A CONCILIAÇÃO NA REFORMA DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL COMO CONDIÇÃO PRÉ-PROCESSUAL NA COMARCA DE BONFIM/MG

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7120805


Autoras:
Grasiele Cristina Parreiras1
Larissa Andreza da Silva2
Orientador:
João Paulo Jucatelli3


RESUMO

O presente artigo buscou examinar os métodos alternativos de solução de conflitos trazidos pelo novo Código de Processo Civil (NCPC). Para tanto, será apresentado um conteúdo expositivo abordando diversas nuances do tema. Primeiramente, analisará as principais técnicas para resolução de lides existentes em nosso ordenamento jurídico. Em um segundo momento, abordará os principais aspectos da Resolução n. 125 do CNJ. Ademais empreendeu-se um estudo bibliográfico em doutrinas, leis, dados secundários e fontes documentais, por referir-se a um procedimento metodológico, cuja finalidade é a exposição dos entendimentos sobre o assunto. Além disso, examinará as mudanças trazidas pelo novo diploma processual no que diz respeito a Conciliação, em especial sua definição e principais características. Por fim, após o desenvolvimento do tema, será abordado as consequências práticas que as mudanças trazidas pelo novo Código irão proporcionar ao andamento das demandas, e se estas serão positivas e de fato atenderão os objetivos visados pela nova legislação processual. E para conferir uma noção exata do que fora exposto, será apresentado um estudo de caso realizado na Comarca de Bonfim/MG sobre o assunto em questão.

Palavras-chave: Métodos alternativos de solução de conflitos; conciliação; autocomposição; novo Código de Processo Civil; Comarca de Bonfim/MG.

ABSTRACT

This article sought to examine the alternative methods of conflict resolution brought by the new Civil Procedure Code (NCPC). To this end, an expository content will be presented addressing various nuances of the theme. First, it will analyze the main techniques for resolving existing disputes in our legal system. In a second moment, it will address the main aspects of Resolution n. 125 of the CNJ. In addition, a bibliographic study was carried out on doctrines, laws, secondary data and documentary sources, as it refers to a methodological procedure, whose purpose is to expose the understandings on the subject. In addition, it will examine the changes brought by the new procedural law with regard to Conciliation, in particular its definition and main characteristics. Finally, after the development of the theme, the practical consequences that the changes brought by the new Code will provide to the progress of the demands will be addressed, and whether these will be positive and will in fact meet the objectives pursued by the new procedural legislation. And to give an exact idea of what was exposed, a case study carried out in the Comarca de Bonfim/MG on the subject in question will be presented.

Keywords: Alternative conflict resolution methods; conciliation; autocomposition; new Civil Procedure Code; Bonfim/MG.

1. INTRODUÇÃO

Com o passar dos anos, percebemos que o Direito brasileiro passou por modificações emblemáticas.

Entre as transformações ocorridas no Código de Processo Civil, destacamos a ampliação dos métodos de solução de conflitos.

Os métodos de solução de conflitos são a exteriorização de uma nova concepção para a defesa dos direitos.

Ao invés de se ter uma só solução, a qual possibilita o ingresso de todos e a qualquer momento, sem discriminações objetivas, individuais ou teleológicas, o ordenamento jurídico apresenta vários métodos de resolução, o qual possuem o mesmo objetivo: a tutela dos direitos, de modo satisfatório, acertado e eficiente.

A essência desses procedimentos excepcionais só será significativa enquanto for também, concomitantemente constitucionalmente devida.

O Direito pertinente aos meios de solução de conflitos acolhe demandas jurídicas individuais, coletivas, disponíveis e indisponíveis, entre particulares e até mesmo entre o poder público.

Nessa perspectiva, percebemos que o novo CPC trouxe em seu bojo o artigo 3°, §3°, o qual traz como preceito o incentivo à solução pacífica de pleitos.

Tal dispositivo legal, além de ser um princípio atinente ao Código de Ritos, também é uma regra indispensável, aplicável tanto na parte geral do código, quanto a demandas e procedimentos não codificados.

Desse modo, notamos que o Direito brasileiro vem sendo conduzido para a resolução de litígios de maneira extrajudicial, sejam os denominados métodos autocompositivos – conciliação, mediação ou negociação – ou heterocompositivos, como a arbitragem.

Como vimos acima, as formas de solução de conflitos surgem no Código Instrumental por meio de seus institutos mais reputados, como a arbitragem, conciliação e mediação.

A mediação é aplicada de modo mais contido, em áreas específicas, como no Direito de Família.

Já a A arbitragem é regulada pela Lei n. 9.307/96, a qual possui as regras atinentes ao tema.

Em relação a conciliação, verificamos que ela já estava sendo estimulada e utilizada pelo Judiciário e, por isso, abordaremos mais a fundo o presente instituto.

A possibilidade em solucionar o conflito por outro modo que não seja através da via judicial, proporciona certos benefícios, sendo o principal deles, o contentamento das partes e o reestabelecimento do convívio entre os envolvidos.

Outra consequência do uso de tais meios é a diminuição das ações judiciais litigiosas, bem como o cumprimento voluntário daquilo que foi convecionado.

Assim, o uso de tais métodos tem se mostrado como um avanço e melhoria para os jurisdicionados, os quais almejam resultados descomplicados, práticos, diretos, eficazes e menos custosos.

Entre os meios alternativos de solução de conflitos, a conciliação tem demonstrado benefícios, visto que o novo CPC ampliou sua aplicação, pois foi ao encontro da Resolução nº 125 de 2010 do Conselho Nacional de Justiça – que dispõe sobre a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário – ao determinar a criação, pelos tribunais, de centros de solução de conflitos e regulamentar o cadastro dos conciliadores.

