A BANALIDADE DO MAL E IMPOTÊNCIA DA VÍTIMA FRENTE O INCAUTO ALGOZ

THE BANALITY OF EVIL AND THE VICTIM’S IMPOTENCE IN FRONT OF THE UNAUTHORIZED EXECUTIONER

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th10241222306


Edison Divonzir Soares1


Resumo

Este estudo abordou a banalidade do mal à luz da análise sociológica e filosófica dos últimos Séculos de autores como Hanna Arendt, Kant e Hobbes. Assim, trouxe o fenômeno paradigmático da prática do mal visto como algo banal, insensível, cujo sofrimento, tristeza e dor são causados, ainda que por motivos torpes, na sua forma mais cruel, impiedosa e interesseira, impactando no social e no individual, com repercussão tanto para o Estado, como para seus aparelhos de controle social, gerando uma reflexão social, jurídica, literária e do pensamento humano, para o bem.

Palavras-chave: Banalidade. Mal. Fenômeno social.

1  INTRODUÇÃO

Este estudo busca analisar a banalidade do mal, contracenando o caso Richthofen ocorrido em 2002, em São Paulo/Brasil, fazendo uma análise criminológica, social e fenomenológica veiculada pela mídia brasileira, em uma visão filosófica e social, tendo como fio condutor o pensamento de Hanna Arendt, Kant e Hobbes.

2   A PRÁTICA DO MAL NA VISÃO SOCIOLÓGICA E FILOSÓFICA DE HANNA ARENT, KANT, HOBBES E WEBER

1 Graduado em Direito pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), especialista em Direito Processual pela Universidade Tuiuti do Paraná (UTPR), professor de Direito Processual Penal e Direito Civil na Faculdade Inspirar de Curitiba, advogado com registro na OAB/PR.

2.1  Banal-banalidade

A palavra banal significa algo sem valor, sem capacidade de valor econômico, ético, legal ou social, corriqueiro para determinada pessoa, ainda que produza dor, tristeza, agonia, revolta, angústia ou ausência. O banal decorre do descaso por algo alguém, tornando-se indiferente à prática do bem e mal. É desinteressante aos olhos daquele que banaliza a coisa ou alguém. Não é estimado, faz vistas grossas, é totalmente desapegado ao sentimento e à sensibilidade, não pretende ligação física, emocional ou material, desligado e assim, o que para a maioria social é importante, ao que banaliza é comum, sem importância.

2.2  O mal

Na acepção do termo “mal” significa tudo aquilo que se mostra no oposto em relação a algo ou alguém, é contrário ao bem e instiga a infelicidade (humana ou animal), que produz desgraça, calamidades, danos, prejuízos, é inconveniente, imperfeito ou decorre de uma imperfeição, representado na forma de ofensa que desabone, que gere aflição, doença, que produza lesão, risco, derramamento de sangue inocente, pouco, agonizante, insuficiente, difícil, escasso, severo ou rude.

É algo sem regularidade alguma, muito distante do esperado, muito ruim, servido ou ofertado de modo incompleto, sem perfeição alguma, não satisfaz àquele que espera, produz insatisfação e desassossego, está errado ou feito erradamente, inadequado, defeituoso, não suficiente às expectativas, inexpressivo, vergonhoso, implacável, ofensivo, caluniante, indelicado, não comunica claramente o que pretende, cruel, impiedoso, se opõe à virtude e à ética, imprudente, imoral, aético, não possui boa saúde ou desprovido dela, prejudicial, machuca, irrita, um modo de agir ou sentir ruim, que causa prejuízo, tragédia, proporciona dor, mácula, mágoa, contrário à virtude e à honra, portanto, reprovável à justiça.

2.3  A banalidade do mal nos tribunais contemporâneos

Segundo Rocha (2003), Johann Wolfgang Goethe, um importante escritor nascido na Alemanha, durante o Século XIX, escreveu a obra Os Sofrimentos do Jovem Werter, uma peça teatral de sucesso mundial, cujo principal personagem Werther, quando ainda jovem, comete o suicídio. Neste país, despois dessa criação literária e sua respectiva publicação notou-se que o número de mortes, tendo como causa o suicídio, passou a acontecer com maior frequência, tendo como pressuposto a banalidade – sem causa, motivo ou justificação cabível e aceitável.

