A IMPORTÂNCIA DA ANÁLISE BIOMECÂNICA NA PREVENÇÃO DE LESÕES E MELHORA NO DESEMPENHO FÍSICO EM PRATICANTES DE ATIVIDADE FÍSICA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10630405


Eder Magnus Almeida Alves Filho¹ – Autor;
Dr. Alexandre Lopes Evangelista2 – Orientador.


RESUMO- A biomecânica no esporte é um tema que merece toda a nossa atenção, pois desempenha um papel fundamental no desempenho esportivo de atletas e entusiastas. Através da análise dos movimentos corporais e das forças envolvidas durante a prática esportiva, a biomecânica oferece insights valiosos para melhorar a performance, prevenir lesões e alcançar resultados extraordinários. Sendo assim, constrói-se este estudo com o principal objetivo de discutir sobre a importância da análise biomecânica na prevenção de lesões e melhora do desempenho físico em praticantes de atividade física. Para atender ao objetivo desta pesquisa, realizou-se uma revisão bibliográfica da literatura, de abordagem descritiva e de caráter qualitativo. A prevenção de lesões é uma prioridade constante para qualquer indivíduo que pratica esportes. É aqui que a biomecânica entra em cena como um aliado crucial. Ela nos permite identificar quais movimentos e padrões de esforço podem aumentar o risco de lesões. Ao compreendermos as forças e pressões que o corpo enfrenta durante a atividade esportiva, podemos desenvolver estratégias eficazes para minimizar tais riscos. Além disso, a análise biomecânica desempenha um papel fundamental na reabilitação após lesões esportivas. Ela permite que profissionais de saúde e fisioterapeutas avaliem a biomecânica alterada de um atleta devido a uma lesão e criem planos de tratamento personalizados. Isso não só acelera a recuperação, mas também ajuda a evitar futuras recaídas.

PALAVRAS-CHAVE: Análise Biomecânica. Atividade Física. Educação Física. Prevenção de lesões.

1 INTRODUÇÃO

Com o passar dos anos a população tem se mostrado mais preocupada com a saúde e o bem-estar físico e mental, sendo a prática de atividade física uma das maneiras de promover saúde e prevenir algumas doenças (Rombaldi et al., 2014). Os esportes e atividades físicas em geral envolvem riscos consideráveis de lesões musculoesqueléticas para aqueles que o praticam, sejam eles atletas de elite e/ou recreacionais. As lesões esportivas geralmente afetam em maior porcentagem a extremidade inferior (dependendo da modalidade esportiva praticada), incluindo lesões no quadril, joelho, perna e tornozelo (De Blaiser et al., 2017).

Para De Blaiser et al. (2017), para prevenir da melhor maneira essas lesões esportivas deve-se compreender os fatores de risco intrínsecos, extrínsecos e os mecanismos de lesão. A biomecânica alterada, por exemplo, é um fator de risco em que o aumento do ângulo de abdução do joelho e o momento de abdução do joelho durante o movimento, podem causar lesões do ligamento cruzado anterior em atletas do sexo feminino. Mas, além de alterações biomecânicas, a ausência de estabilidade do core (núcleo) mostrou ter grande influência na ocorrência de lesões de extremidades inferiores.

Imagine um atleta de alto desempenho em plena ação. Cada movimento, cada passo, cada gesto técnico é resultado de uma complexa interação entre músculos, ossos e articulações, coordenados de maneira precisa e eficaz. É a biomecânica que nos permite entender essa intrincada dança corporal, desvendando os segredos por trás de um salto perfeito, um arremesso certeiro ou uma corrida veloz.

A palavra “Biomecânica no esporte” não é apenas um termo técnico, mas sim um conceito que permeia todas as modalidades esportivas. Seja no futebol, na natação, no tênis ou em qualquer outro esporte, a compreensão dos princípios biomecânicos pode fazer toda a diferença. É como ter um mapa detalhado que guia atletas e treinadores na busca pela excelência atlética.

Sendo assim, constrói-se este estudo com o principal objetivo de discutir sobre a importância da análise biomecânica na prevenção de lesões e melhora do desempenho físico em praticantes de atividade física. Para atender ao objetivo desta pesquisa, realizou-se uma revisão bibliográfica da literatura, de abordagem descritiva e de caráter qualitativo.

