A IMPORTÂNCIA DA FISIOTERAPIA NO TRATAMENTO DE MULHERES HISTERECTOMIZADAS PÓS CÂNCER DE COLO DO ÚTERO

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10156867


Antonia Pereira dos Santos
Daiane Brito de Souza
Elaine De Sousa Magalhães
Orientadora: Ana Luiza Ferreira Donatti


RESUMO

O câncer do colo do útero é o terceiro tipo de câncer com maior incidência no Brasil ficando atrás apenas do câncer de pele não melanoma. O tratamento envolve frequentemente histerectomia, radioterapia e quimioterapia. Além da luta contra a doença em si, as pacientes enfrentam uma série de desafios físicos e emocionais durante e após o tratamento. A histerectomia pode gerar complicações físicas como distúrbios uroginecológicos e também implicações emocionais e psicológicas significativas para algumas mulheres. Nesse cenário complexo e multifacetado, a fisioterapia emerge como um aliado fundamental, podendo promover mitigação dos comprometimentos uroginecológicos causados pela histerectomia,  promovendo alívio da dor, melhora da mobilidade, da função sexual e melhora da qualidade de vida.  Este estudo teve o objetivo principal de investigar o papel da fisioterapia na reabilitação das disfunções uroginecológicas resultantes da histerectomia em mulheres com câncer de colo de útero. Foi realizada uma revisão sistemática da literatura, com base no Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses(PRISMA). A busca foi realizada nas bases de dados SciELO, Web of Science e LILACS. Após a seleção dos artigos com base nos critérios de inclusão e exclusão pré – determinados, o número total de artigos revisados foram 8 artigos. O resultado deste estudo demonstrou uma recorrência de disfunções uroginecológicas, com destaque para alterações na força dos músculos do assoalho pélvico, que podem levar a disfunções miccionais. Também foi documentada a presença de disfunções sexuais, com impacto significativo na qualidade de vida das mulheres. Como principal estratégia terapêutica, o Treinamento dos Músculos do Assoalho Pélvico (TMAP) foi comum entre as pesquisas, mostrando potencial para promover melhorias na função muscular, função sexual e qualidade de vida dessas mulheres. Esse estudo conclui que a fisioterapia desempenha um papel fundamental na melhoria da qualidade de vida de mulheres submetidas à histerectomia como parte do tratamento do câncer de colo de útero, sendo uma abordagem não invasiva e eficaz para a reabilitação dessas pacientes.

Descritores: fisioterapia; histerectomia; câncer de colo de útero; disfunções uroginecológicas.

ABSTRACT

Cervical cancer is the third most common type of cancer in Brazil, behind only non-melanoma skin cancer. Treatment often involves hysterectomy, radiotherapy and chemotherapy. In addition to fighting the disease itself, patients face a series of physical and emotional challenges during and after treatment. Hysterectomy can generate physical complications such as urogynecological disorders and also significant emotional and psychological implications for some women. In this complex and multifaceted scenario, physiotherapy emerges as a fundamental ally, which can promote mitigation of urogynecological impairments caused by hysterectomy, promoting pain relief, improving mobility, sexual function and improving quality of life. This study had the main objective of investigating the role of physiotherapy in the rehabilitation of urogynecological dysfunctions resulting from hysterectomy in women with cervical cancer. A systematic review of the literature was carried out, based on the Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA). The search was carried out in the SciELO, Web of Science and LILACS databases. After selecting articles based on pre-determined inclusion and exclusion criteria, the total number of articles reviewed was 8 articles. The result of this study demonstrated a recurrence of urogynecological dysfunctions, with emphasis on changes in the strength of the pelvic floor muscles, which can lead to voiding dysfunctions. The presence of sexual dysfunctions was also documented, with a significant impact on women’s quality of life. As the main therapeutic strategy, Pelvic Floor Muscle Training (PFMT) was common among research studies, showing potential to promote improvements in muscle function, sexual function and quality of life in these women. This study concludes that physiotherapy plays a fundamental role in improving the quality of life of women undergoing hysterectomy as part of cervical cancer treatment, being a non-invasive and effective approach for the rehabilitation of these patients.

Descriptors: physiotherapy; hysterectomy; cervical cancer; urogynecological dysfunctions.

1. INTRODUÇÃO

O câncer do colo do útero (CCU) é o terceiro tipo de câncer com maior incidência no Brasil ficando atrás apenas do câncer de pele não melanoma. É o quarto tipo de câncer mais comum entre as mulheres, sendo responsável por 311 mil óbitos por ano, sendo a quarta causa mais frequente de morte por câncer em mulheres1.

