A PERSPECTIVA DE PROFESSORES DOS CENTROS MUNICIPAIS DE EDUCAÇÃO INFANTIL SOBRE A EDUCAÇÃO INCLUSIVA DE CRIANÇAS COM DEFICIÊNCIA

THE PERSPECTIVE OF TEACHERS FROM MUNICIPAL EARLY CHILDHOOD EDUCATION CENTERS ON INCLUSIVE EDUCATION FOR CHILDREN WITH DISABILITIES

LA PERSPECTIVA DE LOS DOCENTES DE LOS CENTROS MUNICIPALES DE EDUCACIÓN INFANTIL SOBRE LA EDUCACIÓN INCLUSIVA DE NIÑOS CON DISCAPACIDAD

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ma10202409181234


Aline Cristina Beijora1;
Cláudia Rejane Lima de Macedo Costa2;
Helenara Salvati Bertolossi Moreira 3;
Júlia Macedo Costa4;
Eliane Pinto de Góes5;
Carmen Lucia Rondon Soares6.


Resumo

Ao longo da história, as Pessoas com Deficiência passaram a ter maior visibilidade e autonomia. O estudo tem como objetivo compreender a perspectiva de professores dos Centros Municipais de Educação Infantil (CMEIs) sobre a educação inclusiva de crianças com deficiência. Participaram da pesquisa quatro CMEIs onde foi aplicado um questionário quali-quantitativo. Os resultados apontaram que 76,9% dos professores já tiveram alunos com alguma deficiência, 86,7% deles receberam orientações para lidar com os alunos com deficiência, 87,1% declararam que conseguiriam atuar em alguns tipos de deficiência e, mesmo estando capacitados, 59% dos professores relataram sentir-se desamparados para acolher as crianças com deficiência. 43,6% dos professores disseram que não conseguiriam identificar quaisquer atrasos em seus alunos, 94,9% dos participantes relataram sobre a capacidade dos fisioterapeutas atuarem no desenvolvimento motor de crianças e 79,4% desses profissionais afirmaram nunca ter presenciado situações de exclusão de crianças com deficiência nos CMEIs. Conclui-se que a inclusão das crianças com deficiência no ambiente escolar ainda é um desafio para a maioria dos profissionais da educação. A maioria dos professores receberam alguma formação para lidar com as crianças com deficiência e afirmaram nunca ter presenciado situações de exclusão de crianças com deficiência nas escolas. Uma parte dos professores sentem necessidade de mais formações e capacitações para acolherem essas crianças para que possam promover e estimular o desenvolvimento delas e para eles, o fisioterapeuta no ambiente escolar é importante para o desenvolvimento das crianças e contribui para uma educação inclusiva. 

Palavras-chave: Inclusão Escolar; Crianças com Deficiência; Professores; Fisioterapeutas.

Abstract

Throughout history, people with disabilities have gained greater visibility and autonomy. The study aims to understand the perspective of teachers at Municipal Early Childhood Education Centers (CMEIs) on inclusive education for children with disabilities. Four CMEIs participated in the research, where a qualitative and quantitative questionnaire was applied. The results showed that 76.9% of the teachers had already had students with some kind of disability, 86.7% of them received guidance on how to deal with students with disabilities, 87.1% stated that they could work with some types of disabilities and, even though they were trained, 59% of the teachers reported feeling helpless when it came to welcoming children with disabilities. 43.6% of the teachers said they could not identify any delays in their students, 94.9% of the participants reported on the ability of physiotherapists to work on the motor development of children and 79.4% of these professionals stated that they had never witnessed situations of exclusion of children with disabilities in the CMEIs. It is concluded that the inclusion of children with disabilities in the school environment is still a challenge for most education professionals. Most teachers received training to deal with children with disabilities and stated that they had never witnessed situations of exclusion of children with disabilities in schools. Some teachers feel that they need more training and qualifications to welcome these children so that they can promote and stimulate their development. For them, the presence of a physiotherapist in the school environment is important for the development of children and contributes to an inclusive education.

Keywords: Education; Disabled Children; Professors; Physical Therapists. 

