REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10791055
Anna Beatriz Tavares Soares
Jhorrana Andrade da Maia
Vânia de Cássia Souza da Silva
Resumo:
As fissuras labiopalatais são anomalias congênitas que acontecem entre a 4ª à 12ª semana de vida intrauterina e acometem cerca de 1 a cada 650 recém-nascidos. São classificadas tendo como referência o forame incisivo.
O diagnóstico deve ser prematuro para que haja um plano de tratamento adequado e um bom prognóstico. A equipe multifuncional deve estar o tempo todo atuando em conjunto a partir do diagnóstico e ao longo da vida do paciente.
Durante o tratamento o cirurgião-dentista é extremamente importante, tanto na parte estética quanto na funcional, sempre orientando sobre os cuidados bucais e tratamentos a serem realizados.
Palavras-chave: Fissura labiopalatina. Bucomaxilofacial. Cirurgia. Tratamento ortodôntico. Tratamento multidisciplinar.
Abstract: Cleft lip and palate are a congenital anomaly that occurs between the 4th and 12th week of an intrauterine life and affects approximately 1 in every 650 newborns. They are classified based on the incisive foramen. The diagnosis must be premature so that there is an adequate treatment plan and a good prognosis. The multifunctional team must be working together all the time from the diagnosis and throughout the patient’s life. During treatment, the dentist is extremely important, both aesthetically and functionally, always providing guidance on oral care and treatments to be carried out.
Keywords: Cleft lip and palate. Oral and maxillofacial. Surgery. Orthodontic treatment. Multidisciplinary treatment.
Introdução
Dentre as anomalias congênitas na região cabeça e pescoço, a mais prevalente está a fissura lábio palatina, popularmente conhecida como lábios leporinos. No Brasil, aproximadamente 1 a cada 650 recém-nascidos são acometidos por esse tipo de fissura (MORAIS, 2020).
É caracterizada por uma abertura no lábio superior e/ou palato, essa abertura pode ser unilateral ou bilateral. Desta forma pode comprometer funções estéticas e funcionais como, fala, deglutição, audição, desenvolvimento psicossocial (SILVA et Al, 2021).
As fissuras labiopalatais acontecem em meio a 4ª e a 12ª semana de vida intrauterina, devido à má formação durante a união dos processos nasais médio junto ao processo maxilar e à fusão das cristas palatinas. As fissuras são classificadas conforme a sua localização, a referência para a classificação das fissuras é o forame incisivo (SILVA et Al, 2021).
O tratamento deve ter início nos primeiros meses de vida para que não haja problemas futuros na fala, audição e deglutição. Sendo assim, o recém-nascido e a família devem receber o acompanhamento de uma equipe multifuncional (LUZZI, 2021).
Objetivos
Este trabalho tem como objetivo realizar uma revisão de literatura que aborde sobre as fissuras palatinas, a integração da equipe multidisciplinar para um bom prognóstico e tratamento, a importância da odontologia e seus profissionais para a reabilitação estética e funcional dos pacientes acometidos pela fissura lábio palatina.
Metodologia
Para a metodologia de pesquisa desta revisão de literatura, foram utilizadas bases de dados em artigos, como SCIELO, LILACS, BBO, Google Acadêmico e PubMed para encontrar artigos publicados entre 2009 e 2021, em português ou inglês, que abordam sobre o papel da odontologia frente a pacientes acometidos por fissura labiopalatina. Também foram examinadas as publicações do HRAC/USP (TRINDADE; SILVA-FILHO, 2007; SOUZA-FREITAS ET AL., 2012A, 2012B, 2012C, 2013), instituição que soma no estudo da fissura labiopalatina há mais de 50 anos.
Revisão de literatura
1 O diagnóstico prematuro e a Intervenção odontológica:
O diagnóstico prematuro da fissura lábio palatina é a parte mais importante para dar início ao plano de tratamento do paciente. Então, a odontologia entra para fazer o seu papel ativo no planejamento das estratégias de tratamento, tanto na parte da anomalia facial quanto nas complexidades dentárias. Esse processo de reabilitação do paciente é bastante longo, pois cada fase do tratamento depende da idade do paciente (DE ANDRADE LIMA et al., 2015).
