A CORRELAÇÃO DA MATEMÁTICA COM OS JOGOS INDÍGENAS: PONTOS DE CONVERGÊNCIA INOVADORES PARA O ENSINO NA ALDEIA KATOKINN

THE CORRELATION OF MATHEMATICS WITH INDIGENOUS GAMES: INNOVATIVE CONVERGENCE POINTS FOR TEACHING IN KATOKINN VILLAGE

REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.12862217


Cristina do Nascimento França1
Claudiene dos Santos2


RESUMO

Este artigo surgiu da necessidade de encontrar estratégias que aprimorem o aprendizado dos nossos estudantes. O objetivo principal é conectar os jogos indígenas ao ensino de matemática, uma vez que nossos estudantes estão inseridos na cultura e os jogos são meios que auxiliam na eliminação de obstáculos nos estudos de matemática. A nossa metodologia foi criada a partir de um projeto-piloto na escola na qual o estágio supervisionado foi realizado e que buscou demonstrar a relevância da ludicidade para se trabalhar de forma interdisciplinar o a matemática, conforme o cumprimento da Lei n. 11.645/2008. Observou-se que, durante as aulas, houve um melhor desempenho na aprendizagem e os alunos demonstraram bastante interesse. Desta forma, se justifica o tema que tem por objetivo geral discorrer sobre a correlação da matemática com os jogos indígenas a fim de aprimorar a percepção do aluno para que ele descubra a matemática que está presente em sua aldeia, mais especificamente aquela presente nos jogos indígenas.

Palavras-chave: Jogos indígenas. Matemática. Ensino. Povo Katokinn.

SUMMARYThis article arose from the need to find strategies that improve our students’ learning. The main objective is to connect indigenous games to mathematics teaching, since our students are embedded in the culture and games are means that help eliminate obstacles in mathematics studies. Our methodology was created from a pilot project at the school where the supervised internship was carried out and which sought to demonstrate the relevance of playfulness to work in an interdisciplinary way or mathematics, in accordance with Law no. 11,645/2008. It was observed that, during classes, there was better learning performance and students showed a lot of interest. In this way, the theme is justified, which has the general objective of discussing the correlation of mathematics with indigenous games in order to improve the student’s perception so that they discover the mathematics that is present in their village, more specifically that present in indigenous games.

Keywords: Indigenous games. Mathematics. Teaching. Katokinn people.

INTRODUÇÃO

É importante compreender que as práticas corporais que predominam na cultura indígena são consideradas elementos que têm significados para esses povos, uma vez que representam o contexto social e cultural em que vivem. Os jogos dos povos indígenas foram criados em 1996, por meio de uma iniciativa indígena.

No território brasileiro existem atualmente 225 (duzentas e vinte e cinco) etnias indígenas, segundo o Instituto Socioambiental (ISA), apresentando uma grande diversidade cultural (ISA, 2006, p.7). Compreende-se que cada uma dessas culturas possui uma lógica que rege o seu funcionamento e encontra coerência dentro do próprio sistema cultural. “Cada cultura ordenou a seu modo o mundo que circunscreve e que esta ordenação dá um sentido cultural à aparente confusão das coisas naturais” (LARAIA, 2002, p. 92). Contudo, esta lógica consiste em uma forma de classificação distinta da ciência moderna; enfim, proporciona uma determinada concepção de mundo aos indivíduos.

Compreender o que são os jogos indígenas nos leva a buscar uma definição de sua participação contributiva para o ensino de matemática no nosso país. Partindo-se deste pressuposto, destaca-se aqui a definição adotada por Baldino (1991, p.18) que diz que a Educação Matemática é o “estudo de todos os fatores que influem, direta ou indiretamente, sobre todos os processos de ensino-aprendizagem em Matemática e a atuação sobre estes fatores”. Desta maneira, por meio desta concepção, estudar a matemática presente nos jogos indígenas também é um fazer da educação matemática.