Com isso, diante de várias mudanças significativas, tem-se o instituto da conciliação como condição pré-processual para a resolução das lides, fazendo com que, antes de uma possível demanda judicial, as partes, podem juntas, resolverem suas querelas.

O presente trabalho pretende demonstrar e examinar a conciliação, suas principais características, em especial a sua aplicabilidade e eficiência como condição pré-processual na comarca de Bonfim/MG, local este escolhido para ser realizado um breve estudo de caso.

2. OS PRINCIPAIS MÉTODOS ALTERNATIVOS DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Ao longo dos anos, o Direito Processual Civil lidou com a concepção de que a viabilização tão somente do processo judicial – o qual é constituído por quatro princípios essenciais de ação, jurisdição, defesa e procedimento – seria hábil para conferir uma tutela satisfatória e devida ao direito pleiteado. A esse respeito, as ideias conceituais implícitas no revogado CPC de 1973 apresentavam um significativo padrão sobre: possuir o direito de ação consistia em desfrutar do direito ao processo e a decisão de mérito, da qual o magistrado, ao julgar desempenhava a função jurisdicional. Ou seja, todas as maneiras para se resolver a lide eram realizadas pela via judicial. (MARINONI, 2020).

Com o passar do tempo, esse cenário começou a ser transformado. Preliminarmente, segundo os métodos incomuns de solução de conflitos, diferentes modelos heterocompositivos (tal como a arbitragem) e autocompositivas (como a conciliação e mediação) obtém lugar como formas capazes para a resolução das adversidades de cooperação na execução do direito material. Apesar disso, existia certa censura frequentemente voltada a esses meios de solução de embates. (MARINONI, 2020).

É válido que essas acabaram se corroborando não exclusivamente como técnicas facultativas, mas como procedimentos sérios. Por esse motivo, a definição de “Justiça Multiportas” prevista no artigo 3° do Código de Ritos, cujo objeto está em explorar uma definitiva adequação dos modelos de resolução das lides às espécies de litígios que precisam ser assentados. (MARINONI, 2020).

Vejamos o que dispõe o dispositivo citado.

“Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito.
§ 1º É permitida a arbitragem, na forma da lei.
§ 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.
§ 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial”.

Para melhor elucidação, tem-se os dizeres do Ilustre Marinoni:

“Tudo isso significa, ademais, que o processo reage ao direito. Vale dizer: que o plano do direito processual reage ao plano do direito material. Além de procurar resolver as mais diferentes crises ou ameaças de crises de colaboração na realização do direito material e tratá-las de forma adequada, o processo civil procura fazê-lo com o emprego de diferentes técnicas processuais visando à promoção de uma tutela que consiga ao mesmo tempo ser adequada, efetiva e tempestiva para as partes e a menos dispendiosa possível – em termos de recursos econômicos e pessoais – para a administração da Justiça Civil. (MARINONI, 2020, p.35)”.

Com isso, tornou-se inapropriado cogitar a jurisdição como o único método de solução do conflito por uma sentença. De fato, o litígio necessita ser analisado com o meio procedimental mais adequado às suas particularidades – o que pode, até mesmo, apontar a solução pela via da jurisdição como a última opção. (MARINONI, 2020).

À vista disso, o Novo Código de Processo Civil categoricamente trouxe em seu bojo, além da jurisdição – presente desde o CPC de 1973 – como um dos prováveis meios para se resolver a controvérsia. Ao estabelecê-lo, o Código Instrumental cria a Justiça Civil proporcionando não só um único método para sanar o conflito – não apenas uma única “porta”. Longe disso, o novo CPC legitima um complexo de “Justiça Multiportas” o qual proporciona diversas ferramentas para resolver as lides – destacando-se a conciliação e a mediação. (MARINONI, 2020).

Sobre o tema, tem-se o disposto no Guia de Conciliação e Mediação Judicial, editado pelo Conselho Nacional de Justiça:

“O CPC/2015 fortalece, em boa hora, a conciliação, a mediação e a arbitragem como mecanismos hábeis a pacificação social. Na realidade, a nova codificação estabelece como uma de suas principais premissas o incentivo a utilização dos métodos adequados de solução consensual de conflitos, conforme se vê do artigo 3°, § 3°, inserido no capítulo inicial que trata das normas fundamentais do processo civil.
Não obstante, o CPC/2015 menciona a conciliação, a mediação e a arbitragem em diversas passagens, deixando clara a intenção do legislador de incentivar a utilização de variados métodos de resolução de controvérsias.
Além disso, o novo Código trata dos mediadores e conciliadores judiciais, atribuindo-lhes a qualidade de auxiliares da justiça (art. 149), estando sujeitos, inclusive, aos motivos de impedimento e suspeição (art. 148, II). (CNJ, 2015, p. 45)”.

Antes de abordamos a fundo o instituto da conciliação, torna-se indispensável conhecermos, ainda que breve, os métodos de solução de conflitos de um modo geral.

Entre as técnicas eletivas para se resolver as lides aponta-se aqui as mais utilizadas, como por exemplo: mediação, a negociação, a transação, arbitragem e a conciliação, sendo está o objeto do presente estudo. Vejamos:

2.1 Mediação

A Mediação é uma palavra latina mediare que quer dizer, apreciar, deliberar, colocar-se entre; e, desse modo, no campo dos métodos de resolução de conflitos, o vocábulo refere-se a uma técnica sem adversários, a qual deriva da coparticipação dos litigantes, para que juntos cheguem a um resultado satisfatório, visando o reestabelecimento das relações e a harmonia. (BUZZI, 2013, p. 5, apud SERPA, 1995).

