REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/pa10202506081946
Leci Maria Soriano Bobsin Corrêa1
RESUMO
O presente trabalho se propõe a apresentar, de forma contextualizada, como a depressão e a doença de Alzheimer podem afetar a qualidade de vida dos idosos, com base em pesquisa bibliográfica e a prospecção de dados feita a partir de plataformas eletrônicas, como artigos científicos disponibilizados pelos sites da SCIELO e do Ministério da Saúde. Para avaliar tal impacto na vida das pessoas que atingem a chamada terceira idade, foi necessário abordar aspectos do Transtorno Depressivo e da Demência do tipo Alzheimer e de como estes podem afetar indivíduos nesta faixa etária, isto é, a partir dos 60 anos. Para analisar como a depressão pode desencadear ou piorar um quadro demencial, se faz indispensável, abordar medidas preventivas e de identificação para a melhoria no bem-estar destes indivíduos, além de formas de tratamento multiprofissional para estes casos. A partir dos dados apresentados, entende-se ser de extrema relevância o entendimento das dificuldades enfrentadas pelas pessoas que chegam nessa etapa do desenvolvimento, assim como a melhoria na qualidade de vida destes.
PALAVRAS CHAVE: 1. Idosos. 2. Envelhecimento. 3. Doença de Alzheimer. 4. Depressão.
ABSTRACT
This paper aims to present, in a contextualized manner, how depression and Alzheimer’s disease can affect the quality of life of older adults. It is based on bibliographic research, in which data were sourced electronically from scientific articles available on the SCIELO platform and the Brazilian Ministry of Health’s website. In examining the impact on quality of life among people who reach old age, it was necessary to address aspects of Depressive Disorder and Alzheimer’s-type Dementia, and how these can affect individuals in this age group, that is, from 60 years of age onwards. To evaluate how depression can trigger or aggravate a case of dementia, it was also essential to discuss preventive and identification measures aimed at improving the quality of life of these individuals, as well as the forms of interdisciplinary treatment available for such cases. Therefore, based on the data provided, it is clear that understanding the challenges faced by people reaching this stage of life is of utmost relevance, as well as improving their well-being.
KEYWORDS: 1. Older adults. 2. Aging. 3. Alzheimer’s disease. 4. Depression.
INTRODUÇÃO
O envelhecimento é uma das fases do desenvolvimento humano, caracterizando-se nos âmbitos social, biológico e psicológico. Mais conhecida como terceira ou melhor idade, esta etapa do desenvolvimento é marcada por mudanças físicas e psicológicas, alterando funções no organismo, bem como suas reações e comportamentos.
De acordo com cada cultura e sociedade, esta fase do desenvolvimento é assinalada pela faixa etária de 60 anos ou mais, quando se inicia uma série de complicações, como dificuldade física, emocional e memória prejudicada.
O processo de envelhecimento no Brasil, assim como em outros países em desenvolvimento, vem ocorrendo em um curto espaço de tempo e de forma gradual (BRASIL, 2000; CARVALHO & GARCIA, 2003). Conforme Garrido & Menezes (2002), em 2025 o país poderá ocupar o 6º lugar quanto ao contingente de idosos, com aproximadamente 32 milhões de pessoas com idade a partir de 60 anos.
Com referência a população idosa no Rio Grande do Sul, o censo de 2010 realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), constatou que das 20 cidades brasileiras com maior concentração de pessoas acima de 60 anos, 18 são do Estado do Rio Grande do Sul, sendo este, o que possui a maior população idosa do Brasil, justificando a importância de estudos desta natureza. Com o aumento da longevidade e da alta incidência de depressão em senis, o Brasil precisará repensar sobre melhores condições de vida para aqueles que chegam nesta fase da vida.
De acordo com Gazalle, Hallal & Lima (2004), a depressão nessa faixa etária, tem sido um dos diagnósticos mais frequentes encontrados nos serviços de psiquiatria para atendimento da população idosa em nosso país, sendo responsável pelo aumento da mortalidade nesta etapa do desenvolvimento humano.