A pesquisa trará um breve histórico dos jogos indígenas, desde a sua criação até os dias atuais e como a matemática pode ser inserida nessa atividade lúdica. Logo em seguida, apresentar-se-á a importância dos jogos tradicionais realizados nas aldeias.

Partindo-se da hipótese que o uso dos jogos indígenas é uma maneira de fomentar a aprendizagem dos alunos indígenas do povo katokinn, sugere-se a sua aplicação nas aulas de matemática com a intenção de sanar as dificuldades que permeiam a aprendizagem e sobretudo proporcionar aos alunos habilidades como tomada de decisões, capacidade de resolver situações-problemas e interagir socialmente.

Na seção seguinte apresentar-se-á a etnomatemática na versão de D’Ambrósio (2007), onde o autor defende uma matemática mais humanizada, respeitando as diferenças culturais, ao passo que apresenta uma nova perspectiva de ensino para esta área de conhecimento.

Por fim, apresentar-se-ão alguns jogos que são realizados na aldeia katokinn e suas contribuições para o ensino da matemática; ou seja, como o docente pode relacionar os conceitos matemáticos presentes nos jogos com o conhecimento secular posto na escola.

Diante do exposto, se considerarmos que a matemática contribui para os jogos indígenas, perceberemos que ela é desenvolvida neste trabalho como parte do saber indígena, permitindo que um indivíduo conheça formas, figuras, objetos, pessoas, animais e árvores, quantificando, relacionando elementos, ordenando, categorizando-os e criando estratégias de ação para solucionar um problema específico.

Dessa forma, a matemática presente nos jogos proporciona a interação entre o docente e o discente em busca do novo e das próprias interpretações pessoais em um ambiente sociocultural e histórico em constante mudança e respeitoso no que tange à cultura indígena.        

1. JOGOS INDÍGENAS – BREVE HISTÓRICO

Os jogos dos povos indígenas são eventos que acontecem na cidade onde a aldeia está. Esses jogos trazem desafios que devem ser superados. A comunicação e a compreensão do significado desses jogos são frequentemente dificultadas por diferenças na linguagem dos saberes ancestrais, no conhecimento técnico do poder público e nas áreas relacionadas ao esporte. Podemos dizer que muito já foi conquistado e paradigmas foram quebrados, os jogos indígenas no Brasil é um evento novo, só foram efetivos a partir de 1996. A partir desse daí, os povos indígenas começaram a ser ouvidos e perdura até os dias de hoje com novidades e melhorias no que tange à área de esportes e educação física. O Comitê Intertribal de Memória e Ciência Indígena tem trabalhado para encontrar um bordão de celebração que não seja meramente competitivo.

Existem várias interpretações sobre esses eventos. Alguns buscam o inusitado, o diferente, enquanto outros enxergam uma perda da autenticidade dos rituais sagrados. Há também aqueles que buscam compreender o significado dos Jogos para os povos indígenas. A chegada dos jogos indígenas à cidade trouxe novas perspectivas tanto para os indígenas quanto para os não indígenas em diversas áreas.

A organização desses jogos envolve a colaboração de diferentes segmentos da sociedade, como o Comitê Intertribal de Memória Indígena, o Poder Público, os povos participantes, os colaboradores responsáveis pela logística, alimentação, saúde, alojamento, mídia, entre outros.

Cada povo tem sua forma de organização, ou seja, um cerimonial, lembrando que nem todos os povos fazem da mesma maneira, alguns usam a cerimônia para acender o fogo sagrado, tradicionalmente, com o atrito de gravetos, e é realizada ao pôr do sol, um dia antes. Esse cerimonial representa a união dos povos originários, lembrando os antepassados quando não estavam em guerra.

No dia seguinte, a tocha será conduzida até a arena, local dos jogos. Tais celebrações duram até uma semana, são apresentados à população elementos da cultura indígena. Também acontece a pajelança que é uma série de rituais que o pajé indígena realiza em certas ocasiões com um objetivo específico de cura ou magia.