Segundo o Ilustre Professor, Fredie Didier Jr, sobre a temática, disserta que:

“Cabe ao mediador servir como veículo de comunicação entre os interessados, um facilitador do diálogo entre eles, auxiliando-os a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam identificar, por si mesmos, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos. Na técnica da mediação, o mediador não propõe soluções aos interessados. Ela é por isso mais indicada nos casos de conflitos societários e familiares. A mediação será exitosa quando os envolvidos conseguirem construir a solução negociada do conflito”. (DIDIER JR. 2016, p. 274).

2.2 Negociação

A negociação é uma maneira de se resolver a querela entre os envolvidos e consiste no deleite simultâneo das partes na disputa. (BUZZI, 2013, p. 7. apud AZEVEDO, 2012, p. 91).

2.3 Transação

A transação na área do Direito Civil acontece quando há o compromisso, por meio de consentimentos mútuos em que os envolvidos evitam ou dão fim aos embates. (BUZZI, 2013).

2.4 Arbitragem

A arbitragem é um método heterocompositivo de solução do conflito e se dá quando os demandantes procuram em um terceiro, os quais confiam, a resposta amistosa e justa – visto que, a tratativa não é realizada pelas partes envolvidas diretamente na lide, mas sim ao árbitro (DIDIER JR, 2016).

Nos dizeres de Fredie Didier Jr:

“Trata-se de uma opção conferida a pessoas capazes para solucionar problemas relacionados a direitos disponíveis. Não se admite em causas penais. Ademais, a Emenda Constitucional n. 45/2004 consagra a arbitragem em nível constitucional, no âmbito trabalhista (art. 114, §§ 1° e 2°, CF/1988).
[…] a arbitragem no Brasil, é regulamentada pela Lei n. 9.0307/1996. Pode ser constituída por meio de um negócio jurídico denominado convenção de arbitragem que, na forma do art. 3° da Lei n. 9.307/1996, compreende tanto a cláusula compromissória quanto o compromisso arbitral”. (DIDIER JR, 2016, p. 171).

2.5 Conciliação

A Conciliação é o ajuste dos anseios decorrente de consentimentos recíprocos, em que um conciliador de modo imparcial auxilia, aconselha e oportuniza a transação. O conciliador, além de direcionar as partes, pode propor a saída para o conflito, desempenhando a sua atribuição de forma neutra, ocasião em que ele vai examinar o contexto litigioso e indicar a sua resolução, expondo os benefícios e malefícios que o referido instituto possa causar as partes. (DINAMARCO, 2005).

Percebe-se que a conciliação contribui efetivamente para a solução da lide, tendo em vista que a sua finalidade é a realização do acerto entre as partes, as quais, ainda que “rivais”, obtêm um acordo e impedem a propositura de uma ação judicial. (BUZZI, 2013).

Ressalta-se que, as práticas que implicam a busca da resolução de contendas por intermédio da conciliação podem ser realizadas tanto na fase em que o embate ainda não fora judicializado, em outras palavras, na etapa pré-processual ou extrajudicial, ou durante o processo. (BUZZI, 2013).

Sobre o tema, tem-se os dizeres do professor Kazuo Watanabe:

“[…] o objetivo primordial que se busca com a instituição de semelhante política pública, é a solução mais adequada dos conflitos de interesses, pela participação decisiva de ambas as partes na busca do resultado que satisfaça seus interesses, o que preservará o relacionamento delas, propiciando a justiça coexistencial. A redução do volume de serviços do Judiciário é uma consequência importante desse resultado social, mas não seu escopo fundamental. Por meio dessa política pública judiciária, que proporciona aos jurisdicionados uma solução mais adequada dos conflitos, o Judiciário Nacional estará adotando um importante filtro da litigiosidade, que ao contrário de barrar o acesso à justiça, assegurará aos jurisdicionados o acesso à ordem jurídica justa […].” (BUZZI, 2013, p. 10, apud WATANABE, 2013).

O instituto da conciliação tem demonstrado o real objetivo da justiça, em que as partes resolvem suas demandas, restabelecem as relações e reduzem os inúmeros processos judiciais, contribuindo, assim, para o fim da crise do judiciário.

Como visto acima, o tema em exame é de extrema relevância, pois demonstra um novo caminho, uma nova porta na busca do efetivo direito e da verdadeira justiça.

3. A RESOLUÇÃO N. 125 DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

Da mesma forma que o Código instrumental, outras orientações regulamentares desenvolveram a temática dos métodos alternativos de conflitos, expondo consideráveis normas e aprimoraram o campo de aplicabilidade dos meios excepcionais de resolução de lides, como por exemplo: a conciliação, mediação e arbitragem.

O presente capítulo apresentará uma breve síntese sobre as fundamentais informações constantes da Resolução n. 125 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ – em especial, sobre a conciliação.

No dia 29 de novembro de 2010 foi publicada a Resolução n. 125 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ a qual preceitua sobre a Política Judiciária Nacional de Tratamento apropriado dos conflitos de interesses na esfera do Judiciário.

A referida Resolução simbolizou um marco no ordenamento jurídico brasileiro, por ser a ferramenta mais importante em relação a conciliação.

Sua finalidade é estruturar o conjunto de solução pacífica de lides, concedendo a técnica pertinente a cada demanda, para esse objetivo, tem-se o disposto no artigo 1°, parágrafo único que estabelece:

“Art. 1º Fica instituída a Política Judiciária Nacional de tratamento dos conflitos de interesses, tendente a assegurar a todos o direito à solução dos conflitos por meios adequados à sua natureza e peculiaridade.
Parágrafo único. Aos órgãos judiciários incumbe, nos termos do art. 334 do Novo Código de Processo Civil combinado com o art. 27 da Lei de Mediação, antes da solução adjudicada mediante sentença, oferecer outros mecanismos de soluções de controvérsias, em especial os chamados meios consensuais, como a mediação e a conciliação, bem assim prestar atendimento e orientação ao cidadão”.