Conforme Correa (1997), os sintomas depressivos podem ocorrer em até 30% dos pacientes com a Doença de Alzheimer; e ainda para Raskind (1998), a coexistência de depressão e demência, principalmente em fases iniciais do processo, tem sido assinalada por diversos estudos. Plati et al (2006) apontam que a depressão de início tardio pode ser um sintoma de demência.
Para Henderson et al (1997), pacientes geriátricos deprimidos frequentemente queixam-se de falhas na memória, podendo ser um início de demência, como o Alzheimer. A partir de estudos recentes, e conforme os autores anteriormente mencionados, a ocorrência de depressão na terceira idade tem sido considerada um possível fator de risco para demência. Para Cummings & Colle (2002), são diversos os fatores de risco para desenvolver este tipo de demência, como idade avançada, histórico familiar e aspectos genéticos, baixa escolaridade, ser do sexo feminino, ser portador de doenças vasculares e histórico de depressão. Entende-se, desta forma, e a partir dos autores citados, que idosos deprimidos que apresentam dificuldade na memória como déficit’s cognitivos, podem ter risco aumentado de evoluir para demência.
Estes mesmos autores enfatizam que, frequentemente, a demência do tipo Alzheimer se manifesta em indivíduos que vivem sob dificuldades e adversidades, como história anterior de quadros depressivos, isolamento familiar, viuvez, situações de vida estressantes, moradia em clínicas ou casas de repouso e pouco suporte social. Ainda, o diagnóstico da demência em idades mais avançadas, pode indicar que a fragilidade e as morbidades são os fatores mais relevantes na etiologia dessa doença (HENDERSON et al, 1997).
De acordo com Oliveira, et al (2012), a prevalência da depressão em pessoas desta natureza no Brasil varia de 4,7% a 36,8% dependendo da gravidade dos sintomas e do instrumento utilizado, sendo considerada um dos transtornos psiquiátricos mais comuns nesta faixa etária, precisando ser monitorada e avaliada constantemente.
Sendo assim, e a partir dos dados apresentados, o problema de pesquisa deste estudo que se pretende abordar é de que forma a depressão e o Alzheimer podem afetar a qualidade de vida dos idosos na terceira idade. O tema em questão tem sido cada vez mais debatido por pesquisadores e estudiosos, a partir de pesquisas que vêm demonstrando o aumento significativo da longevidade.
Entende-se ainda, que segundo as informações apresentadas, este assunto torna-se de extrema importância para a sociedade, como forma de se entender as dificuldades enfrentadas pelas pessoas que chegam nessa etapa do desenvolvimento e como auxiliá-las a lidar com as adversidades que surgem com o avançar da idade. Desta forma, o objetivo do presente estudo é verificar como a depressão e o Alzheimer podem afetar a qualidade de vida dos idosos na terceira idade.
METODOLOGIA
A metodologia do presente estudo caracteriza-se como revisão bibliográfica onde a coleta de dados foi feita por meio eletrônico, mais especificamente pela Internet, em publicações disponibilizadas pelo Ministério da Saúde e pelo site Scientific Eletronic Library Online (SCIELO). As palavras chave utilizadas na busca dos artigos foram depressão em idosos, Alzheimer e demência na terceira idade. Os artigos localizados foram analisados detalhadamente e excluídos os que abordassem especificamente o tema da depressão e qualidade de vida em idosos com Alzheimer.
O assunto terceira idade é considerado relativamente novo, porém, a abordagem da depressão em pessoas senis, bem como das doenças desencadeantes, como o Alzheimer, tem sido debatido por autores a partir das duas últimas décadas, justificando-se, desta forma, a utilização dos artigos para construção deste estudo, a partir dos anos 1990.
Marconi & Lakatos (2011), referem que a pesquisa bibliográfica tem como base o levantamento de toda a bibliografia já divulgada em forma de publicações e livros, com a finalidade de colocar o pesquisador em contato com tudo aquilo que já foi escrito sobre determinado assunto. Desta forma, este tipo de pesquisa caracteriza-se pela leitura e escrita dos assuntos já divulgados e pesquisados, auxiliando pesquisadores para o desenvolvimento de novos estudos.
