A DOR CRÔNICA E TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO ENVOLVENDO ACUPUNTURA E ATIVIDADE FÍSICA: REVISÃO DE LITERATURA

CHRONIC PAIN AND NON-PHARMACOLOGICAL TREATMENT INVOLVING ACUPUNCTURE AND PHYSICAL ACTIVITY: LITERATURE REVIEW

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7908808


Renata Isabel de Sousa Carmim Gonçalves1
Lorena Penha de Almeida2


RESUMO

Dor é uma sensação ou experiência emocional desagradável, associada com dano tecidual real ou potencial. Ela pode ser aguda ou crônica dependendo do seu tempo de instalação. A partir de 30 dias essa dor é considerada crônica e sua permanência poderá levar o paciente a entrar num ciclo vicioso para a melhora de sua condição, esses pacientes possuem como porta de entrada no serviço de saúde a UBS, onde deverá ser conduzida sua situação. Porém, a condição de múltiplas queixas de dor com baixa resposta ao tratamento poderá levar ao aparecimento de depressão, problema no sono, alterações cognitivas e disfunções sexuais. Muitos indivíduos com dor crônica fazem uso de medicação analgésica por conta própria e em doses crescentes levando ao aparecimento de reações adversas e piora da sua situação clínica. Assim, a implementação de tratamento não medicamentoso como o uso de acupuntura e de atividade física parecem produzir resposta efetiva e redução de efeitos nocivos de uso prolongado de medicação.

Palavras-chave: dor crônica. tratamento alternativo para dor crônica. acupuntura na dor crônica.

ABSTRACT

Pain is an unpleasant sensation or emotional experience associated with actual or potential tissue damage. It can be acute or chronic depending on its onset time. After 30 days, this pain is considered chronic and its permanence may lead the patient to enter a vicious cycle to improve their condition. However, the condition of multiple complaints of pain with low response to treatment may lead to the onset of depression, sleep problems, cognitive alterations and sexual dysfunctions. Many individuals with chronic pain make use of analgesic medication on their own and in increasing doses, leading to the appearance of adverse reactions and worsening of their clinical situation. Thus, the implementation of non-drug treatment such as the use of acupuncture and physical activity seem to produce an effective response and reduce the harmful effects of prolonged use of medication.

Keywords:  chronic pain. alternative treatment for chronic pain. acupuncture in chronic pain.

1 INTRODUÇÃO

 Dor é uma sensação ou experiência emocional desagradável, associada com dano tecidual real ou potencial. Ela pode ser aguda (duração inferior a 30 dias) ou crônica (duração superior a 30 dias), sendo classificada segundo seu mecanismo fisiopatológico. (9) 

A dor com duração superior a quatro meses e processos patológicos crônicos de forma recorrente, têm sido uma queixa frequente nas abordagens com paciente que envolve não somente a capacidade técnica de tratamento, mas a empatia de reconhecer no paciente um ser humano complexo. O impacto social costuma ser alto, principalmente pelos encargos nos sistemas de saúde. (8)

Podemos facilitar a compreensão através da classificação da dor em orgânicas (nociceptivas e/ou neuropáticas, neoplásicas e não neoplásicas), psicofisiológicas e emocionais. A dor é sempre subjetiva, cada indivíduo vivencia através de sensações relacionadas às experiências físicas e psicológicas de lesões prévias. (8)

Existem importantes comprometimentos físicos e psicológicos, como a piora da qualidade de vida, alterações de sono, alterações cognitivas e insatisfações sexuais. No Brasil, a doença prevalece em 2,5% da população geral, predomina no sexo feminino e entre 35 e 44 anos. (8)

A medicina da dor tem se mostrado cada vez mais atuante diante dos quadros onde o paciente vive um ciclo entre a vergonha ao queixar-se constantemente e a automedicação de analgésicos simples e opióides, associado à sua problemática, soma-se os efeitos adversos de fármacos utilizados indevidamente. Nesse sentido o tratamento inclui uma tríade com os seguintes personagens: doente, profissionais e sistema de saúde. (6)

O tratamento torna-se desafiador e as medidas não farmacológicas são técnicas não invasivas para o controle da dor, apresentando-se como alternativa viável na abordagem e isso inclui um conjunto de medidas educacionais, físicas, emocionais e comportamentais, possuindo baixo custo, baixo risco de eventos adversos e de fácil aplicação. (12)

