REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7971851
Lívia Maria Ribeiro Santos
Maria Vitória Moura Da Silva
Orientadora: Prof.ª Dra. Rosália Maria Carvalho Mourão
RESUMO
O presente artigo tem como finalidade fazer análise através de livros, leis brasileiras, doutrinas e pesquisas afins, abordar a imputabilidade penal do serial killer conforme o ordenamento jurídico brasileiro onde será examinada se as leis existentes são de fato uma pena ou uma medida de segurança que a legislação brasileira impõe. Trará também o conceito de serial killer, como é abordada a questão do serial killer e a psicopatia, se há tipologia de seriais killers, mostrará também uma linha na questão psicológica do indivíduo relatando quais suas motivações para cometer os crimes, se suas vítimas possuem todas o mesmo perfil, como são escolhidas e se são assassinadas por motivos ou razões aparente observando suas características e possíveis transtornos de personalidades, bem como investigar a sua capacidade de discernimento do caráter ilícito do fato, a fim de entender se o indivíduo pode ser considerado imputável, semi-imputável ou inimputável. Abordar os casos mais conhecidos envolvendo serial killers no Brasil e o projeto Lei 140/2010 que foi arquivado, esses e outros aspectos foram fatores que contribuíram para o desenvolvimento do tema, devido a toda uma complexidade dessa figura e o tratamento do ordenamento jurídico brasileiro. O trabalho visa, portanto, analisar a imputabilidade do serial killer no seu enquadramento no ordenamento jurídico brasileiro, visto que somente é considerado imputável o indivíduo que possui a capacidade de entender a gravidade de seus crimes.
Palavras-chave: Serial killer, legislação brasileira, psicopatia, imputabilidade, crimes, ordenamento jurídico.
ABSTRACT
The purpose of this article is to analyze, through books, Brazilian laws, teachings and related research, the criminal responsibility of the serial killer according to the Brazilian legal system, examining if the existing laws are in fact a punishment or a security measure imposed by the Brazilian law. It will also bring the concept of the serial killer, how the issue of the serial killer and psychopathy is approached, if there is a typology of serial killers, it will also show a line on the psychological issue of the individual reporting his motivations to commit the crimes, if all his victims have the same profile, It will also investigate the individual’s ability to discern the illegal character of the act, in order to understand if the individual can be considered imputable, semi-imputable, or not.
Addressing the most known cases involving serial killers in Brazil and the project Law 140/2010 that was filed, these and other aspects were factors that contributed to the development of the topic, due to the overall complexity of this illustration and the treatment of the Brazilian legal system. The paper therefore aims to analyze the culpability of the serial killer in its background in the Brazilian legal system, since it is only considered imputable to the individual who has the ability to understand the seriousness of his crimes.
Keywords: Serial killer, Brazilian legislation, psychopathy, culpability, crimes, legal system.
1 INTRODUÇÃO
O trabalho em questão tem por objetivo por meio de doutrinas, livros, artigos e entrevistas, trazer a possível ideia de que nem todos os assassinos em série são pessoas com algum tipo de doença mental ou até mesmo que são psicopatas, enquanto psicologicamente e/ou clinicamente falando irá se trata de uma anomalia psicoemocional o que vai influenciar no seu modo frio de agir, na sua crueldade, manipulação, ausência de remorso ou culpa entre outras características de sua personalidade, será realizado quando e onde surgiram os casos de serial killer, se há tipos de serial killer, quais seriam esses tipos e se existe alguma forma em sua característica que o definem como um serial killer.
O objetivo deste trabalho é investigar de que modo os seriais killers podem ser enquadrados no ordenamento jurídico brasileiro e se sua punição se torna adequada no que tange o serial killer. Ao curso do artigo será tratado sobre os aspectos históricos e conceituais do serial killer, a relação entre o psicopata e o serial killer, as características da personalidade de um serial killer, a perspectiva da justiça brasileira em relação aos casos de serial killer, o conceito de imputabilidade e a aplicabilidade da imputabilidade quanto aos seriais killers e abordará o projeto de lei 140/2010. O problema de pesquisa deste trabalho é apresentar de que modo podem ser enquadrados os seriais killers no ordenamento jurídico brasileiro
O presente documento tem por finalidade quebrar paradigmas impostos pela sociedade quando o assunto se trata de serial killer, serão trazidos conteúdos informativos a fim de aplacar a curiosidade gerada quando é abordado o assunto sobre serial killer e que quando é falado surge a vontade de saber mais sobre. Serão feitas análises de alguns casos brasileiros de serial killer, com base em entrevistas, sentenças e julgamentos, se sua pena foi cumprida de forma correta ou se o caso foi julgado de maneira inadequada, mostrar casos em que a mídia e justiça brasileira classifica assassinos como serial killers, que, no entanto, não se enquadram na característica de serial killer.
