A INFLUÊNCIA DA ASSISTÊNCIA AO PRÉ-NATAL RELACIONADO À PREMATURIDADE: UMA REVISÃO INTEGRATIVA DE LITERATURA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8342051


Isabella Silva Bese
Orientador: Dr. Eduardo Nogueira Cortez.


1 INTRODUÇÃO

O nascimento prematuro é a causa mais frequente de morte neonatal e é o fator mais importante que influencia a saúde e a sobrevivência subsequentes de uma criança. Em comparação com bebês nascidos a termo, ou seja, entre 37 e 41 semanas de gestação, bebês prematuros, nascidos com menos de 37 semanas de gestação, apresentam uma ampla variedade de problemas de saúde e desenvolvimento, incluindo dificuldades cognitivas, comportamentais, sociais, emocionais e de neurodesenvolvimento de longo prazo (SOUZA et al., 2019).

De acordo com dados do Ministério da Saúde, aproximadamente 340 mil bebês nascem prematuros no Brasil anualmente. Este número tem sido utilizado para indicar que, são em média 930 por dia ou 6 nascimentos de bebês prematuros a cada 10 minutos (BRASIL, 2022).  

Os bebês prematuros correm maior risco ao longo da vida de distúrbios respiratórios, cardíacos, renais e do sistema endócrino, com o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal excessivamente estimulado à medida que esses bebês enfrentam adaptação precoce ao mundo exterior, possivelmente levando a um “desgaste” mais rápido, além das vulnerabilidades específicas de órgãos, o estresse oxidativo do ambiente alterado ao nascimento que pode causar encurtamento do comprimento dos telômeros e metilação do DNA, levando a modificações epigenéticas que podem aparecer durante o seu desenvolvimento ou na idade adulta (MELO; OLIVEIRA; MATHIAS, 2015).

Desta forma, uma abordagem importante para reduzir o risco de nascimento prematuro e de bebês Pequenos para Idade Gestacional (PIG) é o cuidado pré-natal adequado. O cuidado pré-natal é um serviço de saúde frequentemente usado que pode reduzir a incidência de morbidade e mortalidade perinatal ao tratar condições médicas, identificar e reduzir riscos potenciais e ajudar as mulheres a lidarem com fatores comportamentais que contribuem para resultados indesejados (WACHHOLZ et al., 2016).

O pré-natal refere-se aos cuidados médicos e de enfermagem recomendados durante a gravidez. Isso inclui cuidados de saúde e educação e aconselhamento sobre o parto (WHO, 2018). O objetivo de um bom pré-natal é detectar precocemente quaisquer problemas potenciais, preveni-los, se possível, e encaminhar as mulheres a especialistas ou hospitais apropriados, se necessário (CARVALHO, 2018).

Além disso, o atendimento pré-natal pode garantir o bem-estar da gestante e de sua família, ao mesmo tempo em que fornece educação e informação. O apoio e envolvimento da comunidade para mulheres grávidas também é importante para melhor resultado na vida da gestante (OMS, 2015). Sendo assim, o plano de cuidados de assistência pré-natais deve levar em consideração as necessidades médicas, nutricionais, psicossociais e educacionais da mulher e sua família e o pré-natal precoce e regular pode aumentar as chances de ter um bebê saudável prevenindo ou antevendo intercorrências como síndromes hipertensivas e partos prematuros (WHO, 2018).

E para promover uma reorientação à mulher durante o período gravídico, como forma de evitar e/ou minimizar a ocorrência de partos prematuros, conferindo melhor qualidade de vida à gestante e ao recém-nascido o Ministério da Saúde a partir do ano 2000, com estratégias que possam diminuir o alto índice de morbimortalidade materna e infantil, e implantou o Programa de Humanização no Pré-natal (PHPN) e lançou vários manuais para a assistência ao pré-natal de risco habitual e de alto risco, como o Guia de pré-natal na Atenção Básica em 2018, a 6ª edição do Manual de Gestação de Alto Risco, lançado no ano de 2022.

Assim, conforme as orientações do Ministério da Saúde, cabe às instituições de saúde e aos profissionais que nelas atuam garantir a consecução dos serviços de assistência pré-natal, priorizando a disponibilização de consultas de qualidade, assim como assistência ambulatorial e no parto (COLOMBELLI et al., 2022).

