A EFICÁCIA DAS BACTÉRIAS DO GÊNERO WOLBACHIA NO CONTROLE BIOLÓGICO DO VÍRUS DA DENGUE

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7877733


Eduardo Araújo Lima1
Paloma Santos Alencar Sousa2
Luís Evêncio da Luz3
Ellen Eduarda Alencar Vasconcelos4
José Nilton de Araújo Gonçalves5
Maria Vitória Moura Santos6
Priscila de Sousa Nunes7


Resumo

Experimentos envolvendo a contaminação do mosquito Aedes aegypti com bactérias endossimbióticas do gênero Wolbachia mostraram resultados animadores por terem causado supressão dos quatro sorotipos do vírus DENV, causador da dengue, promovendo algumas mudanças nas atividades fisiológicas normais do vetor, e que prejudicam a replicação do vírus. Essa prática, denominada método Wolbachia, tem se mostrado uma alternativa eficaz e sustentável no combate à dengue e que pode ser utilizada para possibilitar uma diminuição dos casos de dengue em regiões epidêmicas. Quanto maior o campo de pesquisas sobre a eficácia dessa bactéria contra o vírus DENV, maior será a propagação do conhecimento sobre esse método de controle biológico ainda pouco explorado. Foram realizadas pesquisas nas bases de dados: Web of Science (WOS), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e PubMed, e os resultados encontrados foram utilizados para a seleção dos dados apresentados no presente estudo. Observou-se que os estudos analisados comprovaram a eficácia do uso do método Wolbachia no combate à dengue. Os estudos comprovam uma queda tanto no número de infecções quanto no número de mosquitos nas regiões onde a técnica foi implantada, ao mesmo tempo que possibilita o controle da doença em grande escala e em um período de tempo curto. O método estudado configura uma técnica sustentável, com pouco ou nenhum impacto ambiental. O presente estudo objetiva atrair um olhar científico para exploração dessa técnica em maior escala expandindo o conhecimento da intervenção e suas vantagens.

Palavras-chave: Aedes aegypti. Arboviroses. Controle biológico. Dengue. Wolbachia.

Abstract

Experiments involving the contamination of the Aedes aegypti mosquito with endosymbiotic bacteria of the genus Wolbachia showed encouraging results as they caused suppression of the four serotypes of the DENV virus, which causes dengue, promoting some changes in the normal physiological activities of the vector, which impair virus replication. This practice, known as the Wolbachia method, has proven to be an effective and sustainable alternative to combat dengue and can be used to reduce dengue cases in epidemic regions. The greater the field of research on the effectiveness of this bacterium against the DENV virus, the greater the spread of knowledge about this still little explored method of biological control. Searches were carried out in the following databases: Web of Science (WOS), Latin American and Caribbean Literature in Health Sciences (LILACS) and PubMed, and the results found were used to select the data presented in this study. It was observed that the analyzed studies proved the effectiveness of using the Wolbachia method in combating dengue. The studies show a drop both in the number of infections and in the number of mosquitoes in the regions where the technique was implemented, at the same time that it makes it possible to control the disease on a large scale and in a short period of time. The studied method configures a sustainable technique, with little or no environmental impact. The present study aims to attract a scientific look to explore this technique on a larger scale, expanding knowledge of the intervention and its advantages.

Keywords: Aedes aegypti. Arboviruses. Biological control. Dengue. Wolbachia.

1  INTRODUÇÃO

Arbovírus são os vírus que possuem disseminação vetorial por meio de artrópodes, principalmente por meio de mosquitos hematófagos da família Culicidae. Essa família é alvo do interesse de muitas ações de saúde e da parasitologia médica por serem responsáveis pela transmissão de arbovírus com altos índices de emergência, como o vírus da dengue (DENV), vírus Chikungunya (CHIKV) e vírus Zika (ZIKV), que causam as doenças: dengue, febre chikungunya e zika, respectivamente (BEEBE et al., 2021; KAMTCHUM-TATUENE et al., 2017).

A maioria das ações de saúde contra as arboviroses são voltadas para o combate ao vetor, ainda que o controle da proliferação dos mosquitos seja muito difícil. A principal espécie transmissora dessas doenças é o mosquito Aedes aegypti, transmissor da dengue, arbovirose de maior importância médica. O vetor é um mosquito de cor escura, com nítida marcação prateada no tórax em forma de lira. O combate a ele é muito difícil por vários fatores, dentre eles, sua rápida proliferação e transmissão vertical (do mosquito adulto aos ovos) do vírus da dengue (NEVES, 2016).

