A IMPORTÂNCIA DO ACOMPANHAMENTO PSICOLÓGICO NA ELABORAÇÃO DO LUTO POR ASSASINATO

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102411161010


Helbetania Carvalho Lopes1
José de Ribamar Carvalho Rodrigues1
Luzineide Rodrigues (In memorian)1
Maira Antelma Lustosa Batista1
Adrielly Martins Porto Netto2


Resumo: O luto é um processo complexo e individualizado que pode ser desencadeado pela perda de vínculos emocionais significativos, sejam eles objetos, animais, trabalho, pessoas, entre outros. Pode ser visto como uma resposta emocional à reconexão com o que foi perdido. A experiência de luto varia de acordo com o contexto cultural e as circunstâncias da morte e pode incluir fases como negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. A perda repentina, especialmente em casos de violência, pode complicar o processo de luto, tornando-o mais doloroso e prolongado. O objetivo do artigo é compreender o acompanhamento psicológico para mãe que enfrenta a perda de um filho em situação de violência. A investigação demonstrou que o sofrimento psicológico associado à perda de um filho não se limita ao objeto perdido, mas inclui também a perda de um projeto de vida, muitas vezes influenciado por fatores culturais e sociais.

Palavras-chave: Luto; Mães; Morte; Violência; Assassinato.

Introdução

O que define a humanidade é sua capacidade de autoconsciência (Fink ,2020). Essa habilidade é um bem inestimável, superando até mesmo o valor da vida. Contudo, essa consciência só surge quando se é capaz de reconhecer a própria mortalidade. Além disso o autor ainda pontua que a experiência humana é repleta de conexões que se formam, se ampliam e, em certas ocasiões, se desfazem. Esses laços permitem que o indivíduo vivencie relacionamentos, transforme suas ideias e reavaliem suas percepções.

O primeiro vínculo significativo que uma pessoa estabelece é com a mãe que a gerou (Pereira, 2020). Um laço invisível que perdura por toda vida, mesmo após a separação física, como ocorre com o corte do cordão umbilical. Entretanto, esse vínculo pode ser abruptamente interrompido devido a circunstâncias trágicas, como um assassinato. O laço invisível continua a existir, mesmo com a ruptura visível (Kersting; Wagner, 2022).

Segundo analisa Kovács (2005) embora possa parecer um paradoxo, a morte é uma componente intrínseca da vida, muito mais do que o ser humano percebeu até agora. Ela está presente em guerras, conflitos civis e sociais, atos de violência e doenças crônicas. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (2023), o Brasil enfrenta uma taxa alarmante de homicídios, que afeta, em especial, jovens e adolescentes. Esses assassinatos têm um efeito devastador sobre as famílias, sobretudo sobre as mães que são confrontadas com a perda violenta de seus filhos.

Estudos de Casellato (2020) apontam que o luto materno decorrente de assassinatos tem particularidades que dificultam a elaboração desse luto, como o trauma, a busca por justiça e o impacto profundo da notícia da perda. Contudo, a literatura sobre o luto materno relacionado à morte violenta de um filho ainda é escassa.

A perda de um filho é uma das experiências mais devastadoras que uma família pode enfrentar. O luto resultante dessa perda não apenas causa dor intensa à mãe, mas também desorganiza a dinâmica familiar como um todo. Estudos mostram que a morte de uma criança pode levar a um luto prolongado e complicado, afetando o relacionamento entre os membros da família (Kubler-Ross, 1969; Worden, 2009).

Diante disso, fica a questão: de que forma o acompanhamento psicológico pode amenizar a perda de um filho por assassinato para uma mãe? Considerando que, quando a morte acontece de forma súbita e inesperada, é provável que o sofrimento da mãe por essa perda insubstituível se intensifique, resultando em dificuldades de aceitação, desorientação e uma sensação de impotência.