Os dados coletados para o desenvolvimento deste artigo foram consolidados tendo como base para a organização textual, as regras da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), referidas por Furasté (2011).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Após o levantamento dos dados e a partir dos artigos pesquisados, pode-se avaliar que nesse período do desenvolvimento humano, isto é, na chamada terceira idade, sintomas depressivos são frequentes, alterando significativamente a qualidade de vida dos idosos. A doença de Alzheimer, demência que acomete pessoas nessa faixa etária – a partir dos 60 anos de idade – pode ter como fator desencadeante a depressão, com a ocorrência de déficits cognitivos e problemas relacionados à memória.
Desta forma, faz-se necessária uma análise do reflexo da depressão em indivíduos senis e de uma abordagem sobre a qualidade de vida dos familiares dessas pessoas, bem como das limitações destes que chegam nessa faixa etária e que são acometidos pelo transtorno depressivo, até chegar à demência do tipo Alzheimer. Ainda, quais medidas de prevenção e identificação precoces podem ser adotadas para a depressão senil e os tratamentos possíveis nos casos da doença de Alzheimer.
O reflexo da depressão na terceira idade
Nesta etapa do desenvolvimento, configurada como terceira idade, o idoso costuma fazer uma reflexão de tudo o que fez ou deixou de fazer, pensando nas suas realizações e significados. Cada pessoa vivenciará essa fase de diferentes formas, podendo uns apresentar desesperança e sentimento de que sua vida acabou, restando somente a morte; e outras, poderão passar por essa etapa de forma positiva, isto é, com a sensação de dever cumprido (RABELLO; PASSOS, 2001). Nessa fase da vida é natural acontecerem mudanças físicas, psicológicas, econômicas e sociais, e o idoso inevitavelmente avaliará suas perdas e ganhos.
Zimerman (2000) enfatiza que todo ser humano em qualquer etapa de sua vida pode experimentar sintomas depressivos, porém, em indivíduos idosos, a probabilidade dessa doença é maior, pelo fato de se manifestarem diversas limitações e dificuldades. Para Mckenzie (1999), a depressão na terceira idade tem sido considerada um dos transtornos que mais afeta o idoso, e a família deve estar atenta a mudanças de comportamentos, isolamentos e medos que possam surgir em seu familiar.
Para o autor, o surgimento da depressão nessa fase do desenvolvimento pode aumentar significativamente após a morte de um cônjuge, por exemplo, sendo este, um dos dez acontecimentos mais frequentes e estressantes na vida daqueles que atingem a terceira idade. Ainda, e de acordo com Zimerman (2000), a depressão pode estar associada a algum problema físico, doença ou incapacitação, pelo fato das enfermidades e dores crônicas surgirem justamente nessa fase, somado a distúrbios do sono e/ou apetite.
Michelin, Corrente & Burini (2011) referem que o sintoma psicológico mais frequente em idosos deprimidos é a perda da capacidade de sentir prazer nas coisas, somado a déficits cognitivos, como perda de memória, chamada de anedonia. Nestes casos, é comum os idosos terem sentimento de tristeza, vazio e choro frequente, podendo não haver um motivo aparente.
Segundo Beck et al (1997), velhos deprimidos podem ainda apresentar oscilações de melancolia, raiva, ansiedade, distração, disforia, sentimento de culpa e vergonha, além dos sintomas comportamentais como passividade, evitação e inércia, déficits em habilidades sociais e sintomas fisiológicos, como sexuais.
O diagnóstico tardio da depressão poderá atrapalhar e dificultar o tratamento, pelo fato desta ser considerada complexa devido aos diversos fatores que a compõem. É importante que familiares e pessoas que convivem com idosos estejam atentos aos sintomas e seus comportamentos. Ao ser diagnosticada e tratada com antecedência, mais rápido e eficaz poderá ser o tratamento.