Essa espécie tem sido alvo de experimentos envolvendo a contaminação do culicídio com bactérias endossimbióticas do gênero Wolbachia, que se classificam como bactérias intracelulares obrigatórias, gram-negativas (apresentam cápsula), que alteram funções vitais do hospedeiro, como imunidade, fertilidade, metabolismo e longevidade, interferindo na compatibilidade do ambiente intracelular com alguns patógenos que ocorrem também em humanos, conseguindo ser eficiente no combate à reprodução dos quatro sorotipos da dengue (DENV 1-4) no vetor, e assim interrompendo sua transmissão por via vetorial (BISHOP et al., 2022; HOFFMANN, 2020; UTARINI et al., 2021).

Várias espécies e cepas desse gênero de bactérias são utilizadas em experimentos que já sugerem, por meio de pesquisas, que seria uma ótima forma de complementar os métodos de combate à dengue que já são utilizados mundialmente: combate ao mosquito adulto e à larva. Outros métodos consistem em controle biológico através da criação de predadores e parasitas de larvas em criadouros e transgenia de machos, provocando a morte da prole (NEVES, 2016).

Além de ser um controle biológico que pode ser usado simultaneamente com as medidas de controle já existentes, o método Wolbachia ainda é pouco explorado pela sua complexidade, visto que a implantação da bactéria em mosquitos acontece em laboratório, uma vez soltos no meio, é necessário um monitoramento entomológico de A. aegypti contendo wolbachia para verificar sua disseminação em locais de recém-implantação do método (UTARINI et al., 2021). Diante desse cenário, é importante a realização de pesquisas na literatura que busquem conhecer os benefícios da ampliação da realização do método Wolbachia, uma vez que estudos revelam que essa técnica apresenta resultados animadores e pode ser a chave para uma drástica diminuição nos casos de dengue em regiões epidêmicas (NEVES, 2016). Quanto maior o campo de pesquisas sobre a eficácia dessa bactéria contra o vírus DENV, maior será a propagação da existência desse método de controle biológico ainda pouco explorado. Busca-se, através dessa revisão, alcançar um maior interesse científico, tendo em vista os resultados promissores observados em estudos anteriores.

Essa pesquisa se justifica com base na necessidade de novos métodos mais eficazes contra a dengue, visto que é uma doença de difícil combate pela alta resistência do A. aegypti aos métodos de proteção mais comumente utilizados, evidenciando a insuficiência dos métodos de combate ao vetor que se baseiam em proteção individual e extermínio do mosquito adulto e dos seus criadouros. Este fato aponta para a importância da exploração do grande potencial das bactérias do gênero Wolbachia de bloquear patógenos no seu hospedeiro (DORIGATTI et al., 2017; SILVA, 2016).

2  METODOLOGIA

Essa pesquisa fundamentou-se em passos de elaboração de revisão de literatura seguindo o conceito trazido por Grant e Booth (2009), baseada nas etapas: Definir as questões de pesquisa e os critérios de inclusão e exclusão; realizar a busca nas bases de dados selecionadas, utilizando uma ampla variedade de termos para a pesquisa; realizar a triagem dos estudos encontrados de acordo com os critérios de inclusão e exclusão pré-estabelecidos e fazendo uso de filtros; realizar a seleção de dados relevantes para a revisão a partir dos estudos escolhidos; avaliar a qualidade dos estudos selecionados e sintetizar os resultados dos estudos selecionados.

É uma pesquisa sobre a eficácia do uso de bactérias do gênero Wolbachia em métodos de controle biológico contra a proliferação do vírus da dengue em mosquitos da espécie Aedes Aegypti, inicialmente estabelecida pela questão norteadora: “Quais são os resultados da implantação de métodos de controle biológico baseados no uso de bactérias do gênero Wolbachia no controle da dengue?”, tendo como principal critério de relevância a carência de estudos íntegros sobre o tema, que tenham em foco a explanação da utilidade dessas bactérias no combate à dengue, também relacionando as mudanças fisiológicas provocadas no vetor e seu impacto no ciclo biológico do mosquito.