De acordo com Edler (2021), o luto, quando não devidamente elaborado, pode se tornar patológico. Culturalmente, faz parte das narrativas das mulheres-mães a ideia de que são os filhos que devem sepultá-las, sendo comum ouvir a expressão “os filhos devem enterrar as mães, e não o contrário”. Essa perspectiva está enraizada na visão de morte ligada ao envelhecimento, sem levar em conta mortes inesperadas, acidentes, violências, tragédias ou assassinatos.

A razão para investigar essa temática, que é pouco abordada e permeada por emoções de dor e injustiça, revela a importância de entender a experiência de mães

que perderam seus filhos em assassínios. Essa compreensão é fundamental para que, se possa oferecer um apoio realmente humano e eficaz, além de implementar intervenções que ajudem no enfrentamento dessa dor.

Violência Letal nas Sociedades Urbanas: Análise das Tendências

A violência na sociedade urbana é muito frequente, e essa prática decorre desde a antiguidade, não é um fenômeno moderno ou contemporâneo, manifesta-se com uma questão social delicada e séria, tanto no meio público quanto privado e de diversas formas. Segundo Hayeck (2019), em um estudo realizado as ocorrências de violência no Brasil representam um desafio significativo de saúde pública, com ampla extensão e importância, resultando em sérias consequências para a saúde e a vida da população

Na edição do Monitor da Violência (2023), o Brasil contabilizou 39.492 homicídios dolosos, que incluem crimes como feminicídios, latrocínios, roubos resultantes em morte e lesões corporais que levaram ao óbito, o que equivale a uma média superior a 108 vítimas diárias. No ano anterior, 2022, o número total de mortes violentas foi de 41.135, ou seja, cerca de 113 por dia. Apesar desses dados alarmantes, mães relatam uma enorme lacuna por parte do Poder Público no apoio às pessoas enlutadas pela perda de filhos.

Segundo dados do Instituto de pesquisa econômica e aplicada (IPEA) a macrorregião norte do Brasil se tornou uma das áreas com o maior aumento na criminalidade e na violência letal. A taxa de homicídios na região aumentou 260,3% de 1980 a 2019 (IPEA,2019). Isso contrasta com a taxa média nacional de 85% no mesmo período. A edição número 36 do Boletim de Análise Político-Institucional (BAPI), que é publicado pelo Ipea, tem como objetivo examinar as causas desse crescimento.

Para entender esse cenário, é importante pensar em várias vertentes: o aumento de grupos criminosos originários do sistema prisional nos estados do Norte, o avanço da circulação de armas de fogo na região, a deterioração das políticas e instituições de controle socioambiental e o estímulo do governo federal à exploração predatória de recursos naturais de 2019 a 2022. Segundo informações do Monitor da

Violência, Tocantins ocupa a 3ª posição no ranking nacional de aumento de homicídios, ficando atrás do Estado do Rio de Janeiro e Amapá.

Os dados se referem ao primeiro semestre de 2023, comparado ao mesmo período do ano anterior. Enquanto o estado apresentou um aumento nos índices de assassinatos, o Brasil como um todo registrou uma redução de 3,4%. Incluem-se as vítimas de homicídios dolosos (abrangendo feminicídios), latrocínios e lesões corporais que resultaram em morte. Esses casos são agrupados sob a categoria de crimes violentos letais e intencionais.

Segundo Minayo e Souza (2018) esta violência está enraizada nas estruturas sociais, econômicas e políticas, e nesse contexto, pode-se incluir diversos sentidos, como agressão física, aplicação da força, intimidação, lesão corporal seguida de morte.

Ao observar as informações divulgadas sobre o monitoramento da violência, seria possível observar as consequências psicossociais para as famílias que lidam com as perdas. Segundo Worden (2013), essas famílias não apenas enfrentam o número de feridos e mortos, mas também enfrentam efeitos subjetivos como o luto, a dor da perda e os possíveis impactos emocionais.

Reflexão sobre a morte e o processo de luto

Ao longo da história, o ser humano sempre procurou entender a morte e os enigmas que abarcam o antes e o após de sua vivência. Ariés (1990) relata em seus estudos sobre a morte que, por um longo período, a morte foi considerada algo natural para os humanos.