Diante destas prerrogativas, a assistência pré-natal é recomendada durante a gravidez como um método para melhorar os resultados neonatais e maternos. Melhorar o uso de cuidados pré-natais é importante, particularmente para mulheres com risco moderado a alto de desfechos adversos.  Assim, este estudo tem por objetivo, analisar como a qualidade do atendimento de pré-natal pode influenciar na ocorrência de partos prematuros.

METODOLOGIA

O presente estudo foi desenvolvido mediante uma revisão integrativa da literatura, de caráter exploratório e qualitativo, não sistemático. Para delineamento e realização do estudo, optou-se protocolo de revisão integrativa PRISMA (Preferred Reporting Itens for Systematic Reviews and Meta-Analysis), por se tratar de uma ferramenta de revisões de alta qualidade, propondo lista de itens a serem propostos no artigo e fluxogramas para composição de resultados (AZEREDO, 2021).

Os estudos de revisão integrativa da literatura, é um método que permite a incorporação de evidências na prática clínica e visa reunir e sintetizar resultados de pesquisas sobre determinado tema ou questão de forma sistemática e ordenada, contribuindo para aprofundar o conhecimento do objeto investigado (ERCOLE; MELO; ALCOFORADO, 2014). Neste sentido a pergunta norteadora dessa revisão foi: como a qualidade do atendimento de pré-natal pode influenciar na ocorrência de partos prematuros:

Para responder esta pergunta, realizou-se pesquisa bibliográfica no primeiro semestre de 2023, por meio de busca nas bases de dados Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), PuBMED e SciELO. Os descritores utilizados foram consultados junto aos DeCS (Descritores em Ciência da Saúde) / MeSH Terms. E para a estratégia de procura, recorreu-se ao Operador Booleano “AND” para a combinação dos descritores: prematuridade AND cuidados pré-natal AND nascimento prematuro, traduzidos para a língua inglesa, o que tornou possível a realização das pesquisas nas plataformas.

Quanto aos critérios de exclusão, foram descartados os estudos de opiniões de especialistas, cartas ao editor e artigos de revisão. Os critérios de inclusão definidos, foram baseados em artigos publicados na íntegra, representados ensaios clínicos randomizados, sendo os mesmos limitados a trabalhos publicados nos últimos 5 anos, em inglês, português e espanhol que descrevessem a temática referente à questão norteadora.

As buscas foram realizadas pela pesquisadora (I.S.B), de forma independente. A seleção dos artigos foi realizada pela autora, de forma independente com o auxílio do software Rayyan.  Seguindo as recomendações do protocolo PRISMA realizou-se a identificação, seleção, elegibilidade e inclusão dos estudos e seu check list foi utilizado para a elaboração deste trabalho.

 Posteriormente foi feita a avalição (GRADE) da qualidade das publicações selecionadas, conforme orientações dispostas no site: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_metodologicas_sistema_grade.pdf, sendo as publicações classificadas de acordo com a qualidade da evidência em quatro níveis: alto, moderado, baixo, muito baixo.

Finalizada a coleta dos dados, foram aplicados os critérios de inclusão e exclusão, e os estudos que estivavam dentro dos parâmetros pré-estabelecidos foram selecionados, analisados e discutidos.

RESULTADOS

A busca eletrônica resultou na identificação de 293 artigos, 33 artigos duplicados foram removidos, assim como outros 128 com base na leitura dos títulos e resumos. Dos 132 artigos restantes após a exclusão inicial, em uma segunda análise, 49 artigos foram excluídos por tratem se revisão de literatura, 41 por não atenderem aos critérios de inclusão e, 32 por abordarem motivos diversos dos que interessam a este estudo e que podem levar à prematuridade dos partos. Por fim, 10 artigos foram selecionados para análise de viés, conforme apresentado na Fig. 1 – Diagrama de fluxo.

