A IMPORTÂNCIA DO VÍNCULO PROFISSIONAL-FAMÍLIA NA ASSISTÊNCIA DE ENFERMAGEM À CRIANÇA COM DOENÇAS CRÔNICAS

THE IMPORTANCE OF PROFESSIONAL-FAMILY BOND IN NURSING CARE FOR CHILDREN WITH CHRONIC DISEASES

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202508121531


Ana Claudia Duarte Silva
Daniela Botelho Nogueira
João Vitor Lopes Ramos
Elciana de Oliveira Emerick Coelho


RESUMO

A doença crônica na infância representa um desafio significativo para o sistema de saúde, com impactos na vida da criança e também da sua família. O presente estudo teve como objetivo analisar a influência do vínculo entre profissionais de enfermagem e familiares na qualidade da assistência prestada a crianças com doenças crônicas. Trata-se de uma revisão integrativa da literatura. A análise evidenciou que o fortalecimento do vínculo profissional/família contribui significativamente para a adesão ao tratamento, a continuidade do cuidado no domicílio e a promoção de um cuidado mais humanizado. Dentre os principais achados, destacaram-se estratégias como a escuta ativa, a comunicação terapêutica, o envolvimento da família no planejamento do cuidado e o suporte emocional. Foram também identificados desafios importantes, como barreiras institucionais, limitações na formação profissional, sobrecarga de trabalho e fragilidades na rede de apoio. Conclui-se que a consolidação desse vínculo é essencial para a qualidade da assistência, sendo necessária a implementação de políticas e práticas que favoreçam o cuidado centrado na família e a capacitação contínua dos profissionais de enfermagem.

Palavras-chave: Enfermagem; Criança; Doença crônica; Relações Profissional-Família; Cooperação do Paciente.

ABSTRACT

Chronic illness in childhood represents a significant challenge for the healthcare system, with considerable impacts on both the child’s life and that of their family. This study aimed to analyze the influence of the bond between nursing professionals and family members on the quality of care provided to children with chronic conditions. It is an integrative literature review. The analysis revealed that strengthening the professional/family bond significantly contributes to treatment adherence, continuity of home care, and the promotion of more humanized care. Among the main findings, strategies such as active listening, therapeutic communication, family involvement in care planning, and emotional support stood out. Important challenges were also identified, including institutional barriers, limitations in professional training, work overload, and weaknesses in the support network. It is concluded that consolidating this bond is essential for the quality of care, requiring the implementation of policies and practices that support family-centered care and the continuous training of nursing professionals.

Keywords: Nursing; Child; Chronic illness; Professional-Family Relationships; Patient Cooperation.

1. INTRODUÇÃO

As doenças crônicas na infância constituem desafio relevante para os sistemas de saúde brasileira e internacional, acarretando repercussões profundas na vida da criança acometida e de seu entorno familiar (Lopes et al., 2021). Estimativas da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp apontam que 9 a 11% das crianças e adolescentes no Brasil convivem com alguma condição crônica, o que impõe elevada demanda por serviços de atenção continuada, planejamento integrado e abordagem centrada na família (Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, 2018).

A doença crônica caracteriza-se por curso prolongado, evolução lenta e efeitos de longa duração, frequentemente imprevistos. Ainda que em geral não haja cura, tais condições podem ser prevenidas ou controladas por meio de diagnóstico precoce e intervenções terapêuticas adequadas (Silva et al., 2017). O reconhecimento da condição crônica infantil implica reorganização dos papéis e rotinas no âmbito familiar, exigindo adaptações na dinâmica social e no cotidiano dos cuidadores.

O impacto no núcleo familiar revela-se multifatorial, abrangendo aspectos emocionais, sociais, econômicos e organizacionais (Fernandes et al., 2021). São recorrentes internações prolongadas, exames frequentes e regimes terapêuticos complexos, bem como efeitos adversos de medicamentos, dificuldade na compreensão diagnóstica, sobrecarga financeira e manifestação de sentimentos de angústia, medo e apreensão diante de possíveis agravamentos ou desfechos adversos (Silva et al., 2017).