As etnias têm uma placa com oseu nome e os participantes chamados de guerreiros e se apresentam com seus adereços, pinturas e vestimentas típicas. As comunidades apresentam danças e cantos durante a concentração e quando pisam no terreiro. Este é um momento muito importante em espiritualidade. Vale ressaltar, que as pessoas que assistem não têm permissão para entrar no terreiro.

2. A IMPORTÂNCIA DOS JOGOS3

Conforme os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN – Matemática (1998), o jogo é uma atividade natural no desenvolvimento dos processos psicológicos básicos, sem necessidade externa ou imposição, embora exija regras e controle. Assim, percebemos que o jogo faz parte da natureza humana e pode ser uma característica sociocultural de um grupo, uma comunidade ou um povo.

Os jogos constituem uma forma interessante de propor problemas, pois permitem que estes sejam apresentados de modo atrativo e favorecem a criatividade na elaboração de estratégias de resolução e busca de soluções. Propicia a simulação de situações-problema que exigem soluções vivas e imediatas, o que estimula o planejamento das ações. (BRASIL, 1998, p.47)

Sabemos que muitos educadores utilizam os jogos matemáticos apenas por mera brincadeira para entreter os alunos, e isso não é o que prega os PCN, os jogos sejam em sala de aula ou fora dela devem ter um propósito voltado para a aprendizagem.

Segundo D’Ambrósio (1994), a Matemática ensinada nas escolas é em grande parte obsoleta, o que resulta em dificuldades no ensino e na aprendizagem dessa disciplina. Ao analisar o ensino dessa disciplina, Silva Neto et.al. (2011) salientam que:

Na escola, essas crianças costumam levar um choque. A matemática que lhes é imposta mais parece “grego”; trata dos mesmos temas, mas despreza as informações que vêm de casa. Os problemas de matemática são apresentados à criança sem a devida preocupação em transpor o conhecimento científico para o cotidiano de vida, ou mesmo, escolar. O resultado não poderia ser outro: o aluno cria aversão à disciplina, não vê utilidade no que é ensinado e, claro, vai apresentar dificuldades. (SILVA NETO, et.al. 2011, p.2)

Percebemos que o ensino dessa disciplina tem diversas dificuldades, sobretudo na compreensão desse importante saber pelos alunos e na formação reflexiva dos professores. Os jogos e brincadeiras podem ser empregados como métodos de ensino alternativos para o aprendizado.

Diante do exposto, percebemos que o ensino da matemática ensinada não tem nada de novo ou atrativo para os nossos alunos. Ele se apresenta arcaico e de modo estritamente tradicional, não induz o aluno a resolver situações-problemas e nem usar seu raciocínio logico, o que tem tornado difícil a aprendizagem. Os professores não conseguem aproveitar o conhecimento prévio que o aluno traz consigo para a escola.

Pressupõe-se que aprender matemática através das correlações feitas dos jogos indígenas com a matemática escolar é uma ação formativa para reorganizar possíveis bloqueios que o aluno tenha, o que o ajuda a resolver problemas, superar desafios, criar soluções, desenvolver a capacidade crítica, a intuição e a criação de estratégias.

3. ETNOMATEMÁTICA: uma perspectiva de ensino

O estudo da Matemática é de grande importância desde os primórdios dos tempos, pois tem servido de instrumento para que o ser humano possa compreender o mundo à sua volta. Assim sendo, este estudo tem sido relevante e inserido nas grades curriculares de qualquer escola do mundo, por percorrer todos os níveis de ensino e por ser necessária no dia a dia da humanidade.

 A matemática deveria ser ensinada de forma equitativa em todas as instituições escolares, todavia, a maioria das escolas não valoriza as culturas e as condições sócio-político-econômicas; bem como o conhecimento prévio de cada aluno.

Na III Conferência Internacional de Educação Matemática realizada em Karlsruhe no ano de 1976 na Alemanha, as discussões foram acerca dos objetivos e metas para a educação matemática, debates acerca da abordagem, da teoria e do porquê ensinar matemática. Reflexões diversas foram discutidas principalmente pelos participantes de países de menor poder econômico, e tecnológico.

