A CONSTRUÇÃO DA CULTURA DE SEGURANÇA NA REDUÇÃO DE ACIDENTES DE TRABALHO

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cs10202408241420


Kamilla Felix dos Santos1
Nicole de Oliveira Malta2
Ma. Grasiela Aparecida Coura Querobino Alvarenga3


RESUMO

A criação e disseminação de uma cultura de segurança na redução de acidentes de trabalho representam iniciativas necessárias nos diversos contextos da produção, principalmente em setores nos quais é maior a incidência de ocorrências, como exemplo da construção civil. O presente trabalho teve como objetivo geral identificar a importância da promoção da cultura de saúde e segurança e a aplicação destes conhecimentos no dia a dia da construção civil. A pesquisa é descritiva, de caráter qualitativo, documental e bibliográfica. Os índices alarmantes apresentados, indicados por meio de dados oficiais, carecem da promoção de uma cultura de segurança eficaz é essencial para reduzir esses acidentes e deve ser promovida por meio de treinamentos, capacitações e conscientização contínua de todos os envolvidos. A implementação de práticas preventivas e o compromisso de todos os níveis hierárquicos são fundamentais. Além disso, a segurança deve ser integrada à cultura organizacional geral da empresa, envolvendo práticas que evoluem com as interações dos membros da organização. A adoção de medidas preventivas, como a correta utilização de equipamentos de proteção individual e coletiva, o planejamento adequado das atividades e a eliminação de riscos são essenciais. A segurança representa um investimento estratégico, com a participação ativa dos envolvidos nos processos, sendo esse público interno e externo. A transformação da cultura de segurança exige comprometimento contínuo e a integração de valores e normas de segurança em todas as práticas organizacionais.

Palavras-chave: Segurança no Trabalho. Cultura. Construção Civil.

ABSTRACT

The creation and dissemination of a safety culture to reduce workplace accidents represent necessary initiatives in various production contexts, especially in sectors where the incidence of accidents is higher, such as the construction industry. The general objective of this study was to identify the importance of promoting a health and safety culture and applying this knowledge in the day-to-day operations of the construction industry. The research is descriptive, qualitative, documentary and bibliographic. The alarming rates presented, indicated by official data, lack the promotion of an effective safety culture, which is essential to reduce these accidents and must be promoted through training, qualifications and ongoing awareness of all those involved. The implementation of preventive practices and the commitment of all hierarchical levels are essential. In addition, safety must be integrated into the general organizational culture of the company, involving practices that evolve with the interactions of the members of the organization. The adoption of preventive measures, such as the correct use of individual and collective protective equipment, adequate planning of activities and the elimination of risks are essential. Safety represents a strategic investment, with the active participation of those involved in the processes, both internal and external audiences. Transforming the safety culture requires ongoing commitment and the integration of safety values ​​and standards into all organizational practices.

Keywords: Occupational Safety. Culture. Civil Construction.

1. INTRODUÇÃO

A indústria da construção é responsável pela geração de milhares de empregos e participa de forma significativa no Produto Interno Bruto (PIB) nacional (CBIC, 2021). Apesar das grandes contribuições à economia do país, há um índice lamentável que está presente nesse setor: o elevado número de acidentes e doenças do trabalho decorrentes das atividades da construção.

Um fator que contribui para essa notoriedade negativa em relação a saúde e segurança dos trabalhadores da área, infelizmente ainda continua sendo a negligência quanto a aplicação das normas regulamentadoras (NRs) pelas organizações (Filgueiras et al., 2015). O maior índice de acidentes, na construção civil, é em decorrência da queda de altura. Provavelmente, a causa fundamental, é, principalmente, o não seguimento das normas existentes. Esse foi o motivo principal para o estudo em questão, além de aprimorar os conhecimentos adquiridos no curso e sua aplicação de forma prática, tendo como enfoque principal, a implementação de uma cultura de segurança.

Recomenda-se o estabelecimento de uma cultura de segurança dentro das organizações, iniciando com o treinamento, capacitação e conscientização de todos os envolvidos nas atividades, avaliando e identificando os principais fatores de riscos, definindo ações a serem implementadas, com a participação e comprometimento de todos, para que as medidas preventivas possam evitar e reduzir os acidentes de trabalho. Uma cultura de segurança bem implementada pode contribuir para o sucesso e o bom desempenho da organização.

Dal’Igna (2019) afirma que uma cultura organizacional que prioriza a segurança no trabalho faz com que todos se sintam responsáveis por ela, atuando proativamente para identificar e corrigir comportamentos e condições de risco. A cultura de segurança envolve aspectos ambientais, pessoais e comportamentais, além do simples cumprimento das obrigações normativas em Saúde e Segurança. Isso requer um compromisso contínuo com práticas que promovam um ambiente de trabalho seguro e saudável.

Na busca por criar uma cultura de segurança e saúde no canteiro de obras, dá-se ênfase na realização de treinamentos e capacitações, que são fundamentais para garantir que os funcionários conheçam os procedimentos de segurança adequados às suas atividades, equipamentos de proteção individual e coletiva a serem empregados, dentre diversos outros aspectos (Peinado, 2019). Pergunta-se: qual a importância do desenvolvimento e efetivação de uma cultura de segurança no âmbito da construção civil?