Nesse contexto, o estabelecimento de vínculo sólido entre equipe de enfermagem e familiares da criança com doença crônica configura-se como elemento essencial à qualidade da atenção prestada (Machado et al., 2018). Tal vínculo favorece o acolhimento, o suporte emocional e a adesão terapêutica, pautando-se em comunicação efetiva e escuta qualificada (Silva et al., 2018).

O suporte social oferecido pela equipe multiprofissional contribui para o enfrentamento dos desafios do adoecimento crônico, desde que percebido como eficaz e adequado às necessidades familiares, impactando positivamente a experiência de cuidado e a qualidade de vida (Sousa et al., 2013). Dessa forma, torna-se imprescindível a avaliação contínua da percepção familiar quanto às estratégias de apoio implementadas.

Estudos prévios indicam que o fortalecimento desse vínculo potencializa a adesão ao tratamento e otimiza os resultados assistenciais (Rodrigues et al., 2013). Mandetta (2019) ressalta que o tratamento de crianças com doenças crônicas deve envolver o núcleo familiar de modo integrado, de modo a promover resiliência e desenvolvimento conjunto de estratégias de enfrentamento. A ausência de espaços adequados de escuta pode gerar repercussões emocionais negativas, como culpa, apatia ou ansiedade.

Não obstante a relevância reconhecida, persistem fragilidades na relação entre profissionais de saúde e familiares, incluindo falhas de comunicação, ausência de acolhimento estruturado, sobrecarga laboral dos profissionais e restrições institucionais (Bossato; Loyola; Oliveira, 2021). Tais limitações podem comprometer a qualidade da assistência e dificultar a sustentação de redes de cuidado.

Em face desse cenário, investiga-se como o vínculo entre profissionais de enfermagem e familiares influencia a qualidade da assistência a crianças com doenças crônicas, bem como quais estratégias se mostram mais eficazes para seu fortalecimento. A elucidação desses aspectos contribui para o desenvolvimento de práticas assistenciais humanizadas e orientadas para as necessidades da criança e de seu contexto familiar. 

O presente estudo justifica-se pela necessidade de aprofundamento teórico e empírico acerca do tema “vínculo profissional/família” no âmbito da enfermagem pediátrica, reconhecido como fator determinante na qualidade da assistência e na promoção da qualidade de vida. Ademais, os resultados poderão subsidiar a formação de profissionais, a elaboração de protocolos institucionais e a formulação de políticas de saúde voltadas ao cuidado integral da criança com condição crônica.

O objetivo consistiu em analisar o impacto da doença crônica infantil na dinâmica familiar; identificar na literatura quais são os benefícios do vínculo profissional/família na adesão ao tratamento; identificar quais estratégias da Enfermagem são necessárias para estabelecer e manter o vínculo efetivo com as famílias e identificar quais são os desafios da Enfermagem na construção e manutenção do vínculo enfermeiro/paciente/família. Deve oferecer uma breve revisão da literatura, destacando os avanços científicos e contextualizando a pesquisa propriamente dita.

2. METODOLOGIA

O presente estudo caracteriza-se como revisão integrativa da literatura, cujo objetivo foi identificar semelhanças e divergências entre publicações acerca do vínculo entre profissionais de enfermagem e familiares de crianças com doenças crônicas (Canuto & Oliveira, 2020). Adotou-se o delineamento de natureza descritiva e abordagem qualitativa.

A busca eletrônica foi realizada na base Scientific Electronic Library Online (SciELO), abrangendo o período de março a abril de 2025. Inicialmente, efetuou-se pesquisa utilizando-se isoladamente cada descritor para dimensionar o número de registros associados a cada termo. Posteriormente, procedeu-se à combinação dos descritores por meio do operador Booleano “AND” para refinar a seleção de estudos. Os Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) empregados foram: “Enfermagem”; “Criança”; “Doença Crônica”; “Relações Profissional/família” e “Cooperação do Paciente” (sinônimo validado para “Adesão ao tratamento”). Todos os termos foram validados na base DeCS, mantida pela BIREME, a fim de assegurar padronização terminológica e relevância temática.