Em harmonia com o I. Fredie Didider Jr. (2015), a citada Resolução implementou a Política Pública de procedimento próprio de conflitos de interesses, além disso, determinou o CNJ como estruturador desta política. Ademais, determinou a constituição, pelos tribunais, de centros de resolução de embates, assim como regulou a atividade dos conciliadores, atribuindo aos tribunais o encargo de conferir publicidade aos bancos de estatísticas de seus centros.

O artigo 2° da Resolução é possível visualizar alguns modos para se chegar a tal finalidade, ou sob um olhar doutrinário:

“três metas fundamentais para a disseminação da cultura de pacificação social: 1) centralização das estruturas judiciárias; 2) adequada formação e treinamento de servidores, conciliadores e mediadores; 3) acompanhamento estatístico específico”. (IWAKURA, 2014, p.76).

Em consenso com a Resolução está o CPC, o qual inseriu essas regras e recomendou a aplicação das mesmas, demonstrando os métodos alternativos de solução das lides, para resolver cada embate do modo mais acertado, observando suas singularidades. (CUNHA; NETO, 2014).

4. A CONCILIAÇÃO

Realizadas as breves considerações sobre os meios alternativos de resolução consensual de conflitos, passaremos a analisar o instituto da Conciliação, objeto principal do presente trabalho.

4.1 Conceito e principais características

A conciliação, como vimos alhures, é uma técnica de solução de conflito, pela qual o terceiro denominado conciliador, atuará em certo procedimento, com o objetivo de amparar os envolvidos a alcançarem a autocomposição. (DIDIER JR, 2016).

Na conciliação a querela é debatida de maneira perfunctória, na qual procura- se, basilarmente, autocomposição, com a consequente conclusão da lide. (CABRAL, 2017).

O referido instituto é altamente propagado em nosso ordenamento jurídico, além de simbolizar expressivo encargo na resolução consensual do combate, mesmo que, em alguns casos, não consiga a diminuição das demandas judiciais com o consequente desafogamento do Poder Judiciário. (CABRAL, 2017).

A conciliação obteve destaque com o estabelecimento dos Juízados Especiais Cíveis, sendo uma fase imprescindível à demanda. Apesar de ter sofrido certa objeção preliminar, os efeitos positivos gozavam de confiabilidade a esta medida, e na atualidade a maioria das lides são resolvidas na audiência de conciliação, isto é, sem passar por pronunciamento judicial do Magistrado. (CABRAL, 2017).

Por seu turno, a conciliação possui previsão normativa no Código de Ritos, assim como em determinadas legislações específicas. (CABRAL, 2017).

Vale ressaltar que o mencionado instituto pode ser enquadrado entre os métodos permissíveis de ingresso à justiça, consoante expresso no artigo 5°, inciso XXXV da Constituição Federal de 1988, posto que, soluciona o litígio de modo satisfatório e, consequentemente, mais legítimo. Refere-se, então a ferramenta apta a resolver os embates de modo consentâneo, a fim de diminuir as demandas judiciais, além de opor-se a descaracterização da atribuição jurisdicional, concedendo, destarte, uma interpretação moderna do acesso a justiça. (CABRAL, 2017).

4.2 A Conciliação no revogado Código de Processo Civil de 1973

A conciliação encontrava-se expressamente prevista na Lei n. 5.869 de 11 de janeiro de 1973 – Revogado CPC/73 – mais precisamente a partir do artigo 277 e seguintes. Entretanto, o Código Instrumental não tinha tanta preocupação com o citado instituto, sendo mera formalidade o uso de tal técnica, a qual só era utilizada se houvessem indícios de possível acordo entre as partes.

Na sistematização do CPC passado haviam três classes processuais: i) conhecimento, ii) execução e, iii) cautelar. Relativamente ao processo de conhecimento, existiam os procedimentos comuns e especiais.   O procedimento comum era utilizado de modo residual, tão somente para aquelas ações que não tinham rito próprio e, consoante o artigo 272 do CPC/73: “O procedimento comum é ordinário ou sumário”.

O rito ordinário era ajustado de modo integral e pormenorizado pelo CPC obsoleto, ao passo que os outros eram prescritos tão somente naquilo que se divergiam deste, visto que, o procedimento ordinário aplicava-se de forma subsidiária a eles. (THEODORO, 2012).

O procedimento ordinário, conforme o artigo 331 do CPC/73, realizava-se da seguinte forma,: o autor ofertava a exordial, após o julgador determinava a citação do réu, para que oferecesse sua defesa e, posteriormente, realizava-se uma audiência preambular onde eram feitas as tentativas de conciliação. Havendo possibilidade de consenso entre as partes acerca da lide, o ajuste seria homologado por sentença pelo juiz. Todavia, caso restasse frustrada a tratativa, delimitava-se o objeto contencioso e admitia-se as provas que seriam produzidas e, caso fosse relevante, era designada audiência de instrução e julgamento, a qual ao início desta, o magistrado faria a seguinte pergunta: Há possibilidade de acordo? Em sendo a resposta negativa, o processo prosseguiria.(THEODORO, 2012).

O procedimento sumário, por sua vez, era delimitado conforme parâmetros relacionados à matéria e ao valor da causa, os quais eram previstos no artigo 275 do código anterior. (THEODORO, 2012).

Nesse sentido:

“A audiência de conciliação prevista no procedimento sumário, embora tenha algumas diferenças significativas, possui conteúdo semelhante à audiência preliminar prevista no artigo 331 do Código de Processo Civil de 1973. A principal diferença diz respeito à amplitude do seu conteúdo, na medida em que ocorre o recebimento da resposta do réu, além de se realizar antes do encerramento da fase postulatória”. (NETO, Armando Ghedini. 2015, p. 37).

Vale dizer que, a finalidade do legislador ao disciplinar o rito sumário foi de oportunizar um veredicto mais rápido a fundamentos específicos, por essa razão é o procedimento mais ágil que o ordinário. (THEODORO, 2012).