2 DESENVOLVIMENTO

2.1 Biomecânica

A preocupação com a análise física do movimento humano é bastante antiga. Obras clássicas de pensadores como Aristóteles evidenciam que o interesse do homem em analisar o movimento, a partir de preceitos físicos, é antiquíssimo. Interesse esse que se aprofundou durante os séculos seguintes, como demonstram os estudos clássicos de Borelli (século XVI) e Marey (século XIX), e que continua em curso até os dias atuais (ARTWATER, 1980).

Entretanto, apesar de o estudo do movimento ser antigo, a consolidação da Biomecânica como uma ciência e, posteriormente, como uma disciplina acadêmica é bastante recente (AMADIO & SERRÃO, 2004). Por conseguinte, a história da Biomecânica no Brasil começou a ser escrita há poucos anos. Esta trajetória foi fortemente influenciada pelo apoio que algumas instituições de ensino superior brasileiras receberam do governo alemão. Um dos marcos históricos desta relação deu-se em 1965, ano em que foi concretizado o convênio cultural entre o Brasil e a República Federal da Alemanha para a introdução da Biomecânica nos cursos de Educação Física no Brasil (DIEM, 1983).

A SBB é uma sociedade civil de direito privado, sem fins lucrativos, que tem por objetivo reunir os profissionais da biomecânica e ciências afins no território brasileiro, com as seguintes finalidades: promover e apoiar o aperfeiçoamento técnico e científico desses profissionais; estimular a criação de centros de pós-graduação através da colaboração com universidades e instituições de pesquisa; manter vinculação com entidades do país e do exterior, agindo como representante oficial da biomecânica brasileira; zelar pelos aspectos éticos do exercício da biomecânica; e organizar a realização do CBB e de outros eventos científicos, promovendo a divulgação de conhecimentos sobre a área. Atualmente, a Revista Brasileira de Biomecânica – Brazilian Journal of Biomechanics (RBB) representa o órgão oficial de divulgação científica da SBB. Antes do seu lançamento, em novembro de 2000, os anais do CBB representavam o único meio de divulgação científica destinada exclusivamente à Biomecânica existente no Brasil. Desde o seu lançamento, a RBB atua como o órgão de divulgação científica oficial da SBB. Essa iniciativa teve o propósito de dotar a comunidade de um veículo de referência aos serviços, laboratórios e grupos de pesquisa (AMADIO, 2000b).

Saltar mais alto ou mais longe, correr a maior distância ou fazê-lo no menor tempo possível, converter o maior número de pontos. Qualquer que seja a modalidade esportiva, o objetivo central é sempre o mesmo: superar os limites do homem. Embora a otimização do rendimento esportivo seja fruto da combinação de fatores tão diversos como os genéticos e os sócio-afetivos, é inegável que a obtenção do máximo rendimento depende em grande monta da elaboração de estratégias de treinamento capazes de potencializar as capacidades e habilidades envolvidas no desempenho da modalidade. Associada a outras disciplinas, a Biomecânica é uma ferramenta indispensável na determinação dos fundamentos capazes de embasar o planejamento e a aplicação de um programa do treinamento esportivo.

Com vistas a exemplificar tal possibilidade, tome-se o exemplo do estudo de BRENNECKE, GUIMARÃES, GAILEY, LEONI, CARDACI, OLIVEIRA, MOCHIZUKI, AMADIO e SERRÃO (2009), cujo objetivo central foi investigar, por meio da Eletromiografia, a efetividade de um método de treinamento de força bastante popular: a pré-exaustão. Tal estratégia de treinamento preconiza que os exercícios multiarticulares devam ser precedidos, sem intervalos de descanso, por exercícios mono-articulares, objetivando a potencialização do trabalho dos músculos agonistas. Com vistas a analisar a efetividade deste método de treinamento, os autores determinaram parâmetros temporais e de intensidade da ativação muscular, utilizando os exercícios supino (multiarticular) e o crucifixo (monoarticular). A intensidade de ativação muscular do peitoral maior e do deltóide anterior não foi significativamente diferente quando da adoção do protocolo de pré-exaustão, contrariando a premissa básica que fundamenta este método de treinamento.