Diante disso, para a seleção dos artigos, em fevereiro de 2023, efetuou-se a busca da temática nas seguintes bases de dados: Web of Science (WOS), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e PubMed, fazendo uso dos termos em saúde dos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS/BIREME) e Medical Subjective Headings (MeSH/PubMed). Foram eles: Dengue, Aedes, Wolbachia, Controle Biológico/Biological Control Agents e MicroRNAs, alternados com o marcador booleano AND.

Dessarte, foram realizadas buscas em cada base de dados. Na primeira base de dados, Web of Science, foram utilizados na busca dos artigos os descritores previamente conferidos no MeSH: Dengue, Wolbachia e Biological Control Agents e foram encontrados 21 resultados. Para refinar a busca, foram aplicados os filtros: “últimos 8 anos” e “Artigos (sem revisões)”. Após isso, restaram 7 resultados, dos quais foram selecionados dois artigos que tinham relação com o propósito da pesquisa. Os demais artigos foram descartados por não terem o texto completo disponível, não ter relação com o tema proposto pela pesquisa ou ambos.

Posteriori, na base de dados LILACS, foram utilizados na pesquisa os descritores previamente conferidos no DeCS: Dengue, Wolbachia e Controle Biológico e foram encontrados 9 resultados, dos quais foram selecionados dois artigos que tinham relação com o propósito da pesquisa. Os demais artigos foram descartados por não possuírem relação com o tema proposto pela pesquisa.

Por conseguinte, na base de dados PubMed, foram realizadas duas buscas: na primeira, foram utilizados os descritores previamente conferidos no MeSH: Wolbachia, MicroRNAs e Aedes e foram encontrados 13 resultados, dos quais selecionamos um artigo que tinha relação com o propósito da pesquisa. Os demais artigos foram descartados por não terem relação com o tema proposto pela pesquisa.

Na segunda busca, foi utilizado apenas o descritor Wolbachia, obtendo-se 3856 resultados. Foi aplicado o filtro “texto completo gratuito”, apresentando 2312 resultados após isso, dos quais foram selecionados nove artigos que tinham relação com o propósito da pesquisa. Os demais foram descartados por não possuírem relação com o tema proposto pela pesquisa ou por serem artigos já encontrados anteriormente.

Após a releitura dos artigos de forma integral, os dados de interesse para a pesquisa foram extraídos para a construção do conhecimento buscado, sempre respeitando todos os princípios éticos para a construção da revisão de literatura.

3  FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A dengue é a arbovirose mais importante do mundo, afetando comunidades em áreas tropicais e subtropicais. Devido à grande utilidade de se atenuar o vírus circulante em

mosquitos, é válida a utilização de métodos que possam agir no próprio vetor, evitando a disseminação viral pela transmissão vertical, na qual a fêmea passa o DENV para os ovos, que já eclodem infectados pelo vírus (NEVES, 2016).

Em razão dos impactos na saúde pública associados a doenças reemergentes transmitidas por artrópodes, torna-se fundamental o desenvolvimento de metodologias alternativas para o combate ao vetor. Boa parte dos programas tradicionais de combate aos mosquitos transmissores são baseados prioritariamente no uso de inseticidas químicos, porém essa técnica apresenta eficácia limitada e representa riscos potenciais ao meio ambiente, além de contribuir na evolução da resistência do hospedeiro (NEVES, 2016; DORIGATTI et al., 2017). Nesse contexto, o desenvolvimento e emprego de controles biológicos como a Wolbachia é primordial por se configurarem como estratégias sustentáveis que trazem pouco ou nenhum prejuízo ecológico e à saúde humana.

As bactérias do gênero Wolbachia são gram-negativas intracelulares obrigatórias, encontradas em ampla gama em invertebrados. Estima-se que mais de 60% de todas as espécies de insetos possuam bactérias desse gênero. São conhecidas por afetarem a reprodução de seu hospedeiro e também por interferir no desenvolvimento de patógenos comuns em humanos em mosquitos vetores (HUSSAIN et al., 2011). Na última década, vários estudos comprovaram uma grande relação da bactéria com o artrópode hospedeiro, até mesmo naqueles que naturalmente não carregam a bactéria.

A implantação das técnicas de transinfecção despertou o interesse por métodos baseadas em Wolbachia para refrear doenças propagadas por vetores. Através de microinjeções embrionárias em ovos jovens de A. aegypti é possível instituir infecções estáveis pelo procarionte nesses hospedeiros, ao mesmo tempo que os descendentes conservam a bactéria ao decorrer das próximas gerações (LAMBRECHTS et al., 2015). Desse modo, o número de portadores de Wolbachia aumenta progressivamente até que grande parte dos mosquitos de uma população passem a portar o micróbio.