Em outra face, deve-se explanar como a justiça brasileira trata seriais killers como imputáveis e quais seriam as modalidades mais adequadas de se aplicar uma punibilidade compatível com seus atos criminosos, onde seus crimes devem ser vistos com um diferencial acrescentado pela justiça, pois os serial killers estão cientes da gravidade dos crimes que estão cometendo, sabem o quão errado são seus atos e detém a capacidade de saber que podem ser considerados culpados, por isso são tidos como inimputáveis, em razão do próprio conceito referente à pessoa que seja responsabilizada pelos seus atos, nesse caso por seus crimes. Também será feita a análise do Projeto de Lei do Senado Nº 140/2010 que vai tratar da punibilidade do serial killer.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 ASPECTOS HISTÓRICOS E O CONCEITO DE SERIAL KILLERS
Por muito tempo os serial killers meramente foram classificados como simples homicidas que cometiam uma série de assassinatos, no entanto, desde a década de 1970, surgiu o conceito de serial killer a fim de sugerir um padrão que pudesse lhe diferenciar das várias formas de homicídios em que se está acostumado ver e ainda assim existem muitos conflitos do que se trata o real conceito de serial killers.
O termo serial killer imposto pelo agente do Federal Bureau of Investigation (FBI), Robert K. Ressler, onde este detinha experiência em entrevista com até então assassinos em série, com a ajuda Jonh Douglas e Ann Burgess o agente se tornou o prógono na elaboração e junção de perfis psicológicos que resultam em sua identificação e em seguida na captura desses criminosos, esses relatos são encontrados detalhadamente no livro mindhunter (1965), que tratará o início do discurso e relato sobre o serial killer. (OLSHAKER, 2017)
Os paradigmas criados pelos criminalistas sugerem um perfil e estilo de como eles agem, como procuram sua vítima e a maneira que eles a matam, seguindo esse pensamento é um pouco provável compreender o motivo destes cometerem tais delitos e às motivações que lhes levam a solidificar os crimes.
A especialista em serial killer e criminologista Ilana Casoy em um de seus livros (2017, p. 22) traz o possível conceito de assassino em série e serial killers como:
Indivíduos que matam quatro ou mais vítimas em um só local, em um só evento. Em geral sua explosão de violência é dirigida para o grupo que supostamente o oprimiu, ameaçou ou rejeitou. Aceitamos como definição que serial killers são indivíduos que cometem uma série de homicídios durante algum período de tempo, com pelo menos alguns dias de intervalo entre eles. O espaço de tempo entre um crime e outro os diferencia dos assassinatos de massa, indivíduos que matam várias pessoas em questão de horas. O primeiro obstáculo na definição de um serial killers é que algumas pessoas precisam ser mortas para que ele possa ser definido assim.
Nos Estados Unidos o conceito de serial killer é a forma de constatar três, quatro ou mais assassinatos, sendo que um desses assassinatos deve ter ocorrido dentro dos Estados Unidos e que tenham aspecto em comum para que sejam considerados a uma ligação dos crimes a um mesmo autor. Embora, ultimamente, o conceito usado com frequência que diz respeito aos serial killers é de que ele seja algum tipo de criminoso do qual comete os assassinatos com uma razoável frequência o que se chama de modus operandi e na sua maioria das vezes expõe sua “assinatura” nas cenas do crime.
No Brasil além da definição conceitual abordar a mesma que foi dada no exterior, em nossa legislação, há um Projeto de Lei 140/2010, cujo instrumento tem como autor o ex-senador Romeu Tuma no qual teria o propósito de acrescentar no art. 121 do Código Penal Brasileiro alguns parágrafos, porém especificamente no parágrafo 6º é que ele traz essa definição no qual considera serial killer:
§6º o ser que comete três homicídios dolosos (intencionais), no mínimo, em determinado espaço de tempo. sendo que a conduta social e a personalidade do agente, o perfil idêntico das vítimas e as circunstâncias dos homicídios indicam que o modo de operação do homicida implica em uma maneira de agir, operar ou executar os assassinatos sempre obedecendo a um padrão pré-estabelecido, a um procedimento criminoso idêntico.
No cenário brasileiro, a prática de homicídios cometidos por serial killer veio ter visibilidade no ano de 1926 com o caso do Preto Amaral, visto que era o primeiro caso considerado de serial killer no Brasil, se tornou famoso e alvo de repercussão por conta da absolvição pelo júri em seu julgamento onde foi inocentando com alegações de que teria sofrido racismo, mas é de total ciência que ao decorrer da história da humanidade os assassinatos em série cometidos pelos serial killers são registrados desde antigamente tendo o primeiro caso que foi concretizado e registrado em Roma que foi o caso de “Locusta, a Envenenadora” e o mais ouvido falar foi o famoso “Jack, o estripador” do qual fora registrado em 1888, e após esta ocorrência, foi comum terem sido registrado casos de serial killers, no Brasil os mais conhecidos temos os casos do Maníaco do parque, Chico Picadinho, Vampiro de Niterói entre outros.