Dentre as medidas não farmacológicas, a acupuntura tem se mostrado eficaz como co-analgésico pela capacidade de diminuir a quantidade de fármacos utilizados para o controle da dor. Ela representa uma opção terapêutica, indicada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) aos seus Estados-Membros, podendo ser usada isolada ou de forma integrada com outros recursos terapêuticos. Além do alívio da dor, a Acupuntura é comumente utilizada na Medicina Chinesa (MC) para tratar diversas doenças. (11). Com objetivo de analisar os benefícios oferecidos pela Acupuntura, este trabalho faz uma revisão bibliográfica sobre o seu emprego no tratamento da dor crônica. 

2 METODOLOGIA

Trata-se de uma revisão integrativa da literatura (RIL) com objetivo de analisar entre as publicações qual entendimento em relação à dor crônica com tratamentos não farmacológicos, incluindo a acupuntura nesse manejo. A pergunta que norteou as pesquisas foi: Como tratar o paciente com dor crônica de forma empática e minimizando efeitos colaterais de esquemas terapêuticos medicamentosos? A Acupuntura é efetiva nesse processo? 

Para construção da pesquisa foram utilizados as bases de dados nos periódicos CAPES, GOOGLE ACADÊMICO e BVS (Biblioteca Virtual em Saúde) nos últimos 10 anos, porém alguns títulos do tema acupuntura devido sua origem e aplicação milenar foram analisados e utilizados mesmo fora da faixa de tempo inicialmente estabelecida. Como critérios de inclusão, artigos que nos títulos ou resumos dos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) contivessem as palavras: dor crônica, tratamento alternativo para dor crônica, acupuntura na dor crônica. O período de buscas foi de janeiro a março de 2023. Os critérios de exclusão: artigos que não apresentassem algum dos descritores, os duplicados e que na leitura não correspondem à pergunta deste estudo. Após a seleção dos artigos pertinentes realizou-se a confecção dessa revisão.

 3 RESULTADOS

Foram identificados 16 estudos que relacionaram a dor crônica, qualidade de vida e tratamento. No entanto, a partir da aplicação dos critérios previamente definidos, 12 fizeram parte do escopo desta revisão.

Dentre os estudos selecionados restaram 12 que associaram a dor crônica à qualidade de vida, exercícios físicos, manejo psicológico, medidas não farmacológicas, acupuntura além de abordarem na maioria a importância do acolhimento ao paciente pelo profissional e da empatia com o doente. A dor crônica esteve associada à fibromialgia em diversos estudos onde houve a aplicação atualizada de uso medicamentoso de Cannabis medicinal. Como tratamento não farmacológico houve a utilização de acupuntura, ventosaterapia, ozonioterapia e o método de Isostretching. 

4 DISCUSSÃO

A porta de entrada para acesso à saúde no Brasil é a atenção básica, onde ocorre de forma descentralizada o atendimento ao usuário. Esse sistema tem a intenção de ser a principal via de comunicação do paciente com o serviço de saúde para tratamento e prevenção de suas doenças e agravos. É oportuno salientar que a dor crônica vêm sendo um motivo frequente de procura à UBS, onde os usuários buscam por soluções de suas queixas, porém os estudos e visibilidade desse tema no Brasil precisam ser melhorados. (10)

É importante conceituar que a dor crônica não é um mero prolongamento da dor aguda, sua origem é distinta, havendo a adaptação dos sistemas neuronais e disfunção prolongada do sistema nervoso periférico, sistema nervoso central ou de ambos, podendo durar por meses e até por anos. (10)

A definição da dor crônica é crucial para que o entendimento acerca do assunto se solidifique, exatamente pelo fato de que com o passar dos anos e com as diversas abordagens já realizadas foi possível definir melhor sua implicação clínica e categorizar sua patogênese, assim observamos que a dor crônica inclui os seguintes tipos: inflamatória, estrutural focal e neuropática. Para facilitar o entendimento podemos utilizar como exemplos, a dor relacionada à artrite reumatoide (AR) causada por acometimento primariamente inflamatório; a da osteoartrite (OA) como primariamente relacionada à patologia estrutural anatômica na articulação; e neuropática como na neuropatia diabética.  Assim, a dor de característica central referia-se às localizadas no SNC por lesões cerebrais ou na medula espinhal. Porém com o passar dos anos a definição foi alterada, onde a dor centralizada é definida por qualquer condição de dor que não possa ser explicada por fonte periférica. (5)