Há dois tipos principais de câncer do colo do útero que são classificados de acordo com a origem do epitélio comprometido. O carcinoma epidermóide acomete o epitélio escamoso, sendo o tipo com maior incidência, representando cerca de 90% dos casos. O adenocarcinoma atinge o epitélio glandular sendo mais raro. Ambos são causados por uma infecção persistente por tipos oncogênicos do Papiloma Vírus Humano (HPV) especialmente o HPV-16 e o HPV-18, responsáveis por cerca de 70% dos cânceres cervicais2.

O câncer do colo do útero é precedido por uma longa fase de doença pré-invasiva, denominada de neoplasia intraepitelial cervical (NIC). A lesão precursora que se origina do epitélio colunar é denominada de adenocarcinoma in situ (AIS). O AIS pode estar associado à NIC em um a dois terços dos casos. A NIC é categorizada em graus I, II e III, dependendo da proporção da espessura do epitélio que apresenta células maduras e diferenciadas1.

No carcinoma in situ (estágio 0) as células cancerosas estão localizadas apenas na camada mais superficial do colo do útero, sem ter invadido os tecidos circundantes. O tratamento nessa fase é altamente eficaz, geralmente envolvendo procedimentos como a remoção do tecido afetado (conização) ou crioterapia. No estágio I, o câncer se espalhou para as camadas mais profundas do colo do útero, mas ainda está confinado a essa área. O tratamento pode envolver cirurgia, radioterapia ou uma combinação de ambos. No estágio II o câncer se espalhou além do colo do útero para os tecidos próximos, como a vagina ou as estruturas ao redor do colo do útero. O tratamento pode incluir cirurgia, radioterapia e, em alguns casos, quimioterapia. No estágio III o câncer se espalhou para a parte inferior da vagina ou para os tecidos ao redor do colo do útero, mas não se espalhou para órgãos distantes. O tratamento envolve frequentemente cirurgia, radioterapia e quimioterapia2

E no estágio IV o câncer se espalhou para órgãos distantes, como os pulmões, o fígado ou os ossos. O tratamento nesse estágio é mais desafiador e geralmente envolve abordagens para controlar os sintomas e a disseminação do câncer. É importante ressaltar que a detecção precoce por meio de exames de Papanicolau e testes de HPV é fundamental, pois o câncer de colo de útero é altamente tratável quando diagnosticado em estágios iniciais. Além disso, a vacinação contra o HPV é uma medida importante de prevenção3.

Além da luta contra a doença em si, as pacientes enfrentam uma série de desafios físicos e emocionais durante e após o tratamento. A radioterapia, a quimioterapia, a histerectomia e outros procedimentos associados ao tratamento do câncer de colo de útero podem gerar diversas sequelas para o sistema uroginecológico da mulher, como a dor genital, diminuição da elasticidade do canal vaginal, diminuição da secreção vaginal e atrofia do revestimento mucoso da vagina4 que afetam significativamente a qualidade de vida das pacientes4. 

A histerectomia é um procedimento cirúrgico que pode envolver a remoção completa do útero (histerectomia total) ou, em alguns casos, apenas a remoção da parte superior do útero (histerectomia parcial). Dependendo da situação, outros órgãos reprodutivos, como as trompas de Falópio e os ovários, também podem ser removidos durante o procedimento3. Esse procedimento pode gerar complicações físicas como distúrbios uroginecológicos e também implicações emocionais e psicológicas significativas para algumas mulheres, incluindo questões de identidade e autoestima4.

Nesse cenário complexo e multifacetado, a fisioterapia emerge como um aliado fundamental, e muitas vezes subestimado, na jornada das mulheres que enfrentam o câncer de colo de útero. A fisioterapia desempenha um papel fundamental na mitigação dos comprometimentos uroginecológicos causados pela histerectomia,  promovendo alívio da dor, melhora da mobilidade, da função sexual e melhora da qualidade de vida5.

Dentre os recursos utilizados como o treinamento dos músculos do assoalho pélvico, fisioterapia para dor pélvica, educação postural, técnicas para melhorar a mobilidade e a elasticidade da cicatriz, o treinamento dos músculos do assoalho pélvico intensivo e assistido por biofeedback, integrando o treinamento de estabilização do core como músculo transverso do abdome e músculo oblíquo interno do abdome, é uma terapia eficaz no tratamento do assoalho pélvico especialmente em mulheres pós câncer de colo de útero. O tratamento consiste em um programa de exercícios direcionados para o Músculo do assoalho pélvico (MAP), havendo contrações voluntárias e intermitentes realizando o fechamento uretral enfatizando somente a musculatura da região pélvica4,5,6.