Por fim, é importante elucidar que entre as divergências doutrinárias existentes o que é certo é de que os serial killer são casos profundamente excepcionais e é relevante a conexão entre um crime a esse calibre de homicida existe todo um quantitativo de fatores, motivações ou simplesmente a ausência destes.
2.2 RELAÇÃO ENTRE PSICOPATA E SERIAL KILLER
Grande parte das pessoas idealizam serial killers como pessoas loucas ou doentes mentais, mas é incorreto afirmar essa assertiva, pois não é o que acontece em grande parte dos casos, em razão de haver sim a ligação de que eles possuem relações particulares com a psicopatia e a psicose que são duas coisas diferentes.
A psicose é um transtorno mental que causa uma alteração do que é real, onde na mente do psicótico se cria uma nova realidade, ou seja, ele vai viver em delírios, sofrer alucinações, ter visões, ouvir vozes, manias de perseguição e que em geral são conhecidos como esquizofrenia e paranoia, acontece que poucos serial killers se encaixam nesse padrão psicótico.
Já a psicopatia afeta a mente de várias formas diferentes da psicose ela não vai criar uma ilusão ou paranóia, pelo contrário o psicopata tem total ciência da realidade onde ele sabe exatamente o que é errado, que matar é proibido, o que os tornam frios e apáticos como cita Ilana Casoy em seu livro (CASOY, 2017.)
Com isso se tem em mente que um serial killer, que é psicopata vai possuir uma vida dupla, onde ele veste uma máscara para se socializar, ele vai ser interativo, gentil, carismático até mesmo racional, tudo isso com fim de se aproximar de suas vítimas, enquanto a sua realidade de fato é sombria, que geralmente é mostrada para suas vítimas quando ele já conquistou sua confiança e as seduziu, ele vai se mostrar frio, impetuoso, cruel tudo em prol do seu prazer pessoal, pelo seu prazer pessoal eles são capazes de cometer qualquer tipo de atrocidade desde matar, estuprar, atos de necrofilia, canibalismo, tortura entre vários outros tipos.
Explicadas as diferenças mais substanciais entre psicóticos e os psicopatas, devem se fazer outros esclarecimentos importantes. O primeiro é que nem todos os assassinos seriam pertencentes a um desses dois grupos, mesmo que as estatísticas indiquem que a maior parte deles se encaixa neles. Estudos recentes dizem que a porcentagem de assassinos em série psicóticos está entre 10% e 20%. A porcentagem restante é quase integralmente pertencente aos psicopatas. O segundo esclarecimento: nem todos os psicopatas têm o mesmo grau de psicopatia e, por conseguinte, nem todos acabam se transformando em criminosos e muito menos assassinos seriais. Para termos uma ideia da incidência dessa anomalia comportamental no mundo, a Organização Mundial da Saúde apontou, em 2003, que cerca de 20% da população espanhola padecia de algum grau de psicopatia. Cerca de três anos antes, havia calculado que nos Estados Unidos moravam 2 milhões de psicopatas, dos quais 100 mil moravam em Nova York (RÁMILA, 2012. p.28-29).
Diante dessa pesquisa, é notório ver que o número de psicopatas existentes é considerável levando a vertente que nem todos os psicopatas são de fato um serial killer.
Segundo a autora Ilana Casoy (2017, p.23) os serial killers possuem quatro tipologias:
- missionário: acredita que a sociedade deve se livrar de determinadas categorias de pessoas (homossexuais, prostitutas, mulheres, crianças), pois crê que estas são o mal do mundo;
- emotivo: obtém prazer no planejamento do crime e mata por pura diversão;
- sádico: é o que busca satisfação através do sofrimento das vítimas, mediante tortura, mutilação e homicídio, os quais lhe trazem prazer sexual;
- visionário: são os psicóticos, que matam como resposta às vozes ou visões que lhe exigem que cometam os crimes.
Ao investigar a vida de um serial killer e procurar a origem de seu problema vai ser possível encontrar sinais de comportamentos comuns entre eles, onde os mais comuns são: piromania, o ato de provocar incêndios; enurese em idade avançada, o costume de urinar na cama; espécies de sadismo precoce como torturar animais ou crianças, esses atos são conhecidos como a “terrível tríade” como é algumas vezes relatado por Ilana em seu livro (CASOY, 2017) que é completada por outras características citada pela autora Ilana Casoy como: “masturbação compulsiva, isolamento social, automutilação, convulsões, baixa autoestima entre vários outros comportamentos, ao investigar a infância e a adolescência de um ou vários seriais killers vai se notar que grande parte desses comportamentos são frequentes”. (2017, p. 27).