Curiosamente, o tríceps braquial apresentou maior intensidade de ativação quando da aplicação do método de pré-exaustão. Os autores concluem que o método de pré-exaustão pode ser eficiente para impor maior estímulo neural sobre pequenos grupos acessórios na execução de um movimento e não sobre o grupo principal. Dados como este, são de fundamental importância para colaborar no julgamento da validade de métodos tradicionalmente utilizados no treinamento. A identificação das características mecânicas do gesto esportivo pode ser considerada outra grande contribuição da Biomecânica.

Bom exemplo desta contribuição pode ser observado no estudo de BRAGA NETO (2008), que a partir da utilização de procedimentos da dinamometria, da cinemetria e da eletromiografia, analisou as características biomecânicas de dois dos mais utilizados movimentos do tênis: o “forehand” e o “backhand”. Em função do posicionamento dos pés, o “forehand” pode ser realizado de duas formas distintas: “forehand open stance” (FOS) e “forehand square stance” (FSS). Dados da literatura especializada apontam que o posicionamento dos pés pode ser determinante no desempenho do tenista. O “backhand” pode ser executado, em função do posicionamento das mãos na raquete, com uma (BK1) ou com duas mãos (BK2). Os resultados obtidos pelo autor apontam a ocorrência de uma maior ativação muscular para as técnicas FOS e BK2.

Entretanto, durante a fase pré-impacto, os maiores valores de ativação muscular foram observados quando da utilização do FSS e BK1. Dados como os apresentados por BRAGA NETO (2008) exemplificam como a Biomecânica pode estabelecer uma significativa contribuição para a avaliação da influência da técnica de movimento no desempenho esportivo.

A forte relação da Biomecânica com o Esporte pode levar a enganosa ideia de que, dentre as diversas formas de expressão do movimento humano, as ações esportivas são as que mais despertam o interesse da Biomecânica. Embora a relação seja forte, ela não é exclusiva. A própria história da Biomecânica evidencia de forma clara e inequívoca, que seus interesses são muito mais amplos. A investigação de parâmetros relacionados à locomoção humana, um dos tópicos mais estudados na Biomecânica, é evidencia do fato. Tome-se como exemplo o estudo da locomoção humana, um dos objetos de estudo que mais tem recebido atenção na Biomecânica. Das primeiras considerações de Aristóteles, da Vinci, Borelli, passando pelos clássicos estudos dos irmãos Weber, Marey, Braune & Fischer e Muybridge, até os estudos contemporâneos que se beneficiam dos recentes progressos nos processos de aquisição e processamento do sinal biológico, a locomoção sempre foi foco de atenção dos estudos biomecânicos (CAPOZZO, MARCHETTI & TOSI, 1992).

Esta que é uma das formas mais elementares do movimento humano, de cuja realização depende a maioria das ações motoras humanas, é um bom exemplo do interesse da Biomecânica pelo estudo dos movimentos cotidianos. Historicamente, a preocupação com a análise do movimento humano sempre esteve atrelada à necessidade de entender os mecanismos que regulam e controlam o movimento, como forma de buscar sua otimização. Como exemplo desta preocupação, considere-se o clássico estudo sobre a influência da postura na compressão dos discos intervertebrais realizado por NACHEMSON e ELFSTRÖM (1970).

O estudo conduzido por estes autores apontou que a compressão discal aumenta sobremaneira na posição sentada, quando comparada à posição em pé. Em função da projeção ântero-posterior do centro de gravidade do corpo, aumenta-se o torque resistente aplicado à coluna, que por sua vez gera necessidade de aumentar a força produzida pelos músculos responsáveis pela estabilização da coluna, levando também ao aumento do torque potente. Sob efeito do aumento dos torques potente e resistente, os discos intervertebrais acabam sendo alvos de considerável sobrecarga mecânica.