Segundo Kovács (2002) em sua obra “ Morte e desenvolvimento humano “ ela afirma que quando a morte acontece de maneira repentina, a sensação de perda irreparável pode ser acentuada, particularmente para a mãe, o que muitas vezes leva a problemas para aceitar a circunstância. Este efeito pode resultar em desordem emocional e um sentimento intenso de incapacidade, complicando ainda mais o processo de adaptação e aceitação do luto.

A morte simboliza a perda e, quando existe um vínculo afetivo, resulta, por conseguinte, em sofrimento. Isso ocorre porque, segundo Luz (2021), lidar com a morte é mais complicado quando houve convivência com a pessoa falecida.

Conforme Bittencourt (2016) o luto é uma perda de uma conexão importante entre o indivíduo e seu objeto, ou seja, um processo inerente ao ser humano que surge naturalmente e persiste ao longo de seu desenvolvimento. De forma similar, Worden (2013) caracteriza o luto como uma resposta à perda de um objeto significativo, que desencadeia uma série de comportamentos, sentimentos e emoções com o intuito de restabelecer a conexão com esse objeto perdido.

Engel (1961) estabelece uma analogia entre o trauma causado pela perda e o processo físico de se ferir. É importante ressaltar que, durante o luto, há um rompimento no equilíbrio do bem-estar e da saúde mental, requerendo um período para que o indivíduo enlutado se recupere, de maneira análoga ao tempo necessário para a cicatrização de lesões físicas.

O processo de luto, de acordo com Ramos (2016) é altamente individualizado, variando de pessoa para pessoa, influenciado pelo contexto de residência, cultura, círculo social e, especialmente, pelas circunstâncias da morte. Isso ressalta a complexidade e dificuldade enfrentadas durante o luto, que, se não forem cuidadas, podem evoluir de um luto comum para um estado crônico (Ceccon, 2017). Por outro lado, existem diferentes estágios do processo de luto, incluindo um período inicial de torpor ou inquietação, seguido pela saudade e busca pela figura perdida, uma fase de desorganização e desespero, culminando em uma fase de reorganização gradual.

Os estudos de Parkes (1998) também revelam que a perda inesperada de um filho pode intensificar sentimentos de raiva, depressão e culpa nos pais, gerando mais problemas de saúde e lembranças dolorosas, em contraste com a perda de filhos devido a uma doença conhecida. Assim, segundo o autor, mortes repentinas e precoces tendem a complicar o processo de luto, sendo preditora de questões psicológicas como depressão e ansiedade (Parkes, 1998).

Segundo Luz (2021), o luto pode ainda provocar ajustes na visão espiritual do mundo, levando a uma revisão de valores e crenças filosóficas. Diversas mães se fecham emocionalmente ao confrontar a dor da perda, enquanto em outros, se expandem ao se engajar no movimento de restauração da vida. Dessa forma, os sentimentos de incapacidade e vulnerabilidade são sinais das dificuldades intrínsecas da perda, que precisam ser compreendidas considerando aspectos individuais dos familiares enlutados.

Nesse sentido, definir o luto e seus processos subjacentes é uma tarefa teórica complexa e desafiadora. Kubler-Ross (2005) permitiu um debate mais aberto sobre a morte, nosso maior medo é a única certeza. A autora apontou que é necessário preparar os profissionais para lidar com a dor da perda, no entanto, não há teorias, estatísticas, esquemas, protocolos ou receitas.

Ela propôs que os sentimentos de incapacidade e vulnerabilidade são sinais das dificuldades intrínsecas da perda, que precisam ser compreendidas considerando aspectos individuais dos familiares enlutados. Kubler-Ross (2017) propôs cinco estágios não lineares do luto: negação, raiva, negociação, depressão e aceitação.

