada são realizadas por meio de critérios pessoais, serão facilmente expostos a falhas. E essa divergência de diagnóstico entre os profissionais resulta na insegurança dos pacientes e de seus familiares que recebem opiniões variadas sobre o mesmo quadro clínico. (Martinelli, 2020).
Da mesma forma, acontece quanto a classificação do grau do frênulo diagnosticado, situação em que também se faz presente uma controvérsia entre os profissionais da saúde em relação a indicação ou não da frenectomia, que por vezes não é indicada, mesmo após um diagnóstico favorável para Anquiloglossia. E mais uma vez, a insegurança do paciente prevalece diante da variedade de diagnósticos entre os profissionais. A literatura ainda diverge em alguns critérios, que a depender do avaliador poderá ser normal ou alterado (Vargas et al., 2018).
De acordo com Pereira et al. (2019), as funções de sucção e deglutição, dependem dos movimentos da língua e estão totalmente relacionadas à amamentação (Figura 2). A língua e os lábio atuam juntos fazendo a preensão do mamilo e o vedamento oral para a perfeita amamentação. Se a língua estiver apresentando algum movimento restrito, consequentemente a amamentação poderá ser prejudicada. Dessa forma, quatro movimentos importantes devem ser realizados: Extensão (estender a língua até cobrir a gengiva inferior e manter essa postura durante a mamada), Elevação (língua até o palato para comprimir a aréola e assim poder mamar), Lateralização (mover a língua a ambos os lados da boca) e Peristaltismo (movimento ondulante que permite levar o leite até a sua deglutição).
Figura 2: Posicionamento da Língua durante a amamentação
Fonte: Imagens Públicas
Conforme mostra a figura 2, a língua deve realizar movimentos ondulatórios de Extensão, Elevação, Lateralização e Peristaltismo durante a mamada, assim é possível observar que quando não há alteração no frênulo lingual, o mamilo vai para trás e acoplado ao palato, uma boa quantidade de leite é expelida. Em contra partida, quando o frênulo lingual apresenta-se com alteração, o mamilo não encosta e nem fica acoplado ao palato, tendo o trajeto reduzido até a metade da cavidade oral, assim a língua faz movimento de pistão (sobe e desce), e a quantidade de leite reduz bastante.
Silva (2016), entende que a Anquiloglossia após diagnosticada, precisa de um tratamento, porém, se não houver comprometimento significativo da função orofacial, o tratamento indicado e menos invasivo deve ser a fonoterapia, pois ela consiste em exercícios que promove o alongamento da estrutura do freio.
Outros critérios também são relatados por estudiosos, entre eles se destaca, os critérios de avaliação qualitativos por considerar a dificuldade na articulação da fala, na troca ou distorção do fonema “r”, relacionando com a dobra da ponta da língua para baixo ao projetar-se para fora da boca formando um coração em seu ápice, diastema entre os incisivos centrais inferiores, abrasão ou corte na face inferior da língua, dificuldade de movimentar a ponta da língua ao lamber sorvete, flexibilidade do assoalho bucal, alteração de deglutição e alimentação, principalmente durante a fase de amamentação, o que pode causar insuficiência de leite materno, dor nas mamas, feridas no mamila e dificuldade de sucção do leite materno (Vargas et al., 2018).
Além dos critérios apresentados acima, existem outros critérios quantitativos que ainda são utilizados por alguns profissionais. São os critérios de avaliação, onde se adota medidas que calculam o tamanho da língua livre. Essas medidas levam em consideração o comprimento da Língua, que vai da inserção do freio lingual na base da língua, até a ponta da língua, denominando a medida como aceitável (Vargas et al, 2018).
O quadro 1 representa medidas quantitativas conforme descrito por Ktlow (1999)., utilizadas para determinar o grau de severidade da Anquiloglossia, a partir de medidas do comprimento da língua.
Quadro 1: Critério Quantitativo de Avaliação do Frênulo Lingual
Normal | Maior que 16 mm | Língua Livre |
Classe I | 12 a 16 mm | Anquiloglossia Suave |
Classe II | 08 a 11 mm | Anquiloglossia Moderada |
Classe III | 03 a 07 mm | Anquiloglossia Severa |
Classe IV | Menor que 03 mm | Anquiloglossia Completa |
Fonte: Ktlow, 1999
Outra evidência que diverge entre profissionais, é a nomenclatura para o diagnóstico apresentado, pois são vários nomes encontrados na literatura, tais como: Língua Presa, Anquiloglossia, Frênulo Curto, Frênulo Longo, Língua Aderente, Mucoso curto, Mucoso Longo, Frênulo alterado, entre outros (Marcione, 2016).
