MEDIATION AS A LEGAL INSTRUMENT TO INHIBIT IMPACTS NEGATIVES FOR MINORS IN LITIGIOUS DIVORCES
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8309741
Antônio Henrique Prado Ruiz Filho 1
Tiago Feres Massouh 1
Resumo
O presente artigo científico, em um primeiro momento, efetua o estudo da crise do Poder Judiciário brasileiro, bem como a apresentação das possíveis soluções que as vias conciliativas podem trazer (em especial a mediação), para sanar as múltiplas deficiências e inconsistências da jurisdição estatal. Posteriormente, é retratada a essência deste trabalho, especificamente se busca compreender a utilização do instituto da mediação no sentido de se oferecer decisões consensuadas e não degradantes para divórcios litigiosos contemplando menores, de modo a garantir a estabilidade familiar. O Direito Comparado também é explorado em virtude de uma maior abrangência da pesquisa. Por fim, é realizada uma série de considerações sobre a temática sob análise, com base nas informações trazidas e os fundamentos legais intrínsecos à ordem jurídica pátria, com enfoque na Lex Legum brasileira (Constituição Federal).
Palavras-chave: Mediação. Vias conciliativas. Poder Judiciário
1 INTRODUÇÃO
Em uma abordagem inicial, são apresentados os fatores que, conjuntamente, promoveram uma crise do Poder Judiciário brasileiro. Por um lado, a crise referida se deve aos problemas internos do próprio aparelho jurisdicional do Estado, podendo-se citar a morosidade, o alto custo do processo e a quantidade excessiva de lides a serem apreciadas (ROCHA & SALOMÃO, 2017). Porém, existe um outro aspecto que deve ser considerado, trata-se de fatores exteriores ao Poder Judiciário que o impactam negativamente, como a complexidade e elevado grau de litígios presentes na sociedade moderna (WATANABE, 1988). Todos estes obstáculos ao bom funcionamento da Justiça acarretam um considerável descrédito da prestação jurisdicional do Estado, criando-se a necessidade de repensar o sistema e encontrar novas vias para a efetivação dos direitos (GRINOVER, 2008).
Justamente em decorrência disto, as vias conciliativas “reaparecem” no cenário nacional, sendo a esperança de uma solução jurídica. As vias conciliativas possuem vários benefícios e características que são potentes para apagar ou, pelo menos, amenizar os problemas existentes já citados, como a morosidade e a complexidade. Ainda, elas possuem funções que a jurisdição estatal não possui, como a função social e a função política. (GRINOVER, 2008). Dentre as vias conciliativas, a presente pesquisa focaliza na via da mediação, uma técnica pela qual ocorre uma facilitação da comunicação entre as partes, uma “restauração” das relações pessoais para que elas mesmas cheguem a uma resolução da disputa (SCAVONE JÚNIOR, 2020).
Após esta abordagem introdutória, é apresentado o fundamentum, o ponto central deste trabalho, consistente precisamente no uso da mediação para resolução de litígios em divórcios litigiosos envolvendo menores. O uso da mediação nesta situação propicia um ambiente amigável e resiliente para os menores que são normalmente impactados negativamente pelo processo judicial (DA SILVA, 2013). Sobre este assunto específico, são explorados entendimentos de juristas estrangeiros. No contexto espanhol, juristas entendem que a mediação nestes casos é bastante útil para descomplicar amplamente a comunicação dos pais para com os filhos sobre a dissolução da sociedade conjugal (SERRANO & URIOS, 2004). Já no âmbito estadunidense, foi demonstrado, em um estudo de caso, que a mediação permitiu esclarecer as “raízes” do motivo do divórcio, verificando-se as bases sociológicas que contribuíram para tal (MONK & WINSLADE, 2000).