Figura 1 – Diagrama de fluxo das qualificações conforme diretrizes do PRISMA

Quadro 1 – Ensaios clínicos randomizados incluídos na revisão (33.508 participantes)

Autor, local, ano.Nível de qualidadeAmostraDesfechos analisados de interesse do estudoEstratégias de intervençãoTempo de intervençãoResultados da análise
Melo; Oliveira; Mathias (2015). Brasil.A576 mãesQualidade do pré-natal de mães com parto prematuro e a termo e identificar fatores maternos e gestacionais associados ao pré-natal inadequado.Visitas diárias nos dois hospitais que atendem ao parto pelo SUSoutubro de 2013 a fevereiro de 2014,A prevalência de nascimentos prematuros foi de 17%. 75,7% das puérperas com filho a termo tiveram pré-natal adequado, enquanto para aquelas com filho prematuro o pré-natal adequado foi de 63,2%.
Vos et al. (2015). HolandaC3500 gestantes no grupo controle e 3500 no grupo intervenção.Avaliação do risco sistemático e ampliado da realização de pré-natalA intervenção consiste na seleção sistemática de risco com o cartão de pontuação de Redução de Risco Reprodutivo de Rotterdam (R4U) em mulheres grávidas na consulta de agendamento e encaminhamento para as vias de atendimento correspondentes.2 anosOs resultados primários deste estudo são nascimento a termo (peso ao nascer <p10), prematuridade (nascimento <37 semanas) e eficácia da implementação.
Gonzaga et al. (2016) BrasilB208 puérperas, sendo 104 casos e 104 controles, com partos prematuros.Adequação do pré-natal e fatores de risco associados à prematuridade e ao baixo peso ao nascerem.Entrevista estruturada com as puérperas em um prazo de até 48 horas após o parto, além de auditoria nos prontuários médicos das puérperas e dos recém-nascidos e nos cartões das gestantes.outubro de 2012 a abril de 2013A baixa escolaridade, não realizar atividade remunerada, parto cesáreo, oligodrâmnio, descolamento prematuro da placenta e pré-eclâmpsia são fatores independentes associados com a prematuridade e/ou baixo peso ao nascer.
Wagura et al. (2018). Quênia.A322 mãesPrevalência de parto prematuro e os fatores associados ao parto prematuro.A prevalência de parto prematuro foi de 18,3%.Dezembro 2013.A prevalência de parto prematuro foi de 18,3%. Idade materna ≤ 20 anos, paridade > 4, gestação gemelar, infecções maternas do trato urinário, hipertensão induzida pela gravidez, anteparto hemorragia e ruptura prolongada de membranas antes do trabalho de parto foram significativamente associadas ao parto prematuro.
Oliveira (2018) Brasil.B273 duplas mães/bebêsDiferenças no resultado pré-natal quando se consideram os diferentes modelos de atenção, com melhor situação na Estratégia Saúde da Família e que a baixa qualidade pré-natal é fator de risco para prematuridade.O risco de prematuridade, foi maior entre as mulheres acompanhadas em serviço pré-natal classificado com baixo escore de qualidade, quando comparadas àquelas cujo escore de qualidade pré-natal foi classificado com melhor qualidade.junho de 2015 e janeiro de 2016Apesar do processo de atenção pré-natal nas Unidades de Saúde da Família ser mais qualificado, não houve melhor resultado, possivelmente porque nestas as mulheres apresentavam piores condições socioeconômicas.
Medeiros et al. (2018) Brasil.AUm total de 976 casos e 2.377 controles foram alocados para as análises, aproximadamente (1:2,5).Verificar os fatores de risco associados à prematuridade (PTB) em uma maternidade-escola.Gestação múltipla, pré-natal inadequado, apresentações anômalas e história obstétrica de até dois partos vaginais são fatores de risco para o trabalho de parto prematuro.2017.Nenhuma das variáveis sociodemográficas maternas apresentou relação suficiente com a prematuridade para ser inserida no modelo de regressão.  
Lee et al. (2019). EUA.A4072 gestantes no grupo intervenção e, 3760 no grupo controleVerificar se a ocorrência de nascimentos prematuros são atribuídos a infecções na gravidez.Intervenção baseada na comunidade para rastrear e tratar infecções do trato geniturinário materno, com o objetivo de reduzir a incidência de parto prematuro.Janeiro de 2012 a julho de 2015.No geral, a incidência de nascidos vivos prematuros antes de 37 semanas de gestação não diferiu significativamente entre os grupos de intervenção e controle (21,8% vs 20,6%; risco relativo 1,07 [95% CI 0,91–1,24]
Pervin et al. (2020). BangladeshA12980 puérperas.Avaliar a associação entre consulta pré-natal (CPN) e parto prematuro;Realização de um projeto de saúde pública para reforçar os serviços de controle de pré-natal.2005 a 2009.O controle das visitas para controle de pré-natal atenuou substancialmente esse efeito observado do projeto SMNI no nascimento prematuro (OR 0,88, IC 95% 0,77 a 0,99) (teste de mediação de Sobel p<0,001).
Regasa et al. (2021). Etiópia.BUma amostra total de 358 mulheres foi recrutada. Destes, 72 eram casos e 286 eram controles.Identificar preditores de parto prematuro no oeste da Etiópia, 2017/2018.Aplicação de questionário estruturado em 4 hospitais.Março de 2017 a março de 2018A falta de consulta pré-natal, história de prematuro anterior, Intervalo curto entre gestações, infecções do trato reprodutivo e complicações obstétricas foram preditores de parto prematuro.
Beeckman et al. (2023). Bélgica.B333 gestantes.Análise da relação entre elementos específicos do cuidado pré-natal e o risco de parto prematuro em comparação com a consideração apenas do número de consultas.Entrevista estruturada e, desenvolvimento de uma ferramenta para mensurar a trajetória do cuidado pré-natal, que incluiu o Conteúdo e o Momento do Atendimento na Gravidez (CTP).Não determinado.O número de visitas por si só não foi associada com parto prematuro. Em contraste, uma associação significativa foi encontrada entre o conteúdo e tempo de cuidado e parto prematuro.