Essas características não querem dizer que sejam regra, ou seja, não é porque o indivíduo em sua infância até a adolescência tem ou apresenta alguns desses comportamentos que ele vai ser ou se tornar um serial killer, não é esse o intuito e sim como uma forma de observância em analisar e procurar ajuda caso necessário.
2.3 CARACTERÍSTICAS DA PERSONALIDADE DE UM SERIAL KILLER
Antes de aprofundarmos em quais são essas características, é necessário que a neurociência seja compreendida através de análises e estudos. O córtex cerebral, é considerado como uma proteção usada em todas as superfícies cerebrais, incluindo das superfícies conhecidas como “fissuras” ou “sulcos”, o neurologista Damásio, afirma. São essas superfícies que definem as regiões como o lobo frontal, lobo temporal, lobo parietal e lobo occipital, todos eles são importantes para determinadas funções do corpo e comportamento humano, são necessários. No qual relata, Piazzeta, (2018, p.60) que:
O lobo frontal, é o que está ligado às nossas relações de moral e ética, comportamentos do dia a dia que são fundamentais para uma vida social. O lobo temporal, que tem como papel relacionado a memória e audição. O lobo parietal, que está ligado às sensações do corpo humano, mandando e recebendo coordenadas, o lobo occipital, são aquelas informações em que os olhos captam e a partir dela se faz uma seleção, comparação de acordo com que já se tem adquirido ao longo do tempo.
O mais importante relacionado ao nosso estudo e que vamos tratar é o lobo frontal, mais necessariamente uma parte dele, que é o chamado córtex pré-frontal, que exerce papel fundamental na personalidade e nas emoções. Afirma, Piazzeta, (2018, p.62)
Funções de cognição, linguagem, controle emocional e da personalidade são frequentemente associadas ao funcionamento dorsolateral do córtex pré-frontal, e surgem alteradas na ocorrência de lesões destas áreas específicas […] passando haver um comportamento de caracterizados por ações agressivas e envolvimentos em atividades criminais ou antissociais
Em anos de estudos tenta-se compreender que essas lesões causadas podem afetar a personalidade e as emoções daquelas pessoas que sofreram com ela. Um caso de muita importância para a neurociência, foi o de Phineas Gage, que após ter tido seu cérebro perfurado por uma barra de metal em um acidente e ter sobrevivido, teve uma mudança de personalidade, apresentando agressividade, comportamento grosseiros, desrespeitoso, entre outros comportamentos, o que levou a pesquisas sobre como a personalidade de uma pessoa pode sofrer alterações quando ocorrer pancadas em determinados regiões do cérebro. (PICHININ, 2021).
Ainda é um estudo muito complexo e cheio de mistério sobre como o serial killer se tornou um indivíduo tão perigoso e o porquê, o caso abriu margem para estudos sobre possíveis causas e uma delas seria justamente alguma região do cérebro tenha sido prejudicada devido alguma lesão e se o serial killers talvez possam ter suas personalidades formadas ou alteradas depois de determinada lesão. Um juiz, no Condado de Lehigh, na Pensilvânia, pediu no julgamento ao serial killer Harvey Robinson, que ele doasse o seu cérebro para ciência, para os estudos acerca da mente e o comportamento de criminosos, uma vez que alegaram em sua defesa que o mesmo tinha sofrido lesões cerebrais quando criança, de acordo com Melo (MELO, 2019)
Segundo Piazzeta (2018, p.67), “o medo e o instinto de sobrevivência são emoções primárias, então tudo que se resulta dessas emoções, são as chamadas emoções secundárias, você adquire de acordo com as suas vivências, são resultados delas”.
Quando se trata de um serial killers, é importante ter essas características da personalidade, para que possa montar um perfil e tentar assim ter um caminho no qual pode ser os próximos passos dele.
Eles formam personalidades para que dessa forma se camuflam pela sociedade sem gerar suspeitas pelo seu comportamento, isso mostra que ele sabe muitas vezes que seu comportamento não é aceito e nem bem visto pela sociedade.
Abreu (2013, p. 30), traz as classificações do transtorno de personalidade, que são citados pelo Manual Diagnósticos e Estatísticos de Transtornos Mentais, sendo eles:
Grupo A, que traz os transtornos de personalidade paranóide, esquizóide e esquizotípica. o Grupo B trata dos transtornos de personalidade antissocial, histriônica, narcisista e borderline. O último, o Grupo C, trata dos transtornos de personalidade esquiva dependente e obsessivo-compulsivo.