A depressão, conforme Carreira (2011), é um distúrbio de natureza multifatorial da área do humor e/ou afetiva, exercendo forte impacto funcional, envolvendo numerosos aspectos de ordem biológica, psicológica e social, tendo como principais sintomas, o humor deprimido e a perda de interesse em quase todas as atividades anteriormente prazerosas. Atualmente a depressão é considerada a enfermidade mental de maior prevalência a nível mundial e estima-se que, para os próximos anos, será a segunda maior causa de incapacidade.
Com referência a população idosa, frequentemente a depressão é desconsiderada e não tratada (MEDEIROS, 2010). Nessa fase da vida, os sintomas depressivos são permeados por situações e vivências que dizem respeito não somente à doença, mas às oscilações sentimentais próprias da senilidade e ao contexto social assinalado pelas vivências passadas da juventude. Ainda, a incidência de suicídios, está relacionada ao indivíduo idoso tendo a depressão como o pior prognóstico.
O transtorno depressivo no idoso pode manifestar-se por meio de queixas físicas sendo muitas vezes confundido com as doenças clínicas gerais, levando à dependência e à perda de autonomia; porém, é importante ressaltar que a depressão é um distúrbio psicológico e não um problema fisiológico, mas que pode agravar ou desencadear as enfermidades clínicas, levando, muitas vezes, à mortalidade do indivíduo.
Os sintomas depressivos em pessoas senis são frequentemente confundidos com as doenças clínicas gerais, podendo ser entendida como parte normal do envelhecimento, sendo considerada como uma consequência natural e não diagnosticada adequadamente. O idoso deprimido precisa de tratamento adequado, constituindo um desafio para a família e todos que estão ao seu entorno. O tratamento da depressão deverá ter, como finalidade, a redução do sofrimento psíquico, a melhora do seu estado geral, a diminuição do risco de suicídio e a garantia de uma melhor qualidade de vida (MEDEIROS, 2010).
Repercussões da doença de Alzheimer: uma visão da qualidade de vida de idosos e seus familiares
O aumento da expectativa de vida e consequentemente do envelhecimento populacional está relacionado a fatores como, avanços na medicina e melhoria na qualidade de vida, provocando crescimento progressivo de casos de doenças crônico-degenerativas, dentre elas, a demência.
A doença do tipo Alzheimer é a causa mais frequente de demência em todo o mundo, refletindo diretamente na vida de familiares, principalmente pelo aumento da carga de cuidados. O Alzheimer se caracteriza por um quadro demencial progressivo, com comprometimento inicialmente na memória do idoso. A partir daí as funções cognitivas são afetadas e a evolução torna-se lenta, variável e irreversível, finalizando normalmente com um estado vegetativo, num período aproximadamente de 10 a 15 anos (VIZZACHI; DASPETT; CRUZ & HORTA, 2015).
Os sintomas possuem três estágios: a fase inicial, a intermediária e a terminal. A fase inicial caracteriza-se pela dificuldade de linguagem, perda da memória recente, desorientação em tempo e espaço, sinais de depressão, agressividade e perda de interesse em atividades anteriormente prazerosas. Essa etapa dura, em média, de 2 a 4 anos. A fase intermediária apresenta crescente perda de memória e início das alterações na linguagem, raciocínio e ainda dificuldades motoras, podendo variar de 2 a 10 anos (VIZZACHI; DASPETT; CRUZ & HORTA, 2015). A última fase, chamada de terminal, caracteriza-se pela dependência do idoso, normalmente restrito ao leito, pela retenção intestinal, mutismo e posição fetal, sendo esta última, devido às muitas contraturas adquiridas. Todos esses sintomas cognitivos e comportamentais tornam os doentes cada vez mais dependentes de seus familiares, devido à dificuldade na realização das atividades diárias. Para a família, compreender e conviver com um membro que se encontra fisicamente presente, mas mentalmente ausente, é um desafio constante, com alterações na rotina e na qualidade de vida, envolvendo tanto aspectos psicológicos e emocionais, como físicos e sociais (VIZZACHI; DASPETT; CRUZ & HORTA, 2015).