2 A CRISE DO PODER JUDICIÁRIO E A EXPONENCIAÇÃO DAS VIAS CONCILIATIVAS
Como já dito, são incontáveis os fatores que contribuíram para a crise do sistema judiciário; é possível explanar sobre alguns destes fatores. Caio Cesar Vieira Rocha e Luis Felipe Salomão tratam de alguns destes fatores, que são: o “afogamento” do Poder Judiciário brasileiro; a morosidade e alto custo do processo judicial. Observemos o que eles muito bem preceituam:
Além do inquestionável “afogamento” do Judiciário, a busca por este caminho poderá não trazer aos jurisdicionados o ideal de justiça esperado, pois apesar dos diversos esforços do Poder Público para melhorar a prestação jurisdicional no sistema jurídico estatal, ele ainda é moroso, caro e de difícil utilização para a maioria da população. (ROCHA; SALOMÃO, 2017, p. 235)
Kazuo Watanabe, em um tempo mais remoto, já criticava a estrutura da jurisdição estatal, considerando que ela é muito “pesada” e “formal”. Ele expressava seu anseio por um Poder Judiciário “mais leve” e “mais ágil”. Ainda, lecionou que a complexidade da sociedade moderna somada à transformação social em alta velocidade, fez com que os conflitos de interesses fossem impulsionados e surgissem uma grande quantidade de conflitos. Desta maneira, ocorreu uma insuficiência dos instrumentos processuais inerentes ao Poder Judiciário brasileiro para a resolução de disputas que se insurgiram na sociedade (WATANABE, 1988).
Por sua vez, Ada Pellegrini Grinover efetua uma análise muito bem desenvolvida sobre a crise do Poder Judiciário no âmbito brasileiro. Dentre os elementos responsáveis pela crise; a autora cita a morosidade dos processos; o custo processual; a burocratização existente na gestão dos processos; complicação procedimental; a mentalidade dos magistrados (que frequentemente ignoram a legislação); ausência de informação e orientação para os detentores dos interesses em conflito e sérias deficiências na gratuidade da justiça. Todos estes fatores, em conjunto, formam obstáculos fatigantes para o acesso à justiça via Poder Judiciário (GRINOVER, 2008).
Esta crise descrita provoca muitos efeitos negativos à sociedade e à ordem jurídica, dentre os quais se pode citar o descrédito da magistratura e a aparição de “justiceiros”, que tentam sanar os conflitos arbitrariamente “com suas próprias mãos”, através de ações violentas. Um aspecto importante também explano pela autora, já introduzido em momento anterior, é que a densidade excessiva de processos nas mesas dos julgadores, em parte, é consequência da intensificação da litigiosidade na sociedade moderna, considerando seus “rearranjos” inesperados (GRINOVER, 2008).
Em face de tal declínio da Justiça, é necessário repensar o sistema de resolução de disputas, colocando à tona o ressurgimento das vias conciliativas. A priori, estas vias possuem o papel de melhorar a função da Justiça, o seu desempenho, isto é o que se denomina “eficientismo das vias conciliativas” ou “função funcional das vias conciliativas”. Decorre este papel, primordialmente do fato destas vias desobstruírem os tribunais brasileiros. Além do mais, as vias conciliativas não se limitam à aplicação de uma norma jurídica no caso concreto, elas possuem “ferramentas” que permitem a investigação das bases sociológicas responsáveis por gerar problemas entre as pessoas; isto é o que se chama de “pacificação social”. Por fim, estas vias atendem aos reclames da democracia participativa, pois permite a participação popular na efetivação da dos direitos. Portanto, a autora diz que há um fundamento funcional, social e político nas vias conciliativas (GRINOVER, 2008).