A análise acerca da qualidade do atendimento de pré-natal e como este pode influenciar na ocorrência de partos prematuros, foi claramente observado no estudo de Melo, Oliveira e Mathias (2015), no qual 36,8% dos nascimentos prematuros contaram com uma assistência pré-natal inadequada. Completando os resultados anteriores, Vos et al. (2015) asseveraram que o aumento nas evidências da influência de fatores de risco não médicos, como o nível econômico-social, estilo de vida ou etnia, quando associados podem ter como desfecho resultados perinatais adversos, como a ocorrência de partos prematuros. Gonzaga et al. (2016) ainda destacaram problemas como a baixa escolaridade, desemprego, parto cesáreo, oligodrâmnio, descolamento prematuro da placenta e pré-eclâmpsia, podem elevar as chances de prematuridade, especialmente em casos nos quais a gestante apresentou atenção pré-natal inadequada.

No estudo de Wagura et al. (2018), realizado no Quênia, foi observado que a alta paridade é um indicativo no aumento do risco de parto prematuro devido a alterações uterinas, como o alongamento miometrial de gestações anteriores, que por sua vez, estão associados à escassez de recursos financeiros, programas de assistência pré-natal disponíveis à população e devido à persistência de fatores como infecções subclínicas, hipertensão, obesidade ou diabetes. Oliveira (2018), também destacou em seu estudo a relação entre o nível socioeconômico e a realização de acompanhamento pré-natal, sendo observado que mulheres com poder aquisitivo reduzido, muitas vezes deixam de buscar por esta assistência, incorrem em partos prematuros.

Medeiros e colaboradores (2018) destacaram em seus resultados que, no Brasil encontrou a prevalência de parto prematuro em gravidez gemelar é de 12,2%. A alta taxa de prematuridade espontânea de gêmeos é explicada pela sobrecarga uterina, resultando em contrações e/ou ruptura prematura de membranas. Entretanto, o acompanhamento pré-natal inadequado aumentou em 2 vezes a chance de um recém-nascido pré-termo. Para os autores, a prevenção do parto prematuro está ligada à disponibilidade, adequação e acesso ao pré-natal, que é capaz de rastrear as condições que levam ao parto prematuro. Lee e colaboradores (2019) por sua vez, destacaram que, gestantes residentes em comunidades rurais, onde a assistência pré-natal é remota, estão mais propensas a apresentarem infecções no trato vaginal não tratadas e que, posteriormente podem ter influência direta na ocorrência de partos prematuros, aborto espontâneo, natimorto, restrição do crescimento fetal, sepse neonatal e puerperal e encefalopatia neonatal.