A partir dos dados coletados no MTE de 2021 sobre o elevado número de acidentes no setor da construção civil, elabora-se a hipótese de que a implantação e promoção de uma cultura de saúde e segurança dentro do setor pode vir a trazer contribuições significativas para a redução desse cenário. 

O objetivo geral deste trabalho é identificar a importância da promoção da cultura de saúde e segurança e a aplicação destes conhecimentos no dia a dia da construção civil. Os objetivos específicos são abordar as normas regulamentadoras inerentes ao trabalho da construção civil, indicar os dados qualitativos relacionados aos acidentes de trabalho no setor no ano de 2021 e apresentar os conceitos de cultura de saúde e segurança no âmbito das atividades laborais, destacando a necessidade da proteção contra quedas.

2. METODOLOGIA

O presente estudo utilizou o método de pesquisa descritiva, de caráter qualitativo, sendo uma pesquisa documental e bibliográfica, baseada em estudos e nas normas regulamentadoras, que estabelecem os requisitos e as medidas de prevenção na Construção Civil.  Os critérios de inclusão das publicações levaram em consideração o período de publicação, entre 2014 e 2024, bem como a pertinência ao tema proposto e o idioma, português ou inglês. Não foram utilizados trabalhos publicados parcialmente e trabalhos de graduação.

Os dados quantitativos dos acidentes de trabalho na construção civil contaram com os levantamentos a partir das diversas categorias de atividade que formam as classificações das atividades econômicas (CNAE) que compõem o setor, a saber:

Quadro 1 – Classificação Nacional das Atividades Econômicas – Setor da Construção Civil

ATIVIDADECNAE
Aplicação de revestimentos e de resinas em interiores e exteriores4330-4/05
Construção de edifícios 4120-4/00
Construção de estações e redes de distribuição de energia elétrica4221-9/02
Construção de obras de arte especiais4212-0/00
Construção de redes de abastecimento de água, coleta de esgoto e construções correlatas4222
Construção de rodovias e ferrovias4211-1/01
Instalação de portas, janelas, tetos, divisórias e armários embutidos de qualquer material4330-4/02
Instalação e manutenção elétrica4321-5/00
Montagem de estruturas metálicas 4292
Obras de acabamento em gesso e estuque4330-4/03
Obras de engenharia civil não especificadas anteriormente4299
Obras de terraplenagem4313
Obras de urbanização4213-8/00
Obras portuárias, marítimas e fluviais4291-0/00

Fonte: As autoras (2024)

Tais códigos foram obtidos a partir de pesquisa no portal do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2024). A partir da identificação das atividades relacionadas à construção civil listadas no Anuário Estatístico de Acidentes de Trabalho (Brasil, 2023), foram listados os respectivos códigos e submetidos à pesquisa no portal do IBGE.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 CULTURA ORGANIZACIONAL E CULTURA DE SEGURANÇA

3.1.1 Cultura Organizacional: aspectos conceituais

As empresas reagem aos desafios ambientais de acordo com o seu processo cultural, utilizando os recursos disponíveis conforme a sua cultura. Para aproveitar as oportunidades e enfrentar as ameaças, a empresa precisa desenvolver uma expertise que minimize os riscos e otimize os recursos. Isso exige o desenvolvimento de conhecimentos, habilidades e atitudes, ou seja, competências. A cultura é a base para a formação de competências. Portanto, as empresas devem investir no desenvolvimento de culturas específicas e gerais. Embora isso possa parecer elitista, a cultura é fundamental. A cultura geral e a cultura específica do ramo de atuação de uma empresa devem ser disseminadas entre funcionários, fornecedores e acionistas. As ações estratégicas bem-sucedidas se baseiam em conhecimentos diversos e específicos a cada tipo de negócio (Perez; Cobra, 2017).

A Cultura Organizacional é a identidade de uma empresa, formada pelos valores, crenças e comportamentos compartilhados por seus colaboradores (Madruga, 2023). Nesse sentido, discute-se a importância da cultura organizacional, considerando sua influência nas demais variáveis que envolvem as organizações, como a segurança.

A cultura organizacional se distingue do clima organizacional. O clima organizacional refere-se à percepção dos integrantes da organização sobre o ambiente de trabalho, podendo ser observado e medido de maneira mais direta do que a cultura organizacional. Assim, a cultura organizacional compreende um conjunto de valores, crenças e comportamentos compartilhados pelos membros da organização. Vai além do que é visível, como a arquitetura ou a disposição dos escritórios, abrangendo também os pressupostos básicos que influenciam o comportamento dos integrantes. A cultura organizacional envolve tradições, eventos e costumes estabelecidos, que formam padrões de relacionamento e resolução de problemas dentro da organização, além de incluir regras e diretrizes que orientam o comportamento dos membros (Rothman, 2017).

Um aspecto significativo dentro da cultura organizacional é o desenho de trabalho. Conforme Parker (2014), este conceito abrange um conjunto de tarefas designadas a um funcionário. Com base nessa definição, o desenho de trabalho refere-se à forma como essas tarefas são estruturadas e organizadas. O termo desenho de trabalho evoluiu para incluir a relevância do trabalho em equipe, incorporando tanto o conteúdo e a organização das tarefas quanto as interações entre os trabalhadores. Assim, o desenho de trabalho trata do conteúdo, da organização das atividades, das tarefas, dos relacionamentos e das responsabilidades no ambiente de trabalho.