Humberto Dalla Bernardina de Pinho e Marcelo Mazzola, sobre o tema da crise da Justiça, pontuam que o responsável pelo fracasso da efetividade da prestação jurisdicional não está relacionado à legislação vigente no País, apesar de haver um mito que expresse o contrário. Vejamos o que eles consideram:
Um dos mitos que se exige desfazer é o de que o Código de Processo Civil é o responsável pela morosidade crônica da prestação jurisdicional. A crua realidade é bem outra: a ineficiência da administração da justiça tem como causas primordiais a ausência de um serviço judiciário aparelhado e a banalização das demandas judiciais. No Brasil, litiga-se, em todo território nacional, por tudo. É absolutamente surpreendente e intolerável a judicialização dos conflitos individuais sobre questões que poderiam ser dirimidas fora do ambiente forense (por exemplo: acesso a medicamentos, inserção abusiva do devedor nos cadastros de proteção ao crédito, extravio de bagagem, atraso de voo, cobrança de débitos condominiais, má prestação de serviços em geral etc.). (MAZZOLA; PINHO, 2021, p. 21)
Na obra denominada “Mediação de Conflitos”, coordenada por Luciana Aboim Machado Gonçalves da Silva, se diz que a morosidade, o alto custos dos processos judiciais e a burocratização não condizem com a realidade econômica e social brasileira. O que ocorre, ainda, é um dogmatismo em relação ao Poder Judiciário para a resolução de disputas, a autora leciona: “preciso desapegar-se do dogmatismo exacerbado e perceber caminhos alternativos satisfatórios extrajudiciais” (DA SILVA, 2013).
3 MEDIAÇÃO: CONCEITO E CONSIDERAÇÕES OPORTUNAS
É notável a presença milenar da mediação no mundo oriental, em detrimento da mediação relativamente recente surgida no Ocidente. Jorge Miklos e Sophia Miklos abordam a historicidade da mediação na cultura oriental de modo bem compreensível. No mundo oriental, a mediação faz parte da cultura de muitos povos, como por exemplo, chineses, japoneses e judeus. Confúcio, filósofo clássico do Oriente, entendia ser necessária a resolução de problemas com base nos valores morais e vias conciliatórias em vez da utilização de coerção. Já no Ocidente, a mediação seguiu, recentemente, os rumos de países como Estados Unidos e França. Nos Estados Unidos, as resoluções alternativas de disputa ganharam força nos anos 70 em decorrência do alto custo do processo judicial (MIKLOS; MIKLOS, 2021).
É importante identificar e entender o conceito de mediação, antes de mais apontamentos. O conceito de mediação está explícito no artigo 1° da Lei 13.140/2015, a “Lei da Mediação”. De acordo com sua conceituação legal, a mediação é um “meio de solução de controvérsias”, trata-se também de uma “atividade técnica exercida por um terceiro imparcial e sem poder decisório que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia” (art. 1°, Lei 13.140/2015).
O segundo artigo da referida lei é de suma importância, pois aborda os princípios norteadores da mediação, sendo eles a imparcialidade do mediador; isonomia entre as partes; oralidade; informalidade; autonomia das vontades das partes; busca do consenso; confidencialidade e boa-fé (art. 2°, Lei 13.140/2015). É claro que a lei traz inúmeros outros aspectos da mediação, como por exemplo, seu procedimento e possibilidade de atuação dos mediadores, porém este não é o foco deste capítulo, que deve contemplar outras considerações. Conforme lecionam Humberto Dalla Bernardina de Pinho e Marcelo Mazzola, a mediação pode ser concebida como um mecanismo de resolução de conflitos, pelo qual as próprias partes formulam conjuntamente um “sistema de decisão”, de maneira a satisfazer a todos (MAZZOLA; PINHO, 2021).
Luiz Antonio Scavone Júnior exterioriza, sobre o mediador, que ele não participa proativamente da decisão, mas tão somente auxilia as partes envolvidas no litígio, para que elas cheguem a uma decisão. Uma das maneiras de auxiliar as partes é “neutralizar” as fortes emoções que orbitam em torno do conflito, facilitando a solução da controvérsia. Por este motivo que a mediação é bastante útil nas situações em que a lide entre as partes não possui (ou não possui exclusivamente) teor patrimonial (SCAVONE JÚNIOR, 2020). Ainda, sobre esta faceta da mediação, Carlos Eduardo de Vasconcelos transmite que a mediação possui um “trato intersubjetivo, transdisciplinar”, pois ela é potente para tratar questões sensitivas, emotivas e cognitivas (DE VASCONCELOS, 2020).