A dor crônica generalizada pode ser causada por diversas situações e poderá ser definida como dor centralizada ou dor  no plástica, que nada mais é que o resultado de um processo de sensibilização central devido um determinado acometimento, estando presente em uma parcela dos pacientes com: osteoartrite (OA); artrite reumatóide (AR); espondiloartrite (SpA); artrite psoriática; lúpus eritematoso sistêmico (LES); distúrbios de dor musculoesquelética tradicionalmente considerados como distúrbios de dor musculoesquelética localizados e focais, incluindo dor lombar crônica induzida por trauma (LBP) e dor no pescoço, como após um acidente de veículo automotor (MVA); síndrome de dor regional complexa (CRPS); síndrome de hipermobilidade articular (SJH); síndrome do túnel carpal; e epicondilite lateral. (5)

A sensibilização central pode ser iniciada por um estímulo que muitas das vezes não é irritante, essa sensibilização é caracterizada pela hiperalgesia e alodinia, seu início e continuação ocorre por alterações do SNC que não está relacionado à gatilho periférico ou estímulo doloroso contínuo. De acordo com essa visão, a dor centralizada foi caracterizada como disfuncional, em contraste com a dor inflamatória, neurogênica ou estrutural, que foram consideradas adaptativas e potencialmente protetoras.  (5)

Todas as características dessa condição despertam a dificuldade na identificação do problema do paciente, onde devido a apresentação variada e diversas etiologias, podem levantar dúvidas em relação ao seu manejo. Mas ainda assim é importante destacar que o diagnóstico é clínico, embora possa ser auxiliado por questionários validados, exame neurofisiológico e estudos de imagem. (4)

A partir dessa análise surge a principal dificuldade em relação a esses pacientes que é o tratamento dessa condição tão desafiadora, principalmente pelo fato de uma maioria estar em idade produtiva e que tem sua vida profissional impactada pela sua condição. Esses usuários muitas vezes fazem utilização crônica de analgésicos em dosagens cada vez maiores ao longo do tempo e com baixas respostas, lembrando que o agravante do uso indiscriminado de medicamentos pode levar a apresentação de efeitos adversos, que vão desde os mais leves como boca seca, sonolência, prisão de ventre, tontura, alergia, dor de estômago, até a morte causada por uma úlcera perfurada ou hemorragia. (10)

Trata-se de um distúrbio multifatorial, durante a análise da literatura é possível observar a orientação de realização de atividade física de no mínimo três vezes por semana por 10 minutos com intensidade moderada, para obtenção de resultados. (10)

Como alternativa não farmacológica de tratamento existe a técnica de acupuntura, que dentre suas aplicações utiliza introdução  de agulhas em pontos específicos dos canais energéticos do indivíduo. Essa técnica estimula uma ampla rede neural periférica e o sistema nervoso central, promovendo um fenômeno de neuromodulação em três níveis – local, espinhal e supra espinhal – ocasionando a liberação de substâncias como como peptídeos opióides (encefalina , endorfina e beta endorfina) e monoaminas (serotonina, norepinefrina, histamina, dopamina), modulando funções motoras, sensoriais, autonômicas, neuroendócrinas e emocionais.(2)

A execução da técnica de acupuntura em várias sessões poderá trazer o efeito cumulativo, explicado pela redução do estímulo nociceptivo ao paciente, o que desencadeia uma melhor mobilização das articulações e membros inferiores, resultando em menor limitação, e isso poderá resultar em controle progressivo da dor. Sessões adicionais de acupuntura podem fortalecer o efeito analgésico inicial. (2)

 5 Considerações finais

A dor crônica é uma doença multifatorial que implica em uma abordagem ampla para resolução de suas consequências. O indivíduo afetado normalmente tem redução da qualidade de vida, com implicações no seu sono, humor, capacidade física, funcionalidade, vida produtiva e emocional. Em virtude disso, muitos estudos associam o transtorno de humor e depressão após a instalação desse problema.