” O Cirurgião-Dentista deve atuar sabendo que as fissuras geram sequelas ou problemas que ele deve saber prevenir e tratar, a fim de buscar uma melhor qualidade de vida à criança portadora desta malformação.” (DE ANDRADE LIMA, 2015, p. 787).
2 Classificação das fissuras labiopalatais:
É utilizada a classificação de Spina e foi dividida em três grupos, podendo ser fissura unilateral ou bilateral (DE ANDRADE LIMA et al., 2015).
A. Fissuras pré-forame incisivo: são fissuras que se limitam ao palato primário, acometendo somente o lábio e/ou o rebordo alveolar.
B. Fissuras transformers incisivas: são fissuras que afetam o palato primário e o palato secundário, ou seja, afeta desde o lábio até a úvula.
C. Fissuras pós-forame incisivo: afetam diretamente o palato secundário.
3 Tratamento na área da odontologia:
A reabilitação é longa e dura pelo menos 16 anos até estar completa. As etapas são de acordo com a fase de vida do paciente, respeitando seu crescimento craniofacial e a maturidade fisiológica. Por mais que haja um protocolo, cada caso deve ser avaliado de forma singular, uma vez que são levados em consideração os fatores individuais e a atuação das diferentes áreas da saúde em conjunto. (HRAC, 2024)
A. Fissura pré-forame incisivo: A cirurgia do lábio ocorre a partir dos 3 meses de idade. 1 ano após a cirurgia primária, o odontopediatra deve realizar moldagem de documentação dos arcos até concluir o tratamento e, posteriormente a segunda cirurgia que ocorre a partir dos 4 anos. O odontopediatra deve avaliar o controle da cárie e orientar sobre saúde bucal. Entre 8 e 10 anos de idade inicia o tratamento ortodôntico pré-enxerto em casos de pacientes que envolva o rebordo alveolar. Após o tratamento ortodôntico pré-enxerto, o cirurgião bucomaxilofacial avalia e solicita a cirurgia de enxerto ósseo alveolar secundário. Inicia-se o tratamento ortodôntico pós-enxerto diante da avaliação cirúrgica e liberação da equipe de cirurgia bucomaxilofacial.
B. Fissura transforame incisivo: A cirurgia do lábio é realizada a partir dos 3 meses de idade e a do palato a partir de 1 ano de idade. A segunda cirurgia de lábio ocorre a partir dos 4 anos de idade. Assim como na fissura pré-formal, a conduta do odontopediatra é a mesma para esse tipo de fissura. Entre 8 e 10 anos, assim como na fissura pré-forame incisivo, se inicia o tratamento ortodôntico pré-enxerto e após o tratamento o cirurgião bucomaxilofacial avalia e solicita a cirurgia de enxerto ósseo alveolar secundária. E após a liberação do cirurgião bucomaxilofacial, inicia o tratamento ortodôntico pós-enxerto.
C. Fissura pós-forame incisivo: A cirurgia do palato ocorre a partir de 1 ano de idade. 1 ano após a cirurgia primária a conduta do odontopediatra é o mesmo da fissura pré-forame incisivo e fissura transforame incisivo. Entre os 8 e 10 anos o paciente pode iniciar o tratamento ortodôntico. Após finalizar o tratamento ortodôntico, caso haja necessidade de cirurgia ortognática o ortodontista deve entrar em contato como cirurgião bucomaxilofacial.
4 Educação em saúde bucal:
É importante que o cirurgião-dentista auxilie no fornecimento de orientações aos responsáveis do paciente sobre os cuidados bucais, como higienização bucal correta e os tratamentos que serão necessários ao longo do crescimento do paciente (DOS SANTOS et al., 2021).