A cultura organizacional diz respeito à percepção dos funcionários a respeito das características culturais da empresa. Trata-se de um sistema de valores compartilhados pelos membros que distingue uma organização das outras, um conjunto de características essenciais que a organização valoriza. Já a cultura de segurança se caracteriza por ser um estágio avançado no qual esta cultura volta-se à prevenção de acidentes (Dal’Igna, 2019).

3.1.2 A cultura de segurança nas organizações

As abordagens voltadas à cultura organizacional devem pautar-se pela heterogeneidade, diante da variedade de demandas surgidas. Nesse sentido, evidencia-se a importância da segurança no trabalho que, entre outros aspectos, pode ter como fundamento a cultura de segurança. Dal’Igna (2019) destaca a importância da cultura de segurança, diante das dificuldades de se promover as medidas efetivas de proteção à saúde e segurança do trabalhador num cenário no qual estas ações não sejam devidamente sistematizadas.

Pode-se, no entanto, verificar a escassez de estudos relacionados à cultura de segurança nas organizações, observando, inclusive, tratar-se de um dos temas que devem integrar as políticas e práticas no contexto dos recursos humanos. Nesse sentido, Demo (2014) observa a carência de estudos na literatura que abordam políticas e práticas de Recursos Humanos de modo geral. A maioria das publicações existentes concentra-se na necessidade de implementação de um modelo político de RH, na adoção de novas práticas de RH e na responsabilidade social empresarial.

No entanto, uma análise com maior detalhamento mostra que certas políticas, como a de treinamento e desenvolvimento de pessoas, têm sido mais exploradas em pesquisas do que outras, como recrutamento e seleção, condições de trabalho, remuneração e recompensas. Todas essas políticas estão fortemente interligadas e influenciam significativamente as oportunidades de aprendizagem, evidenciando importantes lacunas para investigações futuras (Demo, 2014).

Demo, Fogaça e Costa (2018) destacaram a presença dessa lacuna na literatura e encorajaram novas investigações que examinem as conexões entre políticas de RH e outras variáveis ainda pouco exploradas. Eles enfatizaram que esse entendimento é essencial para o progresso da área de RH e para o reconhecimento de seu papel estratégico nas organizações.

Existe um interesse crescente na pesquisa sobre cultura de segurança. Todavia, devido à sua complexidade, não há um consenso claro sobre sua definição, causas, consequências ou indicadores. Dentro desse campo de pesquisa, podem ser diferenciados dois aspectos, que são a cultura de segurança organizacional, que adota uma abordagem mais teórica, e a cultura de segurança voltada para cuidados de saúde e pacientes, que possui uma ênfase mais prática (Bautista-Bernal; Quintana-García; Marchante-Lara, 2024).

A cultura de segurança é necessária em todas as organizações, especialmente à medida que a complexidade organizacional aumenta, tornando-se essencial na prevenção de acidentes. Nesse contexto, as atividades voltadas à promoção da Segurança do Trabalho são necessárias para a produtividade e moral dos colaboradores, envolvendo medidas técnicas, educacionais, médicas e psicológicas que visam eliminar condições inseguras no ambiente de trabalho e orientar sobre práticas preventivas. O conceito de cultura de segurança surgiu em 1988, no relatório técnico do International Nuclear Safety Advisory Group (INSAG), que analisou o acidente de Chernobyl, revelando uma fraca cultura de segurança na usina nuclear e na indústria soviética em geral (Dal’Igna, 2019).

A cultura de segurança representa um importante argumento para introduzir uma ampla variedade de questões que não se encaixam facilmente em muitos modelos de redução, gerenciamento ou governança de risco, sejam eles vigentes ou em desenvolvimento. Esse conceito deu voz à questão da variância, à filosofia de “é assim que fazemos negócios aqui” e aos níveis irredutíveis de variação quando confrontados com o amplo espectro de organizações na sociedade atual. Organizações de alto risco constituem um subconjunto e compartilham características com grandes burocracias técnicas ou grandes sistemas sociotécnicos (Bourrier, 2018).

No entanto, a cultura de segurança é amplamente um conceito após o fato. Ao ler relatórios de investigação após um acidente, é comum serem encontrados parágrafos enfatizando a falta de cultura de segurança, comentando sobre sua ruptura, ou a respeito da silencia ou inatividade desta cultura. Apesar disso, o conceito possui algum mérito, mesmo que fosse pouco palpável esperar um escopo tão amplo de serviços de um único conceito.  Uma maneira de superar as limitações frequentemente expressas sobre o conceito é passar de cultura de segurança, como um conjunto de normas e programas, para culturas para segurança, como um conjunto de práticas. Mais do que uma mera reviravolta de vocabulário, essa expressão pode oferecer espaço para abraçar uma diversidade de modelos, respostas e opções viáveis no terreno e discutíveis na prática e na teoria (Bourrier, 2018).