Resumen

A lo largo de la historia, las Personas con Discapacidad han ganado mayor visibilidad y autonomía. El estudio tiene como objetivo comprender la perspectiva de docentes de los Centros Municipales de Educación Infantil (CMEI) sobre la educación inclusiva de niños con discapacidad. En la investigación participaron cuatro CMEI donde se aplicó un cuestionario cuali-cuantitativo. Los resultados arrojaron que el 76,9% de los docentes ya ha tenido estudiantes con discapacidad, el 86,7% de ellos recibió orientación sobre cómo tratar con estudiantes con discapacidad, el 87,1% declaró que estaría capaz de trabajar con algún tipo de discapacidad y, aunque estaban cualificados, el 59% de los docentes afirmaron sentirse impotentes a la hora de acoger a niños con discapacidad. El 43,6% de los docentes afirmó que no sabría identificar retrasos en sus alumnos, el 94,9% de los participantes informó sobre la capacidad de los fisioterapeutas para actuar sobre el desarrollo motor de los niños y el 79,4% de estos profesionales afirmó que nunca había presenciado situaciones de exclusión. de niños con discapacidad en CMEI. Se concluye que la inclusión de niños con discapacidad en el ámbito escolar sigue siendo un desafío para la mayoría de los profesionales de la educación. La mayoría de los docentes recibieron formación para tratar con niños con discapacidad y afirmaron que nunca habían visto situaciones en las que los niños con discapacidad fueran excluidos de las escuelas. Algunos profesores sienten la necesidad de una mayor formación y cualificación para acoger a estos niños para que puedan promover y estimular su desarrollo y para ellos, el fisioterapeuta en el entorno escolar es importante para el desarrollo de los niños y contribuye a una educación inclusiva.

Palabras clave: Integración Escolar; Niños con Discapacidad; Docentes; Fisioterapeutas. 

1. Introdução

Ao longo da história, diversos foram os marcos que reforçaram as conquistas e os direitos das Pessoas com Deficiência (PcDs). Marcos estes, possíveis de se exemplificar através da Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes (ONU, 1975), do Ano Internacional das Pessoas Deficientes promovido pela Organização das Nações Unidas (ONU, 1981), da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (ONU, 2006), como também, do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Brasil, 2015). Desta maneira, verificam-se os avanços quanto a visibilidade e a autonomia destas pessoas. Contudo, ainda há um longo caminho a ser percorrido para garantir a igualdade de oportunidades e a verdadeira inclusão social.

No Brasil, a educação é direito das PcDs, sendo este acesso ofertado preferencialmente na rede regular de ensino e, em caso de necessidades, são assegurados serviços de apoio especializados para atender as particularidades de cada aluno (Brasil, 1996). No entanto, mesmo com a garantia da educação através de leis e decretos, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no ano de 2023, a taxa de analfabetismo de pessoas com deficiência no Brasil é de 19,5%, superando a taxa de 4,1% no caso de pessoas sem deficiência (IBGE, 2024). Desta maneira, é perceptível que, embora haja suportes legais para a integração de PcDs no ambiente escolar, ainda existe uma desproporção significativa nos níveis de alfabetização quando comparados aos das demais pessoas, refletindo a existência de desafios para a real integração destes alunos. 

A educação inclusiva tem o propósito de responder à diversidade das necessidades de cada aluno, visando a sua maior participação durante a aprendizagem (Souza & Pletsch, 2017). Conforme Silva (2009) na escola inclusiva, é importante que os ambientes sejam preparados com recursos a serviço da comunidade escolar, e que, os estudantes realizem as atividades que são capazes de realizar nas suas turmas de origem, com os seus colegas do ensino regular. Segundo Briant & Oliver (2012), a implementação da educação inclusiva pode trazer consigo uma sensação de impotência e incapacidade dos professores, afinal, estes precisam estar preparados para educar amplamente, ouvir, prestar atenção ao diferente e respeitá-lo. Por esta razão, se faz fundamental a formação de grupos interdisciplinares envolvendo as famílias, alunos, professores, profissionais da saúde e de outras áreas relacionadas, buscando em conjunto o progresso e o desenvolvimento das crianças com deficiência (Júnior et al., 2008; Silva Neto et al.,, 2018; Nunes, 2023). 

O objetivo da Educação Infantil é o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade (Brasil, 1996). No caso de crianças com deficiência, uma grande aliada para que este desenvolvimento seja adquirido é a intervenção e acompanhamento por uma equipe multidisciplinar, incluindo o fisioterapeuta. Ao considerar o papel do fisioterapeuta em intervenções preventivas e reabilitadoras, é fundamental destacar a sua atuação no ambiente escolar, que ainda é pouco conhecida e explorada (Santos; Lara & Folmer, 2014). Inserir o fisioterapeuta no ambiente escolar tem como embasamento a análise de funcionalidade dos alunos, a verificação do desenvolvimento psicomotor e habilidades dos estudantes, o estudo da ergonomia do ambiente educacional e a promoção de ações que resultem em acessibilidade (CREFITO-2, 2023).  