Sabe-se que quanto maior forem as dificuldades econômicas e sociais de um país, menor serão as chances da evolução da aprendizagem da matemática para aquela população, visto que, se não houver investimentos financeiros em profissionais da educação, o ensino e a aprendizagem não acontecerão efetivamente.

Com a evolução notória no mundo nasce também a necessidade da mudança no ensino da matemática, durante essas conferências muitas eram as preocupações dos educadores da área, acerca de um currículo único e da pedagogia mandatória para todos os países. Não era valorizado o saber, ou o conhecimento que a criança trazia de casa para a escola, assim como, era desconsiderado o conhecimento de mundo dos povos originários, do pedreiro, da dona de casa, do morador de rua, etc.

Durante a V Conferência que aconteceu na Austrália em 1984, o ápice das discussões foi às preocupações acerca da matemática e sociedade, assim como, sua forma de ser ensinada. Em meio às mudanças na Educação Matemática, D’Ambrósio (1984) propõe uma nova linguagem para a construção do conhecimento com base na sociedade e cultura que o indivíduo está inserido, a partir daí nasce a Etnomatemática.  Ele não é o único a defender a conexão entre a Matemática e a cultura, é considerado o criador e defensor da Etnomatemática.

D’Ambrósio (1994, 2007) defende uma matemática mais humanizada, respeitando as diferenças culturais, raça ou condição social, defende a tese que todos os povos, entre eles os povos indígenas, criam um conhecimento matemático adequando a sua realidade, a partir das suas próprias necessidades e experiências. Essa prática pedagógica estuda o contexto sociocultural dos alunos, valoriza o conhecimento prévio dos mesmos e a experiência pessoal na construção de significados, aproximando o conteúdo matemático da realidade do aluno.

Com o intuito de atender às demandas e exigências sociais do mundo moderno que afetam cada indivíduo, percebe-se que o ensino de Matemática precisa ser atualizado para que o estudante possa lidar com um mundo em constante mudança e contribuir para o aprimoramento das habilidades exigidas em sua vida social e profissional. A teoria de D’Ambrósio (1984) é uma resposta às necessidades de suprir as deficiências curriculares no ensino da Matemática.

A qualidade de uma educação será avaliada pelo conteúdo ensinado pelo professor e assimilado pelo estudante. A escola espera que o aluno adquira e utilize os recursos de comunicação e analise os materiais necessários para exercer todos os direitos e deveres ligados à cidadania.

Ao analisar a contextualização social e cultural, percebe-se que é preciso criar novas maneiras de ensinar Matemática. A Etnomatemática tem como objetivo uma educação renovada, capaz de preparar indivíduos de diferentes culturas e tradições.

4. A ETNOMATEMÁTICA E OS JOGOS INDÍGENAS

No momento atual, percebe-se a necessidade de investigação por parte dos educadores de matemática acerca da aplicação da Etnomatemática no âmbito, principalmente, dos povos originários do Brasil. Neste aspecto, é interessante também compreender as realizações matemáticas passadas e presentes dos povos indígenas brasileiros.

Cabe salientar que a educação escolar indígena, historicamente, foi utilizada como instrumento de controle, catequização e imposição da mudança social e cultural. Contudo, atualmente há um esforço para valorizar e proteger a cultura indígena brasileira, conforme estabelecido pela Lei n° 11.645/2008, que determina o ensino obrigatório da história e cultura afro-brasileira e indígena nas escolas de Ensino Fundamental e Médio, e pelo Decreto n° 6.861/2009, que regula a educação indígena e sua organização em territórios etnoeducacionais.