Jorge Miklos e Sophia Miklos também abordam um ponto interessante da mediação. É de se pontuar que a mediação, de acordo com o Novo Código de Processo Civil, é atrelada aos casos em que as partes já se conheçam antes da ocorrência da lide. Distintamente da conciliação, o mediador não sugere uma solução ao conflito, a tarefa dele é limitada a intermediar/facilitar a comunicação entre as partes, fazendo com que eles mesmos encontrem uma solução (MIKLOS; MIKLOS, 2021).
Fernanda Tartuce estabelece uma série de semelhanças e diferenças existentes entre a mediação e a conciliação, sendo esta outra alternativa para resolução de disputas. As semelhanças entre ambas são várias, vale citar duas delas. Primeiro que anto uma como outra contam com a participação de um terceiro imparcial. As duas também são frutos do exercício da autonomia privada. Em relação às diferenças, a principal delas é que o mediador não sugere, como dito antes, soluções para o litígio, mas o conciliador sim. Outrossim, como já retratado também, a mediação possui uma essência subjetiva, voltada para os elementos subjetivos do caso, enquanto a conciliação possui uma essência objetiva, direcionada a dirimir objetivamente os problemas da lide (TARTUCE, 2021).
Caio Cesar Oliveira Rocha e Luis Felipe Salomão expressam que a função do advogado na mediação é distinta de sua função na jurisdição estatal. Na mediação, o advogado deve propiciar uma atmosfera cooperativa, além de buscar soluções construídas em conjunto com a outra parte. As conversações que devem ocorrer entre os advogados devem ter caráter cordial. O advogado, na mediação, de certa forma, simplesmente executa o inciso VI do artigo 2° do Código de Ética e Disciplina da OAB (VI, art. 2° CED), que determina que o advogado deve incentivar a conciliação e a mediação entre as partes, a qualquer tempo (ROCHA; SOLOMÃO, 2017).
Uma última consideração a ser feita sobre este assunto específico é a trazida por Luiz Fernando do Vale de Almeida Guilherme, que expõe uma faceta muito interessante da mediação, pouco conhecida. O autor supracitado diz que existem, ao redor do mundo, distintas escolas de mediação, sendo mais expressivas três delas: escola circular narrativa, escola transformativa e escola tradicional-linear (Escola de Harvard). A primeira delas possui o escopo central de promover a exteriorização das emoções dos mediados, “o mediador objetiva causar desor•ganização no sistema capaz de provocar uma nova organização não circular”. A escola transformativa apoia a mudança de relacionamento entre as partes, “mantém um foco dual ao longo do processo de mediação: empoderamento e reconhe•cimento”. Por fim, a última é a mais conhecida, “sem rodeios”, conta com a participação de um terceiro que é responsável pela facilitação da comunicação. (GUILHERME, 2022).
4 O USO DA MEDIAÇÃO PARA DIVÓRCIO LITIGIOSO ENVOLVENDO MENORES
Apresentadas as principais observações sobre a mediação, cabe agora estudar o uso dela na temática específica das lides de divórcios não consensuais, que envolvam interesses de menores. A mediação, como visto, é muito útil para a resolução de conflitos que não sejam, pelo menos exclusivamente, financeiros. Este é o caso da maioria dos problemas familiares. O Direito de Família, por certo, é o ramo do Direito responsável por enfrentar uma gama de impasses não apenas patrimoniais, mas também emocionais, lides que envolvem “fortes emoções”. É o que Luiz Antonio Scavone Júnior manifesta em uma de suas obras:
A mediação se mostra útil quando o conflito entre as partes, no âmbito privado – sem descartar a mediação no setor público –, desborda dos interesses financeiros em discussão que, muitas vezes, são, apenas, o pretexto para disputas emocionais que extrapolam o contexto aparente do conflito. Podemos exemplificar: no direito de família, conflitos envolvendo pensão alimentícia podem, muitas vezes, trazer, de forma oculta, situações afetivas complexas que a jurisdição estatal, a arbitragem (jurisdição privada) e a conciliação não são passíveis de resolver. Para tanto, exige-se profissional habilitado que tenha a capacidade de encaminhar a solução do pano de fundo do conflito, muitas vezes de caráter emociona”. (SCAVONE JÚNIOR, 2020, p. 287)
Luiz Fernando do Vale de Almeida Guilherme pontua que os problemas familiares têm encontrado soluções muito positivas com o uso da mediação, pois ela pode contar com profissionais não só da área do Direito, mas de profissionais de campos que entendem melhor sobre estes conflitos (emocionais), como profissionais da Psicologia: “O instituto pode utilizar profissionais de diversas áreas do conhecimento, bem demonstrando a sua capacidade de atuar de forma multidisciplinar (…) que necessitem da atenção de um psicólogo, de um assistente social ou de um psiquiatra para melhor apreciação” (GUILHERME, 2022).