O fenômeno da crueldade banalizada passou a ser pesquisado nos Estados Unidos, Brasil e em países da Europa, por estudiosos voltados à análise das diversas mídias (jornal impresso e TV) que resultaram em considerações pertinentes para a justiça e para os psicólogos, psicanalistas e psiquiatras, auxiliando aos Tribunais na resolução dos casos e de crimes praticados.

Esses estudiosos afirmaram que quando se destacam assassinatos e suicídios praticados por celebridades ou por cidadãos comuns, na mídia, resulta em um aumento significativo às tais tragédias. Ao fenômeno conceituou-se “efeito imitação”, desencadeador este que tem como função liberar o desejo que um indivíduo possuía anterior à prática delituosa. Ao pesquisar a violência, pela imprensa, a prioridade é proporcionar reflexão sobre o papel da notícia na sociedade, reforçando e desmistificando os preconceitos presentes na cultura da humanidade.

Na Holanda tem-se pesquisado exaustivamente a função que o noticiário exerce sobre a violência na sociedade, especialmente, que perpetuem preconceitos étnico-raciais. Atualmente, evita-se veicular a etnia racial do assassino para evitar preconceito por raça, até porque muitos destes descendem de raças brancas, não somente negros, e de famílias com cultura, emprego e renda invejável, bem colocada social e economicamente.

Rocha (2003) afirma que quando a violência envolve adolescentes pobres a causa-raiz é mais fácil para ser identificada, tendo como pressuposto, normalmente, o uso de drogas, seu tráfico e consumo, responsáveis por originar a violência em classes mais abastadas e também pobres, mas outros motivos associados ao uso de drogas psicoativas estão presentes na listagem de milhares de desempregados no país, na falta de oportunidades e que produzem a exclusão social, as quais limitam o acesso especialmente de jovens pobres ao consumo e ao bem-estar de uma sociedade neoliberal. Uma sociedade injusta costuma ser marcada pelas desigualdades insuperáveis e insolúveis, porém, condenáveis em grau máximo de tolerância. No entanto, quando a violência surge em famílias mais abastadas e de forma cruel, como foi o caso de Suzane, que tramou a morte de seus pais, indo para o motel comemorar sua festa de aniversário porque logo iria usufruir da herança de seus pais.

Suzane Louise von Richthofen (19), estudante cursando Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), auxiliada pelo namorado (21) e seu irmão (26) matam seus pais e após a execução do crime os homicidas encenam um latrocínio, mas ainda somem com US$ 5 mil, joias e R$ 8 mil que foram usados para comprar uma motocicleta (rapaz) e por Suzane para dar um churrasco em seu aniversário. O engenheiro Manfred von Richoffen (pai) e sua mulher, médica psicanalista Marisa von Richthofen (mãe) eram proprietários de uma mansão no bairro do Brooklyn, região nobre de São Paulo, Brasil, foram golpeados com barras de ferro, sufocados com toalhas e sacos plásticos, sem conseguir respirar atingiram a morte, embora Marisia tenha tentado defender-se com as mãos lhe foram quebrados os dedos com as barras de ferro projetadas para esse fim, sem misericórdia (apiedar-se da miséria do outro) alguma. O termo misericórdia é entendido como um sentimento de compaixão latente na alma, desenvolvido pelo homem. É costumeiramente despertada a misericórdia quando percebida a desgraça ou a miséria do alheio. O termo misericórdia teve origem no Latim e decorre da junção do termo miserere, que significa ter compaixão e cordis, que significa coração. Apresentar sentimentos de compaixão do coração é ter a capacidade para sentir o que outra pessoa sente emocionalmente ou sofre fisicamente, tornando-se solidário com a miséria vivida pelo outro. No caso Richthofen não houve misericórdia, na medida que percebiam os algozes sufocados e agonizando, mais se esforçavam para impelir meios para chegar aos fins pretendidos. Conforme Serpone (2011), Suzane, ao ser detida confessou a ideologia criminosa projetada com os irmãos Cravinho, ainda que no início e durante sua execução tivesse tapado os ouvidos ou se arrependido foi um fato cabal e imperdoável.