A questão norteadora que orientou a seleção dos artigos foi: “Como o estabelecimento do vínculo entre profissionais de enfermagem e familiares influencia a qualidade da assistência prestada às crianças com doenças crônicas?”

Os critérios de inclusão estabelecidos foram publicações disponíveis na íntegra e gratuito, idioma português e indexados no SciELO, lacuna temporal de quinze anos, entre 2010 a 2021 que respondessem ao objetivo do estudo. Nos critérios de exclusão foram retiradas as publicações duplicadas, relatos de experiência, artigos de reflexão, cartas, editoriais, e produções não relacionadas com o escopo do estudo.

A análise dos resultados concentrou-se na identificação de padrões conceituais, lacunas de conhecimento e estratégias empregadas para o fortalecimento do vínculo profissional/família, permitindo a síntese crítica dos avanços e desafios na área.

No primeiro momento, a consulta na base de dados SciELO foi realizada com apenas um descritor e sem critérios específicos de busca, para se obter a dimensão dos trabalhos ligados a cada termo. O resultado do número de artigos encontrados após ter sido realizada a pesquisa dos descritores foram: Enfermagem 2.250.000; Criança 3.780.000; Doença crônica 769.000; Relações profissional/família 2.070; e Cooperação do paciente 1.980 estudos. No segundo momento, esses descritores foram combinados entre si pelo operador booleano “AND” e os resultados foram: Enfermagem” AND “Criança” AND “Doença Crônica” 43; “Enfermagem” AND “Criança” AND “Doença Crônica” AND “Família” 14; “Enfermagem” AND “Criança” AND “Doença Crônica” AND “Relações Profissional/família” 38; “Enfermagem” AND “Criança” AND “Doença Crônica” AND “Cooperação do paciente 21”. 

Em seguida, procedeu-se à leitura de títulos e resumos, visando à pré-seleção daqueles considerados potencialmente pertinentes. Os estudos pré-selecionados foram então avaliados na íntegra e após a aplicação dos critérios de inclusão foram descartados 110 estudos porque não atendia a exigência proposta. Ao término desse processo, 11 artigos compuseram o corpus final desta revisão integrativa, servindo de base para a extração e análise dos dados.

Para sistematizar a coleta de informações, elaborou-se um instrumento de extração em formato de quadro (Quadro 1) contemplando o título do estudo, autor, ano de publicação, objetivo, método, principais resultados e conclusão.

A análise dos dados seguiu o procedimento de análise temática de conteúdo, conforme Santos (2012), dividida em três fases:

₋ Pré-análise – exame exploratório do material para familiarização e definição das categorias iniciais;

₋ Exploração do material – codificação sistemática dos trechos selecionados e refinamento das categorias temáticas;

₋ Tratamento dos resultados e interpretação – síntese dos temas identificados e elaboração de inferências em relação ao objetivo da pesquisa.

Esse enfoque metodológico garantiu rigor e consistência na identificação de padrões, lacunas e estratégias referentes ao vínculo entre profissionais de enfermagem e familiares de crianças com doenças crônicas.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Para análise dos dados elaborou-se um instrumento de coleta de informações (Quadro 1). A discussão dos dados obtidos foi realizada de forma descritiva, possibilitando identificar como o estabelecimento do vínculo entre profissionais de enfermagem e familiares influencia a qualidade da assistência prestada às crianças com doenças crônicas. 

Quadro 1 – Caracterização dos artigos selecionados na base de dados SciELO

Fonte: Autores da Pesquisa, 2025.