5 Ação cirúrgica, ortodôntica e ortopédica:
A ortodontia e o tratamento cirúrgico são fundamentais na correção das malformações causadas pela fissura lábiopalatina. Na maioria dos casos, a fissura lábiopalatina causa alterações nos dentes, como por exemplo, ausência dentária, dentes neonatais, anodontia e atraso na erupção (DE ANDRADE LIMA et al., 2015).
É importante que o tratamento ortodôntico tenha início na introdução da dentadura permanente, sendo esse um dos processos demorados da reabilitação. É possível que o paciente necessite passar por cirurgia de enxerto ósseo, já que na maioria dos casos existe uma falha óssea no local de fissura. Em vista disso, é necessário que o ortodontista e o cirurgião trabalhem de forma conjunta no tratamento desse paciente (DE ANDRADE LIMA et al., 2015).
Para Tuji et al. (2009), as cirurgias primárias só devem ser realizadas quando o paciente estiver com condições sistêmicas e o protocolo de atendimento deve ser dividido em etapas pré-cirúrgica, trans e pós-cirúrgica. O bucomaxilofacial faz uma avaliação da forma, função facial e posição da mandíbula. A cirurgia de enxertos ósseos alveolares primários e secundários, é um dos papéis essenciais do cirurgião bucomaxilofacial.
6 Tratamento multidisciplinar:
A Portaria SAS/MS nº 62, de 19 de abril de 1994, estabelece que os serviços de atenção aos pacientes com fissura labiopalatina devem possuir especialistas nas áreas de medicina (anestesiologia, clínica médica, otorrinolaringologia, cirurgia plástica e pediatria); odontologia (cirurgia bucomaxilofacial, implantodontia, odontopediatria, ortodontia, prótese), fonoaudiologia; nutrição; psicologia; fisioterapia; serviço social; enfermagem; e atendimento familiar (ALMEIDA et al., 2017).
O tratamento para os fissurados é conduzido de forma multidisciplinar, que visa uma maior eficiência na reabilitação morfológica, funcional e psicossocial para esses pacientes. Mesmo que varie a severidade das fissuras e anomalias orofaciais, o tratamento multidisciplinar é crucial à reabilitação completa desses pacientes. Portanto, é necessário um protocolo de atendimento e tratamento para os portadores de fissura labiopalatina (TUJI et al., 2009).
Os pacientes com fissura labiopalatina serão acompanhados durante todo o seu crescimento; eles farão tratamento com diversos profissionais até o encerramento da sua reabilitação (TUJI et al., 2009).
Resultados e Discussão
A tabela apresentada abaixo mostra os principais resultados dos estudos sobre a odontologia no tratamento de pacientes com fissura labiopalatina que compõem as referências bibliográficas da presente pesquisa.
Tabela 1- Principais resultados
Autores | Título | Ano | Base | Principais resultados |
DE ANDRADE LIMA, Everaldo Pinheiro et al. | A ORTODONTIA NA ATENÇÃO MULTIDISCIPLINAR NA SAÚDE DO PACIENTE: UMA REVISÃO DA LITERATURA. | 2015 | BBO | O estudo discute o papel da ortodontia na atenção multidisciplinar na saúde do paciente com fissura labiopalatina e qual os procedimentos serão realizados. O estudo discorre sobre como a participação direta do ortodontista no tratamento é importante. |
DOS SANTOS, Eliane Alves Motta Cabello et al. | Conhecimentos atuais em Fissuras Labiopalatinas: uma revisão narrativa. | 2021 | Google acadêmico | A revisão de literatura aborda os conhecimentos atualizados sobre as fissuras labiopalatinas, mas que apesar dos avanços no conhecimento das fissuras labiopalatinas, algumas questões continuam pouco estudadas. |
ALMEIDA, Ana Maria Freire de Lima et al. | Atenção à pessoa com fissura labiopalatina: proposta de modelização para avaliação de centros especializados, no Brasil. | 2017 | Scielo | Este estudo produziu um modelo lógico de atenção à pessoa com fissura labiopalatina, para ajudar nas avaliações em centros de reabilitação do País. Assim, criando um protocolo de avaliação e tratamento. |
TUJI, Fabrício Mesquita et al. | Tratamento multidisciplinar na reabilitação de pacientes portadores de fissuras lábio e/ou em hospital de atendimento público. | 2009 | LILACS | O estudo discute sobre a interação de várias especialidades na reabilitação dos pacientes fissurados. Sendo assim, formulou-se um fluxograma de atendimento multidisciplinar abrangendo as necessidades dos pacientes com fissura labiopalatina. |
A anomalia de fissura labiopalatina continua sendo um assunto pouco estudado. Ainda existem muitas dúvidas sobre a anomalia e os tratamentos envolvidos. Sendo assim, poucos lugares no país fazem o tratamento necessário para esses pacientes, existem poucos centros de reabilitação espalhados pelo país, ou seja, nem sempre o tratamento é de fácil acesso.