Este estudo busca responder a seguinte questão: Qual a eficácia da intervenção fisioterapêutica nas disfunções uroginecológicas resultantes da histerectomia em mulheres pós câncer de colo de útero? A hipótese é que a fisioterapia seja eficaz na melhora dessas disfunções apresentadas por pacientes com câncer de colo de útero submetidas a histerectomia, resultando em uma significativa melhoria na qualidade de vida das pacientes, promovendo uma série de intervenções que visam melhorar a função física, minimizar a dor, prevenir complicações e promover o bem-estar dessas pacientes. Desse modo, a realização desse estudo pode fornecer diretrizes e recomendações para profissionais da fisioterapia, ajudando-os a implementar intervenções de forma mais eficaz e personalizada, e, consequentemente, promover uma reabilitação mais satisfatória para essas pacientes.

Dessa maneira, este artigo teve como objetivo principal investigar o papel da fisioterapia na reabilitação das disfunções uroginecológicas resultantes da histerectomia em mulheres com câncer de colo de útero. Os objetivos específicos foram identificar as disfunções uroginecológicas comuns decorrentes da histerectomia; avaliar as intervenções de fisioterapia utilizadas na reabilitação dessas pacientes e analisar a eficácia dessas intervenções na melhoria das disfunções uroginecológicas e na qualidade de vida das pacientes histerectomizadas.

2. MÉTODO

Foi realizada uma revisão sistemática da literatura, com base no Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses(PRISMA). A busca foi realizada nas bases de dados SciELO, Web of Science e LILACS, organizada e conduzida de forma independente por três pesquisadores experientes no tema – disfunções uroginecológicas, histerectomia e câncer de colo de útero.

2.1 BUSCA E IDENTIFICAÇÃO DE ARTIGOS

A busca eletrônica foi realizada por três pesquisadores com experiência no tema, de forma independente. Essa etapa abrangeu as bases de dados SciELO, Web of Science e biblioteca da Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e Physiotherapy Evidence Database (PEDRo). Sendo propostos descritores na língua portuguesa: fisioterapia; histerectomia; câncer de colo de útero; disfunções uroginecológicas.  A equação de busca foi elaborada, a partir da combinação dos operadores OR e AND, conforme as características de cada base de dados, e por seguinte foram acrescentadas outras palavras-chave frequentemente encontradas em artigos da temática. 

Em todas as bases selecionadas a pesquisa foi realizada no campo de “pesquisa avançada. As buscas foram realizadas no período de agosto a setembro de 2023. Além da busca eletrônica, foi realizada uma busca manual a partir das referências dos artigos encontrados nas bases eletrônicas, a partir de trabalhos de conclusão de curso, dissertações e teses. 

2.2 SELEÇÃO DE EVIDÊNCIAS

Para atingir o objetivo do estudo, foi elaborada uma pergunta com base na estratégia (Patient Intervention Comparison Outcome) PICO: Como a fisioterapia pode ser integrada de forma eficaz no tratamento das disfunções uroginecológicas de mulheres submetidas a histerectomia pós câncer de colo de útero? Para a seleção dessas evidências foi realizada em um primeiro momento a leitura apenas  dos títulos e dos resumos dos artigos pré-selecionados nos bancos de dados. Como na etapa de busca, esta análise também foi conduzida por três pesquisadores com experiência no tema, de forma independente. Os artigos encontrados nas buscas eletrônica e manual foram confrontados, com o objetivo de identificar possíveis duplicidades intra e entre as bases de dados busca. Na segunda etapa os artigos foram avaliados de acordo com os critérios de exclusão e inclusão pré estabelecidos. 

2.3 CRITÉRIOS DE INCLUSÃO E EXCLUSÃO

Os critérios de inclusão foram estudos clínicos randomizados publicados em português nos últimos 10 anos (2013 – 2023) que abordassem as disfunções uroginecológicas em mulheres com câncer de colo de útero que foram submetidas a histerectomia. Os critérios de exclusão foram estudos de revisões bibliográficas, estudos que não abordem essa temática e estudos que não tivessem como amostra mulheres com câncer de colo de útero. Também foram excluídos estudos duplicados, não disponíveis de forma gratuita online ou que não fossem publicados em revistas indexadas. 