Processo de Enfrentamento da perda por Elizabeth Kubler-Ross

No clássico Sobre a Morte e o Morrer (2017), Elisabeth Kubler-Ross propõe um entendimento dos desafios emocionais que as pessoas enfrentam durante o período de luto, discutindo as reações mais frequentes ao receber notícias de perdas significativas.

O estágio inicial é caracterizado pela negação e isolamento. Segundo Kubler- Ross (2017) a negação é vista como um mecanismo de defesa, ao passo que o isolamento se transforma em um meio de escapar dessa realidade e evitar enfrentar a situação atual. Contudo, essa etapa de negação costuma ser breve para a maioria dos indivíduos.

O segundo estágio é a raiva, que engloba emoções fortes de indignação, inveja e mágoa. Neste instante, um indivíduo em luto costuma questionar por que a perda está afetando-o e não a outra pessoa, resultando em uma expansão de sua frustração de diversas maneiras, projetando no ambiente em que se encontra de maneira irracional Kubler-Ross (2017).

A terceira fase, denominada pela autora de negociação ou barganha, é marcada pela tentativa de evitar a perda. Então, surge a ideia de “E se?”, como “E se eu tivesse mais uma oportunidade?” “Se eu pudesse ter apenas mais um instante”, na esperança de estender o tempo ao lado da pessoa querida.

O estágio quatro é denominado depressão. Este estado simboliza a perda iminente do objeto amado, auxiliando na preparação do indivíduo para a facilidade final, já que o estímulo e a confiança já não têm mais um papel prático. Quando a dor é severa, a chance de tolerar uma nova dor que atinja o próprio corpo ou entes queridos diminui Kubler- Ross (2017).

O estágio final, a autora nomeia como aceitação, acontece quando o indivíduo dispõe do tempo e do suporte necessários para lidar com a perda, alcançando um estágio em que não sente mais ira ou depressão em relação ao ocorrido. No entanto afirma que alguns podem continuar ainda presos à negação.

Bowlby (1998) e Kübler-Ross (2017) apresentam abordagens complementares para entender o luto, embora cada um apresente uma perspectiva distinta sobre as fases do processo de luto. Bowlby (1998) identifica quatro fases: entorpecimento, ansiedade, desorganização e desespero, e reorganização. Inicialmente, na fase de entorpecimento, a pessoa enfrentou um choque e uma negação da realidade, sentimentos que também estão presentes na primeira fase do modelo de Kubler-Ross, a negação e o isolamento. Ambas as teorias admitem que a negação é uma resposta comum à perda, atualmente como uma concessão temporária contra a dor. Bowlby (1998) descreve quatro etapas do luto: letargia, o anseio, desordem e desespero e recomposição. O autor propôs que inicialmente, ao serem informadas sobre a perda, as pessoas passam por um momento de choque e negação da realidade, o que caracteriza a primeira etapa, que pode variar de horas a uma semana, denominada de entorpecimento. Bowlby (1998) analisou que na segunda etapa, conhecida como anseio, o anseio por trazer de volta o ente querido se intensifica, levando a buscas constantes e expectativas de ver o falecido; o indivíduo enlutado pode ter sonhos com ele e experimentar uma inquietação contínua. Com a compreensão da morte, surgem sentimento de culpa e ansiedade, culminando na terceira etapa – desordem e desespero.

Além disso, o autor considera que neste estágio, sentimentos de raiva e melancolia são frequentes, já que a pessoa se sente impotente diante da situação. No entanto, depois de passar por momentos de raiva, choque e tristeza, o indivíduo pode se recuperar. Apesar da saudade continuar e da necessidade de adaptação às alterações causadas pela perda, o indivíduo pode retomar suas atividades e concluir a última etapa do luto: a recomposição (Bowlby, 1990).