Portanto, ao considerar-se a importância da educação infantil, bem como, do acompanhamento escolar por uma equipe multiprofissional, é plausível o questionamento a respeito da percepção dos professores sobre a inclusão de crianças com deficiência no ambiente escolar e qual é o conhecimento delas acerca do papel do fisioterapeuta. Por isso, o presente estudo tem como objetivo compreender a perspectiva dos professores dos Centros Municipais de Educação Infantil (CMEIs) sobre a educação inclusiva de crianças com deficiência. 

2. Metodologia

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (CEP) da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE) com o número de parecer 6.320.843. Para a realização da pesquisa, foram selecionados quatro Centros Municipais de Educação Infantil (CMEIs) em Cascavel, Paraná, conforme a proximidade geográfica à UNIOESTE e a disponibilidade e interesse em participar da pesquisa.  Após a concessão de campo para a pesquisa pela Secretaria Municipal de Educação e autorização das instituições participantes deu-se início às quatro fases desta pesquisa. 

Na primeira fase, os CMEIs foram submetidos às visitas técnicas e, durante estas visitas, foram realizadas observações da estrutura física dos ambientes e da disposição dos alunos nesses espaços. Posteriormente, debateu-se com alguns professores sobre a presença de crianças com deficiência e as dificuldades relacionadas à inclusão dessas crianças.   

Na segunda etapa, foi elaborado pelas pesquisadoras um questionário quali-quantitativo, que, posteriormente, foi aplicado aos profissionais da educação destes quatro Centros Municipais de Educação Infantil em Cascavel, Paraná, buscando coletar informações, dados, analisar a visão destes profissionais quanto a realidade da inclusão de crianças com deficiência no ambiente escolar e a percepção destes professores quanto a função do fisioterapeuta para esta inclusão, com a finalidade de encontrar a maneira mais viável e acessível de se estruturar uma rede de apoio interdisciplinar entre estas profissões. Juntamente a este questionário, foi anexado o Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE), com o objetivo de preservar os direitos e autonomia dos participantes da pesquisa, garantindo a compreensão dos respondentes acerca da execução e da finalidade do questionário.

Na terceira fase, os questionários foram submetidos à análise, leitura e interpretação dos dados e foram incluídos os questionários respondidos na íntegra, cujos respondentes tivessem assinado o TCLE. Além disso, foram excluídas e anuladas as respostas de perguntas objetivas que fossem rasuradas, tivessem mais do que uma opção assinalada, ou, ainda, quando os respondentes fornecessem respostas descritivas em questões objetivas. 

Para as questões quantitativas, foi realizada uma análise estatística descritiva simples não intencionando generalização dos resultados, que são características de estudos quantitativos (Estrela, 2018). Os dados foram tabulados e analisados com auxílio do Software Microsoft Office Excel®. Enquanto que, para as perguntas qualitativas do tipo exploratória e descritiva, que se caracterizam por proporcionar uma visão geral ou aproximada a respeito de determinado fato, assim como, descrever características de determinada população ou estabelecer relações entre variáveis, objetivando esclarecer ou modificar conceitos e ideias (Gil, 2008), foram analisadas essas perguntas, onde buscou-se identificar os termos e expressões mais frequentes. Estes dados foram inseridos em uma planilha Software Microsoft Office Excel® e posteriormente analisados observando a frequência de cada resposta. 

Na quarta fase, após a coleta, quantificação e análise das respostas, procurou-se elencar as respostas mais frequentes, a fim de fornecer um material didático no formato de cartilha digital elaborado por meio da plataforma de design Canva® (2024), voltado especialmente para os profissionais da educação, propondo ideias, estratégias e fornecendo orientações sobre como apoiar e auxiliar o desenvolvimento de crianças com deficiência de acordo com a ótica da Fisioterapia. A cartilha digital, de caráter informativo, tem como proposta ser uma forma simples, didática e objetiva de orientação. 