Até este ponto da pesquisa, o que se observa são divergências variadas quanto ao diagnóstico da Anquiloglossia, se total ou parcial, classificação do frênulo, critérios de avaliação para o frênulo e nomenclatura para o diagnóstico. E essas divergências continuam até mesmo no teste da linguinha adotado pelo SUS e no protocolo de avaliação. No SUS existem muitos registros de frenectomias realizadas, e todas atendem de uma forma padrão e generalizada do teste da linguinha. Este protocolo já é adotado por diversas maternidades no Brasil, e está limitado apenas às características físicas da linguinha, e assim acabam desconsiderando outros aspectos relevantes como: Qualidade da mamada, a experiência da lactante, o choro do bebê, e até mesmo os interesses pessoais dos profissionais envolvidos (Lopes et al. 2022).
O gráfico abaixo (Figura 3), demonstra a falta de padronização e exigências na realização do procedimento:
Figura 3: Padronização e exigências para realização de frenectomias.
Fonte: Lopes et al., 2022.
Algumas dessas divergências já vêm sendo esclarecidas e culminando em protocolos. Conforme o gráfico (figura 3) acima, observa-se que há uma enorme quantidade de profissionais da saúde que se apoderam do teste da linguinha já protocolado e exigido pelo Ministério da Saúde, e se posicionam frente ao cenário, como capacitados em diagnosticar a Anquiloglossia. E dessa forma, já existe um processo corrente da Sociedade Brasileira de Pediatria, pela revogação da Lei nº 13.002, de 20 de junho de 2014, enfatizado que a referida lei foi publicada sem consulta prévia às entidades envolvidas nesse aspecto da saúde da criança, sobretudo a Sociedade Brasileira de Pediatria.
No processo, a Sociedade Brasileira de Pediatria, diz que, o diagnóstico para esse transtorno pode ser feito apenas pelo médico, como prevê a Lei nº 12.842/13, que dispõe sobre o exercício da Medicina. Da mesma forma, qualquer prescrição de tratamento ou mesmo intervenção que se faça necessária somente pode ser realizada por este profissional (Sociedade Brasileira de Pediatria, 2019).
Ainda assim, mesmo com todas as divergências apresentadas, observa-se neste cenário, onde a Frenectomia se torna um aliado no processo de amamentação, que há um aumento pela busca de procedimento cirúrgico como solução para a Anquiloglossia, apesar de não haver evidências suficientes de que este procedimento melhora os resultados da amamentação, visto que, ainda não foi desenvolvido um método universalmente aceito que identifique os benefícios deste procedimento (Diercks, 2020).
3. METODOLOGIA
Trata-se de uma revisão de literatura integrativa, que visa sintetizar e analisar pesquisas já publicadas sobre a frenectomia lingual em bebês, considerando aspectos clínicos e sociais.
Foi realizada uma busca nas seguintes bases de dados: Bibliografia Brasileira de Odontologia (BBO), Scientific Electronic Library Online (SciELO), Literatura Latino Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), Medical Literature Analysis and Retrievel System Online (MEDLINE) e Google Acadêmico.
Foram utilizados os seguintes Descritores em Ciências da Saúde (Dec´s): Ankyloglossia (Anquiloglossia); Lingual Frenum (Freio Lingual) e Frenectomy (Frenectomia).
A Pesquisa Bibliográfica se limitou em publicações no período de 2013 a 2024, entre artigos em Português e Inglês, que tem como público-alvo da investigação crianças até 1 ano de vida, em fase de amamentação, e que tivesse relevância na literatura. Foi incluído o autor Ktlow (1999), cuja o período não está dentro do determinado acima, devido a relevância da sua pesquisa, e excluídos artigos que possuíam apenas títulos e resumos disponíveis ou que não tratavam da temática proposta, ou seja, estudos que não abordam diretamente a frenectomia em bebês, e artigos de opinião ou que não apresentem dados empíricos.
Os estudos presentes neste trabalho, envolvem autores que relatam Estudos Experimentais, Relatos de Experiência e Opiniões de Especialistas.
Os autores pesquisados tiveram seus artigos encontrados em diversas plataformas, alguns em duplicidade, ou seja, presente em duas ou mais plataformas, esses artigos foram excluídos restando apenas uma versão de cada artigo. Tornou-se elegível para pesquisa, apenas os artigos que tratavam diretamente da temática proposta, sendo incluídos apenas aqueles que se enquadravam na metodologia apresentada.