Ao examinar os estágios do luto a partir de Kubler-Ross e as etapas do luto de Bowlby, é importante considerar a visão única que cada autor oferece sobre o processo de lidar com a morte. Apesar de não ser possível determinar qual modelo é mais resguardado, ambos trazem contribuições significativas para entender o sofrimento ligado à perda de um familiar querido. Porém ambos concordam que este

processo é caracterizado por uma gama variada de emoções, que podem provocar alterações relevantes no funcionamento emocional da pessoa.

perda

O Luto Materno: Impactos Emocionais e Desafios no enfrentamento a

Embora o luto compartilhe aspectos comuns, como tristeza, desamparo,

sentimento de culpa e vazio, a experiência de perder um filho, conforme observa Worden (2013), geralmente é a mais intensa e possui características únicas. Para o autor, a morte de um filho, independentemente da idade, pode ser uma das perdas mais devastadoras na vida de uma pessoa, e seus efeitos podem durar por muitos anos. Para as mães, a morte abrupta de um filho representa uma perda precoce de alguém com quem mantém profundos laços afetivos e de vínculo.

Conforme analisa Martins (2017), o status social da pessoa enlutada também se altera em outras formas de luto: o cônjuge passa de casado a viúvo e o filho fica órfão, mas a mãe não assume uma nova conjuntura. No entanto, ela continua sendo mãe de um filho que já faleceu. Para essas mães, não foi apenas a perda dos filhos, mas também o fim de um modo de existir que se manifestava na relação com eles.

O assassinato do filho traz consigo um sentimento de culpa pela crença de ter falhado na sua missão de proteção, levando-a a assumir uma parcela da responsabilidade pelo que aconteceu, como se não tivesse cumprido o seu dever de cuidar. Oliveira e Lopes (2018) argumenta que além do sofrimento pela perda do filho, algumas mães podem experimentar sentimentos de raiva, injustiça e a necessidade de buscar justiça e punição para os responsáveis pelo crime, o anseio por justiça torna-se imprescindível para estas mães.

Quando o autor do crime é punido, parece que grande parte desse sentimento se dissipa, pois, as mães conseguem constatar e afirmar que os responsáveis foram severamente castigados. Assim, a condenação também serve como uma maneira de atenuar a culpa inevitável que elas sentem em relação ao ocorrido.

Além disso, Parkes (1998) afirma que a culpa é uma experiência comum durante o processo de luto, mas é mais forte em mães enlutadas. Nesse sentido, entende-se que, o luto se configura como um paradoxo entre a possibilidade de preservar a existência através das lembranças ou superar a morte para continuar a viver. No entanto, o filho continua presente na expressão da angústia vivida pela mãe enlutada.

A perda de um filho, evoca e mobiliza muitos sentimentos, e que cada mãe vivenciará essa experiência de forma única, tendo uma experiência diferente da outra. Freitas e Michel (2014) relatam ainda que, aquelas que perderam um filho de outras maneiras também podem sentir ódio, mas muitas vezes é direcionado para si mesmas, para a vida, ou até mesmo para Deus, de forma difusa e ambígua, pois não têm um alvo específico para responsabilizar pela morte. Essa combinação trágica de elementos influencia as reações da família diante da perda.

Como afirma Rodrigues (2009, citado por Brandão, 2010) esse ódio mobiliza as mães que perderam um filho devido a um assassinato a buscar justiça, levando-as não somente vivenciar o processo de luto pela perda do ente querido, como também a busca por justiça.

Uma morte ocasionada por assassinato impede que os membros da família se preparem para lidar com questões pendentes ou mesmo para se despedir. Essas mortes não apenas preocupam pela sua magnitude, mas também pelo amplo impacto que provocam nos âmbitos individual, social, econômico e político (Cano; Ribeiro, 2017).

Krug et al., (2022) ressaltam a necessidade célere de atendimento especializado para manejar esse tipo de luto. Ela destaca a importância de psiquiatras que oferecem atendimento emergencial, destacando a urgência em prover suporte psicológico adequado para as mães que enfrentam essa dolorosa realidade.