Chegamos em casa, eu entrei e fui até o quarto dos meus pais. Eles estavam dormindo. Aí, eu desci, acendi a luz e falei que eles podiam ir. Fiquei sentada no sofá, com a mão no ouvido. Eu não queria mais que meus pais morressem. Mas aí eu percebi que não tinha mais o que fazer, que já era muito tarde […].

Na vida pregressa da família Richtoffen há relatos que um mediador confiável costumava ser chamado para “apagar” frequentes brigas e acaloradas discussões entre Suzane e seu pai, justificadas na contrariedade do namoro entre a filha e um

dos irmãos Cravinho. A jovem, bonita, de família abastada, fluente no inglês e alemão, usuária de maconha, afirmou que seus pais bebiam de forma exagerada e continuamente.

Ao longo de algumas semanas a mídia brasileira explorou exaustivamente uma banalidade estapafúrdia, mostrando a reconstituição do crime projetada pelos três acusados, permitindo revelar e o público conhecer a intimidade da família Richthofen. No entanto, quais são as explicações para que se cometa um crime dessa natureza, afinal, estes jovens, especialmente, Suzana, tinha tudo o que precisa materialmente, porque mataria seus pais para ficar com a herança deles? Uma atitude egoísta, vingança, falta de afeto ou ausência dos pais? Curiosamente, as autoridades que visitaram o local, sendo chamados pelos próprios homicidas, traz importantes questionamentos e reflexões sobre o fato, conforme segue.

O crime era um procedimento de amadores. Largaram as joias, celulares, deixaram uma arma no quarto do casal. Se alguém quer roubar, furtar, não deixaria isso no local, afirmou o policial, em 2006. Um ladrão não deixaria a arma no chão. Boto disse ter estranhado o comportamento de Suzane, que lhe perguntou quais seriam os procedimentos que a polícia iria seguir. “Eu estranhei a pergunta e a atitude impassível diante da morte dos pais” […]. Em seguida, ela perguntou como estavam os pais. “Quando eu disse que estavam bem, ela ficou espantada. “Como? perguntou”. O policial também estranhou as perguntas de Daniel, que chegou ao local pouco depois. “Você sabe se levaram alguma coisa de dentro da casa? Parece que a família guardava todo o dinheiro em uma caixinha”. Em seguida, Daniel falou os valores exatos das quantias guardadas. A cena do crime motivou mais suspeitas. Os rostos cobertos podiam ser um sinal de que as vítimas conheciam seus algozes. Manfred estava com o rosto lavado. O alarme curiosamente não funcionou e não havia sinais de arrombamento. Os papéis espalhados pela biblioteca também davam a impressão de que haviam sido espalhados de propósito. Percebemos várias coisas estranhas no local do crime. Isso fez com que desde o início suspeitássemos de que não se tratava de latrocínio, disse o delegado Daniel Cohen. Chamada para depor, Suzane perguntou ao delegado quando poderia vender a casa. No enterro do casal, no dia 1º de novembro, a jovem chorou muito, ficando o tempo todo ao lado do irmão.