A partir de resultados como os de NACHEMSON e ELFSTRÖM (1970), pode-se entender a razão pela qual as lombalgias representam uma das mais importantes causas de afastamento do trabalho (SODERBERG, 1986). Evitá-las, permitindo que o sujeito possa trabalhar de forma confortável, condição fundamental ao bom desempenho de suas tarefas, torna-se possível a partir de adoção de estratégias bastante simples, como a introdução de pausas regulares durante a jornada de trabalho. Pausas que permitam alternar períodos na posição sentada, quando o estresse mecânico imposto à coluna é maior, com pequenos intervalos em pé, quando o estresse sofre considerável redução.

Tal condição configura um bom exemplo de como é possível, a partir dos conhecimentos oriundos da Biomecânica, otimizar a realização de um movimento extremamente rotineiro, como trabalhar em posição sentada. Considerando que o movimento laboral é uma das mais importantes formas de movimento, visto o tempo despendido em sua execução, continuemos a utilizá-lo como exemplo da importância da Biomecânica na otimização do movimento cotidiano.

Dentro desse contexto, ANDERSON, ÖRTENGREN, NACHEMSON e ELFSTRÖM (1974), estudaram a inclinação da cadeira como fator de interferência no estresse imposto à coluna vertebral. Após calcular o estresse gerados por diferentes inclinações do encosto, os autores concluíram ser possível reduzir sensivelmente a sobrecarga aplicada à coluna a partir da adoção de uma inclinação de 120°, associada a presença de uma estrutura capaz de apoiar a coluna lombar. O estudo da influência do mobiliário e dos materiais de trabalho é um claro exemplo de como a Biomecânica pode influenciar de forma decisiva a realização dos movimentos empregados em nossa rotina. Identificar a forma mais adequada e segura de realizar as atividades cotidianas é o primeiro passo rumo a promoção de saúde. Além da possibilidade de realizar de maneira confortável e segura as atividades cotidianas, a manutenção e a promoção da saúde ainda dependem da prática regular e sistematizada de alguma forma de atividade física.

 Dentre as diferentes expressões do movimento disponíveis para este fim, a caminhada, em função da sua popularidade, merece especial destaque. Por além de ser um meio de locomoção, a caminhada figura atualmente como uma das mais populares formas de condicionamento físico, sendo largamente praticada por pessoas de diferentes idades e níveis de aptidão física. Ainda que represente uma das expressões mais elementares do movimento humano, trata-se de um movimento de característica complexidade. As dificuldades enfrentadas por uma criança até que adquira um padrão maduro de marcha e os problemas sofridos por aqueles que, expostos a uma lesão traumática não mais conseguem manter tal padrão, representam exemplos muito concretos de tal complexidade. Complexidade que, retratada pela análise de parâmetros mecânicos, pode fornecer importantes subsídios, não somente para a caracterização de uma das mais importantes expressões do movimento humano, como também para o entendimento dos mecanismos de controle e gerenciamento desta importante forma de condicionamento físico.

Desta forma, a análise das características biomecânicas da locomoção nos diferentes estágios da vida: a infância (LOBO DA COSTA, 2000), a idade adulta (BRUNIERA, 1994), e a terceira idade (SERRÃO & AMADIO, 1994), subsidiam, por além do entendimento dos mecanismos envolvidos no gerenciamento mecânico do movimento humano, a estruturação de programas de intervenção destinados a estes grupos. A importância dos parâmetros biomecânicos no planejamento de programas de atividade física também pode ser exemplificada por intermédio dos estudos que focaram a análise do comportamento biomecânico do movimento de grupos que demandam atenção especial como os portadores de doenças neurológicas (PINHO, FONSECA, OLIVEIRA, VILLASBOAS, SERRÃO, AMADIO & SOUSA, 2008), os diabéticos neuropatas (SACCO & AMADIO, 2003), os amputados (CERQUEIRA SOARES, 2005), os portadores de pé torto congênito (SOARES, 2007), e os indivíduos que sofreram lesão ligamentar (MOTA, AMADIO, HERNANDEZ & DUARTE, 2002; LIMA, 2006).