O Poder Judiciário conta com “um clima” de adversidade, intensificando os conflitos já existentes entre as partes. Todo este clima de intriga faz com que as crianças e os adolescentes que presenciam o processo judicial sofram grandemente: “Como os pais querem vencer, em geral, não se importam com as ‘armas’ desse embate, e é nesse fogo cruzado que se encontram a criança e o adolescente que, sem condições de entenderem o que se passa entre seus pais, são colocados como vítimas” (DA SILVA, 2013). Porém, a mediação pode ser bastante útil neste sentido. Carlos Eduardo de Vasconcelos determina que o método que é utilizado na mediação é distinto do método da jurisdição estatal. A mediação utiliza-se, dentre muitas outras técnicas, de uma linguagem ordinária, que é bem compreendida e assimilada pelos envolvidos da lide, colocando-os em uma esfera mais empática (DE VASCONCELOS, 2020).
Os mediadores que atuam na esfera do Direito de Família devem ter em mente que eles não devem levar em consideração somente as partes, propriamente ditas, mas também os terceiros envolvidos. Pois, em ações desta área específica do Direito é comumente que seja intensa a presença de interesses de terceiros, normalmente entes queridos. Os autores expressam que interesses de menores ou idosos (vulneráveis) são frequentemente envolvidos nestas situações. Requer-se que o mediador, nestes casos, busque uma satisfação das partes e também o bem-estar para os terceiros (GRINOVER; LAGRASTA NETO; WATANABE, 2007).
Os conflitos inerentes ao Direito de Família possuem certa complexidade e delicadeza, tendo em mente que eles englobam não só interesses das partes, mas também de terceiros. Por isso é importante que se institua a mediação para a resolução de tais, pois, diferentemente da jurisdição estatal, ela pode contar com uma gama de profissionais capacitados para tratarem da lide, com expertise, capazes de cuidar dos interesses dos menores e familiares envolvidos, que de alguma forma são impactados desfavoravelmente por este tipo de lide:
O mediador que conduz as mediações nesse circuito deve ter em mente todas essas dificuldades e ser capaz de gerenciar os conflitos, visando a satisfação das partes, bem como o bem-estar dos terceiros envolvidos. Por isso é de grande importância que essas mediações sejam conduzidas por pessoas especificamente capacitadas em tal mister. De início, é fundamental a participacão de assistentes sociais e psicólogos do juízo. Esses profissionais, em razão do caráter de seu trabalho, têm extrema capacidade de lidar com assuntos delicados como os tratados nesse circuito. É preciso atentar para que os assistentes sociais e psicólogos do juízo não atuem simultaneamente como técnicos e mediadores. Assim, quando as mediações envolverem pessoas e casos que já́ são acompanhados pela assistente social ou psicólogo do juízo, deverá ser designado outro mediador, desde que vocacionado para a área de família. (GRINOVER; LAGRASTA NETO; WATANABE, 2007, p. 28)
Marcelo Mazzola e Humberto Dalla Bernardino Pinho, sobre a utilização da Justiça para a resolução de conflitos pessoais, dizem que a jurisdição estatal se preocupa tão somente em proferir uma decisão jurídica para o litígio. Malgrado uma decisão jurídica não é, por vezes, suficiente para colocar fim às tensões existentes entre duas pessoas. O Poder Judiciário não é capaz de promover uma melhoria neste aspecto, inexiste um mecanismo que de fato restaure a relação saudável entre os envolvidos: “A jurisdição é mais frequentemente acionada para decidir impasse oriundo das relações pessoais do que sobre o direito. Esse novo campo de atuação demanda um agir mais destinado à gestão tutelar do que decisória” (MAZZOLA; PINHO, 2021).