O diagnóstico da doença de Alzheimer é uma ameaça constante à estabilidade da família, pois traz perdas significativas de independência, podendo gerar medo, ansiedade, tristeza e irritação, devido à incerteza do futuro e um possível luto do familiar idoso, além da falta de conhecimento da doença e da dificuldade de aceitação – negação. Para o idoso, precisar depender dos familiares e/ou cuidadores para o desenvolvimento das tarefas que antes eram feitas sem a menor dificuldade, torna-se complexo e de difícil aceitação, principalmente nos primeiros estágios da doença, quando o indivíduo ainda tem consciência de sua vida passada, precisando agora de cuidados contínuos, mudando totalmente seu estilo e qualidade de vida (ILHA et al, 2015).
Com o avançar da demência, uma das dificuldades mais comuns enfrentada pelo senil é o não reconhecimento de familiares, pessoas próximas e locais comuns, como a sua própria casa. Em decorrência dos sintomas da doença, principalmente relacionado ao esquecimento, o indivíduo acaba por colocar-se em situações de risco a sua integridade física e a das demais pessoas que convivem com ele, como sair sozinho sem a percepção dos familiares, autocontrole de medicações, agressividade, dentre outros. Dessa forma, é importante que os familiares e/ou cuidadores conheçam bem os sinais e sintomas do Alzheimer e que saibam compreender e manejar a pessoa idosa, não encarando como verdades as agressões verbais/físicas e o não reconhecimento da pessoa frente aos seus familiares, sendo estes fatores, inerentes ao processo de adoecimento e agravamento da doença (VIZZACHI; DASPETT; CRUZ & HORTA, 2015).
Depressão e Alzheimer: relação e fator desencadeante
Tanto a depressão como o Alzheimer são comuns em idosos. A relação entre elas levanta algumas hipóteses, sendo a primeira, de que a demência – Alzheimer – aumenta o risco ou desencadeia o surgimento da depressão, seja por alterações físicas e orgânicas ou pela própria reação do doente à doença. A segunda, é de que a depressão aumenta o risco da doença de Alzheimer, podendo ser até mesmo uma fase prodrômica desta, surgindo como um sinal do início da deterioração cognitiva. Uma terceira hipótese, ainda sugere que dada a complexidade do transtorno depressivo e do Alzheimer, existe uma relação bidirecional, embora não necessariamente pelos mesmos mecanismos (RAMOS, 2014).
Apesar de ser mais frequente em adultos jovens, a prevalência da depressão aumenta a partir dos 60 anos, afetando funcionalmente o idoso, tanto fisicamente como psicologicamente, além do envolvimento de familiares no processo de adoecimento, podendo se confundir com as demências (RAMOS, 2014).
Muitas vezes o diagnóstico da doença ou do transtorno depressivo poderão ser errados, especialmente se o clínico não estiver consciente das particularidades da sintomatologia do transtorno e do Alzheimer, podendo se confundir. A grande maioria dos estudos e das pesquisas apontam que a depressão de início tardio é um fator de risco para o desenvolvimento de demência, em particular, o Alzheimer. Os mecanismos para este fator de risco devem ser esclarecidos em maior profundidade, mas esta informação poderá ser utilizada pelos clínicos para uma melhoria na qualidade de vida dos idosos e dos familiares envolvidos em todo o processo de adoecimento e envelhecimento do indivíduo idoso (ILHA et al, 2015).
Medidas de prevenção e identificação precoce da depressão e do Alzheimer
De acordo com a Organização Mundial da Saúde, qualidade de vida é um conceito bastante amplo, que incorpora de maneira complexa a saúde física de uma pessoa, seu estado psicológico, nível de dependência, suas relações sociais e crenças, incluindo, ainda, a percepção que o indivíduo tem de sua posição na vida dentro do contexto de sua cultura e do sistema de valores de onde vive. Partindo desse princípio, pode-se entender a qualidade de vida como sendo um conceito subjetivo em que a autopercepção da pessoa é levada em consideração (NERI, 1993).