Além disso, para muitas mães que perdem seus filhos (as) devido à violência, o processo de elaboração do luto pode ser significativamente prejudicado pela negação do direito de enterrá-los adequadamente quando os corpos não podem ser localizados. Isso impede que essas mães passem pelo teste de realidade e enfrentem a concretude da morte de seus entes queridos por meio dos rituais tradicionais de luto. Como destacado por Fustinoni e Caniato (2019), o evento traumático de perder alguém amado de forma abrupta e sem a possibilidade de encontrar e identificar o corpo cria um terreno fértil para complicações emocionais e impede o processo de luto. O apoio social e familiar é menos duradouro que o processo de luto, evidenciando

a necessidade de terapia para o enlutado.

Importância do Acompanhamento Psicológico no Processo de Luto Materno Por Violência

Segundo Freitas e Michel (2014), cada mulher vivencia a perda de forma única, pois sua experiência de vida, desde a infância, e o vínculo específico com o filho influenciam essa vivência. A capacidade de cada mãe de se adaptar à ausência do filho varia, e é preciso considerar as vulnerabilidades individuais, como fragilidades emocionais, físicas ou sociais, que aumentam o risco de comoção psíquica e desenvolvimento de trauma.

Franqueira, Magalhães e Féres-Carneiro (2015) afirma que algumas mães podem ter mais recursos para se readaptar ao mundo sem o filho, suportando e ressignificando o sofrimento, enquanto para outro esse processo pode ser mais desafiador ou até mesmo inviável. Mas deve-se considerar que segundo Worden (2013) cada pessoa possui sua própria maneira de vivenciar a dor, sendo única em sua experiência de luto. Ter um espaço para compartilhar sentimentos pode ser um recurso importante no enfrentamento da morte. Assim, o aconselhamento do luto pode ocorrer em diversos locais, desde que sejam ambientes acolhedores. Contar com apoio e ter espaço para expressar a dor e falar sobre a perda.

A intensidade da dor do luto é equivalente ao amor experimentado na relação que foi interrompida pela morte. Arantes (2019) destaca que é através desse amor que as pessoas encontram forças para se reconstruírem. Então, destaca a importância do psicólogo no acolhimento dessas mães enlutadas.

Santos (2019), destaca o papel da psicoterapia em auxiliar a mãe enlutada a atribuir novos significados ao seu sofrimento, compreendendo a morte como parte natural da existência e aprendendo a lidar com a ausência do ente querido. O objetivo é proporcionar um ambiente seguro para expressar toda a dor, evitando o acúmulo de emoções que poderiam resultar em um luto complicado. Segundo Leal et al. (2024), este tipo de luto envolve reações do indivíduo que não seguem o padrão esperado após a perda, tais não se alinham com as fases convencionais do luto, que incluem entorpecimento, anseio e protesto, desespero e recuperação e restituição.

De acordo com Silva, Carneiro e Zandonadi (2017), citados por Leal et al. (2019), destaca-se a importância da atuação profissional dos psicólogos, enfatizando a necessidade de que esses profissionais possuam conhecimentos específicos sobre o luto, as teorias pertinentes e a problemática do contexto.

A psicoterapia é necessária para ajudar uma mãe enlutada a se reintegrar à vida. Este estudo centra-se na perda de um filho através do processo de luto, entre os diferentes tipos de perdas existentes. Essa perda merece atenção especial porque é frequentemente citada na literatura como um acontecimento devastador, capaz de abalar os “pilares da vida” e é considerada por muitas mães enlutadas como “a pior dor do mundo” (Freitas; Michel, 2014). Sentir-se acolhido e seguro na relação terapêutica são elementos essenciais da experiência psicoterápica, que dependem da relação terapeuta-paciente.

Ana Claudia Quintana Arantes afirma em seu livro ‘A morte é um dia que vale a pena viver’ (2019) que a intensidade da dor do luto é equivalente ao amor experimentado na relação que foi interrompida pela morte. No entanto, a médica também destaca que é através desse amor que as pessoas encontram forças para se reconstruírem.