Os crimes praticados entre ricos normalmente parecem merecer explicações mais acuradas e maior atenção por parte da mídia, das autoridades competentes e da sociedade. Os psicanalistas, psiquiatras, psicólogos, jornalistas e especialistas na área, na época (2003) tentaram explicar utilizando diversas teorias que ilustraram ludicamente a conduta da jovem perante o homicídio praticado contra seus pais, amparados na existência de possíveis conflitos familiares na vida da família que vivia em uma mansão no Broklyn, apontando a ausência presumida dos pais junto aos

filhos Suzane e Andreas e uma possível psicopatia presumida entre todos os envolvidos no caso (pais e homicidas), como a psicose de Suzane Louise, insistência dos pais em impor limites para os filhos, um amor ainda juvenil, a paixão proibida e o reticente uso de drogas como a maconha, pela homicida e os irmãos Cravinhos. O crime ocorreu em 30 de outubro 2002, conforme o relato de Serpone (2011):

As suspeitas em torno do casal [Suzane e o namorado Cravinho] continuaram a crescer quando dois dias depois do crime os investigadores voltaram à casa dos Richthofen e encontraram Suzane, Daniel, Andreas e um casal de amigos à beira da piscina, ouvindo música e tomando cerveja. No dia seguinte, um domingo, o casal foi ao sítio dos Richthofen onde comemorou o aniversário de 19 anos de Suzane. A garota, mesmo dispensada das aulas da faculdade, não faltou nenhum dia. Apesar da série de evidências, foi Cristian quem confirmou as suspeitas. Dez horas após o crime, ele comprou uma moto Suzuki 1.100 cilindradas com 36 notas de US$ 100. Dias depois, investigadores passaram em frente à casa de Daniel e viram a motocicleta. Descobriram que ela havia sido comprada por Cristian, que não trabalhava nem tinha dinheiro para tal aquisição. No dia 7 de novembro, a polícia disse a Cristian que precisava de sua ajuda para o reconhecimento de um suspeito. Na delegacia, após cerca de seis horas dando respostas contraditórias e confusas, acabou assumindo a participação no crime. Em outra sala, Daniel e Suzane também foram interrogados e confessaram os assassinatos. O trio, em prisão preventiva por representar perigo a Andreas, principal testemunha, foi denunciado por duplo homicídio triplamente qualificado – por motivo torpe, meio cruel e impossibilidade de defesa da vítima – e de fraude processual, por terem alterado a cena do crime. Em 2005, os três receberam habeas corpus para aguardar o julgamento em liberdade. Porém, no ano seguinte, voltaram à prisão. Daniel e Cristian foram detidos após darem uma entrevista em que afirmaram que Suzane era estuprada pelo pai desde os 13 anos de idade e que ela planejava matar Manfred e Marísia com uma arma. Já Suzane foi presa novamente, pois a Justiça entendeu que ela continuava sendo um risco ao seu irmão. No ano em que ficou solta, Suzane voltou a surpreender: ela entrou com um pedido na Justiça para ter o direito de administrar os bens da família, inclusive, de receber parte do seguro de vida do pai. Em julho de 2006, o trio foi a júri popular. Suzane tentou convencer que havia sido manipulada pelo namorado, que se aproveitava da condição financeira dela e lhe dava drogas. Daniel procurou mostrar que a intenção de assassinar o casal sempre foi de Suzane e que ela a induziu ao crime. Suzane e Daniel foram sentenciados a 39 anos e seis meses de prisão, e Cristian a 38 anos e seis meses. A Justiça negou uma revisão das penas e não cabe mais recurso. No fim de 2009, Suzane pediu, sem sucesso, para ter direito ao regime semiaberto, pois […] teria cumprido um sexto da pena. Na ocasião, foi classificada como “dissimulada” por psicólogos e psiquiatras que a avaliaram. Dois anos depois, ela teve o pedido negado de novo. Em 2011, Suzane foi considerada “indigna” de receber metade da herança dos pais, avaliada em R$ 11 milhões. A ação foi movida por Andreas. Suzane recebeu a notícia no presídio de Tremembé, onde continua presa.