Conforme Naji et al. (2021), o desempenho de segurança, como o resultado global das políticas de prevenção de acidentes de trabalho em uma empresa, pode ser conceituado por seis fatores, que são o equipamento de segurança, medidas de segurança, gestão de segurança, estatísticas de investigação de acidentes, treinamento de segurança e organização de segurança. Os modelos de desempenho de segurança envolvem elementos, determinantes e históricos de desempenho. 

O histórico de desempenho é determinado nos níveis individual e organizacional. O nível individual inclui funções de desempenho, habilidade, experiência e personalidade. O nível organizacional inclui a atmosfera de uma organização, que atribui significado aos indivíduos e valoriza as características do ambiente de trabalho. Existem três elementos de sucesso, que são conscientização, capacidade e motivação. Os componentes de desempenho definem os comportamentos reais das pessoas no trabalho, como conformidade com o desempenho de saúde e segurança (Naji et al., 2021).

Diversos estudos ressaltam a importância de avaliar a cultura de segurança nas organizações, levando em conta aspectos técnicos, gestão, conscientização e responsabilidade individual e coletiva. No período de 1986 a 2000, diferentes modelos influenciaram a teoria, a pesquisa e a prática da cultura de segurança, sendo utilizados por pesquisadores, reguladores e indústrias. Cada modelo oferece uma estrutura para compreender e abordar a cultura de segurança nas organizações (Cooper, 2018).

Outro aspecto são os fatores comportamentais que descrevem o que os indivíduos realmente fazem na organização em relação à segurança, bem como fatores situacionais, ou seja, as estruturas que caracterizam a organização. Nesse contexto, a importância da liderança e da gestão para a cultura de segurança também é abordada em vários estudos, especialmente o comprometimento da gestão para a segurança (Berglund et al., 2023). 

Wu et al. (2016) fazem uma distinção entre liderança transacional, que está conectada às estruturas de monitoramento e recompensa, e a liderança transformacional focada na inspiração e motivação. A liderança transformacional, em particular, pode ser vista como parte das próprias descrições e definições dos gerentes sobre a cultura de segurança como a maneira como as coisas são executadas e a maneira como os componentes das organizações pensam sobre elas. 

Conforme Berglund et al. (2023), a importância que é colocada na liderança contribui significativamente para a perspectiva normativa sobre a cultura de segurança que é tão prevalente na indústria da construção, ou seja, que o desenvolvimento da cultura de segurança inevitavelmente envolve processos de gestão de cima para baixo em uma determinada organização.

3.2 SEGURANÇA DO TRABALHO NA CONSTRUÇÃO CIVIL: DADOS QUALI-QUANTITATIVOS

Os acidentes de trabalho apresentam-se como um grave problema que envolve os indivíduos, organizações e governos, diante de suas implicações sociais e econômicas. No Brasil ocorre uma quantidade muito grande de acidentes de trabalho, colocando o país como um dos locais que apresenta o maior número de ocorrências. Conforme Fonseca (2024), o Ministério Público do Trabalho (MPT) indica que o Brasil está entre os países mais perigosos do mundo para os trabalhadores. Nos últimos dez anos, o país registrou aproximadamente 6,7 milhões de acidentes de trabalho, com mais de 600 mil ocorrências somente em 2022. Importa destacar que esses números consideram apenas os trabalhadores formais, deixando de fora aqueles sem registro, como estagiários, por exemplo. No cenário global de acidentes de trabalho, o Brasil ocupa a terceira posição, ficando atrás apenas da China e dos Estados Unidos.

No Brasil, entre 2012 e 2021, foram registradas 6,2 milhões de comunicações de acidente de trabalho (CAT). Durante esse período de 10 anos, 22.954 pessoas perderam a vida em decorrência de acidentes de trabalho. Somente em 2021, foram comunicados 571,8 mil acidentes e 2.487 mortes relacionadas ao trabalho, representando um aumento de 30% em comparação com 2020 (Malta et al., 2023).  Alguns setores da economia são mais predisponentes à ocorrência de acidentes de trabalho, sendo que esta realidade deve ser considerada tanto para o desenvolvimento de ações locais de prevenção quanto para a elaboração de políticas públicas de proteção ao trabalhador.

Na Tabela 2 podem ser observados os dez setores que, no ano de 2021, apresentaram maior número de acidentes de trabalho. Foram considerados os acidentes típicos, de trajeto e doenças ocupacionais, bem como os casos com e sem Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT) registrada:

As atividades de atendimento hospitalar foram as que apresentaram maior quantidade de ocorrências, sugerindo a relação destas ocorrências com a pandemia do Covid-19. Outros setores também apresentaram um elevado número de acidentes de trabalho, como o comércio varejista, a administração pública em geral, o transporte de cargas, os frigoríficos e a construção de edifícios, objeto de análise da presente pesquisa.