Para que o procedimento citado cumpra o seu propósito de prosseguir com mais rapidez, é necessário que seja designada audiência de conciliação e, esta não acontecendo, já apresenta-se a resposta do réu, de acordo com os artigos 277 e 278, ambos do CPC/73). Ressalta-se que, aqui a atuação do conciliador é permitida, pois possui a atribuição de ajudar o Magistrado na missão de lograr êxito na demanda conciliatória. (THEODORO, 2012).

Assim, a audiência de instrução não era instaurada sem que fosse tentada a conciliação, ocasião em que, caso ocorresse, o deliberado seria reduzido a termo e homologado por sentença. No entanto, se a conciliação fosse negativa, a AIJ prosseguiria com a proposição da resposta do réu, segundo o artigo 278 do CPC/73. (THEODORO, 2012).

Nos dizeres do professor Humberto Theodoro Jr (2012, p. 365):  “Somente ocorrerá a segunda audiência, destinada à instrução e julgamento, se, após a frustração da tentativa de conciliação, houver necessidade de colher prova oral para dirimir a lide”. Após a breve síntese sobre a conciliação prevista no CPC/73, torna-se crucial aprofundarmos nas consideráveis alterações trazidas pelo Novo CPC ao tema em exame.

4.3 A Conciliação no novo CPC

A Lei n. 13.105 de 16 de março de 2015, instituiu o Novo Código de Processo Civil, o qual estabeleceu como um dos seus basilares intentos o fomento ao emprego dos meios pertinentes de resolução consensual de conflitos, em conformidade com o artigo 3°, §3°, introduzido na parte introdutória que versa sobre as regras elementares do processo civil. (CABRAL, 2017).

Evidencia-se que o novo CPC refere-se a conciliação e aos outros métodos de solução de conflitos em vários pontos, deixando nítido o intento do legislador em estimular e impulsionar a utilização dos meios existentes.

Outrossim, o novo Código de ritos descreve os conciliares como colaboradores da justiça, segundo o artigo 149 do CPC, os quais estão submetidos, ainda, as causas de impedimento e suspeição, conforme artigo 148, II do CPC.

Além disso, o Código dedicou a Seção V, do Capítulo III, para normatizar os deveres dos conciliadores, e entre outros temas dispôs sobre:

“a) a criação de centros judiciários de solução consensual de conflitos pelos tribunais, destinados à realização de audiências e pelo desenvolvimento de programas para auxiliar, orientar e estimular a autocomposição (art. 165); b) os princípios que informam a conciliação e a mediação (art. 166); c) o cadastro e a capacitação de conciliadores e mediadores (art. 167); d) a possibilidade de as partes escolherem, de comum acordo, o conciliador ou mediador (art. 168); e) as formas de remuneração dos conciliadores e mediadores (art. 169); f) os casos de impedimento (art. 170); g) a impossibilidade temporária do exercício da função (art. 171); g) o prazo de impedimento de um ano para o conciliador e mediador assessorar, representar ou patrocinar as partes (art. 172); h) as hipóteses de exclusão do cadastro (art. 173); i) a criação de câmaras de mediação e conciliação para a solução de controvérsias no âmbito da administração pública (art. 174); j) a possibilidade de outras formas de conciliação e mediação extrajudiciais (art. 175)”. (CABRAL, 2017. pgs. 361/362).

À vista disso, deve o Judiciário desfrutar oportunamente de tais instrumentos em benefícios aos envolvidos.

Vale dizer que o NCPC colocou em nosso Poder Judiciário avultada esperança de transformação de condutas dos conflitantes, para que estes reflitam e reconsiderem os prováveis resultados em relação a lide, passando a utilizar ferramentas mais apropriadas para a solução  do embate, por intermédio de um alicerce hábil a  tal objetivo. (CABRAL, 2017).

Vale destacar a inovação mais surpreendente na estruturação do Judiciário: a instituição, como regra, da audiência de conciliação e/ou mediação, como prática preliminar do procedimento comum, isto é, antes do oferecimento da contestação pelo demandado. (CABRAL, 2017).

De acordo com o Código Instrumental, o reclamado será citado para ir a audiência de conciliação e/ou mediação – segundo o disposto no artigo 334 do NCPC – sendo que, apenas com o término do feito e em sendo frustrada a convenção, será aberto o prazo para, querendo, apresentar contestação – consoante artigo 335, I do NCPC.

Salienta-se que a citada audiência não será realizada, conforme o exposto no artigo 334, §4° do CPC quando: “i) se ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na composição consensual ou II – quando não se admitir a autocomposição”.

Percebe-se que, ao Magistrado é proibido rejeitar a realização da audiência de conciliação, ainda que o consenso seja impossível. Além disso, a norma inadmite a renúncia de apenas um dos litigantes, de modo que, o não comparecimento infundado ao procedimento será reputado como ato atentatório à dignidade da justiça, passível de multa de até dois por cento do valor da causa ou do benefício financeiro esperado, a qual será convertido em proveito da União ou do Estado. (CABRAL, 2017).

Após os breves apontamentos sobre a conciliação prevista no CPC/2015, torna- se essencial analisarmos o preparo material técnico dos operadores do direito para implementação da conciliação os quais serão tratadas no capítulo a seguir.

5. O PREPARO MATERIAL TÉCNICO DOS OPERADORES DO DIREITO PARA IMPLEMENTAÇÃO DA CONCILIAÇÃO

O preparo material técnico dos operadores do direito para implementação da conciliação é estimulado e definido pelo legislador, o qual determinou as regras de atuação, instituição e capacitação. Senão Vejamos:

Como vimos, a atual sistemática processualista é idealizada para incentivar a utilização e o estabelecimento dos métodos alternativos de resolução de conflitos. Na listagem das regras primordiais do NCPC estão as regras do artigo 3°, §2° e §3°, in verbis:

“Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito. […]
§ 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.
§ 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.”