É importante questionar-se como um homicídio tão brutal a ponto de eliminar a vida dos pais, e doloroso como se manifesta o caso Richthofen, tenha ocorrido em uma estrutura familiar dessa natureza, onde existia toda uma cultura social, jurídica, médica, psiquiátrica e psicanalítica formada, para a qual injustificaria o cometimento

de tal brutalidade inexplicável, cujas pessoas, possivelmente eram tidas como cultas e academicamente preparadas (as vítimas) ou em processo de formação (a homicida), apresentando condições sociais e econômicas invejáveis ou razoáveis (os irmãos Cravinho). Afinal, qual teria sido o motivo torpe e banal que motivou o cometimento de tal crime? O fato, talvez, possa buscar uma explicação nas elucubrações apresentadas por Foucault (1979), quando traz também um crime cometido por um jovem durante o Século XIX o qual assim relatou: “Eu Pierre Riviére, que degolei minha mãe, minha irmã e meu irmão […]”. O assassinato ocorreu em uma família considerada boa para a época. Porém, seria Suzane Luoise parecida à Riviére, comparativamente? No entanto, este jovem ainda se considerou altruísta ao matar sua mãe e irmãos para livrar seu pai de sofrimentos, humilhações e outros problemas sofridos por ele justificados na atitude perversa de sua mãe ante eles. Para entender o que se passa nessa mente, pensamento, sentimento e atitude, somente a psiquiatria recém-inaugurada à época e ávida para ocupar-se de conhecimentos e saberes que recentemente tentavam ocupar esse campo na época.

Notoriamente que, ao confrontar o horror incompreensível e impiedoso do parricídio cometido pela filha, suscita reações ainda conservadoras. Ora, inicialmente, procura-se culpar o crime na dissolução da família, fenômeno típico vivenciado na pós-modernidade. No entanto, existem autores que entendem que essa família não estruturada o suficiente, embora os pais fossem unidos, os filhos estivessem estudando, estivessem sendo educados dentro de limites que pareciam claros, cujas alegações não foram consistente os suficiente para dizer que a oposição do casal Richthofen ao namoro de Suzane, sendo o rapaz pertencente à classe média baixa e ainda desempregado, motivo capaz de deflagrar a tragédia.

É necessário compreender que a família burguesa entendida como sendo bem constituída, com natureza monogâmica e claustrofóbica, tem sido – especialmente durante os dois últimos Séculos, no mundo todo, o caldo necessário para aquecer o sofrimento mental da modernidade. Porém, o que assusta no caso Richthofen é o panorama mental que se assenta em Suzane e sua comum estupidez à prática da banalidade. Pensar nesse tipo de crime como um sinal do fim dos tempos não seria correto, porém, não dá para dissociá-lo dos efeitos da cultura de massa da sociedade contemporânea. O homem está vazio de pensamento, sensibilidade e sentimento, agrupado com a alienação de um outro ser emissor de sentido, torna-se banal à existência, ficando conhecida como a banalidade do mal. O fato é que essa burguesia deveria estabelecer a razão mesclada com a inteligência, mas, contrariamente, procurou fazer do capitalismo seu principal foco, que se reverteu no consumo. Neste sentido, segundo Lora (2007, p. 4):

Se trataba de construir un mundo inteligible, donde la razón institucionalizara el juego de las fuerzas políticas, económicas y sociales, en base al libre contrato entre seres iguales. Conjugando libertad y necesidad, la razón fue construyendo el proceso emancipador de la humanidad. Sin embargo, el resultado de esta “razón burguesa” fue el fracaso que se manifestó en todos los aspectos deshumanizadores y alienantes de la sociedad capitalista, dando pie a la economía política de Marx, quien explicita las contradicciones de la razón ilustrada burguesa, y de esta forma procura reconstruir la futura emancipación de la sociedad. Expresado en términos subjetivos, la emancipación significa la recuperación de todas las fuerzas humanas, de todas las facultades humanas esenciales, incluso todos los sentidos humanos.

Na época a imprensa tentou, de diversas formas, tranquilizar a opinião pública do povo brasileiro, fornecendo explicações utilizando-se de especialistas competentes. Assim, as famílias foram identificadas como pertencentes às classes A e B – classe alta e média no Brasil. A mídia revirou os baús da psiquiatria, psicologia e da psicanálise para explicar ao seu público as causas que levaram ao crime banal e assim tranquilizou a elite leitora de matérias jornalísticas impressas e televisivas. No entanto, caso a explicação melhor aceita pelos especialistas e pelas autoridades ligadas ao caso em análise tenha sido a falta de autoridade ou a omissão dos pais Richthofen, todos os que não se descuidavam ou cometiam o excesso de liberalismo na educação respiraram mais aliviados e assim puderam somente imaginar que: “na nossa família […] não vai acontecer” tal banalidade.