A construção civil possui variadas áreas de atuação, com uma significativa heterogeneidade quanto às atividades exercidas, cujas classificações envolvem os diversos tipos de construção, obras de urbanização, montagens e instalações. Nesse sentido, destaca-se que a abrangência do setor e os riscos intrínsecos ao trabalho cotidiano o tornam mais suscetível à ocorrência de acidentes de trabalho. Os dados a seguir apresentam o quantitativo de acidentes de trabalho entre algumas das ocupações que integram a indústria da construção civil (Tabela 2):

Tabela 2 – Acidentes de trabalho – Ocupações específicas da construção civil

PERÍODO 2018-2019PERÍODO 2020-2021
Servente de Obras52.15741.039
Pedreiro35.82128.404
Carpinteiro7.1155.715
Pintor de obras6.3354.936

Fonte: Adaptado de Smartlab (2023)

Observa-se uma redução da quantidade de acidentes, comparando os períodos antes e durante a pandemia, sendo que tal diminuição parece dever-se essencialmente à retração das atividades, no cenário de crise. Muitas atividades foram paralisadas, sendo importante considerar que as estatísticas consideram como acidentes de trabalho também os afastamentos resultantes de adoecimento motivado pela atividade laboral cotidiana. De modo geral, verifica-se que a comparação entre o triênio 2019 a 2021, apresentou a diminuição expressiva dos acidentes profissionais em 2020, em relação ao ano de 2019, mas um aumento também significativo em 2021, com a retomada das atividades.

As obras de instalações em construções não especificadas (CNAE 4299-0) contabilizaram 1.002 acidentes em 2019, 904 em 2020 e 1.472 em 2021. As áreas de obras de infraestrutura (CNAE 4221-9) tiveram 4.044 acidentes em 2019, 3.427 em 2020 e 3.738 em 2021. O setor da construção civil que registra o maior número de acidentes de trabalho é o de construção de edifícios (CNAE 4120-4), com 9.837 acidentes em 2019, 8.516 em 2020 e 10.641 em 2021 (Brasil, 2023). No Gráfico 1 pode ser observada a quantidade de acidentes de trabalho na construção civil entre os anos de 2019 e 2021:

Gráfico 1 – Acidentes de trabalho na construção civil nos anos de 2019, 2020 e 2021

Fonte: Brasil (2023b)

Esses dados alarmantes indicam que o mercado de trabalho necessita cada vez mais de profissionais especializados para implementar procedimentos de segurança e medidas de controle, promover a cultura de prevenção e segurança, reduzir o número de acidentes de trabalho e doenças ocupacionais, além de assegurar o cumprimento da legislação. Isso, por sua vez, diminui o passivo trabalhista das empresas e garante um ambiente saudável e motivador para os trabalhadores (Chirmici; Oliveira, 2016).

Nesse contexto, o trabalho em altura representa um risco significativo em várias profissões críticas para a Saúde e Segurança do Trabalho (SST), como bombeiro, faxineiro, pedreiro, repositor de mercadorias, eletricista, soldador, entre outras. Destaca-se a importância da adoção de medidas preventivas, planejamento das atividades, eliminação ou minimização dos riscos de queda, e a criação de procedimentos operacionais e administrativos (Saraiva, 2023). 

Conforme a NR-35, que aborda o Trabalho em Altura, essa atividade é caracterizada por qualquer trabalho realizado acima de dois metros do nível do chão, onde exista risco de queda. A norma estipula que a execução do trabalho em altura deve ocorrer apenas com a implementação de medidas de proteção coletiva e, que ausentes tais medidas, outras ações de caráter individual devem ser utilizadas. A NR-35 se aplica a todas as atividades que envolvem trabalho em altura, como na construção civil, na manutenção de fachadas de edifícios, na instalação de antenas, entre outras (Ribeiro; Araújo, 2023).

As causas desses acidentes incluem ambientes inseguros, falta de sinalização adequada e de equipamentos de proteção coletiva, além do uso inadequado ou ausência de equipamentos de proteção individual. De acordo com informações do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), aproximadamente 40% dos acidentes no Brasil estão associados a quedas de trabalhadores em altura, ou seja, em diferenças de nível. Acidentes em altura são dos mais fatais e comuns, dado que atividades em alturas elevadas fazem parte de diversos setores industriais (Saraiva, 2023).

3.3 A IMPORTÂNCIA DA CULTURA DE SEGURANÇA NA CONSTRUÇÃO CIVIL

Apesar de ser um processo lento, a implantação de uma cultura de segurança é eficaz na obtenção de resultados positivos e é essencial para o desenvolvimento de uma organização eficiente. Para alcançar esse objetivo, os profissionais do Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT) precisam do apoio e da participação de membros da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA), bombeiros civis (que também atuam na prevenção), gestores e profissionais de todos os níveis hierárquicos da empresa, especialmente os operacionais, que são os principais responsáveis pelo sucesso da segurança e saúde no trabalho (Chirmici; Oliveira, 2016).

A cultura de segurança e o gerenciamento de relacionamentos com funcionários em um clima seguro e socialmente responsável podem ajudar a evitar riscos no local de trabalho e danos à reputação das empresas. A gestão da segurança é composta pelo conjunto de práticas que são desenvolvidas pelas organizações com o objetivo de minimizar os riscos no local de trabalho e, portanto, os acidentes. Para atingir esse propósito, é necessário envolver os trabalhadores, que devem estar cientes da importância da segurança no trabalho e agir de acordo. A cultura de segurança não pode ser dissociada da cultura organizacional geral da empresa e esta última só pode ser concebida como um conceito dinâmico que é gerado por meio das interações entre os diferentes membros da organização (Bautista-Bernal; Quintana-García; Marchante-Lara, 2024). Desse modo, é importante que os trabalhadores estejam diretamente envolvidos em todas as etapas do planejamento e execução das políticas voltadas ao desenvolvimento da cultura de segurança.