Na discussão os estudos selecionados foram organizados e apresentados em quatro categorias temáticas. 1) O impacto da doença crônica infantil na dinâmica familiar; 2) Benefícios do vínculo entre profissional de Enfermagem e familiares na adesão ao tratamento das crianças com doenças crônicas; 3) Estratégias da Enfermagem para manter o vínculo efetivo com as famílias; e 4) Desafios da Enfermagem na construção e manutenção do vínculo profissional/paciente/família. 

3.1 O impacto da doença crônica infantil na dinâmica familiar

Na infância, o diagnóstico de uma condição crônica representa um evento abrupto que exige reorganização das rotinas familiares e dos papéis sociais, configurando-se como desafio multifacetado para cuidadores e demais membros do núcleo familiar (Baltor et al., 2013). 

Araújo et al. (2013) descrevem que as famílias vivenciam interrupções nas atividades cotidianas, hospitalizações prolongadas, exames repetidos, adesão rigorosa ao tratamento e possível ocorrência de efeitos adversos da medicação, bem como dificuldades de compreensão diagnóstica e sobrecarga financeira. Essas demandas geram sentimentos de angústia, medo e incerteza quanto ao prognóstico, repercutindo diretamente na qualidade de vida familiar.

Salvador et al. (2015) destacam que, diante do diagnóstico, as famílias necessitam desenvolver estratégias de enfrentamento para lidar com as sequelas e reorganizar sua estrutura interna. Nesse contexto, os familiares passam também a demandar orientação especializada sobre cuidados continuados, evidenciando sua condição de “cuidadores especiais” (Amorim Silva et al., 2018).

Um elemento recorrente nos estudos é a sobrecarga do cuidador primário, frequentemente a mãe, que assume a maior parte das responsabilidades materiais e emocionais associadas ao cuidado da criança cronicamente enferma. Essa prevalência materna é especialmente notável durante internações e consultas ambulatoriais (Salvador et al., 2015), sugerindo a necessidade de suporte específico a esse perfil de cuidador.

No plano das relações sociais, Araújo et al. (2013) ressalta que a rede de apoio — família ampliada, amigos e instituições comunitárias — pode atenuar o impacto da condição crônica. Contudo, observou-se que esse apoio raramente é estável e alinhado às demandas reais das famílias, o que enfatiza o papel dos profissionais de enfermagem no fortalecimento e na continuidade do suporte social.

Salvador et al. (2015) corroboram que o impacto econômico associado ao adoecimento infantil crônico também se revela significativo. As internações frequentes e tratamentos prolongados elevam os custos diretos e indiretos, podendo levar famílias a estados de vulnerabilidade socioeconômica. Em muitos casos, um dos pais abandona o emprego para dedicar-se integralmente aos cuidados da criança, aprofundando o desequilíbrio financeiro.

Diante desse cenário complexo, é imprescindível que a equipe de enfermagem adote uma abordagem de cuidado integral e humanizado, capaz de reconhecer as dimensões emocionais, sociais e econômicas vivenciadas pelas famílias. Somente assim será possível oferecer intervenções que considerem, de forma equânime, as necessidades da criança e de seu contexto familiar.

3.2 Benefícios do vínculo entre profissional de Enfermagem e familiares na adesão ao tratamento das crianças com doenças crônicas

Como forma de contextualizar, o quadro nº 2 apresenta os principais benefícios do vínculo profissional/família na adesão ao tratamento de crianças com doenças crônicas, conforme identificado nos estudos analisados:

Quadro 2 – Benefícios do vínculo profissional-família na adesão ao tratamento

Fonte: Autores da Pesquisa, 2025.

O quadro nº 2 demonstra que o vínculo entre profissionais de enfermagem e familiares gera múltiplos benefícios, refletindo diretamente na qualidade da assistência e na adesão ao tratamento. Dentre os elementos identificados nos estudos analisados, destacam-se o empoderamento familiar, a continuidade do cuidado após a alta hospitalar e o fortalecimento da rede de apoio social como fatores cruciais para o manejo domiciliar eficaz da doença crônica infantil.