Diante dessa descoberta, cientistas utilizaram essa característica do procarionte para aumentar a resistência de mosquitos vetores de arboviroses aos seus respectivos vírus, como o caso do Aedes aegypti, associando a bactéria a esse hospedeiro, que não a abriga naturalmente (HOFFMANN, 2020). Diante dos achados, tornou-se de grande interesse descobrir como essas bactérias influenciavam as funções fisiológicas normais do organismo do culicídeo.

3.1  Relação entre a bactéria e o hospedeiro

Pesquisas apontam uma redução da densidade das espécies W. wAlbB e W. pipientis após transfecção de um inibidor de microRNA (miRNA) em células infectadas pela bactéria. A descoberta aponta a necessidade de manipulação da expressão gênica das células do mosquito pela bactéria, utilizando esse método para manter a sua sobrevivência dentro dessas células, alterando o metabolismo celular do mosquito infectado para conseguir se replicar eficazmente. A regulação da expressão gênica é fundamental para a sobrevivência da bactéria, regulando positivamente a produção de proteínas necessárias para o desenvolvimento bacteriano. Além disso, também atua alterando funções vitais do hospedeiro, como imunidade e fertilidade (BISHOP et al., 2022; HUSSAIN et al., 2011).

Os miRNAs são moléculas pequenas de ácido ribonucleico (RNA) não codificadoras de proteínas, que atuam regulando o funcionamento de RNAs mensageiros (mRNAs), assim regulando sua tradução em novas proteínas pela maquinaria celular de síntese proteica através dos genes (NELSON & COX, 2014). Esse tipo de RNA é encontrado em eucariontes, o que significa que a bactéria, sendo procarionte, não o sintetiza, mas manipula ao seu favor a codificação de alguns genes do seu hospedeiro.

Além disso, essa bactéria tem a capacidade de induzir a expressão alterada de genes imunes do mosquito, competir com o vírus por recursos como o colesterol e impedir diretamente a replicação do RNA viral pela sua capacidade de alterar as funções celulares e regular a tradução de mRNAs ao seu favor. Ademais, a bactéria é dependente do gene de metaloproteases (enzimas que utilizam um metal para fazer a quebra de proteínas), não conseguindo persistir na célula se o mesmo for inibido. Ela atua regulando positivamente a expressão do gene codificador de metaloprotease, que uma vez inibido, leva à redução da densidade da bactéria no organismo do hospedeiro. Outro fator importante é que a atividade do endossimbionte aumenta a quantidade de radicais livres na célula do hospedeiro, contribuindo para a inibição do vírus (ANT et al., 2023; HUSSAIN et al., 2011).

A cepa wMel é altamente eficaz contra a disseminação do vírus DENV através de sua ação retardatária na frequência de salivação do mosquito, diminuindo drasticamente seu potencial infeccioso. Dessa forma, ela retarda a chegada do vírus às glândulas salivares. Como consequência, há uma drástica diminuição na presença do vírus na saliva do culicídio, isso faz com que a probabilidade de que uma pessoa seja infectada com o vírus ao ser picada seja diminuída. Junto a isso, a resistência conferida pela bactéria é benéfica ao mosquito, pois o vírus DENV também o causa prejuízos: quanto maior a carga viral detectada, menor é o tempo de vida observado, e a bactéria acaba por oferecer proteção ao hospedeiro, servindo como fonte de imunidade contra o patógeno (SILVA, 2016; YIXIN et al., 2015).

A Wolbachia também causa em seu hospedeiro um fenômeno conhecido como incompatibilidade citoplasmática, no qual os machos infectados com a bactéria não geram ovos férteis quando cruzam com fêmeas não infectadas, pois há uma modificação nos espermatozóides, resultando em uma interferência na divisão nuclear embrionária (HOFFMANN, 2020; YEN & BARR, 1971).

A incompatibilidade citoplasmática causada pela liberação apenas de mosquitos machos na natureza acaba por reduzir a população de mosquitos no local, pois após a liberação dos ovos, não há desenvolvimento das larvas, e uma população de hospedeiros infectados pode acabar causando uma supressão populacional de A. aegypti. No entanto, essa incompatibilidade entre o mosquito macho infectado e a fêmea não infectada evita a ocorrência da transferência vertical da bactéria, tendo por finalidade apenas o impedimento do desenvolvimento dessa espécie de culicídeos. Esse método de manejo causa uma forte supressão de A. aegypti selvagens por mosquitos infectados com Wolbachia e é utilizado para realizar a manipulação populacional de mosquitos em sistemas agrícolas, apresentando um alto potencial de controle (ANT et al., 2023; BEEBE et al., 2021).