2.4 SUMARIZAÇÃO DOS DADOS

Foram sumarizados os seguintes dados dos estudos selecionados: autores e ano de publicação, amostra, intervenção e desfecho.

2.5 AVALIAÇÃO DA QUALIDADE METODOLÓGICA

Os autores avaliaram a qualidade e risco de viés de forma independente, utilizando a escala PEDro, que inclui os seguintes itens a serem avaliados: critérios de elegibilidade, randomização, ocultação da alocação, semelhança nos dados iniciais, cegamento de assuntos, cegamento de avaliadores, seguimento adequado, a análise de intenção de tratamento e a análise estatística entre os grupos avaliados (Tabela 1).

3. RESULTADOS

A busca inicial identificou 100 estudos sobre os benefícios da fisioterapia para mulheres histerectomizadas pós câncer de colo de útero. Cinco estudos duplicados foram removidos (n = 95). Depois da análise de título e resumo, foram excluídos 80 estudos que não contemplavam os critérios de inclusão (n= 15). Após análise de texto completo, 7 estudos foram considerados não eram elegíveis (n=8) com base na análise da Escala PEDro. Ao final 8 artigos foram selecionados para esse estudo de revisão sistemática de acordo com o fluxograma da figura 1.  

Figura 1. Fluxograma de análise e seleção dos Estudos.
Fonte: Elaborado e analisado pelos autores em 2023.

A tabela abaixo demonstra a pontuação na escala PEDro para os estudos selecionados. Está escala inclui os seguintes itens a serem avaliados: critérios de elegibilidade, randomização, ocultação da alocação, semelhança nos dados iniciais, cegamento de assuntos, cegamento de avaliadores, seguimento adequado, a análise de intenção de tratamento e a análise estatística entre os grupos avaliados (Tabela 1).

A tabela abaixo apresenta os dados dos artigos selecionados para esse estudo (Tabela 1):

Tabela 1 – Pontuação na escala PEDro para os estudos selecionados.

Critérios Escala PEDro
Estudos234567891011Total
Costa, 2023511111111109
Souza et al, 2021910100711117
Correia et al.,2020810100111117
Pereira et al, 20201111101111008
Silva et al./2018211111111008
Fitz et al, 20171211110011017
Corrêa et al, 2017711100011117
Menezes et al, 20171111110111018

2) = Alocação randomizada; (3) = Atribuição mascarada; (4) = Similaridade no início do tratamento; (5) = assuntos cegos; (6) = Fisioterapeutas cegos; (7) = avaliadores cegos; (8) = acompanhamento apropriado; (9) = análise por intuito de tratar; (10)= correlações intergrupos; (11) = uso de medidas de precisão e variabilidade.
Fonte: Elaborado pelos autores em 2023.

4. DISCUSSÃO

A histerectomia é um procedimento cirúrgico frequentemente realizado como parte do tratamento do câncer de colo de útero de estágio grave. A histerectomia pode ter implicações significativas na saúde uroginecológica das mulheres, uma vez que a remoção do útero e estruturas adjacentes pode levar a disfunções, como incontinência urinária e prolapso de órgãos pélvicos. Essas complicações podem afetar a qualidade de vida das pacientes, impactando sua saúde emocional e física, bem como a função sexual1.

Em relação às disfunções uroginecológicas, os estudos selecionados apontaram redução da força muscular do assoalho pélvico, disfunções miccional, anorretais e retenção urinária7,8,9,10. O estudo de Menezes et al10 avaliou as disfunções do assoalho pélvico consequente a histerectomia. Esse estudo verificou que 75% das pacientes relataram dor durante a relação sexual. No que diz respeito a força dos músculos do assoalho foi verificado que 41,7% das mulheres apresentaram redução dessa força quando feita a avaliação de disfunção miccional e funcional do assoalho pélvico (AFA).  Costa et al8 afirma que além das disfunções uroginecológicas, essas mulheres também podem apresentar constipação intestinal, podendo ter uma associação com as disfunções do MAP.

Em relação às características desses pacientes, os estudos demonstram que a maioria dessas mulheres possuem em média 50 anos, baixo nível socioeconômico, baixa escolaridade e  muitas delas necessitam realizar histerectomia devido ao estágio avançado do câncer6. O estudo de Costa5 analisou 75 mulheres que realizaram tratamento de CCU e houve predomínio de mulheres que realizaram tratamento cirúrgico, baixa escolaridade, idade média de 48,64 anos, baixo nível socioeconômico. Observou-se prevalência de mulheres com sintomas de MAP, sendo que os sintomas urinários foram os que mais causaram desconforto seguidos dos sintomas anorretais. 