Conforme relatado por Baltor et al. (2013), o estabelecimento de relação de confiança e parceria entre a equipe de enfermagem e os cuidadores favorece a adesão terapêutica. Esse efeito se relaciona ao diálogo contínuo e à escuta ativa, apontando-os como pilares do suporte social capaz de amenizar o impacto do adoecimento crônico na infância. Assim, a criação de um ambiente de segurança relacional encoraja as famílias a participarem ativamente do plano de cuidados (Machado et al., 2018).

Sousa et al. (2013) observa que enfatiza que o enfermeiro deve promover ações de acolhimento, ouvir as narrativas familiares e compartilhar informações de forma clara, de modo a atenuar o sofrimento e valorizar o papel dos cuidadores no processo terapêutico. Assim, quando as famílias compreendem os objetivos e as prescrições do tratamento, apresentam maior comprometimento com as rotinas de cuidado, reduzindo falhas na administração de medicamentos e procedimentos.

Além disso, a redução da ansiedade e do estresse familiar é outro benefício recorrente. Machado et al. (2018) corroboram que o apoio percebido pelos profissionais de saúde contribui para o desenvolvimento de estratégias de enfrentamento mais adaptativas. Em consonância, propõe que o envolvimento integral do núcleo familiar potencializa a resiliência coletiva, essencial para lidar com os desafios diários.

No que tange à comunicação, Amorim Silva et al. (2018) ressalta que um vínculo consolidado aprimora a troca de informações sobre a condição clínica, as necessidades da criança e a evolução do tratamento. Machado et al. (2018) reforçam que a escuta qualificada constitui ferramenta indispensável para garantir a compreensão mútua e o alinhamento das expectativas entre equipe e família.

Finalmente, a literatura destaca a continuidade do cuidado após a alta como indicador de qualidade. Nóbrega et al. (2022) apontam que famílias amparadas pelo vínculo profissional–família conduzem o manejo domiciliar com maior segurança, resultando em menor incidência de readmissões. sugerem que o acompanhamento pós-alta e o reforço do relacionamento facilitam a superação de barreiras no cuidado de crianças com doenças crônicas.

Diante desses achados, evidencia-se a importância de práticas de enfermagem fundamentadas no diálogo, na escuta consciente e no apoio contínuo, visando a uma atenção integral e centrada na família em contextos de pediatria crônica.

3.3 Estratégias da Enfermagem para manter o vínculo efetivo com as famílias 

Como discutido no quadro nº 3, as estratégias identificadas demonstram a importância de uma abordagem multidimensional na construção e sustentação do vínculo entre profissionais de saúde e famílias de crianças com doenças crônicas.

Quadro 3 – Estratégias da Enfermagem para manter o vínculo efetivo com as famílias

Fonte: Autores da Pesquisa, 2025.

A comunicação terapêutica, o envolvimento ativo da família no planejamento do cuidado e uma abordagem centrada na família constituem os pilares para o desenvolvimento de uma relação pautada na confiança, cooperação e corresponsabilização. A literatura analisada aponta diversas estratégias que podem ser adotadas por profissionais de enfermagem para estabelecer esse vínculo efetivo. 

Salvador et al. (2015) identificaram medidas utilizadas pelas próprias famílias no manejo do cuidado, tais como: conciliar trabalho, estudo e cuidados com a criança; redistribuir as tarefas cotidianas; adaptar a estrutura física do domicílio; incluir a criança no seu processo de autocuidado; buscar apoio em redes sociais, religiosas ou comunitárias; procurar assistência em outras localidades; e praticar atividades físicas para enfrentamento do estresse. Os autores ressaltam que o enfermeiro deve integrar essa rede de apoio, contribuindo para o fortalecimento familiar e para o desenvolvimento de competências de enfrentamento frente às adversidades impostas pela doença.