3.2  Identificação de artrópodes infectados por Wolbachia

O monitoramento entomológico de A. aegypti contendo a bactéria é de grande importância para a possibilidade da condução de estudos randomizados de implantação do método Wolbachia em campo para verificar sua disseminação em locais de recém-implantação, observando sua disseminação entre os mosquitos com o passar do tempo (UTARINI et al., 2021).

Esse monitoramento pode ser realizado através da análise de larvas e ovos em criadouros ou de mosquitos adultos capturados em ambiente externo, através da implantação de armadilhas em locais estratégicos, com alta circulação do artrópode. Após a captura, é possível identificar a presença de Wolbachia em suas células através de métodos que examinam especificamente a presença do simbionte (BEEBE et al., 2021).

É possível identificar a presença de bactérias do gênero Wolbachia em artrópodes através da detecção da presença do DNA bacteriano exclusivo do gênero em larvas do mosquito por meio do método da Reação em Cadeia da Polimerase (PCR), predominantemente utilizado para essa finalidade, e a técnica de Amplificação Isotermal Mediada por LOOP (LAMP), ainda pouco explorada. Ainda que se use predominantemente o método PCR para a identificação da presença da bactéria, o método LAMP apresenta um menor custo de realização, apresentando um preço de cerca de 50% menor do que o necessário para a realização do PCR, e ainda sendo dotado de valores altos de sensibilidade e especificidade (GONÇALVES, 2014).

Também é possível detectar o vírus DENV diretamente da saliva do mosquito através da indução da salivação, deixando-os em jejum por algumas horas para posteriormente realizar a coleta e examinar a presença de RNA viral (SILVA, 2016). Esse método, por apresentar alta complexidade, normalmente é utilizado em laboratório, portanto não é eficiente para realizar o monitoramento da prosperidade de bactérias em mosquitos de campo.

3.3  Obstáculos e questões futuras para o uso da técnica

O uso da Wolbachia para biocontrole contra a dengue é uma abordagem recente e promissora que necessita do aporte de novos estudos e testes. Concomitantemente, essa estratégia apresenta obstáculos futuros a serem superados, dentre eles está o fato da necessidade de pesquisas posteriores que tenham como objetivo determinar qual cepa desta bactéria apresenta um melhor equilíbrio entre a força da incompatibilidade citoplasmática, a influência do patógeno e outros efeitos de aptidão. Outrossim, é de suma importância o monitoramento ao decorrer do tempo de mudanças evolutivas tanto do procarionte quanto do hospedeiro e do arbovírus (KAMTCHUM-TATUENE et al., 2017).

Apesar das atuais pesquisas em andamento apontarem que a disseminação da Wolbachia reduz drasticamente a incidência dos casos de dengue, ainda se faz necessário transformar essa estratégia inovadora em uma intervenção de saúde pública (LAMBRECHTS et al., 2015). Converter a Wolbachia em um item de controle biológico inteiramente padronizado, instrumentalizado, apto a produzir em grande escala, com baixo custo financeiro e de maneira eficiente ainda é uma barreira a ser ultrapassada. Os estabelecimentos destinados a produção em ampla escala de mosquitos juntamente com monitoramento dos mesmos representam altos custos monetários. Nesse contexto, torna-se fundamental mais estudos com o intuito de aperfeiçoar e maximizar esse processo (DORIGATTI et al., 2017).

Destarte, o sucesso da técnica depende de outros fatores que também se evidenciam como impasses futuros, dentre os quais está a obtenção da aceitação e envolvimento da comunidade e a avaliação das especificidades geográficas de cada região afetada, uma vez que a eficácia e a aplicação dessa abordagem podem não ocorrer de maneira equivalente em todas as áreas, por exemplo, em regiões endêmicas para mais de uma arbovirose com diferentes hospedeiros, a liberação de populações do mosquito infectadas pela bactéria pode requerer a interrupção temporária do emprego de inseticidas, fato que colabora no crescimento dos riscos de um surto da doença, pois favorece a progressão de outros vetores (KAMTCHUM- TATUENE et al., 2017).