3. Resultados 

Os questionários foram distribuídos em quatro Centros Municipais de Educação Infantil para 82 profissionais da educação e destes, 39 questionários foram respondidos. A respeito da formação acadêmica relacionada à educação de crianças com deficiência, os resultados mostram que 66,7% dos profissionais receberam orientações durante a graduação, 51,2% realizaram pós-graduação ou alguma especialização na área, 71,8% participaram de cursos de capacitação ou formação continuada oferecidos pela prefeitura, secretaria de educação ou pela própria escola, 71,8% pesquisaram informações em páginas da internet, livros ou vídeos sobre o assunto (pesquisas próprias),  41,0% receberam orientações em campanhas de conscientização, 12,8% adquiriram informações por outras vias, tais como,  a leitura do currículo para a rede municipal da Educação Infantil, orientações de outros profissionais ou experiências pessoais com crianças com deficiência e 5,1% dos participantes afirmaram não apresentar qualquer tipo de formação referente a este tema.

Dentre os profissionais entrevistados, 76,9% já tiveram alunos com alguma deficiência, destes, 86,7% receberam orientações de como lidar com estes alunos, seja por meio de familiares, através da Secretaria Municipal de Educação, de outros profissionais ou até mesmo da coordenação do CMEI. Adicionalmente, todos os respondentes afirmaram que seria de grande importância receber mais orientações de profissionais e familiares para saber como acolher e promover o desenvolvimento desses alunos. Quando questionados sobre como sentiam-se ao tentar acolher crianças com deficiência no ambiente escolar, 59% dos professores relataram sentir-se desamparados e 79,4% desses profissionais afirmaram nunca ter presenciado situações de exclusão de crianças com deficiência.

Em relação ao preparo dos professores para auxiliar as crianças com deficiências, somente 2,6% dos respondentes disseram apresentar habilidades para lidar com qualquer tipo de deficiência, enquanto 87,1% declararam que conseguiriam atuar em alguns tipos de deficiência, e, por fim, 10,3% afirmaram não ter qualquer habilidade com qualquer tipo de deficiência. Em relação ao manuseio de órteses, próteses e cadeiras de rodas, 28,2% dos professores afirmaram apresentar habilidades para manusear esses instrumentos, enquanto 69,2% declararam não apresentar tais habilidades. Além disso, 51,3% dos professores se consideram aptos para identificar possíveis atrasos em seus alunos, inclusive, no caso de identificar alguma limitação, 64,1% disseram que saberiam como agir em seguida. No entanto, 43,6% dos professores afirmaram que não conseguiriam identificar quaisquer atrasos em seus alunos.

Os participantes foram inquiridos sobre sua visão pessoal do conceito de deficiência e, das 38 respostas para esta questão, quinze vezes os indivíduos com deficiência foram comparados explicitamente com “indivíduos normais”, quatorze vezes considerou-se a deficiência como um “impedimento”, dez vezes foi definida como uma “incapacidade” e seis vezes a caracterizaram como uma “dificuldade”. Somente uma vez foi mencionada que, embora as pessoas com deficiência tivessem características específicas, estes indivíduos são dotados de capacidade de desenvolvimento caso sejam estimulados, como mostram os dados no Gráfico 1. 

             Gráfico 1. Conceito de deficiência para os professores dos Centros Municipais de Educação Infantil. 

Fonte: Dados da Pesquisa (2024).

Ao observarmos o gráfico 1, no ponto de vista dos profissionais da educação que participaram da pesquisa, o conceito de deficiência para eles é que os” indivíduos com deficiência” são comparados com “indivíduos normais”, sendo que uma parte dos professores considera a deficiência como um “impedimento”. Alguns professores definiram a deficiência como uma “incapacidade” e a caracterizaram como uma “dificuldade”. Somente uma vez o conceito de deficiência foi estabelecido que, embora as pessoas com deficiência tivessem características específicas, estes indivíduos são dotados de capacidade de desenvolvimento caso sejam estimulados. 

Ao serem questionados sobre seu conhecimento acerca da profissão do fisioterapeuta, 30,3% dos participantes afirmaram apresentar um conhecimento pleno, enquanto 69,7% dos profissionais da educação indicaram um nível de conhecimento razoável sobre a função do fisioterapeuta.  Todos os professores expressaram a crença na viabilidade da colaboração multidisciplinar entre professores e fisioterapeutas, bem como na possibilidade de prevenir problemas físicos com a assistência desses profissionais. Quando indagados sobre a capacidade dos fisioterapeutas atuarem no desenvolvimento motor de crianças, independente da presença ou ausência de algum déficit, 94,9% dos participantes afirmaram acreditar nessa possibilidade.  