Nesse sentido, ressalta-se os ensinos dos professores Leonardo Carneiro da Cunha e João Luiz Lessa de Azevedo Neto (2014, p. 199):

“O Estado deverá promover o uso dos ADR39 e os profissionais da área jurídica deverão estimular o seu uso. Isso inclui um esforço de capacitação de pessoal, criação de estrutura física, esclarecimento da população e treinamento dos servidores e dos profissionais do meio jurídico em geral. Não apenas estimula o uso dos ADR em âmbito judicial, mas o projeto também estabelece que a União, os Estados, e o Distrito Federal e os Municípios deverão criar câmaras de mediação e conciliação, com atribuições relacionadas à solução consensual de conflitos no âmbito administrativo. Assim, há a construção de um verdadeiro sistema de resolução de disputas, composto pelo Poder Judiciário e por instituições públicas e privadas dedicadas ao desenvolvimento de mediação, conciliação e arbitragem”.

O CPC dispõe no caput do artigo 166 que: “A conciliação e a mediação são informadas pelos princípios da independência, da imparcialidade, da autonomia da vontade, da confidencialidade, da oralidade, da informalidade e da decisão informada”.

A independência deve guiar a ação do conciliador, para que ele detenha certa autonomia e não se sinta coagido, no exercício de sua atribuição, assim como, lhe é autorizado rejeitar, cancelar ou suspender a sessão se verificar a ausência dos requisitos primordiais para o prosseguimento. (DIDIER JR, 2015).

Tocante a imparcialidade, o conciliador não pode possuir qualquer interesse na querela em exame. Esse atributo retrata o princípio da imparcialidade, o qual conduz a Administração Pública e está previsto no artigo 37, caput da CF/88. (DIDIER JR, 2015).

Vale enfatizar que: “a aplicação de técnicas negociais pelo conciliador ou mediador, com o objetivo de proporcionar ambiente favorável à autocomposição, não ofende o dever de imparcialidade” (DA CUNHA; NETO, 2014, p. 201).

Tocante a autonomia da vontade, verificar-se que ela está expressamente inserida no §4° do artigo 166 do CPC, que estabelece: “A mediação e a conciliação serão regidas conforme a livre autonomia dos interessados, inclusive no que diz respeito à definição das regras procedimentais”.

Ressalta-se que, referida norma encontra-se em conformidade com todo ordenamento, citando caso análogo, tem-se os artigos 168 e 190, ambos do CPC, os quais permitem aos litigantes a viabilidade de definirem alterações no procedimento para adaptá-lo as peculiaridades da causa, bem como de indicarem, desde que em comum acordo, o conciliador ou a câmara privada para a realização da conciliação.

A confidencialidade, prevista nos parágrafos 1° e 2° do artigo 166 do CPC, aduz sobre a incumbência do conciliador de manter as informações em segredo.

Tal atributo requer certa relevância, visto que, os litigantes necessitam estar à vontade para que possam revelar seus dissabores em busca da autocomposição. (CUNHA; NETO. 2014).

Concernente a oralidade e informalidade no campo da conciliação:

“A oralidade e a informalidade orientam a mediação e a conciliação. Ambas dão a este processo mais “leveza”, sem o ritual e a simbologia próprios da atuação jurisdicional. Mediador e conciliador devem comunicar-se em linguagem simples e acessível e não devem usar nenhum tipo de roupa solene (veste talar, toga, etc.). É conveniente que a negociação realize-se em ambiente tranquilo, se possível sem barulho, em mesa redonda e com paredes pintadas com cor clara. Todos são aspectos cênicos importantes, pois permitem um diálogo mais franco, reforçando a oralidade e a informalidade”. (DIDIER, 2015, p. 278).

Ainda sobre o tema:

“a conciliação ou a mediação não precisa sequer ocorrer no ambiente judiciário, podendo, se as partes preferirem ou caso se sentirem mais à vontade, ser realizado no escritório de um dos advogados ou em outro ambiente”. (CUNHA; NETO. 2014. p. 278).

Atinente ao principio da decisão informada, o acordo entre os envolvidos precisa ser alcançado, logo após o entendimento da contrariedade, como também, dos efeitos do consenso. (DIDIER, 2015).

Nessa perspectiva: “é necessário, enfim, que os interessados sejam bem informados para que não sejam surpreendidos por qualquer consequência inesperada da solução pela qual venham a optar”. (CUNHA; NETO. 2014. p. 202).

Cabe apontar que, além das regras acima, existem deliberações na seção V, acerca dos Centros judiciários de resolução consensual de lides.

O artigo 165, caput e §1° do CPC define que:

“Art. 165. Os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição.
§ 1º A composição e a organização dos centros serão definidas pelo respectivo tribunal, observadas as normas do Conselho Nacional de Justiça”.

Assim: “tal disposição vai ao encontro da política pública de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário desenvolvida pelo CNJ por meio da Resolução 125” (MEIRELLES; MARQUES, 2014, p. 294).

A criação dos citados Centros Judiciários é inescusável, os quais serão administrados por um magistrado, e se for preciso, terão um auxiliar, sendo que, estes possuirão a responsabilidade de coordenar e supervisionar os conciliadores. (DIDIER, 2015).

Além disso, os conciliadores passarão por cursos de capacitação e treinamento conferidos pelos próprios Tribunais.