Bello (1996) argumenta que a Educação Matemática indígena deve levar em conta os aspectos específicos da cultura indígena e sua identidade. Não é viável estabelecer critérios. Para ele

[…] a Educação Matemática indígena deve considerar os aspectos específicos da cultura indígena e sua identidade. Não é possível definir critérios de superioridade entre manifestações culturais decorrentes de realidades específicas. No entanto, o índio precisa entender e saber tudo sobre a sociedade que o envolve (sociedade ocidental) como parte da sua integração na humanidade e do todo até hoje produzido. Essa apropriação de outras formas culturais antes inexistentes no cotidiano indígena justifica-se basicamente pelo contato inevitável. (BELLO, 1996, p. 104)

No Brasil, há uma variedade de etnias, o que resulta em diferentes estilos de vida, princípios, crenças e saberes.

É indiscutível que as origens sociais e culturais de uma pessoa são diferentes e a escola tradicional pode causar a substituição ou alteração da identidade nativa. Sendo assim, o aluno seria forçado a viver uma identidade que não lhe pertence e nem pertence ao meio que ele está inserido.

A tática mais promissora para a educação em sociedades em transição de subordinação para autonomia consiste em resgatar a dignidade de seus membros, reconhecendo e respeitando suas origens. Reconhecer e respeitar as raízes de um ser humano não significa ignorar e rejeitar as de outros, mas, num processo de síntese, reforçar suas próprias raízes (D’AMBRÓSIO, 2007).

É possível fazer transformações no ensino da matemática com uma abordagem educacional inovadora que se concentra na pesquisa da trajetória do aluno e como ela pode ser aplicada para melhorar as habilidades a serem adquiridas na escola. O contexto sociocultural e histórico do estudante deve ser levado em consideração. Seja no ensino de matemática a povos indígenas ou não, a contextualização é essencial. Isso vale para outras disciplinas também.

Os jogos não podem ser meramente pra brincar, os jogos precisam ter um fim específico, como: motivar o raciocínio lógico, estimular o pensamento, a criatividade e a capacidade do aluno para resolver problemas. Na nossa aldeia utilizamos os jogos para fins de melhorar a aprendizagem de forma lúdica. Nosso trabalho em sala de aula está aliado a uma perspectiva de valorização da diversidade cultural. Apresentaremos alguns dos jogos usados na escola a fim de de sanar as dificuldades dos alunos na disciplina de matemática.

4.1 Cabo de guerra

Figura 1 – Mulheres se preparando para a competição do Jogo cabo de guerra.

Fonte: Cacique Daniel Nascimento/ Aldeia Katokinn (2023).

Figura 2 – Mulheres competindo o Jogo cabo de guerra.

Fonte: Cacique Daniel Nascimento/ Aldeia Katokinn (2023).

O jogo cabo de guerra é um jogo pedagógico que ajuda a desenvolver habilidades de atenção, concentração, tempo, força, concentração e lateralidade. Podem participar até 8 pessoas de cada lado, o lado que pisar primeiro na faixa perde o jogo. Lembrando que para crianças menores podemos trabalhar a relação entre números e quantidades.

Relação com os conteúdos matemáticos:

  • Distância: Destaca-se nocálculo da distância em que as duas equipes ficarão uma da outra.
  • Contagem: Presente no cálculo da quantidade de integrantes de cada equipe.
  • Área que será utilizada para o jogo: Vigente no tamanho do espaço que será escolhido para o jogo (cálculo da área a ser utilizada).

4.2 Arco e Flexa

Figura 3 – Indígena Katokinn participando da competição de arco e flecha.

Fonte: Prefeitura Municipal de Pariconha (2023).

O objetivo do jogo é acertar o alvo com a flecha. E Para isso o jogador precisa ter mira nos marcadores de ângulos e força para acertar o alvo. Podemos trabalhar ângulos com alunos do 8º e 9º ano. Os alunos confeccionam os próprios arcos e as flexas.