Ao serem inquiridos sobre a acessibilidade nos CMEIs para todos os alunos, 18,4% dos participantes expressaram que no CMEI em que trabalham oferece plena acessibilidade, enquanto 52,6% indicaram que é razoavelmente acessível, adicionalmente, 29,0% relataram que o ambiente não é acessível para as crianças com deficiência. Em relação à acessibilidade em áreas recreativas, 69,2% dos respondentes afirmaram que tais áreas não são acessíveis. No que diz respeito aos possíveis riscos à segurança das crianças com deficiência, como piso escorregadio e fácil acesso à rua, entre outros exemplos, 64,1% dos professores reconheceram a existência de algum risco. Em relação à possibilidade de adaptação de materiais e objetos para crianças com deficiência, 76,9% dos educadores afirmaram ser viável realizar estas adaptações.

Quando perguntados a respeito da inclusão de pessoas com deficiência no Brasil, 94,9% dos respondentes afirmaram que o Brasil não é um país inclusivo. Ao elencar as maiores dificuldades na implementação da educação inclusiva nos CMEIs, em 39 respostas, foram mencionadas 17 vezes a falta de profissionais, 14 vezes a falta de formações, 13 vezes a falta de recursos, 10 vezes o ambiente do CMEI e 10 vezes a respeito da grande quantidade de alunos em sala de aula, conforme observado no gráfico 2. 

Gráfico 2. Maiores dificuldades enfrentadas pelos professores na implementação da educação inclusiva nos CMEIs. 

Fonte: Dados da Pesquisa (2024).

Ao analisarmos o gráfico 2, pode-se observar que as maiores dificuldades elencadas pelos professores dos CMEIs foram a falta de mais profissionais, seguido da necessidade de mais capacitações e formações de como lidar com as crianças com deficiência, a importância de ter mais investimentos nos Centros Educacionais e a quantidade de alunos em sala de aula. 

Quando questionados sobre como efetivar a educação inclusiva no Brasil, 14 vezes foi mencionada a necessidade de mais profissionais especializados na área, 13 vezes a importância de melhorar o ambiente e a estrutura das escolas, 11 vezes a necessidade de mais formações, 7 vezes sobre leis efetivas e 5 vezes a necessidade do trabalho conjunto e multidisciplinar, conforme os dados do gráfico 3.

          Gráfico 3. Intervenções práticas para efetivação da educação inclusiva nas escolas no Brasil. 

Fonte: Dados da Pesquisa (2024)

Os professores respondentes da pesquisa mencionaram que o Brasil não é um país inclusivo e o gráfico 3 mostra que na opinião desses educadores, para que haja uma efetivação da educação inclusiva nas escolas do Brasil é necessário ter mais profissionais especializados, melhor ambiente e estrutura para trabalhar, mais formações e capacitações, seguidos de leis efetivas e um trabalho multidisciplinar. 

4. Discussão 

Na presente pesquisa, aplicou-se um questionário quali-quantitativo buscando compreender a realidade nos Centros Municipais de Educação Infantil quanto à inclusão de alunos com deficiência. Conforme os resultados encontrados, foi possível perceber que, de acordo com os professores, o Brasil ainda não é efetivamente inclusivo no ambiente escolar e que muitos profissionais da educação não se sentem preparados para acolher as crianças com deficiência. Para eles, o fisioterapeuta inserido no ambiente escolar é importante para o desenvolvimento dessas crianças e contribui para uma educação inclusiva. 

Conforme observado nas respostas objetivas e subjetivas do questionário aplicado, é possível reconhecer a complexidade do assunto em razão das diferentes experiências e realidades dos professores respondentes.

4.1 Definição do termo “pessoa com deficiência”

O termo “pessoa com deficiência” sofreu grandes mudanças no decorrer de cada época, sendo atribuído aos valores de diferentes períodos históricos. Portanto, é necessário compreender o correto emprego do termo ao referir-se a este grupo, pois ao utilizá-lo de modo errôneo, discrimina-se os indivíduos e se ignoram seus direitos já garantidos (Lisboa, 2020). 

No presente trabalho, quando indagados sobre sua concepção do termo deficiência, na maioria das respostas, verificou-se comparações entre pessoas com deficiência e aquelas que, segundo os respondentes, eram “consideradas normais”. Segundo Sassaki (2003), este termo carrega consigo a visão de que as pessoas com deficiência seriam “anormais”, quando, na realidade, o conceito de “normalidade” é questionável, destacando que, referir-se a alguns indivíduos como “normais” deixa subentendida a existência de um padrão idealizado de seres humanos, perpetuando estigmas e ignorando a riqueza da diversidade humana.