4  RESULTADOS E DISCUSSÃO

Em virtude dos fatos apresentados ao longo deste trabalho, depreende-se que a dengue configura-se como um notório problema de saúde pública essencialmente nas regiões de clima tropical e subtropical, sendo a infecção arboviral mais prevalente em humanos, e que dessa forma, torna-se imprescindível a adoção de intervenções alternativas que apresentem a capacidade de minimizar consideravelmente a transmissão da doença, principalmente por meio do uso de estratégias de combate ao vetor, já que o problema da não erradicação da dengue está relacionado com a perseverança do vetor em ambientes domésticos (NEVES, 2016; DORIGATTI et al., 2017).

Dentre essas estratégias, uma das abordagens que vem crescendo significativamente é o uso de bactérias do gênero Wolbachia para o controle biológico da dengue e de outras arboviroses. Esse método consiste na infecção deliberada do mosquito vetor com o procarionte que por sua vez altera funções vitais do hospedeiro (HOFFMANN, 2020). Nesse sentido, a liberação em campo do vetor adulto infectado com Wolbachia tem a capacidade de mitigar a proliferação da dengue através de dois mecanismos: atenuando a densidade populacional e/ou a expectativa de vida do hospedeiro e limitando a competência do mosquito em transmitir o vírus, assim como a sua replicação (ANT et al., 2023; DORIGATTI et al., 2017).

Entretanto, apesar desse método se constituir como uma estratégia altamente inovadora e promissora na redução da transmissão desses patógenos, ainda é um meio pouco explorado e operacionalmente implementado devido sua complexidade, uma vez que a implantação da bactéria nos vetores ocorre em laboratório e após a sua liberação no meio, é de fundamental importância que haja o monitoramento entomológico de A. aegypti contaminados com a Wolbachia para analisar e verificar sua disseminação em locais de recém implantação do método (UTARINI et al., 2021).

Os hospedeiros infectados com esse gênero de bactéria não são considerados geneticamente modificados, visto que a Wolbachia é um simbionte natural de invertebrados, nesse contexto, a mesma não apresenta nenhum risco conhecido à saúde humana ou ao meio ambiente. Em contrapartida, esse método de controle biológico ainda possui obstáculos futuros a serem superados, como por exemplo, as especificidades geográficas, a determinação da cepa ideal de bactéria, a aceitação da comunidade e o monitoramento de alterações evolutivas e nas interações entre a Wolbachia, o vetor e o vírus (KAMTCHUM-TATUENE, 2017).

Na Austrália, um experimento comprovou a capacidade da cepa wMel de bloquear totalmente a transmissão de dengue em condições experimentais, e também seu alto potencial de se estabelecer numa população de mosquitos no campo: após a liberação de A. aegypti contendo a bactéria, a cepa conseguiu prosperar e se estabelecer. O monitoramento de larvas revelou a predominância de mosquitos contendo a bactéria poucos meses após a liberação experimental (WALKER et al., 2011).

Tendo em vista que os mosquitos liberados poderiam passar a bactéria para as próximas gerações, produzindo populações de mosquitos resistentes ao vírus, foi-se descoberto que essa técnica seria uma forma inovadora de intervenção contra a dengue, podendo diminuir drasticamente a incidência de casos em locais de implantação do método.

Também foi realizado na Austrália um estudo que detectou uma forte supressão de mosquitos selvagens após a liberação de machos infectados pela cepa w AlbB2, efeito causado pela incompatibilidade citoplasmática, mostrando que o número de mosquitos reduziu consideravelmente em relação ao grupo controle. Os resultados promissores deixam clara a aplicabilidade desse método em grandes áreas de coexistência entre humanos e o vetor da dengue, indicando que a erradicação desse transmissor de arboviroses pode se tornar realidade (BEEBE et al., 2021).

Na Indonésia, um estudo semelhante foi conduzido para verificar o controle da dengue através da liberação de mosquitos A. aegypti infectados com a cepa wMel em 12 locais de intervenção aleatórios, o que resultou em uma eficácia protetora, reduzindo em 77% a incidência de casos sintomáticos da doença em relação aos grupos-controle, refletindo menos adoecimentos por dengue nos locais de liberação, menos hospitalizações por dengue e uma eficácia contra os quatro sorotipos do vírus (UTARINI et al., 2021).