Historicamente, ações pragmáticas e normativas em relação à segurança do trabalho têm sido observadas. As transformações no contexto produtivo, seja em termos econômicos, estruturais ou humanos, trouxeram à tona problemas recorrentes de condutas insuficientes para resolver situações adversas nos ambientes de trabalho. Os modelos e abordagens existentes se mostraram incapazes de prevenir e reverter essas condições. As constantes mudanças nos processos de produção, organização e estrutura do trabalho resultam em demandas para os gestores, que afetam diretamente a saúde e segurança dos trabalhadores. Isso evidencia uma insuficiência em evitar ou reverter as adversidades que impactam diretamente os trabalhadores e, indiretamente, a sociedade (Jesus et al., 2024).

A cultura de segurança é uma construção social relativamente estável, formada gradualmente ao longo do tempo dentro de uma organização. Ela é moldada por facilitadores que criam as condições necessárias para que os funcionários adotem valores, suposições e normas associadas à segurança. Esses fatores não definem diretamente a cultura de segurança, mas proporcionam as condições para seu desenvolvimento, sendo classificados em três categorias, que são os fatores organizacionais, os fatores grupais e os fatores individuais (Bisbey et al., 2021). 

Os fatores organizacionais são os elementos que permitem aos funcionários adotar valores, normas e suposições da cultura de segurança, como o comprometimento dos líderes com a prioridade da segurança e a implementação de políticas e recursos de segurança. Os fatores grupais são aspectos que favorecem o desenvolvimento de uma cultura de segurança, como a coesão e a segurança psicológica do grupo. Quanto aos fatores individuais, são pautados pelas características que promovem o desenvolvimento da cultura de segurança ao longo do tempo, como o conhecimento relacionado à segurança, o senso de controle e o comprometimento individual com a segurança (Bisbey et al., 2021).

Um exemplo de fator grupal que pode comprometer a segurança no trabalho na construção civil foi citado por Moterle (2014), referindo-se à ausência de técnicos e engenheiros de segurança nos locais de construção como uma das principais preocupações e que, se identificada, precisa ser resolvida urgentemente. Outro desafio é incentivar os trabalhadores a adotarem práticas de higiene e segurança como hábitos no ambiente de trabalho.

A promoção da segurança do trabalho na construção civil envolve, entre outros aspectos, a estrita atenção às normas regulamentadoras. As principais normas que se aplicam ao trabalho no setor podem ser verificadas no Quadro 2:

Quadro 2 – Normas Regulamentadoras inerentes ao trabalho na construção civil

NORMADESCRIÇÃO
NR 4 – Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e Medicina do Trabalho (SESMT)Estabelece a obrigatoriedade de as empresas constituírem serviços especializados em engenharia de segurança e em medicina do trabalho, visando promover a saúde e proteger a integridade do trabalhador no local de trabalho.
NR 5 – Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA)Institui a formação de uma comissão interna com representantes dos empregados e empregadores, cujo objetivo é identificar riscos e promover ações de prevenção de acidentes e doenças decorrentes do trabalho.
NR 6 – Equipamento de Proteção Individual (EPI)Define as responsabilidades das empresas em fornecer EPIs adequados aos riscos e atividades dos trabalhadores, além de garantir a sua utilização correta para a proteção contra acidentes e doenças ocupacionais.
NR 7 – Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO)Exige a implementação de um programa que visa monitorar a saúde dos trabalhadores, através de exames médicos admissionais, periódicos, de retorno ao trabalho, de mudança de função e demissionais, para detectar precocemente qualquer alteração na saúde do trabalhador.
NR 8 – EdificaçõesEstabelece requisitos técnicos mínimos nas edificações e obras de construção civil, visando garantir a segurança, o conforto e a saúde dos trabalhadores.
NR 9 – Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA)Obriga a elaboração e implementação de um programa que visa antecipar, reconhecer, avaliar e controlar os riscos ambientais existentes ou que possam existir no ambiente de trabalho, protegendo a saúde e a integridade dos trabalhadores.
NR 10 – Instalações e Serviços em EletricidadeDispõe sobre as condições mínimas exigíveis para garantir a segurança dos trabalhadores que interagem direta ou indiretamente com instalações elétricas e serviços com eletricidade na construção civil.
NR 12 – Máquinas e Equipamentos Trata sobre a utilização de máquinas e equipamentos de todos os tipos, estabelecendo requisitos mínimos para garantir a segurança e saúde dos trabalhadores que operam esses dispositivos.
NR 17 – ErgonomiaDiscute as relações entre o trabalhador e as condições de trabalho, visando adaptar o ambiente, as ferramentas e os processos às características psicofisiológicas dos trabalhadores para proporcionar um ambiente de trabalho seguro, confortável e eficiente.
NR 18 – Condições e Meio Ambiente de Trabalho na Indústria da ConstruçãoEstabelece diretrizes administrativas, de planejamento e organização que objetivam a implementação de medidas de controle e sistemas preventivos de segurança nos processos, nas condições e no ambiente de trabalho na indústria da construção.
NR 33 – Trabalho em Espaços ConfinadosDetermina diretrizes para garantir a segurança e a saúde dos trabalhadores que executam atividades em espaços confinados, estabelecendo requisitos mínimos para identificação, avaliação, monitoramento e controle dos riscos.
NR 35 – Trabalho em AlturaEstabelece os requisitos mínimos para a proteção dos trabalhadores que executam atividades acima de dois metros do nível inferior, onde haja risco de queda, garantindo assim a segurança e a saúde dos trabalhadores envolvidos nessas atividades.