Esses transtornos de personalidade são atribuídos aos psicopatas tanto do Grupo A, B e C sendo a psicopatia tratada através desses transtornos e não sendo tratados como uma doença mental pela OMS.
Isso ocorre como um modo dele se misturar em sociedade e não ser de certa forma notado pelos seus atos que são reprovados, ocorrendo inclusive lapso de memória de uma personalidade para outra, possuindo nome, idade, e história pessoal diferente. Tendlarz e Garcia (2013, p.173), divide essas identidades em “primária e alternativa, sendo a primeira aquela é mais depressiva, suscetível de culpa, que realmente possui o nome do indivíduo, já a segunda é aquela no qual a primeira cria, que possui nome, habilidades e personalidades diferentes do primeiro”.
Destarte, a forma como eles criam essa identidade e personalidade fazem com que passem despercebidos e sem chamar atenção para seus atos, não mostrando em seu convívio diário social a sua verdadeira face.
Já Piazzeta (2018, p.123), relata que a personalidade nasce com o indivíduo e é a partir de acontecimentos, fatores sociais, que essa personalidade vai se modificando, adquirindo então sua própria personalidade se distinguindo dos demais”. Cada pessoa passa por suas próprias experiências e cada pessoa leva delas sentimentos diferentes, são indivíduos que tem vivências diferentes e a forma como cada pessoa lida com elas é que sua personalidade vai realmente ganhar forma
2.4 A PERSPECTIVA DA JUSTIÇA BRASILEIRA EM RELAÇÃO AOS CASOS DE SERIAL KILLER
Os casos de serial killers no Brasil não são casos isolados, por mais frequente que seja em outros lugares no mundo, não se pode negar que também está presente no país, por mais omisso que o ordenamento jurídico brasileiro seja em relação aos casos que já ocorreram. É justamente por essa omissão, que quando esses casos ocorrem há uma falha no sistema, seja para investigar, processar e o que fazer com esse indivíduo.
Como já demonstrado, o artigo 26 do Código Penal, traz as hipóteses em que será afastada essa imputabilidade e aplicada aos agentes medidas de segurança. O que acontece é que por mais existam casos em que o agente estava com insanidade, em regra esses serial killers estavam lúcidos no momento do ato e os inimputáveis no momento do ato tem uma distorção dos fatos acontecidos.
Assim, afirma Casoy (2004, p.34) que:
Insanidade, frequentemente alegada nos tribunais para tentativa de absolvição do assassino, não é uma definição de saúde mental, como muitos acreditam. Seu conceito legal se refere à habilidade do indivíduo em saber se suas ações são certas ou erradas no momento em que elas estão ocorrendo. É uma surpresa saber que apenas 5% dos serial killers estavam mentalmente doentes no momento de seus crimes, apesar das alegações em contrário.
Então, esses serial killers em sua grande maioria entendia o que estava fazendo no momento do crime, ao se alegar hoje insanidade o que se pretende ganhar é que o indivíduo que cometeu crime não seja punido e consequentemente não se torne mais um número no sistema prisional. A autora (ABREU, 2013, p.162), aponta que “O que nos preocupa é o tratamento penal conferido a tais indivíduos. Considerando que os mesmos têm alto poder de manipulação e apresentam-se destemidos ante qualquer ameaça, tornam-se os principais inimigos do Sistema Prisional.“. ou seja, ela entende que tratar esses indivíduos como presos comuns e como se os crimes cometidos por eles fossem igualados a outros presos, pode acarretar futuramente na ressocialização de um indivíduo, que pode fazer mais vítima tornando se um perigo para a sociedade e para o Estado, uma vez que não há cura para tratar indivíduos, que já tem uma personalidade formada e com grande capacidade de manipulação.
E isso realmente é o que acontece, aqueles que são diagnosticados com psicopatia são um grande desafio, além de ser um perigo para a sociedade se ocorrer de fato uma ressocialização, por não respeitarem as regras sociais, não sentindo culpa ou remorso. O caso do serial killer brasileiro, Francisco das Chagas, considerado um dos maiores assassinos em série do país, matou 42 crianças, foi considerado psicopata e foi diagnosticado com psicopatia, estando preso até os dias de hoje na Penitenciária de Pedrinhas (MA).
2.5 CONCEITO DE IMPUTABILIDADE E APLICABILIDADE DA IMPUTABILIDADE QUANTO AOS SERIAIS KILLERS
Imputar tem como significado atribuir deveres, obrigações ou responsabilidades por algo ou alguém e é nesse sentido que tem referência o termo de imputabilidade penal, onde no Direito Penal imputabilidade irá significar a possibilidade de dar autoria ou responsabilidade de um ato criminoso a um agente em suma uma pessoa imputável vai ser aquela que pode responder por seus atos e ter a condenação de alguma pena por causa deles.