Pervin e colaboradores (2020) em um estudo realizado em Bangladesh constataram que, no país faltam intervenções que possam reduzir a carga de nascimentos prematuros em nível populacional. Para tanto é primordial a existência de programas de atenção pré-natal, que aborde fatores sociocomportamentais e reprodutivos ligados a mediadores biológicos, como infecção, inflamação, estressores e fatores nutricionais que causam parto prematuro.

Resultado semelhante foi verificado no estudo de Regasa e colaboradores (2021) na Etiópia, onde, a morte neonatal precoce causada por parto prematuro é a que mais contribui para a morte perinatal. No país, a causa exata do parto prematuro ainda não foi esclarecida, já que a maioria dos nascimentos prematuros ocorre espontaneamente, no entanto, a ausência de cuidados pré-natal é um forte indicador do aumento na ocorrência de nascimento prematuro.

Beeckman e colaboradores (2023) citaram que, a quantidade de atendimentos de pré-natal não tem validação comprovada, no entanto, o número de medições de pressão arterial, testes de triagem de sangue, ultrassons e seu momento adequado durante a gravidez são avaliados e tem grande importância na manutenção da gravidez e do parto a termo, pois no caso de mulheres que apresentem fatores de risco para parto prematuro, estes podem ser notados previamente, e receber tratamento ou cuidado preventivo estabelecido em tempo hábil, o que poderia reduzir a ocorrência de parto prematuro ou riscos para o bebê como infecções neonatais. Além disso, em comparação aos recém-nascidos a termo, eles são mais propensos a comprometimentos neurocognitivos e motores a curto e longo prazo (WAGURA et al., 2018), juntamente com risco aumentado de desnutrição, doenças crônicas e mortes precoces (GONZAGA et al., 2016).

DISCUSSÃO

Resultados importantes foram encontrados na literatura e, entre as variáveis que demonstraram que a prematuridade está associada a gestações múltiplas e à assistência pré-natal inadequada. Gestações múltiplas têm sido apontadas como risco em muitos estudos (LEAL et al., 2016; AHUMADA-BARRIOS; ALVARADO, 2016), podendo ocorrer 5 vezes do que o observado em gestações de um único feto. Em estudo multicêntrico brasileiro, o fator que apresentou maior razão de chances para prematuridade foi a gestação múltipla (PASSINI et al., 2016). Outro estudo realizado no Brasil encontrou prevalência de gemelares de 12,2% entre os prematuros e de apenas 0,5% entre os controles (SILVA et al., 2009). A alta taxa de nascimentos prematuros espontâneos de gêmeos é explicada pela sobrecarga uterina, resultando em contrações e/ou ruptura prematura de membranas (HUANG et al., 2015).

O acompanhamento pré-natal inadequado aumentou em 2 vezes a chance de um recém-nascido pré-termo. Considerou-se adequado o pré-natal se houvesse quatro ou mais consultas antes de 37 semanas, embora atualmente a qualidade da assistência pré-natal e a forma de obtenção da adesão pareçam ser muito mais importantes do que o número de consultas. De fato, alguns estudos têm demonstrado que a prevenção do parto pré-termo está ligada à disponibilidade, adequação e acesso ao pré-natal, que é capaz de rastrear as condições que levam ao parto pré-termo (ZANG et al., 2012; HUANG et al., 2015).

A má assistência pré-natal tem sido consistentemente associada ao aumento do risco de parto prematuro (TEMU et al., 2016), mas estudos retrospectivos não podem ser adequadamente controlados para ajuste a fatores de confusão e estudos randomizados (sem pré-natal versus tratamento padrão) seriam antiéticos. Portanto, os únicos estudos bem delineados sobre o efeito do pré-natal sobre a prematuridade comparam o cuidado padrão com a melhoria da assistência. Uma metanálise que incluiu três ensaios envolvendo 3.400 mulheres demonstrou que não há evidências claras de que as clínicas de pré-natal reduzam o número de nascimentos prematuros (WHITWORTH et al., 2011).