  • Proporções e Medidas: o comprimento do arco e da flecha deve ser proporcional a estatura do arqueiro e do tipo de tiro desejado.                               
  • Ângulos: o ângulo de curvatura do arco e a forma como a flecha é encaixada e liberada depende de cálculos precisos;
  • Física: a força aplicada ao puxar corda, a resistência do ar e a gravidade influência o vôo da flecha;
  • Proporções: calcular a distância até o alvo e ajustar a força e o ângulo de disparo são fundamentais para a precisão;
  • Pontuação: cálculo da pontuação com base na precisão dos tiros e a posição dos acertos no alvo.
  • Cálculo de tempo e distância: os participantes podem utilizar a matemática para medir o tempo de corrida, a distância percorrida e comparar desempenhos entre diferentes competidores;
  • Geometria: pode ser aplicada para desenhar a pista de corrida e determinar a área do espaço utilizado para o evento;
  • Probabilidade: pode-se utilizar para promover resultados de competições futuras com base em desempenhos desejados.

4.3 Corrida do Maracá

 Figura 4 – Indígena participando da corrida do Maracá.

Fonte: Letícia Valentin (2021).

Corrida de Maracá, uma modalidade que é usada em jogos e gincanas indígenas. Além de proporcionar lazer e interação, promove a transmissão da cultura de gerações. O jogo funciona da seguinte maneira: os jogadores fazem duas filas com 30 metros de distância de uma para a outra; já enfileirados os participantes pegam o maracá e correm para passar para o próximo, quem completar primeiro o circuito vence o jogo, para isso o jogador precisa ter bom condicionamento físico e ser rápido. Na sala de aula podemos trabalhar tempo, velocidade e distância nas aulas de matemática.

  • Cálculo de tempo e distância: os participantes podem utilizar a matemática para medir o tempo de corrida, a distância percorrida e comaprar desempenhos entre diferentes competidores;
  • Geometria: pode ser aplicada para desenhar a pista de corrida e determinar a área do espaço utilizado para o evento;
  • Probabilidade: pode-se utilizar para prever resultados de corridas futuras com base em desempenhos desejados.

4.4 Corrida do Pote

Figura 5 – Indígena participando da corrida do pote.

Fonte: Letícia Valentin (2021).

A corrida do pote também exige esforço físico dos participantes, funciona assim: mulheres com potes na cabeça e cheios de água irão correr de um determinado lugar a outro, sem deixar o pote cair. Essa é um dos jogos mais antigos aqui na aldeia Katokinn. Na sala de aula podemos trabalhar com nossos alunos, distância, peso e volume.

  • Medidas de capacidade e de massa: calcular a capacidade dos potes e o peso da água que está sendo transportada;
  • Velocidade e tempo: medir a velocidade dos participantes e o tempo que levam para completar a corrida;
  • Medidas de comprimento: determinar a distância exata da corrida e os pontos de referência ao longo do percurso.

Diante do exposto, os docentes necessitam ficar atentos quanto à aplicação dos jogos indígenas em sala de aula, visto que como os seus alunos os presenciam, torna-se mais fácil compreender a relação existente da matemática destes jogos com àquela ministrada em sala de aula conforme  os documentos oficiais. Dito isto, o uso em sala de aula de algo trazido da realidade social do discente, é um fator instingante para o processo de ensino e de aprendizagem.

Considerações Finais

A aprendizagem de matemática através de jogos indígenas é uma forma eficaz de reestruturar o ensino de matemática no que tange, principalmente, à recomposição da aprendizagem, pois facilita a compreensão de conceitos, compreendendo a solução de problemas de forma correta. Assim, o aluno que compreende bem o significado e as aplicações da matemática no seu meio social, apresenta uma evolução na sua habilidade de resolver situações-problema, apresentar soluções, exercer o seu direito de crítica, a sua intuição e apresenta ascensão no processo de elaboração de estratégias.

Destaque-se também que a compreensão do conhecimento matemático presente na cultura indígena possibilita ao estudante indígena uma interação interpessoal mais acentuada, tornando-o mais capaz para exercer o seu direito à cidadania cumprindo o seu dever e cobrando os seus direitos.

Ao realizar esta pesquisa, foi possível perceber a importância de correlacionar a matemática presente nos jogos indígenas com àquela vista em sala de aula. É evidente que existem diversos obstáculos para diagnosticar a matemática que está presente na cultura indígena, em especial, nos jogos. No entanto, todo trabalho é válido quando se trata de promover um aprendizado no qual o aluno pode atribuir um significado.