[…] A imputabilidade é elemento sem o qual entende-se que o sujeito carece de liberdade e de faculdade para comportar-se de outro modo, como o que não é capaz de culpabilidade, sendo, portanto, inculpável” (CUNHA, 2016, p. 287).
Para Cunha (2016), a imputabilidade é a capacidade de imputar, ou seja, a possibilidade de atribuir responsabilidade criminal a um indivíduo. Assim como no direito privado pode-se falar da capacidade e da incapacidade de realizar negócios jurídicos, no direito penal pode-se falar da imputabilidade e inimputabilidade de ser responsável pelo crime cometido.
Quanto à aplicabilidade da imputabilidade a respeito dos seriais killers, trata que a imputabilidade é quando se tem a qualidade para atribuir pena para alguém, Capez (2020, p. 273), entende que “O agente deve ter totais condições de controle sobre sua vontade. Em outras palavras, imputável é não apenas aquele que tem capacidade de intelecção sobre o significado de sua conduta, mas também de comando da própria vontade”, ou seja, é necessário que no momento do ato o agente saiba e tenha noção do que ele está cometendo tem caráter ilícito, que é repreendido pelo ordenamento, devendo desse modo ter apresentado conduta diversa. Tendo junção de elementos como o intelectivo e o volitivo, que segundo Cunha (2020, p. 359) “o intelectivo, consiste na higidez psíquica que permite que ao agente ter consciência do caráter ilícito do fato; volitivo, em que o agente domina sua vontade, ou seja, exerce controle sobre a disposição surgida com o entendimento do caráter ilícito do fato, e se determina de acordo com este entendimento.”
O que é muito discutido e ocorre divergência doutrinária, é sobre o momento da ocorrência do crime, se o indivíduo tinha noção de se tratar de caráter ilícito.
Abreu (2013.p 88), discorre sobre essa divergência que:
Uma corrente sustenta que tais indivíduos, quando praticam o delito nesse intervalo de lucidez, devem ser responsabilizados. Outra, por sua vez, inclina-se no sentido de que esse período somente retrata a enganadora aparência de lucidez e saúde daqueles que se encontram enfermos.
Entretanto, o que se prevalece no ordenamento jurídico brasileiro, é que por mais que seja comprovado que o indivíduo tenha por exemplo, alguma doença mental, mas ele praticou o crime em um momento de lucidez ele vai ser responsabilizado por isso, porque não comprometeu seu entendimento sobre o fato ser ilícito e reprovado.
O Código Penal brasileiro nada prevê em relação aos serial killers e psicopatas, dando atenção somente à questão relacionada à medida de segurança que por meio da Lei. 7.209/84, mudou na Parte Geral do Código Penal, como a medida de segurança seria cumprida, sendo somente o sistema vicariante no qual não se pode mais ter uma sanção é uma medida de segurança, devendo, portanto, ter somente uma.
Acerca da imputabilidade, o Código Penal prevê em seu art. 26, os casos em que ocorrerá o afastando da imputabilidade do agente, uma vez que sua compreensão dos fatos foi comprometida, considerados, portanto, inimputáveis, sendo o caso dos crimes praticados por aqueles que apresentam enfermidade mental, retardo ou desenvolvimento mental incompleto:
Art. 26 – É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
Será analisado o momento em que foi cometido o crime, se o indivíduo tinha consciência do que estava sendo praticado, quando na apuração dos fatos for comprovado que ele não tinha essa consciência não será possível atribuir a esses indivíduos responsabilidade penal, uma vez que não compreende o caráter ilícito, podendo ser considerados como inimputáveis ou semi-imputáveis. Sendo a eles impostas medidas de segurança, aos semi-imputáveis somente será aplicada quando o juiz entender o que é mais necessário se a pena ou a medida de segurança, uma vez que o tratamento penitenciário não é o ambiente e modo mais suficiente para tratá-los.
O serial killer, é um indivíduo que sabe o caráter da ilicitude de seus atos e que aquele comportamento não é aceito, uma vez que em ele planeja seus ataques, suas vítimas, simplesmente porque o agrada. Os criminosos comuns tentam buscar uma justificativa para seus crimes, como uma paixão, vingança, entre outros, enquanto o serial killer comete seus crimes por gostar da sensação que aquilo causa, sendo capaz de controlar seus impulsos.
Afirma Abreu (2013), que esses psicopatas entendem o caráter ilícito de seus atos, pois eles não sofrem de qualquer alteração psíquica. O que não acarretaria o afastamento da imputabilidade desses indivíduos, pois psicopata não é considerado doença mental, devendo ser responsabilizado penalmente pelos crimes cometidos uma vez que tinha compreensão de suas atitudes.