Fonte: Metroform (2017)

A promoção do comportamento seguro envolve todas as atividades, sendo um exemplo aquelas que se referem ao trabalho em altura. De acordo com Ribeiro e Araújo (2023), as exigências da NR35 incluem a realização de análise de risco e o planejamento das atividades, a capacitação dos trabalhadores que atuam em altura, o uso de equipamentos de proteção apropriados, a manutenção dos dispositivos de segurança, a sinalização da área de trabalho e a implementação de um sistema de emergência. 

Apesar de inúmeras iniciativas regulatórias para melhorar a saúde e a segurança na indústria da construção, ela ainda é classificada como uma das indústrias mais propensas a acidentes no mundo todo. Um foco dedicado à cultura de segurança foi sugerido como um complemento às leis, regulamentações e sistemas de gestão (Berglund et al., 2023).

Mesmo que o Brasil tenha alcançado uma posição de prestígio ao longo do tempo, ainda está entre os líderes mundiais em acidentes de trabalho, atrás apenas de China, EUA e Rússia. Essa aparente contradição se deve ao constante desenvolvimento em diversas áreas de negócios, como a construção civil e o setor de energias, além do fato de que empresas e trabalhadores ainda não internalizaram plenamente a cultura de segurança e saúde no trabalho (Chirmici; Oliveira, 2016).

Com base na abordagem social e na Gestão de Saúde e Segurança Ocupacional, Bautista-Bernal, Quintana-García e Marchante-Lara (2024) pesquisaram a respeito do impacto da cultura de segurança por meio do desempenho de segurança no desempenho financeiro em organizações. Foram analisadas as informações de um painel de dados de empresas europeias de diferentes setores de atividade de 2005 a 2019. 

Constatou-se que as políticas voltadas para melhorar a saúde e a segurança dos funcionários, treinamento de funcionários ou sistemas de gestão de segurança influenciam positivamente o desempenho de segurança, o que, por sua vez, tem um impacto positivo no desempenho financeiro. O desenvolvimento da cultura de segurança na empresa é necessário para atender às necessidades dos funcionários e, assim, melhorar o desempenho de segurança (Bautista-Bernal; Quintana-García; Marchante-Lara, 2024).

Nesse sentido, Gilbert (2018) compreende que os programas de cultura de segurança são influenciados por uma combinação de fatores interconectados. No centro, estão os stakeholders internos e externos, ou seja, todas as pessoas e grupos que têm um interesse na organização. A base do funcionamento e da efetividade da cultura de segurança representa os fundamentos teóricos que sustentam esses programas e a cultura organizacional, que molda as decisões relacionadas à segurança.

Evidencia-se a correlação entre a cultura de segurança e a cultura organizacional, diante da observação de Aven e Ylönen (2021), de que a cultura organizacional começa a se formar imediatamente quando as pessoas começam a interagir umas com as outras. Os membros observam o comportamento dos colegas e, a partir disso, começam a estabelecer expectativas mútuas sobre o comportamento apropriado. Essas expectativas são internalizadas como normas pelos membros, constituindo os pilares da cultura organizacional. A cultura organizacional exerce um poder coercitivo sobre os indivíduos por meio de expectativas, que são percebidas como pressões sociais, e através de sanções positivas e negativas que influenciam as ações dos membros. 

Os indivíduos possuem a tendência a evitar sanções negativas e a se comportar conforme as normas estabelecidas. Novos membros aprendem tanto as normas quanto às regras formais e informais. Assim como a cultura em geral, a cultura organizacional é vista como um fenômeno relativamente duradouro, que muda lentamente. A cultura é reproduzida, mas às vezes também desafiada nas ações cotidianas dos membros. A cultura organizacional pode facilitar ou restringir o desempenho seguro, permitindo ou suprimindo discussões abertas sobre questões de segurança (Aven e Ylönen, 2021).

Peinado (2019) destaca as particularidades da construção civil quanto aos riscos de acidentes, apontando a falta de participação do executor na fase de projeto da edificação para identificar soluções que promovam maior segurança no trabalho; a ausência de tradição na elaboração de projetos de segurança preventivos; a natureza temporária dos locais de trabalho, que são canteiros de obras; a presença significativa de pequenas empresas no setor; a combinação de métodos industrializados e artesanais; e a alta rotatividade da mão de obra. 

Além disso, as características da construção civil incluem o uso intensivo de mão de obra terceirizada; as mudanças na natureza do serviço conforme a fase da obra; os efeitos do clima que causam atrasos e resultam em horas extras para compensar o tempo perdido; e a não inclusão de custos com segurança e saúde do trabalho nos orçamentos, o que faz com que essas iniciativas recebam recursos mínimos (Peinado, 2019).