Dentre as estratégias mais citadas na literatura, o acolhimento e a escuta qualificada ocupam posição central. Segundo Machado et al. (2018), o vínculo equipe-família é intensificado pelo diálogo contínuo e pela escuta sensível, os quais são reconhecidos como formas efetivas de apoio social. Esses autores destacam que a escuta atenta representa uma ferramenta essencial no cuidado, devendo ser reconhecida como parte do processo terapêutico e como componente da rede de suporte à família.

A comunicação terapêutica, enquanto estratégia relacional, também é amplamente destacada. O papel do enfermeiro na escuta ativa das narrativas familiares, no compartilhamento de informações de maneira clara e no reconhecimento do esforço das famílias no cuidado cotidiano da criança. Essas ações contribuem para a diminuição do sofrimento e para o fortalecimento da parceria profissional-família (Pinto et al., 2010).

O envolvimento da família na elaboração do plano terapêutico constitui outro eixo estratégico relevante. A participação dos familiares nas decisões relativas ao tratamento, quando valorizados seus saberes e experiências, promove corresponsabilidade no cuidado e reforça o vínculo de confiança com a equipe de enfermagem. Ainda, lideranças comprometidas podem revisar protocolos assistenciais que limitam a participação familiar, promovendo maior integração e qualidade de vida tanto para a criança quanto para sua família (Silva et al., 2018).

A educação em saúde e o empoderamento familiar são igualmente mencionados como estratégias fundamentais. De acordo com Salvador et al. (2015), o acesso a informações qualificadas e a capacitação para o manejo da condição clínica da criança permitem que a família desenvolva autonomia e segurança para enfrentar os desafios do cuidado domiciliar. A educação em saúde, nesse contexto, emerge como ferramenta de promoção da autoconfiança e de redução das desigualdades no processo de cuidado.

Outro aspecto relevante é o suporte emocional e psicológico oferecido à família. Ribeiro e Calado (2017) alertam para a necessidade de práticas de acolhimento contínuas, especialmente para aquelas que vivenciam longas jornadas hospitalares. Os autores reforçam que a ausência de espaços de escuta e compreensão pode desencadear sentimentos como culpa, medo, angústia ou apatia, interferindo negativamente no processo de cuidado.

Além disso, a continuidade do cuidado após a alta hospitalar figura como estratégia indispensável. A manutenção do vínculo com a equipe de saúde no ambiente domiciliar é determinante para o êxito terapêutico. Machado et al. (2018) reiteram que o seguimento pós-alta e o fortalecimento das conexões entre equipe e família são fundamentais para superar as barreiras cotidianas impostas pela doença crônica (Machado et al., 2018).

Dessa forma, as evidências reunidas apontam que o vínculo efetivo entre profissionais de enfermagem e famílias de crianças com doenças crônicas demanda um conjunto articulado de estratégias fundamentadas na escuta ativa, no acolhimento, na valorização dos saberes familiares e na corresponsabilização pelo cuidado. Tais estratégias não apenas fortalecem a confiança e a cooperação mútua, como também promovem a continuidade do cuidado, o empoderamento familiar e a qualificação da assistência. Trata-se, portanto, de práticas imprescindíveis à prestação de um cuidado integral, humanizado e resolutivo, compatível com as complexas demandas que envolvem o viver com uma condição crônica na infância.

3.4 Desafios da Enfermagem na construção e manutenção do vínculo profissional/paciente/família

O quadro nº 4 sintetiza os principais desafios enfrentados pelos profissionais de enfermagem na construção e manutenção do vínculo com famílias de crianças com doenças crônicas. Os dados evidenciam a complexidade envolvida nesse processo, especialmente no contexto da assistência à infância com condição crônica.

Quadro 4 – Desafios da Enfermagem na construção e manutenção do vínculo profissional/paciente/família

Fonte: Autores da Pesquisa, 2025.