Em relação ao impacto dessas disfunções na vida sexual dessas pacientes, os estudos demonstram que a maioria das mulheres apresentam estenose, ressecamento vaginal, encurtamento vaginal, estreitamento vaginal, dispareunia, diminuição da libido e dor na relação sexual. O estudo de Costa5 demonstrou que a presença e o incômodo dos sintomas do assoalho pélvico impactam de forma negativa na qualidade de vida avaliada por questionários que analisam diferentes domínios de qualidade de vida, considerando as atividades diárias e saúde emocional. Sobre a qualidade de vida geral, os domínios “Relações Sociais” e “Meio Ambiente” apresentaram maior impacto negativo.  

Nesse contexto o estudo de Silva et al6 afirma que além das questões corporais, associadas às sequelas da doença e do tratamento, as pacientes relatam também dificuldade de reinserção social e afetiva e do sofrimento gerado pela sua nova condição.  O estudo de Correia et al7 demonstrou que em comparação ao grupo controle, o grupo de mulheres pós – tratamento de câncer de colo de útero apresentou maior percentual de mulheres que viviam sem companheiro, que consideravam o relacionamento com o companheiro como ruim/regular e que apresentavam disfunções urinárias, intestinais e sexuais. Dessa maneira a fisioterapia  pode desempenhar um importante recurso terapêutico com as sobreviventes do câncer do colo do útero, resultando em uma possível melhora da qualidade de vida.

Em relação às possíveis estratégias terapêuticas que podem ser utilizadas nessas pacientes, está o protocolo de Treinamento dos Músculos do Assoalho Pélvico (TMAP) que é um conjunto de exercícios destinados a fortalecer os músculos do assoalho pélvico. O TMAP é frequentemente utilizado para ajudar a prevenir ou tratar a incontinência urinária, especialmente em mulheres12.

O estudo de Souza et al8 utilizou o TMAP em mulheres histerectomizadas para o tratamento do câncer de colo de útero. Esse protocolo foi aplicado utilizando o treinamento dos quatro “Fs” que é uma abordagem específica dentro do TMAP que se concentra em quatro componentes principais: força, flexibilidade, função e forma. A força envolve o fortalecimento dos músculos do assoalho pélvico por meio de contrações e relaxamentos controlados. Além de fortalecer, a flexibilidade também é importante. Os músculos do assoalho pélvico precisam ser capazes de se contrair e relaxar adequadamente para desempenhar suas funções. Esse treinamento visa também restaurar ou melhorar a função dos músculos do assoalho pélvico, o que pode incluir o controle da continência urinária e fecal, bem como o suporte dos órgãos pélvicos. A forma está associada à consciência da postura durante os exercícios12

Fits et al 201713 afirma que uma vantagem do protocolo TMAP é que muitos exercícios deste protocolo podem ser realizados em casa, o que oferece conveniência e privacidade ao paciente. Dessa maneira o paciente pode seguir um programa de exercícios regular em casa, de acordo com as orientações do fisioterapeuta. O estudo do autor supracitado comparou ao longo de três meses os resultados obtidos na utilização do TMAP no consultório e na residência de mulheres histerectomizadas para tratamento de câncer de colo de útero e constatou que ambas as terapias (consultório e domicílio) melhoraram de forma semelhante a função muscular e a qualidade de vida das pacientes analisadas. 

Desse modo esse protocolo também pode ser realizado na casa das pacientes desde que sejam realizadas as avaliações iniciais pelo fisioterapeuta para determinar as necessidades específicas do paciente e também o acompanhamento do profissional sobre os exercícios e a realização dos ajustes conforme necessário.

Após a histerectomia, o TMAP pode ajudar a fortalecer os músculos do assoalho pélvico, melhorando o controle da bexiga e prevenindo a incontinência. Também pode contribuir para a melhora da função sexual, aumentando a sensibilidade e o controle muscular. Uma outra disfunção comum nessas mulheres é a síndrome da bexiga hiperativa (BH) que é definida  pela Sociedade Internacional de Continência(ICS) como uma síndrome clínica caracterizada por sintomas frequentes e urgentes de micção, muitas vezes acompanhados de incontinência urinária, resultando em desconforto significativo14