Qualquer programa para estes grupos não pode ser levado a termo sem que se considere as características biomecânicas dos movimentos do grupo a que se destina. Vale lembrar que para pessoas que compõem estes grupos especiais, a prática do exercício físico é condição indispensável à manutenção de sua qualidade vida, fato que reforça a necessidade da elaboração de um programa extremamente bem adaptado às características biomecânicas de seus movimentos. Importante observar que os mesmos subsídios biomecânicos que respaldam a elaboração de estratégias voltadas à maximização do rendimento esportivo, são igualmente úteis no planejamento e implementação de atividades voltadas à promoção da saúde. A análise da contribuição dos músculos do membro inferior no controle da sobrecarga e na geração da energia mecânica (HAMNER, SETH & DELP, 2010) pode bem exemplificar tal condição.

Da mesma forma como tais informações são úteis na elaboração de um programa de treinamento para um atleta que utiliza a corrida durante o desempenho de suas atividades esportivas, elas o são quando a corrida é utilizada como estratégia para desenvolver as capacidades físicas necessárias à promoção da saúde. Diante do exposto torna-se evidente a necessidade de considerar as características biomecânicas dos movimentos a serem utilizados num programa cuja objetivo é a promoção da saúde, de modo de adequá-lo às características e necessidades do grupo a que se destina.

2.2 Análise biomecânica na prevenção de lesões

A tendência cada vez mais intensa de popularizar o exercício físico, além dos conhecidos benefícios para a promoção e manutenção da saúde, tem também ocasionado uma indesejável consequência: o aumento das lesões. A somatória das cargas geradas pelo movimento é apontada por muitos autores como a causa mais provável das lesões degenerativas que acometem o aparelho locomotor (WINTER & BISHOP, 1992).

Ainda que não seja possível, à luz do atual estágio de desenvolvimento dos procedimentos de medição e análise do sinal biológico, determinar os reais limites de tolerância do aparelho locomotor, informações acerca das solicitações mecânicas geradas pela somatória das forças aplicadas ao aparelho locomotor podem ser de extrema utilidade para os profissionais da Educação Física e do Esporte. Tome-se como exemplo as medições da intensidade das cargas externas, por intermédio da determinação da Força de Reação do Solo (FRS).

A partir do conhecimento destes dados, um profissional da área interessado em analisar o estresse mecânico gerado por uma atividade como a corrida, pode comparar a magnitude máxima da FRS gerada nessa condição, que atinge valores médios equivalentes a 2,3x PC para uma velocidade de deslocamento de 5 m/s (MUNRO, MILLER & FUGLEVAND, 1987), a valores referências como os da marcha e do salto. Tal comparação revelaria que as cargas externas (1,2 vezes o peso corporal do executante) impostas ao aparelho locomotor durante a realização da corrida, estão muito próximas da marcha, e bastante distantes das cargas produzidas nos saltos atléticos (AMADIO, 1989; BRUNIERA, 1994; RAB, 1994; WINTER, 1990).

Em função dessa hierarquização de valores, seria procedente afirmar que o estresse gerado pela corrida enquadra-se num espectro que oscila entre a baixa e a moderada solicitação mecânica, configurando, portanto, uma situação compatível com os limites de tolerância do aparelho locomotor. Ainda que seja possível hierarquizar as forças externas geradas pelas diferentes formas de movimento humano, como uma das estratégias de interpretação da sobrecarga mecânica, deve-se considerar que a sobrecarga é um parâmetro de natureza acentuadamente complexa, e como tal requer a determinação de outros indicadores, especialmente os de natureza interna. Desta forma, embora os dados disponíveis não sejam tão numerosos como o são para as forças externas, considerações acerca da sobrecarga dependem da determinação não somente das forças externas, como também das internas. Tome-se como exemplo, os momentos líquidos calculados para a articulação do joelho em algumas formas de movimento.