Nessa direção:

“A capacitação é indispensável, pois o sucesso do mesmo depende da correta explicação em relação aos métodos de solução de conflitos disponíveis (judicial e extrajudiciais: conciliação e mediação), o que possibilitará a escolha do mais adequado pelas partes. Para tanto, a pessoa responsável pela triagem dos casos deve conhecer profundamente todos os métodos de solução de conflitos disponíveis e seus respectivos procedimentos, pois apenas assim poderá passar as informações necessárias para o devido esclarecimento das partes, que devem fazer uma opção consciente.
[…]
na fase inicial, deve o juiz, serventuário da justiça ou técnico, devidamente treinado, e conhecedor dos diversos métodos de solução de conflitos existentes, fornecer as informações necessárias sobre esses métodos (apresentando as vantagens e desvantagens dos mesmos) e indicar a parte o mais adequado para o caso concreto, verificando as características, não só do conflito, mas das partes nele envolvidas e dos próprios procedimentos disponíveis, esclarecendo como funcionará o procedimento escolhido”. (CNJ. Guia da Conciliação e Mediação. 2015. P. 17).

Assim, diante de profissionais capacitados, os envolvidos disporão de informações aptas para realizarem a escolha consciente do método mais acertado ao seu litigio, visto que, apesar da recomendação da técnica cabia ao julgador ou auxiliar da justiça, a decisão caberá as partes.

6. CONCILIAÇÃO: APLICABILIDADE E EFICIÊNCIA

A conciliação possui presentemente um aparato legislativo qualificado para certificar ao citado instituto a segurança jurídica basilar para propagar a cultura da pacificação social e para aprimorar a sua funcionalidade, tanto na seara extrajudicial quanto na judicial.

E essa alteração de padrão já pode ser verificada entre os profissionais do Direito, em especial na comarca de Bonfim/MG, em que, após uma pesquisa realizada, observou-se certas mudanças, as quais serão apresentadas no próximo capítulo.

6.1 Estudo de Caso: A Conciliação na Reforma do CPC como condição pré- processual na Comarca de Bonfim/MG

A princípio foi realizado um levantamento de dados, a partir do mês de novembro de 2021, ocasião em que havia sido instalado o CEJUSC – Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania – e os resultados obtidos foram:

◉ Demandas judicias – processos eletrônicos: foram realizados 21 acordos contra 234 acordos frustrados.
◉ Demandas extrajudiciais: foram realizados 21 acordos e contra 13 acordos frustrados.

Analisando os dados acima, constatou-se que, as demandas extrajudiciais via CEJUSC, novidade em nosso ordenamento, demonstrou resultados satisfatórios.

Além de tais dados, foram realizadas entrevistas aos operadores do Direito da Comarca de Bonfim/MG, as quais possuíam as seguintes indagações: 1) O(a) Senhor(a) percebe alguma diferença na realização da audiência de conciliação antes e depois da reforma do CPC? Se sim, qual? 2) Na prática, é perceptível a mudança acerca da audiência de conciliação no judiciário? 3) Na sua concepção, falta preparo dos profissionais para condução e realização da audiência de conciliação? 4) O que pode ser feito para que as partes desconstruam essa ideia de que somente um terceiro poderá resolver o conflito?

Em relação ao primeiro questionamento tem-se os dizeres do Dr. Túlio Augusto Geraldo Parreiras – Assesssor de Juiz:

1) O Senhor percebe alguma diferença na realização da audiência de conciliação antes e depois da reforma do CPC? Se sim, qual?

“No CPC/73 não tinha tanta preocupação com acordo como hoje, antes podia marcar audiência de conciliação e tentar conciliar, mas não tinha obrigação de marcar a audiência, era mais embrionário e não tinha tanto essa visão.
O TJ/MG até antes da reforma do CPC, criou uma resolução para fazer audiências de conciliação nos processos de família, sendo que o juiz fazia o despacho inicial e já marcava audiência, era inconstitucional, pois era totalmente o contrário do texto do CPC, porém, foi aplicado e tinha resultados bons, já que era na área de família e se trata da área que mais tem acordo.
No CPC antigo, não tinha muita preocupação com acordo, era maias a questão de litigar para ver quem “chegava no final, quem ganhava e perdia.” Após isso, começou o movimento de conscientização pelo CNJ, em que precisava fazer acordo. Depois disso, veio o CPC/15, possuindo uma visão bem melhor do acordo, possuindo uma parte geral que o antigo não tinha, abordando sobre a obrigatoriedade de promover a conciliação. Sendo assim, a partir da reforma, a audiência só não acontece se as partes não quiserem, então, a chance de ter a conciliação é muito maior, e isso tem tido, aparentemente, resultados positivos. Nas ações com empresas, não tem surtido muito efeito, mas nos casos de pessoas físicas, principalmente em processos de família, o índice de acordo tem sido bom.
A crítica em relação ao CPC/2015 no que tange à conciliação, é que ele perdeu a chance de talvez fazer o procedimento ficar mais rápido, porque a parte tem 15 dias a partir da audiência para contestar, e isso poderia ter sido concentrado em uma única audiência, fazendo tudo naquele ato e prosseguir para a decisão do juiz. Além disso, ainda tem a preocupação do CNJ com a justiça multiportas, e agora está caminhando para uma tentativa de maior conciliação.”

Já em relação aos questionamentos dois e três tem-se os dizeres do Dr. Robert Lopes de Almeida – Juiz Direitor da Comarca e Coordenador do CEJUSC:

2) Na prática, é perceptível a mudança acerca da audiência de conciliação no judiciário?

O Código de processo civil é muito recente, então para uma lei processual é muito nova ainda, demandaria assim, uma mudança de mentalidade. Existe um grupo de advogados, de juízes e juristas, que foram educados na escola do contencioso, vez que as pessoas tendem a litigar, então seria realmente uma mudança de cultura.
Dessa forma, é perceptível que tivemos mudança, uma vez que os advogados estão mais abertos a conciliação, os juízes estão mais cientes da necessidade dela, inclusive o ministério público tem aderido. No ambiente forense, os operadores do direito tiveram mudança de mentalidade acerca da audiência de conciliação. Quanto a sua forma, a audiência não teve muita alteração, mas sim na mentalidade quanto a conciliação dentro do judiciário.