Diante do exposto, foi possível perceber que o jogo indígena intitulado cabo de guerra pode ser trabalho associando-o com diversos conteúdos matemáticos, como, por exemplo, distância, contagem e área. No uso da distância, o conteúdo trabalhado seria o de unidades de medidas de comprimento. Para contagem dos integrantes de cada equipe do jogo utilizar-se-ia os números naturais e para calcular o espaço necessário para a execução do jogo, o cálculo de áreas de figuras geométricas planas; neste caso, a área do retângulo.

Ainda como resultado perceptível neste estudo outro jogo indígena a ser destacado é o arco e flecha. Nele pode-se trabalhar a matemática em diversos conteúdos, por exemplo: nas proporções, pois os comprimentos do arco e da flecha devem ser proporcionais à estatura do arqueiro e do tipo de tiro desejado, nos ângulos onde o ângulo de curvatura do arco e a forma como a flecha é encaixada e liberada dependem de estimativas precisas e na resolução de expressões numéricas simples para o cálculo da pontuação com base na precisão dos tiros e na posição dos acertos no alvo.

Outra modalidade esportiva a ser aqui destacada é a corrida do maracá. Pode-se observar que é possível trabalhar com o cálculo de tempo e distância. Na oportunidade, os participantes podem utilizar a matemática para medir o tempo de corrida, a distância percorrida e também comparar desempenhos entre diferentes competidores. Outro conteúdo matemático lícito para ser lecionado por meio deste jogo é a geometria que pode ser aplicada para desenhar a pista de corrida e determinar a área do espaço utilizado para o evento.

Percebeu-se também que o jogo a corrida do pote é factível de uso nas aulas de matemática, principalmente no trato sobre medidas de capacidade e de massa, onde é possível calcular a capacidade dos potes e o volume da água que está sendo transportada. Em ato contínuo, as habilidades relacionadas a velocidade e tempo também podem ser tratadas ao medir-se a velocidade dos participantes e calcular-se o tempo que levam para completar a corrida. Outro tipo de medidas a ser salientado em aula é a de comprimento presente ao determinar-se a distância exata da corrida e na demarcação dos pontos de referência ao longo do percurso.

Depreende-se que é necessário que o docente fique atento às necessidades dos alunos no que compete à aprendizagem, pois o foco neste aspecto é importante para o desenvolvimento de uma consciência de ensino que valorize os indígenas e suas raízes culturais.

Outrossim, apesar das políticas de incentivo à criação de materiais didáticos e pedagógicos e o encorajamento para o uso de diferentes tipos de metodologias de ensino em formações continuadas de professores, a relação entre a matemática secular e à que está presente nos meios sociais e/ou culturais ainda é tratada com escassez, principalmente quando se refere à temáticas indígenas.


3Trata-se aqui da importância dos jogos de forma geral como preconiza os PCN; porém, destacamos neste artigo os jogos indígenas e sua correlação com a matemática.

Referências

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BELLO, S. E L. A pesquisa em etnomatemática e a educação indígena. Zetetiké,        Campinas/SP, v. 4, n. 6, p. 97-106, jul/dez. 1996.

BRANDÃO, C. R. O que é educação. 54 p. Ano desconhecido. Disponível em: <http://s3.amazonaws.com/academia.edu.documents/35209717/O_que_e_a_educacao_Carlos_Rodrigues_Brandao.pdf . Acesso em abril de 2024.

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BRASIL. Congresso. Senado. Lei nº 11.645, de 2008. Coleção de Leis da República Federativa do Brasil, Brasília, DF: Ministério da Educação e Cultura, março/abr. 2008.

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LARAIA, R. B. Cultura: um conceito antropológico. 15. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2002.

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1Graduanda em Licenciatura em Matemática – UNEAL.
2Mestra em Ensino de Ciências e Matemática – UFS. Professora Auxiliar – CLIND/UNEAL.