Foram criados protocolos de tratamento para contribuir com a distribuição de tratamento, tornando mais fácil a indicação de profissionais que devem estar envolvidos na reabilitação do paciente fissurado.
É de grande importância que o paciente passe por todas as fases da reabilitação, ou seja, o envolvimento de uma equipe multidisciplinar nos tratamentos dos pacientes com fissura labiopalatina é indispensável.
Conclusão
Em síntese, a revisão aponta que a odontologia é um pilar no diagnóstico e tratamento dos pacientes com fissura palatina, tendo um papel fundamental durante todos os processos. A inserção de profissionais da odontologia em equipe multidisciplinar revela-se bastante satisfatório para o tratamento destes pacientes, oferecendo cuidados individualizados e abrangentes, e também contribuindo para as necessidades clínicas e para a qualidade de vida. A abordagem do profissional odontológico deve ser humanizada e empática.
Referências
ALMEIDA, A.M.F.L; CHAVES, S.C.L; SANTOS, C.M.L et al. Atenção à pessoa com fissura labiopalatina: proposta de modelização para avaliação de centros especializados, no Brasil. Saúde Debate. v.41, n.especial, p. 156-166, 2017.
ALVES, B. R. R.; DUARTE, L. G. L.; RAMOS, G. DE O. importância de um protocolo preventivo no atendimento odontológico de pacientes fissurados: uma revisão sistemática da literatura. Arquivos em Odontologia, v. 55, 2019.
DE ANDRADE LIMA, E. P. et al. A ORTODONTIA NA ATENÇÃO MULTIDISCIPLINAR NA SAÚDE DO PACIENTE FISSURADO: UMA REVISÃO DA LITERATURA. Odontologia Clínico-Científica, v. 14, n. 4, p. 785–788, 2015. Disponível em: <https://hrac.usp.br/wp-content/uploads/2018/02/etapas_e_condutas_terapeuticas_hrac_fev_2018.pdf>.
DOS SANTOS, E. A. M. C.; DE OLIVEIRA, T. M. Conhecimentos atuais em Fissuras Labiopalatinas: uma revisão narrativa. Revista Eletrônica Acervo Saúde, v. 13, n. 2, p. e5870, 2021.
HRAC-USP, C. Fissura labiopalatina. Disponível em: <https://hrac.usp.br/saúde/fissura-labiopalatina/>.
LUZZI, V. et al. The role of the pediatric dentist in the multidisciplinary management of the Cleft Lip palate patient. International journal of environmental research and public health, v. 18, n. 18, p. 9487, 2021.
MORAIS, M. M. V., et al. Assistência ao portador da má formação de fissura labiopalatina. Brazilian Journal of Health Review, 3(1), 209-219, 2020.
TUJI, F.M; BRAGANÇA, T.A; RODRIGUES, C.F et al. Tratamento multidisciplinar na reabilitação de pacientes portadores de fissuras lábio e/ou em hospital de atendimento público. Rev. Para. Med. v.2, n.43, 2009.
Vista do FISSURA LÁBIO-PALATINA: A IMPORTANTE ATUAÇÃO DO CIRURGIÃO-DENTISTA. Disponível em: <https://pensaracademico.unifacig.edu.br/index.php/semiariocientifico/article/view/1308/1223>.