3) Na sua concepção, falta preparo dos profissionais para condução e realização da audiência de conciliação?

Penso que nós temos profissionais preparados para condução da audiência de conciliação, inclusive eles são capacitados pelo Tribunal de Justiça, onde é fornecido curso para as pessoas que vão conduzir essas audiências, informando, ensinando e colocando-os a par da situação. Por vezes, essas pessoas apresentam dificuldades para se fazer entender quando não têm muito costume com essa audiência. Diante disso, penso que estão sim capacitados, porém, como em toda área do Direito, existem àqueles que estão mais preparados que outros, mas isso é, muitas vezes, atinente a questão pessoal, porém, de modo geral, eles são bem preparados.

Concernente ao quarto questionamento tem-se os dizeres do Dr. Neider Chaves Ribeiro – Defensor Público:

4) “O que pode ser feito para que as partes desconstruam essa ideia de que somente um terceiro poderá resolver o conflito?

“Visando esclarecer e conscientizar os interessados de que a construção da solução do conflito deve partir dos próprios envolvidos, campanhas educativas, difundidas através dos meios de comunicação, seriam de fundamental importância. Operadores do direito devem, sempre que possível, conscientizar as partes acerca da necessidade de elas próprias elaborarem a solução para o conflito, através do consenso.”

Sobre o questionamento acima, vale destacar os dizeres do Dr. Spencer dos Santos Ferreira Júnior – Promotor de Justiça:

4) “O que pode ser feito para que as partes desconstruam essa ideia de que somente um terceiro poderá resolver o conflito?

“Por meio da educação, consegue-se alcançar uma relação social mais consensual, com menos conflitos de direitos, pois é por meio da educação que o indivíduo passa a ter conhecimento dos seus direitos e deveres e a partir daí diminuir a quantidade de violação de direitos, por inobservância de deveres. Então, é uma questão que passa, necessariamente, pela educação, de forma geral e com enfoque na educação que se propõe a trazer o mínimo essencial na temática de direitos na nossa sociedade, sejam eles relacionados a consumo ou civis obrigacionais, por exemplo. Dessa forma, diminuiria a carga e a concepção de que só um terceiro ajudaria, pois conseguiria alcançar um consenso sem se socorrer ao poder judiciário.”

Ao analisar as informações percebemos que na comarca de Bonfim/MG a conciliação tem obtido resultados satisfatórios, em especial nas demandas pré- processuais, em que as partes, magistrado, servidores e auxiliares da justiça tem se empenhado para que haja a resolução da lide e o reestabelecimento da harmonia entre os envolvidos.

Vale dizer, o Judiciário deveria ser o último meio a ser buscado para a resolução do conflito. Entretanto, é necessário uma mudança cultural, deixando claro que, os métodos alternativos de lides são os instrumentos mais adequados para que as partes possam utilizar para resolverem suas controvérsias.

7. CONCLUSÃO

O presente trabalho buscou demonstrar que os métodos alternativos de solução de conflitos são de substancial relevância para o Direito Processual Civil, para os envolvidos, para o Judiciário e para a sociedade como um todo, visto que, apontam incontáveis vantagens se forem bem empregados.

O intento do legislador ao elaborar o novo Código de Ritos foi de avultar os meios consensuais de resolução de lides. Além de incentivar a resposta autocompositiva entre os litigantes, objetivando a execução de uma audiência com este propósito antes mesmo da exibição da resposta do demandado, realmente, pode eliminar vários procedimentos judiciais, desafogando o Judiciário e, assim sendo, ofertar uma solução mais célere igualmente aos processos em que serão obrigatórios um pronunciamento do juiz ao final.

Percebe-se que as benfeitorias vão adiante, uma vez que, visando implantar a cultura da pacificação dos embates por intermédio das técnicas autocompositivas, as alterações postas pelo novo CPC cooperam para que as partes detenham conhecimento de que uma  solução concebida  por eles mesmos é  mais proveitosa do que aquela determinada por um terceiro alheio ao problema.

Dentre essas técnicas, a conciliação foi objeto do presente estudo, na qual percebemos consideráveis mudanças na utilização do referido instituto.

Vimos que no CPC revogado não havia tanta preocupação com a conciliação das partes. Entretanto, notou-se certa movimentação e conscientação pelo CNJ de que o uso dos meios autocompositivos eram necessários.

Assim, surge o CPC/2015, o qual trouxe um incremento no uso de tais técnicas, cuja finalidade é que as próprias partes contribuam de modo efetivo para a construção de soluções mais justas e céleres.

A propósito, a solução consensual de conflitos deve ser estimulada por todos operadores do Direito.

Ao realizarmos o estudo de caso na comarca de Bonfim/MG, vislumbramos um exemplo positivo de que o uso dos métodos, sobretudo a conciliação, realmente funciona, pois todos tem se empenhado para que haja a resolução da lide e o reestabelecimento da harmonia entre os envolvidos.

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THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento – vol. 1 – Humberto Theodoro Júnior – Rio de Janeiro: Forense, 2012.


1Acadêmica de Direito no Centro Universitário Una – Betim/MG.
E-mail: grasyparreiras@yahoo.com.br

2Acadêmica de Direito no Centro Universitário Una – Betim/MG.
E-mail: larissaandreza14@gmail.com

3Graduado em Direito. Pós-graduado em Direito Notarial e Registral. Mestre em Direitos Coletivos e Cidadania. Professor no Centro Universitário Una das seguintes disciplinas: Direitos Reais. Contratos e Direito Internacional.
E-mail: jucatelli7@hotmail.com