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES OU ANÁLISE DOS DADOS
O frênulo, vem sendo objeto de estudo há muitos anos, desde o século XVII até os dias atuais. Muitos profissionais têm buscado evidências científicas que comprovem a sua interferência nos movimentos da língua, e nas funções de sucção, deglutição, mastigação e fala. No Brasil, iniciou-se estudos com crianças e adultos, porém ao longo das pesquisas, um público chamou a atenção de muitos estudiosos, trata-se dos bebês na fase de amamentação, onde percebe-se que a alimentação poderia estar sendo impactada pela alteração no frênulo da língua (Marchesan, 2014).
A Anquiloglossia pode ser um fator determinante no processo da amamentação. No entanto, nem sempre ela é a grande causa do insucesso, pois há relatos de bebês com Anquiloglossia, que conseguem passar pela fase da amamentação sem maiores problemas. Assim, o simples fato de o bebê apresentar a língua presa, não é o suficiente para indicar uma possível intervenção cirúrgica, já que muitos bebês com vários graus de anquiloglossia se alimentam bem (Messner, 2020).
A constatação de que a alteração no frênulo lingual restringe os movimentos da língua, é unânime entre os pesquisadores, porém as opiniões sobre as funções possivelmente afetadas por essas alterações, são divergentes. O mesmo ocorre com outras questões, também divergentes entre eles, tais como: A indicação ou não de cirurgia, o momento adequado, a melhor técnica e, qual profissional está habilitado para sua realização (Marchesan, 2014).
A frenectomia lingual, embora reconhecida como um procedimento que pode beneficiar bebês com anquiloglossia, tem gerado preocupações quando realizada de forma excessiva ou inadequada. Existem diversos estudos que abordam a realização e as indicações da frenectomia, porém ainda existem muitos conflitos entre a prática clínica e a literatura; técnicas de cirurgia; interferência do frênulo nas funções orofaciais; eficiência de exercícios aplicados sobre o frênulo lingual e dúvidas quanto ao tratamento com o fonoaudiólogo (Marchesan, 2014).
No Brasil, existe a Lei nº 13.002 que obriga o teste da Linguinha, e este deveria ser o protocolo ideal adotado por todos os profissionais envolvidos, garantindo que todos os profissionais tenham a mesma visão quanto ao diagnóstico favorável ou não da Anquiloglossia (Brasil, 2018). O teste da linguinha leva em consideração análises clínicas e qualitativas, seguindo parâmetros de avaliação como: Aparência da ponta da língua; Fixação do frênulo na margem gengival inferior; Elevação e Projeção da língua.
No entanto, este trabalho traz uma série de autores e estudos que, mesmo cientes do protocolo adotado no Brasil, relatam um ponto de vista próprio sobre a questão do diagnóstico e tratamento ideal. Marchesan (2014), aborda que em estudos anteriores os relatos de vivências e experiências clínicas, garantem que o frênulo do recém-nascido pode sofrer alterações durante o crescimento ósseo. No entanto, essa visão não condiz com a de outros autores que adotam avaliações clínicas como critério essencial no diagnóstico, como relatado por Pereira et al. (2019), que defende a realização de testes que envolvem os movimentos que a língua consegue realizar, como Extensão, Elevação, Lateralização e Peristaltismo.
Kotlow (1999), levantou outros critérios quantitativos que ainda são utilizados na atualidade, onde se adota medidas que calculam o tamanho da língua livre, para então diagnosticar a existência da Anquiloglossia e seu grau de severidade.
Diante de uma variedade de questionamentos e visões próprias sobre o diagnóstico, existem outras questões cujo protocolo adotado no Brasil não abrange, trata-se dos diversos profissionais envolvidos e capacitados em diagnosticar um problema tão sério. Esse fato é relatado no estudo realizado por Lopes et. al. (2022), onde demonstra vários profissionais envolvidos no diagnóstico e tratamento da Anquiloglossia.
Dessa forma, não existe um padrão nem mesmo quanto a nomenclatura para o diagnóstico, visto que, cada profissional adota uma nomenclatura diferenciada, descredibilizando assim o diagnóstico preciso.
O tratamento cirúrgico é o mais realizado atualmente, porém, Silva (2016) defende a fonoterapia em casos de Anquiloglossia leve, quando não há comprometimento da função orofacial.