O serial killer por mais que não seja considerado como doente mental, a partir dos exames criminológicos, eles também não podem ser considerados como pessoas normais, mas os seus atos criminosos e atentados contra a vida devem ser motivos de punição para que seja aplicado pena. Eles sabem que seus atos são ilícitos e não condiz com as normas legais e com o convívio em sociedade e é a partir desse momento de compreensão acaba por criar suas próprias regras e moldar seus crimes para que não sejam pegos, se adaptando e conhecendo as normas para que tenha conhecimento do que lhe beneficia. (ABREU, 2013)
Verifica-se que esses serial killers não somente tem noção da realidade, como também seus atos são bem pensados e planejados, dificilmente é cometido atos em que não foram reponderados, o fato de haver todo um planejamento, deixando através dos seus crimes a sua assinatura, o seu modus operandi, é perceptível que sua noção da realidade não foi afetada e se molda através da realidade para cometer seus crimes sem ser detectado.
O que pode acontecer é de haver casos em que esses indivíduos possam ser portadores de doença mental, como psicose, esquizofrenia e partir desse quadro praticar crimes não compreendendo a noção dos fatos, a esses devem ser enquadrados a inimputabilidade, quando for comprovado através de exames criminológicos sobre sua capacidade foi comprometida, verificado os critérios que estão presentes no artigo 26 do Código Penal sendo imposto a medida de segurança, uma vez que podem representar perigo para a população e sua ressocialização seria irresponsabilidade do Estado, quando esses não possuem a mesma capacidade social que um detento comum no final da execução penal.
A impulsividade e a falta de controle são colocados como justificativa para alguns doutrinadores, que não acreditam na sua imputabilidade, para o comportamento desses indivíduos, Abreu (2013) são características que podem ser encontradas em qualquer pessoa, ou seja, qualquer ser independente de sexo, cor, opção sexual está sujeito a passar por situações em que podem perder o controle e serem impulsivos e quando envolver atos ilícitos esses mesmas pessoas serão responsabilizadas por seus atos, sendo portanto consideradas como imputáveis.
2.6 PROJETO LEI 140/2010
O ordenamento jurídico brasileiro por mais que não tenha lei específica para tratar de serial killer, já ocorreu a tentativa da implementação de como lidar com esses indivíduos, trata-se do Projeto Lei 140/2010 .O projeto teve como seu propositor o senador Romeu Tuma, que já faleceu, que tinha como objetivo acrescentar parágrafos ao artigo 121 do Código Penal, sobretudo o conceito do serial killer, inclusive foram acrescentados novos parágrafos, porém nenhum relacionado aos assassinos em série e psicopatas. Trazia o conceito de serial killer no parágrafo sexto:
Art. Art. 121. Matar alguém:
Assassino em série
§ 6º Considera-se assassino em série o agente que comete 03 (três) homicídios dolosos, no mínimo, em determinado intervalo de tempo, sendo que a conduta social e a personalidade do agente, o perfil idêntico das vítimas e as circunstâncias dos homicídios indicam que o modo de operação do homicida implica em uma maneira de agir, operar ou executar os assassinatos sempre obedecendo a um padrão pré-estabelecido, a um procedimento criminoso idêntico.
O conceito dado ao assassino em série, é quando ocorreram mais de três assassinatos, em um determinado intervalo de tempo e a partir das condutas, da personalidade do agente, do perfil das vítimas, levando a maneira que ele agia. O que acaba acontecendo que o ordenamento por ter disciplinado, é não saber lidar e tratar quando casos parecidos ocorrem, dificultando mais ainda as soluções de casos e como agir com esses indivíduos.
Em seu parágrafo sétimo, ele abordava as características dos assassinos em série:
7º Além dos requisitos estabelecidos no parágrafo anterior, para a caracterização da figura do assassino em série é necessário a elaboração de laudo pericial, unânime, de uma junta profissional integrada por 05 (cinco) profissionais:
I – 02 (dois) psicólogos;
II – 02 (dois) psiquiatras; e
III – 01 (um) especialista, com comprovada experiência no assunto.
Esses indivíduos vêm sendo estudados ao longo de muitos anos, então é importante essa preocupação do legislador de não se adequar a somente a um entendimento e opinião, principalmente sobre um assunto ainda complexo. Ainda em seu parágrafo oitavo tratava que: “§ 8º O agente considerado assassino em série sujeitar-se-á a uma expiação mínima de 30 (trinta) anos de reclusão, em regime integralmente fechado, ou submetido à medida de segurança, por igual período, em hospital psiquiátrico ou estabelecimento do gênero”. Ou seja, a possibilidade de internação psiquiátrica, pelo mesmo tempo que cumpriria em regime integralmente fechado, prevendo uma pena maior do que a prevista pelo Código Penal, uma vez que a pena máxima prevista no ordenamento é de 40 anos, no tempo que foi proposto o projeto a pena máxima era de 30 anos. Já o parágrafo nono, previa a impossibilidade de benefícios penais, seja ele qual for e por isso foi bastante criticado.