Atualmente, termos como “incapazes”, “crianças especiais”, “portadores de deficiência”, encontrados em algumas respostas desta pesquisa, bem como o emprego de linguagens capacitistas, não são mais utilizados ao referir-se a este grupo social, pois segundo Lisboa (2020), o termo “portador de deficiência” ou “pessoa deficiente” foi abandonado por sugerir que tal pessoa era inteiramente deficiente. A expressão mais adequada é Pessoa com Deficiência (PcD) que valoriza, antes de qualquer condição, o cidadão, mostrando maior dignidade à realidade da deficiência e que foi definida em 2006 pela Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (ONU, 2006). Lisboa (2020) ainda destaca que a deficiência encontra-se relacionada ao impedimento físico, sensorial e/ou intelectual, trazendo como resultado para o indivíduo algumas limitações para a realização de uma ou mais atividades importantes em sua vida. Segundo Nogueira et al., (2016) deve-se tratar a pessoa com deficiência em sua individualidade, na sociedade em que vive, de forma a respeitar e determinar as possibilidades de se enfrentar essa condição e as limitações às quais está submetida.

4.2 Realidade docente

4.2.1 Formação

De acordo com Silva Neto et al., (2018), o grande objetivo da Educação Inclusiva é buscar o ensino de todos os alunos em conjunto, tornando-os aptos para o convívio social. Neste mesmo sentido, Carneiro (2012) já destacava que a inclusão seria um resultado da junção do conhecimento adquirido pelos professores e da disponibilidade em buscar inovação considerando todos os alunos e suas características individuais. Segundo Rozek (2012), os professores deparam-se em seu cotidiano com diversas situações para as quais não têm respostas pré-definidas, sendo frequentemente confrontados com novas exigências e questionamentos. Isto significa que a formação docente é um processo permanente, e busca fornecer aos professores maneiras autônomas de agir. 

No presente estudo, em grande parte das respostas, destacou-se a falta de profissionais, escassez de formações e a falta de recursos como um dificultador importante. Além disso, ao responder sobre a melhor maneira de tornar a educação verdadeiramente inclusiva no Brasil, destacou-se a importância de mais profissionais especializados, melhor ambiente e estrutura e a necessidade de mais formações. Quando questionados a respeito de sua formação pessoal, somente uma pequena parte dos professores elencaram não ter qualquer formação em relação ao tema. 

Ainda sobre este assunto, o participante 26, fez uma observação fundamental:

O que me assusta é o comodismo de alguns colegas educadores quando nos deparamos com formações específicas e a resposta vem como uma decepção aguda, “a mesma coisa” tudo de novo”, etc. […] (Participante 26).

Através desta colocação, é possível verificar um dualismo de realidades: embora formações sejam ofertadas, nem sempre estas são convidativas e efetivas. Segundo Pletsch (2009), a formação de professores e outros agentes de educação ainda segue um modelo tradicional, o que nem sempre é adequado para suprir as exigências a favor da educação inclusiva. Dessa forma, torna-se imprescindível que as formações contemplem o embasamento teórico, mas, além disso, a aplicação prática. De acordo com Antunes, Rech & Ávila (2016), acredita-se que os professores necessitam de formação que os instrumentalizem para que possam atender às necessidades próprias das crianças da educação especial e que a formação continuada faz- se importante para a atuação do professor frente as pessoas com deficiência.

4.2.2 Acessibilidade dentro e fora da sala de aula

Para Lovison et al., (2021), o ambiente de CMEIs em que a criança está inserida influencia na motricidade, especialmente envolvendo atividades diárias e o uso de brinquedos. Segundo Nascimento (2014), a garantia da inclusão não se limita a matricular alunos com necessidades educativas especiais em escolas regulares, mas, envolve fornecer amparo aos professores e às escolas, reformulando práticas pedagógicas com o objetivo de combater qualquer forma de discriminação. 

Conforme verificado nas respostas, um dos fatores que mais influencia a inclusão é a grande quantidade de alunos em sala de aula, o qual foi mencionado muitas vezes nos questionários. Para o participante 16, este fato, associado à falta de professores de apoio Pedagógico (PAP) são grandes dificuldades encontradas na prática:

Falar de inclusão é fácil, mas na prática é complicado, colocam na sala 30 alunos e alguns alunos com deficiência e não colocam pessoas especializadas para auxiliar as professoras. Os pais têm que entrar na justiça para conseguir assegurar um direito que é da criança (Participante 16). 