Maria Helena Diniz, clássica e ilustre civilista, determina que os conflitos familiares, normalmente, decorrem de uma má comunicação entre as partes litigantes. Por isso, a mediação possui um papel importantíssimo nos embates desta natureza, considerando ela ter a função de facilitar a conexão, comunicação entre os conflitantes: “Os conflitos familiares decorrem de uma inadequada comunicação, por isso a mediação familiar tem por escopo primordial estabelecer uma comunicação” (DINIZ, 2022).
A autora também afirma que o Poder Judiciário brasileiro não é capaz de atender as demandas desta natureza, pois estas confusões envolvem sentimentos e a tarefa jurisdicional consiste, basicamente, em aplicar direitos previstos no ordenamento jurídico. A autora cita que um dos exemplos dos conflitos tais, são conflitos que englobam distorções entre pais e filhos. Observemos o que a autora diz, em suas próprias palavras:
Como os conflitos familiares gerados pela dissolução da união estável, pela separação judicial ou pelo divórcio direto trazem, além dos problemas jurídicos, questões de ordem psíquica, por envolverem sentimentos, já que aludem às relações entre pais e filhos menores, dificultam ao Judiciário uma decisão que atenda satisfatoriamente aos interesses e às necessidades dos envolvidos, pois o ideal seria respeitar o direito da coparentalidade, o exercício da autoridade parental conjunta, em que cada um dos pais reconheça o lugar do outro. (DINIZ, 2022. p. 140)
É interessante trazer, no Direito Comparado, estudos sobre o tema. Começando pelo contexto espanhol, María Paz Garcia-Longaria Serrano e Antonia Sánchez Urios afirmam que a mediação deve contar com um terceiro neutro, que tenha, dentre outras tarefas, a missão principal de facilitar a comunicação dos pais para com os filhos acerca o divórcio: “Se trata de la intervención de una persona neutral para apoyar la toma de decisiones respecto al proceso de separación y divorcio. Las cuestiones generales se relacionan con la forma de comunicar a los hijos la separación (…)” (SERRANO; URIOS, 2004).
Vale estudar o panorama estadunidense acerca a mediação envolvendo este tema. Jonh Winslade e Gerald Monk analisam um caso concreto em que a mediação utilizada em determinado divórcio permitiu desvendar “as raízes” do problema, identificar qual eram “os motivos sociológicos do motivo” da desavença entre os pais que disputavam a posição de “cuidador custodial” dos menores. Foi descoberto que o pai (Greg) das crianças possuía uma linhagem de pensamento “patriarcal fundamentalista”, observamos um trecho do caso:
Greg felt entitled to be the custodial caregiver for the children. (We discuss how such entitlements are built from a discursive perspective in Chapter Four.) His sense of entitlement was founded on what he identified as Fiona’s betrayal of her marriage vows and the damage he perceived the divorce would do to the children. In passing he did suggest that he would accept joint custody if it was not possible to have sole custody. He believed, however, that Fiona’s unwillingness to try to rebuild their relationship was evidence of her lack of moral fiber. From the mediator’s perspective, Greg was strongly positioned by a fundamentalist patriarchal stance. (MONK; WINSLADE, 2000, p. 13)
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com base em todas as informações trazidas no presente artigo científico, é possível pontuar algumas considerações finais. A priori, ficou constatado que a Justiça é afetada por inúmeras variáveis que não podem ser sanadas pelas “próprias forças” do Poder Judiciário, pois, envolvem processos naturais da sociedade que não podem ser evitados (WATANABE, 1988). Como já disse Tony Robbins, “A mudança é inevitável. O progresso é opcional”. As vias conciliativas são “ferramentas jurídicas” que podem ser utilizadas tanto para ampliar o acesso à justiça como para combater a crise da Justiça. Estas vias vêm apresentando benefícios não vistos na jurisdição estatal até o dia de hoje, como a celeridade e a simplicidade (GRINOVER, 2008). A mediação, em específico, é bastante eficiente para a resolução de disputas que não envolvem, exclusivamente, discussões patrimoniais (SCAVONE JÚNIOR, 2020).