Entre os obstáculos mais recorrentes identificam-se barreiras institucionais e organizacionais, lacunas na formação profissional, fragmentação do cuidado e desigualdades socioeconômicas. Tais entraves demandam intervenções estruturais e sistêmicas para serem efetivamente superados.

A análise da literatura revela que o impacto da doença crônica na dinâmica familiar é multidimensional, afetando esferas emocionais, sociais, financeiras e organizacionais. Pinto et al. (2010) ressalta a sobrecarga do cuidador principal, as alterações na rotina doméstica e o ônus financeiro como elementos que devem ser considerados no planejamento de ações de cuidado centradas na família.

A articulação entre os resultados apresentados nas tabelas e a discussão textual reforça a importância de compreender não apenas os benefícios e estratégias de vinculação, mas também os desafios concretos enfrentados no cotidiano assistencial. Nesse sentido, Machado et al. (2018) identificaram dificuldades significativas, como a fragilidade na comunicação entre equipe e família, falhas na organização do processo de trabalho e carência de infraestrutura hospitalar, fatores que comprometem o suporte efetivo às famílias

Dentre os desafios mais recorrentes, destacam-se as barreiras institucionais e organizacionais. Regras e rotinas que restringem a presença e participação dos familiares devem ser revistas, pois interferem negativamente na qualidade de vida da criança e de sua família. A autora defende que lideranças comprometidas são capazes de reestruturar protocolos excludentes, promovendo maior inclusão e interação familiar.

Outro ponto crítico refere-se às limitações na formação profissional. Muitos enfermeiros não recebem preparação adequada para lidar com as especificidades do cuidado à criança com doença crônica, o que dificulta o estabelecimento de vínculos significativos. Nóbrega et al. (2022) destacam a importância de os profissionais estarem capacitados para orientar e empoderar as famílias no manejo da condição clínica da criança.

A sobrecarga de trabalho também representa um obstáculo relevante. A elevada demanda de atendimentos, somada à escassez de profissionais e à falta de tempo, compromete a qualidade das interações entre equipe e família. Machado et al. (2018) apontam a desorganização do processo de trabalho como um dos principais fatores que limitam a oferta de apoio qualificado. As dificuldades de comunicação entre profissionais e familiares são recorrentes na literatura. Segundo Machado et al. (2018), a ausência de escuta ativa e de diálogo empático pode fragilizar ou até romper o vínculo profissional-família, comprometendo a continuidade e a qualidade do cuidado prestado.

Outro fator limitante é a fragilidade da rede de apoio social disponível às famílias. Araújo et al. (2013) evidenciam que, embora o apoio social seja reconhecido como importante, sua disponibilidade e efetividade variam de acordo com a composição da rede, muitas vezes sendo descontínuo e insuficiente. Cabe ao profissional de enfermagem identificar essas lacunas e contribuir com estratégias que favoreçam o fortalecimento dessa rede.

Além disso, os profissionais também enfrentam desafios ao lidar com as reações emocionais das famílias frente ao diagnóstico e tratamento da doença crônica. A ausência de espaços para desabafo e acolhimento emocional pode gerar sentimento de culpa, medo e apatia, dificultando o estabelecimento de vínculos terapêuticos (Vaz et al., 2018).

Diante desse cenário, é imperativo que os profissionais de enfermagem adotem estratégias que favoreçam a superação desses desafios. A continuidade do cuidado após a alta hospitalar, associada ao fortalecimento do vínculo entre equipe e família, é apontada como uma possibilidade concreta para minimizar os obstáculos enfrentados no cuidado à criança com doença crônica (Machado et al., 2018).

Por fim, embora as tabelas sistematizem os achados de forma objetiva, é fundamental reconhecer que a complexidade das relações estabelecidas entre profissionais de enfermagem e famílias transcende os dados tabulares. As especificidades de cada contexto familiar, as singularidades de cada condição crônica e as nuances das interações humanas devem ser cuidadosamente consideradas na prática clínica e foram aprofundadas ao longo da discussão apresentada neste artigo.