O estudo de Briant & Oliver (2012), menciona que o número excessivo de alunos nas salas e o pouco investimento na formação de professores também receberam destaque nos discursos dos educadores. A partir disso, é forçoso reconhecer que tais aspectos dificultam o trabalho dos professores e isso se reflete em todos os seus alunos. Por isso Briant & Oliver (2012), coloca que muitas das mudanças apontadas como fundamentais pela política da Educação Inclusiva, como um número menor de alunos na sala de aula, a formação continuada dos professores, a utilização de estratégias pedagógicas diferenciadas, têm que caminhar simultaneamente com a ampliação da qualidade de ensino para todos os alunos.

Outro fator que foi relatado pelos professores diz respeito ao espaço escolar. Verificou-se nas respostas, que uma pequena parte dos professores acreditam trabalhar em um ambiente acessível e, além disso, mais da metade dos participantes alertam sobre a existência de riscos para a segurança dos alunos no ambiente destes CMEIs.

Para Nogueira, Maia & Farias (2015), a escola é imprescindível para formar indivíduos na sociedade, onde, além de conhecimentos técnicos, transmite-se o ensinamento de valores e princípios buscando o respeito à diversidade. No entanto, a falta de acessibilidade, dificulta a participação ativa de crianças com deficiência neste ambiente, restringindo o seu desenvolvimento e a convivência com as outras crianças. Conforme Antunes, Rech & Ávila (2016), na atual perspectiva da educação inclusiva, almeja-se que o estudante ingresse na escola comum e que nela permaneça com igualdade de oportunidades, para que possa desenvolver-se dentro de suas potencialidades.

4.2.3 Acesso a informações

Segundo Lima & D’Ambroso (2018), o direito das pessoas com deficiência ao acesso de informação, comunicação e conhecimento é reconhecido como fundamental tanto no âmbito internacional quanto no ordenamento jurídico brasileiro, sendo reafirmado pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/15). Porém, no presente questionário, a maioria dos respondentes relataram que se sentem parcialmente preparados para lidar com estes alunos.

Um exemplo concreto foi exposto pelo participante 29:

Meu […] irmão era deficiente físico, meus pais tiveram que lutar muito para conseguir ao menos uma professora de apoio que pudesse atender somente ele. Muitas pessoas não conhecem seus direitos por falta de informação, até porque muitas vezes o governo nem faz questão de informar. […] (Participante 29).

Com esta afirmação, percebe-se que, apesar de existirem leis no Brasil que garantem apoio às pessoas com deficiência e buscam incluí-las nas escolas, muitas vezes, as famílias e membros das instituições de ensino não recebem orientações claras sobre como agir e colocar em prática o que está estabelecido nas leis. Este cenário expressa a necessidade de estratégias mais eficazes para disseminar e divulgar as leis já existentes e, assim, implementar efetivamente aquilo que preveem. Conforme Silva et al., (2020), o Regimento Escolar e o Projeto Político Pedagógico (PPP) de uma escola tornam-se fundamentais para o planejamento e execução de ações na perspectiva da educação inclusiva. 

É importante ressaltar que a maioria dos professores respondedores desta pesquisa afirmaram nunca ter presenciado situações de exclusão de crianças com deficiência nos CMEIs. Segundo Capellini & Fonseca (2017), a efetivação da escola inclusiva ocorre a partir das ações do coletivo que passam por uma reformulação do ambiente escolar como um todo, desde o espaço físico, dinâmica de sala de aula, currículo, formas e critérios de avaliação e para tanto, é necessário que a equipe escolar cultive em seu cotidiano a cultura inclusiva, ou seja, práticas fundamentadas na ética, no respeito às diferenças, na solidariedade, no compromisso de professores, pais, diretores, dirigentes, secretários de educação e comunidade com a aprendizagem dos alunos.

4.3 Atuação conjunta de professores e fisioterapeutas na educação inclusiva

Embora todos os profissionais consultados tenham expressado a crença na viabilidade de colaboração entre fisioterapeutas e professores, somente poucas vezes o trabalho multidisciplinar foi mencionado como uma forma de tornar a educação inclusiva na prática. 

É importante considerar que a maioria dos respondentes afirmaram conhecer razoavelmente a profissão do fisioterapeuta. Para a viabilidade do trabalho conjunto entre professores e fisioterapeutas, é necessário que o fisioterapeuta divulgue suas funções dentro do contexto escolar, para que, assim, a comunidade educacional compreenda claramente a sua relevância neste meio.  De acordo com Viçosa et al., (2020), a promoção da saúde no contexto da escola é uma preocupação que se faz constante entre profissionais atuantes na área de Fisioterapia na saúde do escolar.   