No caso do idoso, não há um consenso sobre quais os determinantes de um bom envelhecimento, isto é, de um envelhecer com qualidade, sendo um importante fator para isso, a percepção que o próprio idoso tem do seu processo de envelhecimento. Porém, alguns fatores relevantes podem ser considerados quando se fala em qualidade de vida em pessoas senis, podendo inclusive, prevenir transtornos depressivos bem como a degeneração neurológica, que são: a saúde biológica e mental, a satisfação e o contentamento com a vida, a capacidade social e de se relacionar, seja com familiares e/ou amigos, sua produtividade, eficácia cognitiva, renda e status social (NERI, 1993).
O que ocorre é que boa parte dos idosos que vive hoje com Alzheimer no Brasil, não recebe um diagnóstico formal e antecipado. Nos países de alta renda, por exemplo, os casos de demência são reconhecidos e documentados na atenção primária, apenas, entre 20% e 50%. Se fizermos um comparativo com os países de baixa e média renda, certamente este déficit é maior.
Ainda, estudos apontam que cerca de 28 dos 36 milhões de pessoas com demência do tipo Alzheimer, não tenham recebido diagnóstico precoce e, consequentemente, não possuindo acesso a tratamento, cuidados e apoio que poderiam ser proporcionados inicialmente. Um dos motivos para o diagnóstico tardio, explica-se por ser comum confundir os sintomas iniciais da doença de Alzheimer com o envelhecimento natural, tendendo a adiar a busca por orientação profissional (BURNS; ILIFFE, 2009).
A depressão em idosos é sub diagnosticada uma vez que as queixas somáticas são frequentes no processo de envelhecimento normal, principalmente porque as reclamações dos idosos deprimidos normalmente são acentuadas, seja por ansiedades, ou pela própria demência que se aproxima. Vale lembrar sobre as semelhanças nas sintomatologias do Alzheimer e da depressão senil, aumentando ainda mais a dificuldade em precisar os diagnósticos, demandando maior cautela (TRENTINI et al., 2005; SAMUELS et al., 2004).
Entende-se, desta forma, que o diagnóstico precoce à pacientes deprimidos e com Alzheimer é a melhor forma de proporcionar qualidade de vida ao idoso, podendo, ainda, reduzir o trabalho físico da família e dos cuidadores, a tensão psicológica e as restrições sociais e econômicas, além de proporcionar condições mais dignas para os representantes da terceira idade.
Tratamento multiprofissional
Com o aumento da longevidade da população brasileira, há a necessidade de se implementar ações que visem a manutenção da saúde, funcionalidade e qualidade de vida dos indivíduos que atingem a chamada terceira idade.
A ação terapêutica escolhida para o tratamento de pacientes idosos com depressão e Alzheimer deve ser pensada no sentido de que, nessa faixa etária, os indivíduos são frágeis e sensíveis, podendo ter efeitos diversos e adversos. Muitos poderão apresentar complicações clínicas ou descompensação psíquica, aumentando o risco na administração farmacológica, por exemplo. Esse risco pode ser evitado a partir do diagnóstico precoce e preciso.
A atividade física regular pode ser considerada como uma boa alternativa para o tratamento de pessoas senis com transtorno depressivo e doenças demenciais, podendo prevenir o declínio funcional do indivíduo. O exercício físico apresenta contribuições importantes, quando associado ao tratamento psicofarmacológico da depressão, auxiliando na recuperação da autoestima e da autoconfiança do paciente. Porém, é importante averiguar qual tipo de atividade é mais eficiente e qual a melhor intensidade e frequência para promover melhora na saúde dessa população (GUIMARÃES; CALDAS, 2006).
A terapia ocupacional na reabilitação de idosos com comprometimento neurológico, poderá permitir um progresso no estilo de vida a partir da adoção de atividades que promovam a estimulação das habilidades cognitivas, físicas e psicossociais (KUMAR et al., 2014). Várias estratégias não-farmacológicas para os sintomas cognitivos têm sido desenvolvidas para o manejo das demências, sendo a terapia ocupacional, uma delas.