O Projeto Lei nº 140/2010 não seguiu, sendo arquivado em 2014 por haver incompatibilidade com o Código Penal e ser considerado inconstitucional, ao prevê uma pena de no mínimo de 30 anos e quando no tempo que foi proposto o projeto esse corresponderia a pena máxima que um indivíduo cumpriria e não tendo também direito a nenhum benefício penal.
Ele traria pontos muito importantes para o ordenamento jurídico, suprindo uma lacuna que até os dias atuais não tem previsões que serão fechadas. Para que o Projeto Lei nº 140/2010 fosse realmente aceito deveria ocorrer alterações que fossem compatíveis com o ordenamento jurídico, até os dias atuais não há nenhum outro projeto a propositura do tema.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como foi abordado no presente artigo, nota-se que a figura do serial killer ainda há muitas facetas, algumas inclusive que são desconhecidas por grande parte de estudiosos sobre essas figuras. Entretanto, o que não é desconhecido, talvez questionado por muitas pessoas, é a responsabilidade desses indivíduos quando o assunto é seus crimes, no qual foi claramente exposto. O ordenamento jurídico brasileiro ainda continua omisso quando o assunto é sobre as penalidades do serial killers, o que se mantém sujeito a diversas interpretações, o que pode gerar confusão e até mesmo prejudicar o andamento tanto do ato de identificação desses seres, como também de penalidade.
É mostrado a relação que existe entre os psicopatas e o serial killers, no qual seus comportamentos planejados e conscientes, levaram e levam a morte de muitas vítimas, em que a noção que eles têm sobre o caráter ilícitos de seus atos não demonstrando qualquer tipo de remorso, fica evidente que possuem clareza sobre a realidade, uma vez que esses indivíduos tentam sempre passar despercebidos e em alguns casos desafiando o sistema, porque sabem que aquele comportamento não é aceito e nem lícito dentro da realidade. Grande parte dos doutrinadores não consideram os psicopatas como doentes mentais, o que dessa forma não é afastado a imputabilidade deles, devendo, portanto, ser sim punido como tal.
Ocorreu uma breve tentativa de suprimir essa omissão jurídica quando se trata do serial killers que foi o Projeto Lei 140/2010 proposto por Romeu Tuma, porém não obteve êxito e o projeto acabou sendo arquivado por achar que não tem compatibilidade com o sistema brasileiro. Depois desse projeto, nenhum outro foi proposto ou questionado novamente, mesmo ainda sendo objeto de curiosidade e discussões entre a população e até mesmo em mídias digitais.
A análise do momento em que foi cometido o crime é de extrema importância para que saiba como enquadrar o agente e como ele será responsabilizado, há possibilidade de inimputáveis no qual são aqueles casos que fica isento de pena, já tratado neste artigo estando presente no art.26 do Código Penal. Há a possibilidade de semi-imputável, no qual será aplicado a medida de segurança, por entender que o sistema carcerário não é o mais adequado nesses casos, ou a redução da pena. Em ambos, vai depender do momento do crime, se tinha consciência ou não do caráter ilícito. Por último, e o mais importante para este artigo o enquadramento do serial killer como imutável, no qual esses agentes devem ser responsabilizados penalmente por seus atos criminosos, por terem plena consciência que os atos praticados por eles não são aceitos e são vedados, tal circunstância também é notada por serem planejados e por tentarem de qualquer forma encobrir os rastros de seus crimes, apresentando grande risco para sociedade.
Por fim, o enquadramento como imputável é de extrema importância para que dessa forma ele seja observado da maneira mais adequada, como um indivíduo que sabe dos seus atos, sabe que ele pode ser penalizado devido a eles, tendo pleno conhecimento sobre a prática de sua ilicitude. Deve ser feito os exames necessários psicológicos, físicos e psiquiátricos, tanto antes do cumprimento da pena como durante também, para que além da aplicação do sistema carcerário haja um acompanhamento desse agente tanto para objeto de estudos, como também conhecimento de procedimentos quando novos casos surgirem pois há uma falha na capacitação dos agentes na ocorrência desses tipos de crimes, são necessários também para saber a evolução quadro desses serial killer para que não acabe ocorrendo uma ressocialização de um indivíduo que apresenta risco a sociedade.
É claro que o sistema brasileiro ainda precisa se reeducar quando o assunto é serial killers por de fato ainda existir muitas lacunas sobre esses indivíduos, devendo se dedicar a informações mais avançadas, devido ainda a ausência de uma norma que trate diretamente sobre serial killers.
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