De acordo com Niehues & Niehues (2014), o fisioterapeuta desempenha um papel fundamental para a promoção de educação inclusiva, atuando em diversos âmbitos, desde a prevenção até a reabilitação em saúde. Além de oferecer suporte às necessidades específicas de cada criança, pode orientar os professores quanto ao posicionamento e manuseios adequados de crianças com deficiência, adaptar o ambiente escolar para garantir acessibilidade, promover atividades conjuntas entre pais e profissionais da educação para a conscientização e educação em saúde. Carissimi et al., (2024), em seu estudo sobre Desafios enfrentados pelos pais e familiares de crianças com Transtorno do Espectro Autista matriculadas em Centros Municipais de Educação Infantil de Cascavel, Paraná, relata que 85,7% dos pais e familiares que participaram da pesquisa estão cientes da importância da fisioterapia na promoção da independência e autonomia de crianças com Transtorno do Espectro Autista. 

Na presente pesquisa, ao observar as respostas, percebe-se que uma parte dos profissionais da educação consideram-se despreparados para identificar atrasos, e, caso identificassem, alguns dos professores não saberiam como agir. O papel que o fisioterapeuta pode desempenhar nesta situação envolve, por exemplo, a capacitação dos professores, e, o fornecimento do suporte para a identificação e manejo destes atrasos, por exemplo, com o treinamento destes profissionais sobre os marcos motores típicos e atípicos, bem como sinais e sintomas de diferentes tipos de deficiências. No caso de algum déficit ser identificado, o fisioterapeuta pode fornecer suporte para os profissionais da educação, avaliando estes alunos, fornecendo um diagnóstico cinesiofuncional, e, se necessário, auxiliando no encaminhamento para os outros profissionais. Conforme Viero Badaró et al., (2017) o fisioterapeuta tem muito a contribuir no ambiente escolar, pois estes profissionais são capacitados para trabalhar a promoção da saúde, a prevenção de doenças e a recuperação funcional de forma integrada com outros profissionais. 

Por esta razão, ao final deste estudo, elaborou-se uma cartilha digital, com tópicos relevantes sobre a inclusão no ambiente escolar segundo a perspectiva da Fisioterapia, reunindo legislações, informações, esclarecendo dúvidas verificadas no questionário, relembrando os marcos motores no desenvolvimento infantil, tendo como objetivo a educação em saúde.

5. Conclusão

Os resultados dessa pesquisa indicam que a inclusão das crianças com deficiência no ambiente escolar ainda é um desafio para a maioria dos profissionais da educação. A maioria dos professores já tiveram alunos com alguma deficiência, receberam orientações, treinamentos, cursos de como lidar com as crianças com deficiência e afirmaram nunca ter presenciado situações de exclusão de crianças com deficiência nas escolas.

Uma parte dos professores sentem necessidade de mais formações e capacitações para acolherem as crianças com deficiência para que possam promover e estimular o desenvolvimento delas, pois elas se sentem desamparadas para lidar com as crianças com deficiência. Ao elencar as maiores dificuldades na implementação da educação inclusiva nas escolas de educação infantil, foram mencionadas por parte dos professores que as principais dificuldades eram a falta de mais profissionais, a falta de mais formações e de mais recursos, a estrutura e grande quantidade de alunos em sala de aula. 

Na percepção dos professores, o fisioterapeuta inserido no ambiente escolar é importante para o desenvolvimento dessas crianças contribuindo para uma educação inclusiva. Portanto, juntos, Profissionais da Educação e Profissionais da Saúde, podem tornar o ambiente escolar mais inclusivo, proporcionando igualdade em oportunidades para todas as crianças. Esse trabalho em conjunto, promove o desenvolvimento integral dos alunos, garantindo o acesso igualitário a uma educação inclusiva adaptada às suas necessidades individuais. 

Considerando que o presente estudo apresenta limitações como um pequeno número de sujeitos participantes da pesquisa e foi realizado em curto período, ressalta-se a importância da continuidade dos estudos relacionados aos benefícios da educação inclusiva para as crianças com deficiência. Mais pesquisas que contemplem um maior número de sujeitos e com avaliações em longo prazo fazem-se necessárias para verificar a permanência dos conhecimentos adquiridos com a intervenção de promoção da saúde. Diante dos indicativos deste estudo, indica-se a necessidade de pesquisas futuras para aprimorar o conhecimento sobre a inclusão das crianças com deficiência na educação infantil.  

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