Segundo Elisabeth Kubler- Ross (2005) é importante permitir que o paciente exteriorize seu pesar. Isso pode ajudá-lo a aceitar mais facilmente sua situação e a sentir-se apoiado pelos que estão ao seu redor durante esse estado de depressão. Em vez de tentar constantemente suprimir a tristeza do paciente, é essencial criar um ambiente onde ele se sinta seguro para expressar suas emoções, o que pode colaborar para um processo de aceitação mais saudável e significativo.

Estratégias de Apoio à Mães Enlutadas

A partida de um filho (a) pode representar para algumas mães o confronto com muitas adversidades. Segundo Silva (2006) as várias respostas diante de uma ausência e o esforço para reconstruir e estruturar a existência são elementos essenciais do processo de luto. Para Mazorra (2009) reconhecer a verdade da morte, vivenciar plenamente a aflição, buscar se adaptar à nova realidade, incorporar elementos do ente querido falecido à própria essência e descobrir significado na ausência para iniciar novas conexões, são atividades que podem auxiliar o enlutado a se reconciliar com a existência após o vazio.

É importante ressaltar que a perda de um filho tem o efeito de quebrar o tabu da imortalidade, como apontam Freitas e Michel (2014), alterando assim o caráter impessoal que a morte teve na vida dessas mães. Nesse sentido, é compreensível que a morte de um filho seja inicialmente percebida como irreal ou absurda, pois essa

perda desafia o senso, de que existe uma “ordem natural” segundo a qual os filhos deveriam morrer depois dos pais. Durante o processo de psicoterapia, eles podem assimilar esses acontecimentos e ressignificar.

É muito importante que o psicólogo conheça a história de vida da família e da mãe em sofrimento, para que assim seja capaz de compreender seus valores e crenças e apoiá-la em seu processo de luto. Dessa forma é relevante permitir que o paciente se sinta confortável para exteriorizar seu pesar, possibilitando a compreensão e aceitação de sua atual situação, e, também, que se sinta apoiado pelos profissionais e pessoas próximas (Kubler- Ross,2005).

Segundo Lemos e Cunha (2018), o psicólogo deve estar atento a essa conduta, especialmente em relação a particularidade da mãe enlutada, pois isso influencia diretamente o trabalho, já que a experiência do luto em mães que sofreram uma perda gestacional difere, por exemplo, da expressão de uma perda por morte em circunstâncias de violência.

Para um acolhimento em situações que envolvem a morte de um filho é importante que o profissional respeite o tempo e os limites do paciente (Alarcão et al., 2008).

Fica claro que nos estudos de Santos (2019) o psicólogo é um profissional que tem formação para trabalhar com sofrimento psicológico, ele terá uma visão diferente desse paciente, tentará compreendê-lo para que possa melhorar seu bem-estar durante o período de luto.

Segundo Menezes e Marciano (2019), o psicólogo ali presente terá a tarefa de apoiar a dor da mãe e da família para que possam facilitar da melhor forma possível a elaboração do luto e a resignação à perda do filho. Existe ainda a necessidade de desenvolver um bom vínculo com a família, pois essa é normalmente o principal grupo de apoio da mãe enlutada e é de extrema relevância que haja um tripé entre eles, a mãe, a família e o profissional psicólogo, para que as intervenções sejam voltadas à prevenção de psicopatologias e na valorização do bem-estar e da saúde mental da mulher.

Vale ressaltar que, no contexto de hospitalização, Rios et al. (2016) alertam que, ao prestar assistência hospitalar à morte de um filho, é fundamental que a equipe multidisciplinar considere o processo singular de luto que a mãe está enfrentando, pois, o processo de luto pode se agravar devido ao potencial desta perda.

Para Sluzki (1997) a rede de apoio e o acompanhamento da equipe multiprofissional de saúde que está presente no cuidado prestado a pessoa enlutada desde a notícia da morte, oferecendo um cuidado humanizado e levando em consideração o sentimento de confiança, pode auxiliar no enfrentamento do luto e assim ajudar essa mãe a enfrentar o processo de luto de forma saudável.