No SUS existem muitos registros de frenectomias realizadas, e todas atendem de uma forma padrão e generalizada do teste da linguinha. Este protocolo já é adotado por diversas maternidades no Brasil, e está limitado apenas às características físicas da linguinha
Os estudos apresentados por Lopes et. al (2022), indicam um aumento na taxa de frenectomias em bebês. Fato este, que levanta questões sobre a necessidade e os critérios para a realização desse procedimento. Como relata diversos estudos e autores, a indicação de frenectomia é baseada em diagnósticos subjetivos, visto que, nem todos os profissionais adotam o Protocolo Bristol, como recomendado pelo Ministério da Saúde (Brasil, 2018) o que pode resultar em intervenções desnecessárias. É crucial que os profissionais de saúde realizem uma avaliação criteriosa antes de recomendar a cirurgia, considerando as consequências potenciais para o bebê.
A realização abusiva da frenectomia pode ter várias consequências, como os Riscos Cirúrgicos que este procedimento pode envolver, tais como sangramentos e infecções. Podem causar também Impacto Psicológico, pois as intervenções cirúrgicas em bebês podem resultar em ansiedade nos pais e afetar o vínculo afetivo, além de impactar o desenvolvimento emocional da criança. Existe, ainda, as Expectativas Irrealistas, onde muitas vezes, os pais são levados a acreditar que a frenectomia resolverá todos os problemas relacionados à amamentação, o que nem sempre é verdade. Isso pode resultar em frustração e insatisfação (Diercks, 2020).
Por essas divergências existentes no cenário atual, os bebês e os seus responsáveis estão sendo levados por uma onda modista, que afirma que a Frenectomia irá solucionar todos os problemas inerentes à Anquiloglossia. Todavia, na verdade, alguns problemas de amamentação existem mesmo sem o diagnóstico real e verdadeiro da Anquiloglossia, pois a amamentação pode estar relacionada a pega correta da mamada, como relatado por Bonatti (2023), ou até mesmo à relação entre a mãe e o bebê durante a amamentação (Martinelli, 2020).
Dessa forma, com o intuito de promover segurança no diagnóstico e bem – estar no tratamento proposto, a Sociedade Brasileira de Pediatria, reivindica a revogação da Lei nº 13.002, e alega que o diagnóstico deve ser feito apenas pelo médico pediatra, assim como, qualquer prescrição de tratamento ou mesmo intervenção que se faça necessária somente pode ser realizada por este profissional (Sociedade Brasileira de Pediatria, 2019).
5. CONCLUSÃO/CONSIDERAÇÕES FINAIS
A realização abusiva da frenectomia em bebês para o tratamento da anquiloglossia é um fenômeno preocupante que requer uma reflexão crítica e ações concretas por parte dos profissionais de saúde, pois embora a frenectomia seja indicada em casos severos de anquiloglossia, sua realização em bebês tem se tornado uma prática comum e, muitas vezes, desnecessária.
A adoção de práticas baseadas em evidências, juntamente com uma educação adequada para pais e cuidadores, pode mitigar riscos e promover intervenções mais seguras e efetivas.
A necessidade de uma abordagem mais cuidadosa e informada é evidente. Profissionais de saúde devem fornecer informações claras e embasadas sobre a Anquiloglossia, as suas indicações para a Frenectomia e as alternativas disponíveis.
A educação dos pais é fundamental para que possam tomar decisões informadas e não se sintam pressionados a optar pela cirurgia sem uma avaliação completa dos benefícios e riscos.
A fim de evitar a realização abusiva de Frenectomias, algumas medidas poderiam ser tomadas quanto ao Protocolo de Avaliação, que prezem pelo desenvolvimento de protocolos padronizados e que orientem a avaliação de bebês com anquiloglossia, incluindo critérios objetivos para indicação da cirurgia, a Interdisciplinaridade, envolvendo uma equipe multidisciplinar, incluindo pediatras, fonoaudiólogos e cirurgiões, para assegurar uma abordagem mais completa, e o acompanhamento Pós-Operatório, a fim de monitorar a recuperação e avaliar a eficácia do procedimento. E neste processo, é fundamental que os profissionais de saúde priorizem sempre o bem-estar do bebê, e a melhor conduta a ser adotada, que minimize o impacto e o sofrimento do recém nascido.
REFERÊNCIAS
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1Discente do Curso Superior de Odontologia da Faculdade Edufor. Campus São Luís – MA. E-mail: acm-oliveira@hotmail.com;
2Docente do Curso Superior de Odontologia da Faculdade Edufor. Campus São Luís – MA. Doutora em Clínicas Odontológicas (São Leopoldo Mandic). e-mail: francilena.dias@edufor.edu.br