A mesma hierarquização estabelecida durante a análise das forças externas, pode agora ser procedida à luz das forças internas. Seja em função da análise das forças externas ou das forças internas, torna-se imperativo, conhecer a magnitude das cargas impostas ao aparelho locomotor durante a realização do movimento. Desconsiderá-la durante o planejamento de um programa de atividade física ou de treinamento esportivo poderia gerar condições potencialmente propicias ao surgimento das lesões do aparelho locomotor. Em função de sua potencial capacidade de causar lesões no aparelho locomotor, muitos poderiam razoar que melhor seria afastar-se da prática sistemática da atividade física. Escolha perigosa. Tão nociva quanto a sobrecarga gerada pela execução de uma atividade mal planejada e ou implementada é a sua ausência. Assim como a sobrecarga mecânica é capaz de causar lesões, a ausência ou aplicação insuficiente de cargas mecânicas é capaz de debilitar de forma significativa o desempenho mecânico de importantes estruturas do aparelho locomotor como os ossos (BERGMANN, BODY, BOONEN, BOUTSEN, DEVOGELAER, GOEMAERE, KAUFMAN, REGINSTER & ROZENBERG, 2011), as articulações (MAGNUSSON, LANGBERG & KJAER, 2010; VAILAS, TIPTON, MATTHES & GART, 1981; VAILAS, ZERNICKE, MATSUDA, CURWIN & DURIVAGE, 1986), e os músculos (AAGAARD, SUETTA, CASEROTTI, MAGNUSSON & KJAER, 2010).

A debilidade funcional de tais estruturas terá como consequência imediata a restrição das possibilidades de movimentação do indivíduo, limitando severamente sua possibilidade de executar exercícios físicos e até mesmo, em condições extremas, inviabilizando a realização de movimentos necessários à manutenção de suas atividades diárias. Portanto, as cargas mecânicas geradas pelo movimento humano devem ser encaradas como um estímulo necessário ao desenvolvimento e manutenção das estruturas biológicas que dão suporte ao movimento humano. E como tal, devem ser cuidadosamente controladas para que não atinjam magnitudes excessivas a ponto de causar lesões nas estruturas biológicas, tampouco sejam insuficientes a ponto de impedir a manutenção ou desenvolvimento de suas funções.

A prevenção de lesões é uma prioridade constante para qualquer indivíduo que pratica esportes. É aqui que a biomecânica entra em cena como um aliado crucial. Ela nos permite identificar quais movimentos e padrões de esforço podem aumentar o risco de lesões. Ao compreendermos as forças e pressões que o corpo enfrenta durante a atividade esportiva, podemos desenvolver estratégias eficazes para minimizar tais riscos.

Além disso, a análise biomecânica desempenha um papel fundamental na reabilitação após lesões esportivas. Ela permite que profissionais de saúde e fisioterapeutas avaliem a biomecânica alterada de um atleta devido a uma lesão e criem planos de tratamento personalizados. Isso não só acelera a recuperação, mas também ajuda a evitar futuras recaídas.

A partir destas breves considerações, pode-se evidenciar que o planejamento de um programa de atividades físicas e ou esportivas, independente do objetivo ou do público ao qual se destina, deve necessariamente levar em consideração a somatória das forças geradas pelos movimentos a serem utilizados, bem como as possíveis estratégias para minimizá-la. Para tanto, deve-se somar a já bem enraizada preocupação com o estresse fisiológico gerado exercício físico, a preocupação como estresse mecânico por ele gerado. Indubitavelmente, um programa construído a partir de sólidas bases da Biomecânica tem mais chance de lograr êxito do que outro que, desconsiderando tais fatores, baseia-se apenas em aspectos subjetivos.

3 CONCLUSÃO

A partir da construção deste estudo, conclui-se que a Biomecânica é uma ferramenta indispensável no planejamento e implementação de programas de atividades físicas voltados à promoção da saúde, bem como uma importante ferramenta na prevenção de lesões relacionadas à atividade física. Aliada as demais disciplinas que compõem o corpo de conhecimento da Educação Física, a Biomecânica fornece subsídios para que o professor possa buscar estratégias que permitam selecionar os movimentos mais adequados e seguros ao desenvolvimento de habilidades e capacidades físicas.

Quanto se pensa na participação esportiva, a otimização do gesto e a segurança assumem igual relevância. Buscar a mais perfeita execução do gesto esportivo, significa em última análise otimizar o desempenho atlético. Permitir que esse desempenho seja alcançado sem comprometer a integridade física do atleta, é condição indispensável ao prolongamento da participação esportiva do atleta. 

4 REFERÊNCIAS

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