Ter na equipe de saúde um profissional qualificado, disponível e que ouça atentamente a mãe e a família que perde um filho de acordo com Bisotto et al., (2021) garante uma ajuda humanizada que não está apenas relacionada à dor física da mãe, mas também na aceitação da dor emocional.

Worden (2013) relaciona possíveis estratégias de intervenção ao luto que podem ser eficazes no protocolo de acompanhamento psicológico das mães enlutadas. Um dos princípios fundamentais é o estímulo à percepção da realidade e irreversibilidade da perda, auxiliando a pessoa a ultrapassar o período de choque e negação, incentivando o processamento da perda e a execução de atividades cruciais para um luto adaptativo. Também é essencial auxiliar na identificação, vivência e processamento de emoções, pois muitos indivíduos evitam experimentar emoções.

O autor supracitado ainda argumenta que é relevante estabelecer uma comunicação empática para prevenir sentimento de impotência ou dependência em relação ao profissional de psicologia. Ademais, incentivar a procura por um sentido para a perda pode colaborar, segundo o autor, para a adaptação, uma vez que contribui para a recuperação da sensação de autoeficácia que foi afetada pela perda. Nas estratégias propostas por Worden (2013) ele afirma que é importante ressaltar que um indivíduo perdido nunca será substituído, além de desconstruir a culpa ligada a novos relacionamentos. Além disso, o autor pontua que é essencial que as etapas e atividades do luto não sejam definidas com base no tempo, mas sim na disponibilidade emocional e nas particularidades pessoais. Assim, o papel do psicólogo é auxiliar o falecido a gerir as expectativas de superação das pessoas próximas, particularmente em períodos críticos, como em momentos de luto.

Considerações Finais

A proposta deste artigo é impulsionada pela crescente exposição do tema na mídia e pela urgência de aprofundar a compreensão sobre o luto materno decorrente de violência. A ampla cobertura nos meios de comunicação destaca a prevalência e a gravidade do problema, evidenciando a necessidade de uma análise teórica, e indicando a necessidade de futuras pesquisas empíricas.

Observa-se que há a necessidade de compreender mais profundamente os impactos psicológicos dessas perdas e o papel que o acompanhamento psicológico desempenha nesse processo. É possível perceber que a experiência prática mostrou que, embora existam estudos sobre o luto materno, há uma lacuna significativa na literatura em relação à eficácia do suporte psicológico específico para mães que perderam seus filhos por assassinato.

O artigo visa colaborar para minimizar essa lacuna, fortalecendo e ampliando as evidências sobre a eficácia do acompanhamento psicológico nessas situações. Ao enriquecer o referencial teórico existente, pretendemos fornecer insights valiosos que podem guiar intervenções mais eficazes e compassivas.

A importância de uma abordagem interdisciplinar, envolvendo psicólogos, assistentes sociais, profissionais de saúde e outros especialistas, é essencial para criar uma rede de apoio abrangente. Esse apoio é fundamental para ajudar essas mães a enfrentar o luto de maneira mais saudável, promovendo seu bem-estar físico, emocional e psicológico.

Portanto, a relevância deste artigo reside na sua capacidade de oferecer uma contribuição significativa para a literatura acadêmica e para a prática clínica. Ao investigar e compreender as implicações do luto materno por assassínio e ao desenvolver estratégias de suporte psicológico específicas, esperamos proporcionar um impacto positivo na vida das mães que enfrentam essa dolorosa realidade.

A investigação demonstrou que o sofrimento psicológico associado à perda do filho de maneira violenta não se limita apenas ao objeto perdido, mas também abrange fatores culturais e sociais. Este tipo de luto pode provocar traumas, uma vez que existem várias expectativas. A mulher que enfrenta esta dor necessitará de uma rede

de apoio, bem como de assistência e acompanhamento psicológico para lidar com o processo do luto.

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1 Graduandos em Bacharel em Psicologia pelo Centro Universitário Uninassau – Palmas, Tocantins, e-mail:

2 Professora orientadora Esp. Faculdade Uninassau e-mail: adriellyportonetto.am@gmail.com