Após uma histerectomia, os órgãos pélvicos podem perder parte do suporte estrutural, o que pode contribuir para o desenvolvimento da SBH. Além disso, a cirurgia em si pode afetar a função dos músculos do assoalho pélvico e do sistema urinário. O fortalecimento dos músculos do assoalho pélvico, como parte do TMAP, pode desempenhar um papel importante na gestão da SBH em mulheres histerectomizadas, ajudando a melhorar o controle da bexiga e reduzir os sintomas incômodos associados à SBH. O estudo de Souza et al8 aplicou o 8 sessões do protocolo de tratamento TMAP em mulheres histerectomizadas após o tratamento de câncer de colo de útero e que apresentavam SBH. Esse estudo observou  melhora dos sintomas de SBH e redução nos impactos da qualidade de vida dessas mulheres.

Ainda no contexto das intervenções utilizadas nessas pacientes na pós histerectomia devido ao tratamento de Câncer de colo de útero, o estudo de Pereira et al11 demonstrou que  uma intervenção baseada em massagem perineal e treinamento dos músculos do assoalho pélvico por seis semanas é capaz de proporcionar melhora da função muscular e também houve melhora de alguns domínios do questionário de função sexual e do questionário de QV.

Desta maneira este estudo de revisão sistemática que teve como objetivo principal investigar o papel da fisioterapia na reabilitação das disfunções uroginecológicas resultantes da histerectomia em mulheres com câncer de colo de útero. Esse estudo identificou algumas semelhanças notáveis entre as pesquisas analisadas. A idade média das mulheres envolvidas nos estudos foi, em média, de 50 anos, e essas pacientes frequentemente apresentavam baixo nível socioeconômico e escolaridade5,8,9

Portanto com a análise dos estudos selecionados foi verificado que no âmbito da sobrevivência ao câncer, a fisioterapia tem um importante papel fundamental no restabelecimento da capacidade funcional das pacientes. A fisioterapia oncológica é uma especialidade que visa preservar, manter, desenvolver e restaurar a integridade funcional e prevenir os distúrbios causados pelo tratamento oncológico15.

5. CONCLUSÃO

Ao longo deste estudo, foi examinado como a fisioterapia se tornou uma aliada poderosa no combate às disfunções uroginecológicas em mulheres histerectomizadas para o tratamento do câncer de colo de útero. A fisioterapia não opera isoladamente, mas sim em harmonia com uma abordagem multidisciplinar. Ela é uma parte crucial da equipe de cuidados de saúde que se dedica a melhorar a qualidade de vida das pacientes com câncer de colo de útero. No entanto, ainda existem desafios, como o acesso limitado e questões financeiras que precisam ser superadas para que mais mulheres possam se beneficiar desse cuidado essencial.

Os resultados deste estudo destacam a relevância da intervenção fisioterapêutica na reabilitação das disfunções uroginecológicas resultantes do tratamento do câncer de colo de útero, especialmente no que diz respeito às alterações da força muscular do assoalho pélvico e da função sexual decorrentes da histerectomia. Os achados sugerem que a fisioterapia desempenha um papel valioso na redução desses sintomas, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida das pacientes afetadas por essa condição. Essa abordagem multidisciplinar, que combina tratamentos médicos com intervenções fisioterapêuticas, representa um avanço importante no cuidado integral dessas mulheres, proporcionando não apenas benefícios físicos, mas também emocionais e psicossociais. Portanto, promover o acesso e a conscientização sobre a fisioterapia como parte integrante do tratamento pós-câncer de colo de útero é fundamental para melhorar o bem-estar e a satisfação das pacientes.

Portanto, a fisioterapia desempenha um papel fundamental na melhoria da qualidade de vida de mulheres submetidas à histerectomia como parte do tratamento do câncer de colo de útero. Ao abordar as disfunções uroginecológicas, como as alterações na força dos músculos do assoalho pélvico e as disfunções sexuais, a fisioterapia, por meio de estratégias como o Treinamento dos Músculos do Assoalho Pélvico (TMAP), oferece uma abordagem não invasiva e eficaz para a reabilitação dessas pacientes. Através do fortalecimento muscular, o alívio dos sintomas e a promoção de uma melhor função sexual, a fisioterapia contribui para a restauração da qualidade de vida, afetada por aspectos físicos, emocionais e relacionais. Essa abordagem holística é essencial para ajudar as mulheres a retomarem o controle sobre sua saúde e bem-estar, permitindo uma transição mais suave após a cirurgia e uma vida mais satisfatória após o tratamento do câncer de colo de útero.

REFERÊNCIAS

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