4. CONCLUSÕES

Após a análise e reflexão de todo o conteúdo abordado, tornam-se necessárias as considerações finais deste estudo. O objetivo central foi analisar a influência do vínculo estabelecido entre os profissionais de enfermagem e os familiares na qualidade da assistência prestada a crianças com doenças crônicas. Com base na revisão integrativa da literatura, foi possível confirmar a hipótese de que o fortalecimento desse vínculo contribui de forma significativa para a melhoria da qualidade da assistência e para a adesão ao tratamento dessas crianças.

Os achados demonstraram que o vínculo entre profissionais de enfermagem e familiares vai além da interação técnica, constituindo-se como um elemento central para a promoção do cuidado integral e humanizado. No que se refere ao primeiro objetivo específico, observou-se que os benefícios dessa relação são amplos e impactam diretamente na adesão terapêutica. A construção de uma relação de confiança — sustentada pelo diálogo, pela escuta qualificada e pela empatia — favorece a compreensão da condição crônica pela família, reduz a ansiedade e o estresse relacionados ao tratamento, melhora a comunicação entre equipe e familiares, fortalece a continuidade do cuidado no domicílio e promove o empoderamento familiar, permitindo que os cuidadores se tornem protagonistas no processo de cuidado.

Em relação ao segundo objetivo específico, foram identificadas diversas estratégias que podem ser utilizadas pelos profissionais de enfermagem para a construção e manutenção desse vínculo. Destacam-se: a comunicação terapêutica clara e acessível, a escuta ativa das demandas e angústias familiares, o envolvimento da família no planejamento e na execução dos cuidados, ações de educação em saúde adaptadas à realidade sociocultural, o suporte emocional constante e, sempre que possível, a realização de visitas domiciliares para melhor compreensão do contexto em que a criança está inserida. A aplicação eficaz dessas estratégias exige dos profissionais sensibilidade, empatia e um compromisso ético com o cuidado centrado na família.

No que tange ao terceiro objetivo específico, a análise dos desafios enfrentados na construção e manutenção do vínculo revelou obstáculos significativos. Entre eles, destacam-se a fragilidade na comunicação, muitas vezes influenciada pelo uso excessivo de linguagem técnica e pela limitação de tempo nas interações; a sobrecarga de trabalho; a rotatividade de profissionais; deficiências na infraestrutura institucional; lacunas na formação profissional, especialmente no que se refere ao manejo de questões psicossociais; a fragmentação da assistência entre os diferentes níveis de atenção; e a sobrecarga emocional enfrentada pelos próprios profissionais de enfermagem. Tais fatores comprometem a continuidade e a solidez das relações terapêuticas.

Diante desse panorama, conclui-se que o vínculo entre profissionais de enfermagem e famílias é um componente essencial para a qualidade da assistência prestada a crianças com doenças crônicas. Seu fortalecimento não apenas favorece a adesão ao tratamento e melhora os desfechos clínicos, como também promove um cuidado mais humano, ético e centrado nas necessidades reais da criança e de sua família. A superação dos desafios identificados requer esforços intersetoriais, incluindo a qualificação contínua dos profissionais, a reestruturação dos processos organizacionais nas instituições de saúde, a melhoria das condições de trabalho e a formulação de políticas públicas que incentivem práticas baseadas no cuidado centrado na família.

Por fim, recomenda-se que futuras pesquisas explorem intervenções específicas voltadas ao fortalecimento desse vínculo em diferentes contextos assistenciais, avaliando seus impactos nos indicadores de saúde da criança e na qualidade de vida da família. A continuidade dos estudos nessa temática é fundamental para o aprimoramento das práticas de enfermagem e para a consolidação de uma assistência cada vez mais qualificada, resolutiva e humanizada às crianças com doenças crônicas e seus familiares. Deve trazer como base os objetivos ou hipóteses do trabalho, bem como, os dados comprovados no desenvolvimento do artigo.

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