Desse modo, as empresas do segmento da construção civil devem buscar a efetivação da cultura de segurança por meio de políticas que possam fazer com que os profissionais compreendam o valor destas iniciativas. Uma apropriação necessária para que ocorra a difusão conceitual e prática da cultura de segurança trata-se do comportamento de segurança, que, conforme Al-Bayati (2021), envolve a conformidade com a segurança, referindo-se às atividades realizadas pelos membros das empresas para manter a segurança no local de trabalho, e a participação na segurança, referindo-se às ações realizadas pelos membros das empresas para promover um ambiente seguro. 

Os modelos atuais de prevenção de acidentes entendem que a segurança e os acidentes são produtos de um sistema complexo, onde diversos fatores interagem entre si. Esses fatores abarcam pressões econômicas, decisões organizacionais e influências culturais. Ao analisar esses elementos, é possível identificar as condições que favorecem a ocorrência de acidentes, oferecendo subsídios para aprimorar a segurança (Read et al., 2021).

Um comportamento de segurança exemplar resulta diretamente de esforços eficazes em educação e implementação de segurança. Esses esforços são frequentemente iniciados pelo pessoal de segurança e financiados pela alta administração. Além disso, alcançar um comportamento de segurança superior no campo requer a cooperação dos trabalhadores e supervisores da linha de frente. Portanto, o comportamento de segurança é uma métrica adequada para validar e compreender melhor o impacto da cultura de segurança proposta e da estrutura do clima organizacional (Al-Bayati, 2021).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A indústria da construção, apesar de sua grande contribuição para o Produto Interno Bruto (PIB) e para a geração de empregos no Brasil, enfrenta um desafio significativo: a alta incidência de acidentes de trabalho, especialmente quedas de altura. A análise dos dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e da Organização Internacional do Trabalho (OIT) revela que a negligência na aplicação das normas regulamentadoras (NRs), particularmente a NR 35, é um fator determinante para essa triste realidade.

A implementação de uma cultura de segurança eficaz é essencial para mudar esse cenário. Essa cultura deve ser promovida através de treinamentos, capacitações e conscientização contínua dos trabalhadores sobre os riscos envolvidos nas atividades de construção. Além disso, é necessário um compromisso firme das empresas em adotar e seguir rigorosamente normas regulamentadoras.

Os resultados do estudo evidenciam que a promoção de uma cultura de segurança pode trazer benefícios significativos não apenas para a redução de acidentes, mas também para a melhoria do desempenho organizacional. A cultura de segurança deve ser entendida como parte integrante da cultura organizacional, influenciando positivamente o comportamento dos trabalhadores e contribuindo para um ambiente de trabalho mais seguro e produtivo.

A literatura revisada demonstra que a cultura de segurança não é apenas um conjunto de normas e políticas, mas um conjunto de práticas e comportamentos que devem ser internalizados por todos os membros da organização. A liderança desempenha um papel essencial nesse processo, sendo responsável por inspirar e motivar os trabalhadores a adotar práticas seguras e a participar ativamente na promoção de um ambiente de trabalho seguro.

A adoção de uma abordagem proativa, onde todos os envolvidos nas atividades da construção civil se sentem responsáveis pela segurança, é fundamental. Isso envolve a identificação e correção de comportamentos e condições de risco, bem como a implementação de medidas preventivas eficazes. A participação ativa dos trabalhadores, juntamente com o apoio e comprometimento da gestão, é essencial para o sucesso dessas iniciativas.

A pesquisa também destaca a importância da avaliação contínua da cultura de segurança nas organizações. Isso inclui a análise de fatores comportamentais, situacionais e organizacionais que influenciam a segurança no local de trabalho. A promoção de uma cultura de segurança robusta requer um esforço colaborativo, onde todos, desde os gestores até os trabalhadores de linha de frente, contribuem para a criação de um ambiente de trabalho seguro.

A promoção de uma cultura de segurança na construção civil é vital para a redução dos acidentes de trabalho e para a criação de um ambiente de trabalho mais saudável e produtivo. As empresas devem investir em treinamentos, capacitações e na conscientização contínua dos trabalhadores, além de adotar e seguir rigorosamente as normas regulamentadoras. Somente através de um compromisso coletivo e de uma abordagem proativa é possível alcançar um ambiente de trabalho seguro e eficiente, beneficiando não apenas os trabalhadores, mas também a produtividade e a competitividade das empresas no setor da construção civil.

Ressalta-se a escassez de publicações a respeito da cultura de segurança em língua portuguesa, o que sugere a realização de pesquisas que envolvam as políticas voltadas à realidade brasileira, de modo geral, e especificamente relacionadas à segurança do trabalho na construção civil. Os objetivos do presente trabalho foram cumpridos em sua totalidade, mesmo diante da limitação imposta pela citada escassez, suprida pela utilização de publicações em inglês.

REFERÊNCIAS

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1Engenheira Civil, pós-graduanda em Engenharia de Segurança do Trabalho. E-mail: kamillafelix@hotmail.com
2Engenheira Civil, pós-graduanda em Engenharia de Segurança do Trabalho. E-mail: nmaltaeng@gmail.com
3Orientadora. Mestra. Professora titular do IFMG. E-mail: grasiela.alvarenga@ifmg.edu.br