A capacidade da bactéria de inibir infecções varia de um patógeno a outro, se mostrando ineficaz em uma pesquisa utilizando um vírus de RNA de cadeia negativa, reforçando a ideia de que ela só seja capaz de conferir resistência a vírus de RNA de cadeia positiva (SCHNETTLER et al., 2016). A cepa wMel também foi ineficaz contra a infecção do mosquito

Aedes aegypti pelo protozoário Plasmodium gallinaceum, causador de malária em aves. Em contrapartida, a bactéria bloqueou completamente a infecção da mesma espécie de culicídeo com o vírus da dengue (SILVA, 2016). Isso evidencia a alta eficiência de bactérias do gênero estudado contra o vírus DENV.

Desse modo, observou-se que os estudos analisados apresentam evidências científicas da eficácia do uso do método Wolbachia no controle da proliferação dos vírus transmitidos pelo A. aegypti. Os dados analisados comprovam que houve uma drástica redução tanto das populações de mosquitos quanto dos casos de dengue nas regiões onde a técnica foi implementada, configurando-se como uma abordagem vantajosa em relação aos métodos convencionais, por se mostrar como uma estratégia sustentável com baixo ou nenhum dano ao meio ambiente e à saúde da população e conjuntamente contribui no controle da doença em grande escala e em curto período de tempo.

Entretanto, vale ressaltar que existem poucas pesquisas que abordam esse impacto ambiental e ecológico futuro da utilização do procarionte, assim, faz-se necessária a adoção de estudos e testes que busquem verificar as mudanças e as possíveis consequências relacionadas à interação entre a bactéria, o arbovírus e o hospedeiro com o decorrer do tempo. Outrossim, é de fundamental importância encontrar possíveis alternativas que possam colaborar na atenuação dos custos financeiros de sua implantação com o objetivo de converter a Wolbachia em um método viável e acessível de controle biológico.

5  CONCLUSÃO

Analisando-se as vantagens, observou-se que o manejo de bactérias do gênero Wolbachia em mosquitos vetores da dengue contribuiu no aparecimento de algumas mudanças em suas atividades fisiológicas normais, e que prejudicaram a replicação do vírus no hospedeiro. Essa abordagem causou tanto a diminuição do número da população de A. aegypti quanto da incidência dos casos de dengue nos locais de implantação do método.

O presente estudo esclareceu por meio de evidências científicas que o manejo desse gênero de bactérias para infecção em mosquitos transmissores de arboviroses é bastante vantajoso no controle da proliferação dessas doenças, em especial, a dengue. O método analisado releva-se promissor por se tratar de uma técnica sustentável, com pouco ou nenhum impacto ambiental, apresentando inúmeras pesquisas anteriores que indicam sua eficácia.

Dessa forma, torna-se evidente a necessidade de atrair um olhar científico para exploração dessa técnica em maior escala, contribuindo, dessa forma, com a expansão do conhecimento da intervenção estudada como complementar às medidas de proteção já existentes contra a dengue.

REFERÊNCIAS

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1Acadêmico de Enfermagem da Universidade Federal do Piauí – UFPI, Campus Senador Helvidio Nunes de Barros; ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9930-5781; E-mail: eduardoaraujolima2018@gmail.com.
2 Acadêmica de Enfermagem da Universidade Federal do Piauí – UFPI, Campus Senador Helvidio Nunes de Barros; ORCID: https://orcid.org/0009-0001-4722-5747; E-mail: palomaalencarrsousa@gmail.com.
3 Professor Orientador da Universidade Federal do Piauí – UFPI, Campus Senador Helvidio Nunes de Barros; ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2148-8175; E-mail: evencio@ufpi.edu.br.
4 Acadêmica de Medicina do Centro Universitário Uninovafapi; ORCID: https://orcid.org/0009-0008-3915-138X; E-mail: ellenalencarvas@hotmail.com.
5 Professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Piauí – IFPI, Campus Paulistana; ORCID: https://orcid.org/0000-0002-1578-3656; E-mail: josenilton.ifpi@hotmail.com.
6 Acadêmica de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Piauí – UFPI, Campus Senador Helvídio Nunes de Barros; ORCID: https://orcid.org/0009-0003-3723-9816; E-mail: mariavitoriamoura01@gmail.com.
7 Acadêmica de Enfermagem da Universidade Federal do Piauí – UFPI, Campus Senador Helvidio Nunes de Barros; ORCID: https://orcid.org/0000-0002-6736-4277; E-mail: priscilapatins2018@gmail.com.