Muitos indivíduos acabam por vezes usando de forma exagerada medicamentos para redução dos sintomas, porém, conforme visto,  além do efeito potencial da droga utilizada, existem os efeitos colaterais que são singulares a cada indivíduo e por isso imprevisíveis após o uso prolongado e principalmente em doses crescentes.

A utilização de terapias não farmacológicas para alívio dos sintomas, vêm ganhando espaço e mostrando resolutividade mediante as muitas queixas do paciente. A acupuntura não utiliza medicamentos e envolve em seu tratamento uma abordagem tanto física quanto emocional do indivíduo, o que parece ser um potencial responsável por suas respostas positivas mediante o problema.

Não há como deixar de mencionar a importância da atividade física para uma resposta concreta, pois sua realização promoverá um equilíbrio  neuro-hormonal, que é uma grande chave para a quebra do ciclo vicioso onde a dor e a inatividade são cada vez mais limitantes.

Temas como este devem ser amplamente estudados e divulgados para que os profissionais que atendem na rede básica de saúde e em todo o sistema, e que assim possam cada vez mais diagnosticar e possuir ferramentas de tratamento eficazes. Para os pacientes a redução do preconceito e do estigma seria um dos melhores ganhos em relação à convivência com a dor crônica.

REFERÊNCIAS

1.ANDRADE, Rodrigo Motta Quinet. Dor crônica na atenção primária – um problema de saúde pública. Disponível em http://hdl.handle.net/1843/VRNS-9SPE3X

2. ASTINI, Rafael; et all. Efeitos da acupuntura no tratamento da dor crônica associada à osteoartrite do quadril. Acta Fisiatr. 2022

3. BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS – PNPIC-SUS / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. – Brasília : Ministério da Saúde, 2006.

4. FILHO, Carlos Gonzaga Melo; et all. A eficácia dos tratamentos para a dor neuropática. Research, Society and Development, v. 11, n. 10, e17111032248, 2022

5. GOLDENBERG, Don L. Visão geral da dor crônica generalizada (centralizada) nas doenças reumáticas. Disponível em: http://uptodate.yabesh.ir/contents/overview-of-chronic-widespread-centralized-pain-in-the-rheumatic-diseases?search=%C3%81LGICO&source=search_result&selectedTitle=5~150&usage_type=default&display_rank=5. março de 2022

6. GOMES, Raquel Cerqueira; Pina, Paulo Reis. O controlo da dor crónica: um indicador de qualidade dos serviços de saúde? MGF & Ciência Volume 6|Nº1 junho 2022

7. LIMA, Kátia dos Santos. “Avaliação da qualidade de vida de portadores de dor crônica tratados com acupuntura.” (2014).

8. OLIVEIRA, Roberto Carvalho, et all. Dor crônica e qualidade de vida: revisão da literatura. Brazilian Journal of Health Review, Curitiba, v. 6, n. 1, p. 4189-4206, jan./feb., 2023

9. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas Dor Crônica Portaria, 2015.

10. SOUZA, Daniele Fernandes da Silva, et all. Dor crônica e nível de atividade física em usuários das unidades básicas de saúde. Rev Bras Ativ Fís Saúde. 2019

11. TROMBOTTO. A acupuntura no tratamento da dor crônica. São Paulo, 2015.

12. ZANETTE, Letícia Fernandes. Medidas não farmacológicas e seus benefícios no alívio da dor crônica: revisão integrativa. Escola De Saúde E Bem-Estar, Porto Alegre, 2022


1Graduanda em Medicina do Centro Universitário São Lucas, Porto Velho, Rondônia, Brasil.
Graduada em Fisioterapia pelo Centro Universitário São Lucas;
Mestrado em Terapia intensiva (SOBRATI)
Pós graduação em Fisioterapia Cardiorrespiratória (AVM)
Pós graduação em Acupuntura pela Faculdade Cuiabá.

2Graduação em Medicina pela Universidade Estadual do Pará (UEPA)
Residência Médica em Clínica Médica pela Santa Casa de Misericórdia do Pará
Residência Médica em Reumatologia pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM)
Pós graduação em Acupuntura pela Faculdade Cuiabá
Preceptora da residência de Clínica Médica do Hospital de Base Ary Pinheiro (HBAP)