Dados da literatura, entretanto, mostram que a taxa de prematuros é maior entre adolescentes e em extremos de idade materna (FUCHS et al., 2018; PASSINI et al., 2014), uma vez que a prevalência de doenças crônicas preexistentes e obesidade pode aumentar o risco em idades mais avançadas, enquanto a imaturidade fisiológica e fatores socioeconômicos podem aumentar o risco para mães adolescentes. A influência da presença do parceiro durante a gestação como fator protetor também tem sido relatada, sendo as mães solteiras mais vulneráveis ao parto prematuro, bem como a associação da baixa escolaridade com o aumento da frequência de prematuridade (LEAL et al., 2016).

Apesar da melhora em alguns setores da saúde, alguns indicadores de iniquidade em saúde persistem nos setores mais desfavorecidos da sociedade, onde milhões de pessoas têm baixos padrões de vida e estão mesmo expostos a riscos totalmente evitáveis ​​(DIDERICHSEN; ANDERSEN; MANUEL, 2012). Dados de 86 países de baixa e média renda relatam que essas desigualdades persistem e afetam principalmente os grupos mais vulneráveis, incluindo mulheres e crianças. Na saúde, as maiores lacunas detectadas são a atenção médica especializada (diferença de 80% entre a população mais rica e a mais pobre), pré-natal inadequado com um mínimo de 4 visitas a postos de saúde durante a gravidez (diferença de 25% entre os subgrupos mais e menos escolarizados), além de desigualdades na adoção de métodos de planejamento familiar (WHO, 2015).

Várias categorias de determinantes afetam a saúde. Atributos da doença que são influenciados pela posição social, tais como a situação financeira, marginalidade social, desemprego de longa duração, ambiente físico, ambiente de trabalho, dentre outros. Há ainda fatores que podem alterar as consequências da doença em termos de sobrevivência, capacidade funcional e qualidade de vida (natureza da doença/lesão, desigualdade na utilização dos serviços de saúde, ausência de pessoal de saúde, limitações logísticas, etc.) (CHEN; WU; COYTE, 2014; ATAGUBA; AKAZILI; MCINTYRE, 2011); deficiência de serviços de saúde em setores de difícil acesso geográfico, como áreas rurais, onde há ausência de profissionais de saúde e oferta insuficiente e contínua de insumos, incluindo medicamentos (DIDERICHSEN; ANDERSEN; MANUEL, 2012). Um estudo realizado na Escócia, por meio do “Scottish Index of Multiple Deprivation, “Carstairs index” e “Social Class Based on Occupation”, identificou que as taxas de gravidez na adolescência afetavam principalmente para a população mais desfavorecida de determinantes socioeconômicos (McCALL et al., 2015).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme observado nos estudos analisados, mulheres sem pré-natal apresentaram maior risco de prematuridade. Assim, as mulheres que iniciaram o atendimento nas primeiras semanas de gestação e receberam um número mínimo cuidados como a aferição da pressão arterial, ultrassonografias e tiveram amostras de sangue analisadas no decorrer da gravidez tiveram o menor risco de parto prematuro em comparação com as mulheres que receberam cuidados menos adequados.

A prematuridade é o resultado de uma complexa rede de determinantes que interagem. Para a sua prevenção não bastam apenas medidas de saúde, devem ser desenvolvidas políticas e planos de ação abrangentes para minimizar as desigualdades em saúde, especialmente entre mulheres, recém-nascidos e diferentes subgrupos de crianças. Embora seja verdade que as políticas de saúde por si só não provocam mudanças individuais, podem fornecer soluções para abordar alguns mecanismos que facilitam as desigualdades na saúde.

Por outro lado, devem ser realizadas intervenções dirigidas às mulheres em idade reprodutiva, atendendo às suas necessidades de saúde sexual e reprodutiva, incluindo educação sexual, uso de contraceptivos, prevenção da gravidez precoce na adolescência, prevenção de gravidezes indesejadas, assistência pré-natal de qualidade, cumprimento com abordagem de risco para gestantes e inclusão de pessoal qualificado na assistência ao parto. A prevenção e o tratamento da prematuridade são uma das estratégias mais importantes levadas em consideração para reduzir a mortalidade neonatal e infantil.

A assistência pré-natal oportuna e precisa é considerada um fator importante na prevenção do parto prematuro. Este atendimento pré-natal também influencia positivamente na detecção de algumas complicações na gestação, o que pode desencadear a oferta de tratamento perinatal para melhorar os desfechos e o prognóstico dos prematuros.

REFERÊNCIAS

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