Em relação ao uso da mediação para a resolução de divórcios litigiosos envolvendo menores, esclareceu-se que o ambiente em que se cria na jurisdição estatal é de adversidade e antagonismo entre as partes, fazendo com que os menores sejam bastante afetados psicologicamente. A mediação, porém, possui boas estratégias para lidar com as emoções dos menores e uma possibilidade grande de contar com profissionais especializados no assunto para amenizar os impactos negativos (DA SILVA, 2013). Ainda, construção de decisões consensuadas, na mediação, consequentemente neutraliza o ambiente de adversidade, presente no Judiciário (DE VASCONELOS, 2020).
Também, importante constatação é que juristas estrangeiros, já em um tempo não tão atual, abordavam a mediação para seu usada em divórcios litigiosos envolvendo menores. No contexto espanhol, se acha o entendimento de que a mediação facilita substancialmente a comunicação dos pais para com os filhos, no que tange à dissolução conjugal (SERRANO; URIOS, 2004). Já na esfera estadunidense, juristas descobriram, em estudo de caso, as bases sociológicas que, de alguma forma contribuíram para o divórcio que estava sendo analisado, ressaltando-se, portanto, a função sociológica da mediação (MONK; WINSLADE, 2000).
Agora, em breves palavras, seguem algumas considerações importantes sobre a mediação, considerando o ordenamento jurídico pátrio. A mediação não ofende o inciso XXXV do artigo 5° da Constituição Federal (XXXV, art. 5°, CF), que expressa o direito fundamental de acesso à Justiça por parte dos cidadãos, pois, não se trata de inviabilizar o Poder Judiciário, mas sim de ampliar o acesso à justiça, criando-se “ferramentas jurídicas” mais apropriadas, adequadas para cada tipo de problema. Ainda, sobre o parâmetro constitucional, se pode falar que a mediação contribui para o cumprimento do inciso LXXVIII do mesmo artigo da Carta Magna (LXXVIII, art. 5°, CF), pois o seu uso é uma das etapas para “desafogar” o Poder Judiciário e acelerar o funcionamento da jurisdição estatal.
Agora, pois, sobre o uso da mediação para divórcios litigiosos que englobem menores, cabem algumas ponderações que se relacionem com o ordenamento jurídico. O uso da mediação, nestes casos, consagra o artigo 3° da Lei 8.069/1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 3°, Lei 8.069,/1990), realçando a proteção integral da criança e do adolescente, já que a jurisdição estatal muito desfavorável às condições psicológicas dos menores. Na mesma linhagem, atesta o artigo 227 da Constituição Federal, que estabelece, dentre outros, a proteção à dignidade dos menores: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito (…) à dignidade (…)” (art. 227, CF).
REFERÊNCIAS
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_______. Lei de Mediação, Lei n° 13.140, de 26 de junho de 2015. Diário Oficial da União: Brasília, DF. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13140.htm. Acesso em: 13 abr. 2023.
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[1] Discentes do Curso Superior de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Campus Campinas. e-mails: a.h.p.f@hotmail.com e tiagoferesmassouh@gmail.com.