A terapia ocupacional provê intervenções relacionadas à aquisição de identidade ocupacional, autocuidado, produtividade e atividades de lazer, tendo como foco principal, a melhoria na habilidade dos pacientes, a promoção da independência, a redução da sobrecarga do cuidador e, ainda, melhoraria na qualidade de vida do idoso (KUMAR et al., 2014).
Pelo fato da doença de Alzheimer ser um processo degenerativo progressivo, o tratamento fisioterapêutico poderá auxiliar, ainda, nas limitações físicas do paciente, podendo melhorar e estabilizar, mesmo que temporariamente, a evolução da doença, aumentando a qualidade de vida do idoso. A intervenção fisioterapêutica auxiliará as funções vitais do cérebro, estimulando os circuitos neurais, ajudando no planejamento motor e desenvolvendo meios para a realização de determinadas tarefas (ZAIONS; PAVAN; WISNIEWSKI, 2012). Ainda, os exercícios realizados para estimular a memória possibilitam novos processos mentais através de estímulos externos, melhorando significativamente o desempenho nas tarefas cognitivas, podendo, ainda, estimular a capacidade de concentração.
Incluir na rotina de pessoas idosas atividades que promovam o seu bem-estar, como atividades físicas, fisioterapia e terapia ocupacional, são alternativas que tem trazido sucesso na administração do tratamento a pacientes com Alzheimer, além da terapêutica farmacológica muito utilizada.
A possibilidade de autonomia do idoso e a estimulação do pensamento por meio de leituras, jogos, música, dentre outros, são ainda opções para uma melhoria na qualidade de vida de indivíduos nessa faixa etária, proporcionando a recuperação de funções cognitivas, autoestima e melhoria no humor. Além dos benefícios trazidos para a pessoa idosa, a utilização de estratégias terapêuticas poderá diminuir a sobrecarga dos familiares e cuidadores.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O diagnóstico tardio para idosos com demência do tipo Alzheimer, poderá resultar na piora significativa do quadro clínico e, consequentemente, na falta de acesso ao tratamento adequado. Confundir as demências senis com o envelhecimento normal é comum, porém, o resultado poderá ser devastador para indivíduos nessa faixa etária.
A depressão, em contrapartida, pode ser confundida com a doença de Alzheimer, devido as semelhanças nas sintomatologias iniciais, principalmente pelo fato de ser comum depressão e Alzheimer em idosos. A prevalência da depressão em indivíduos que estão nessa etapa do desenvolvimento poderá indicar uma fase prodrômica da doença de Alzheimer, isto é, pré- doença, com sintomas iniciais de deterioração cognitiva, afetando tanto fisicamente como psicologicamente o idoso, sendo importante o diagnóstico precoce.
Proporcionar o bem-estar e a melhoria na qualidade de vida do idoso é primordial para o seu envelhecimento, e, para tanto, faz-se necessário o acompanhamento e tratamento multiprofissional, assim como a inclusão de estratégias terapêuticas, como terapia ocupacional, fisioterapia, atividades que estimulem o pensamento e a memória, além da farmacologia. Proporcionar condições mais dignas aos indivíduos senis torna-se imprescindível em nossa sociedade onde o envelhecimento e o aumento da longevidade tem sido debatido cada vez mais por pesquisadores e estudiosos da área.
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1 Bacharel em Psicologia e Administração de Empresas pela Pontifícia Universidade Católica do RS. Pós-Graduada em Saúde Mental pela UCDB – Universidade Católica Dom Bosco. Pós-Graduada em Psicanálise pela UNISINOS. Formação Psicanalítica pela ABRAFP – Associação Brasileira de Filosofia e Psicanálise. Mestre em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do RS. Atuou como docente das Faculdades Integradas São Judas Tadeu – POA / RS. Psicóloga Clínica no Centro Clínico do Hospital São Miguel Arcanjo – Gramado / RS. E-mail: lecisbc@gmail.com