O caso Richthofen trouxe profunda reflexão de comparabilidade com a conduta familiar praticada até aquele momento, pelo restante da sociedade brasileira, que hipoteticamente se considerava comportada, apontando que a falta de sentido no projeto de vida de uma família induz aos adultos a apresentarem às gerações modernas uma história similar ao modelo “topa tudo por dinheiro”, em vista de que muitas famílias são educadas pela e com uma boa mesada – “pago para meu filho para me deixar em paz e que eu possa fazer as coisas particulares, individuais e de meu interesse”, assim, fornecem dinheiro e os filhos encaminham-se, eles próprios para os shoppings, às baladas, festas ou shows de raps tornando-se senhores de si e oportunamente, também, usuários de drogas – os pais, a essa altura já não sabem onde, o que fazem e com quem estão ou quando retornarão para casa. Mas o que

chama atenção para o caso é a onipresença que os recursos monetários representavam aos jovens homicidas e importância dentro do crime banal, quando não parecia faltar o que necessitavam ou pelo menos o necessário, na sua forma mais humilhante, como tem sido aos jovens de periferias. Pareceu a herança um elemento pertinente importante na execução do crime. Conforme Lora (2007, p. 5), os cidadãos livres foram analisados por Adam Smith em relação às consequências políticas e morais do comportamento interesseiro:

La decadencia de una sociedad determinada por los intereses de los ciudadanos libres fue analizada por Adam Smith, gran escéptico de las consecuencias políticas y morales del comportamiento autointeresado, pues realiza su análisis de los fenómenos sociales a partir del comportamiento guiado por los intereses económicos. Así, se torna falso que un comportamiento autointeresado conduzca a resultados sociales y morales ventajosos. Es falso también un orden social egoísta y materialista, ya que ni contribuye a la eficiencia económica, ni promueve la virtud ciudadana y la moral de los políticos. El capitalismo comienza a ser considerado la fuente de los males sociales. No había posibilidad de desarrollo en una sociedad liberal- capitalista. La postura liberal afirma que la deshumanización podía ser atenuada sin recurrir al estado y sosteniendo que el pensamiento racional y el cálculo impulsarían a las personas, surgiendo así la concepción del egoísmo racional. Hay que tener en cuenta los límites de la racionalidad y de la prudencia humanas, especialmente la tendencia humana a preferir lo presente a lo posterior.

Considerada uma moça ingênua – quando Suzane estivesse desvencilhada dos pais – vistos por ela como intrigantes, mediante a abreviação de suas vidas, como filha mais velha do casal Richthofen, uma vez que tinha somente um irmão e ainda este era mais novo que ela, poderia então aproveitar-se livremente do patrimônio familiar que restaria (herança) para assim viver um grande amor, uma paixão de adolescente. E, o namorado, estando com uma namorada bonita, herdeira e rica poderia viver também sua desejada paixão, usufruindo das benesses que o consumo poderia lhes oferecer (a todos os homicidas), comparativamente ao reduzido patrimônio experimentado pela classe média baixa no Brasil, à qual não permite tantas satisfações e sofismos. Parece que o irmão do namorado de Suzane deslumbrara-se com a moto que comprara com o recurso franqueado no latrocínio forjado, projetado por Suzane, cuja aquisição foi imediatamente realizada, demonstrando notoriamente que havia mais dinheiro em suas mãos depois da morte dos pais do irmão da namorada. Modernamente, há que considerar que o dinheiro não trás mais a esperada felicidade em tempos modernos, a felicidade é uma conquista permanente. Neste sentido, Serpone (2011) relata que os recursos materiais representam: “[…] um componente essencial da suposta felicidade”, mas não é tudo, na verdade é pouco.

Simmel (1997, p. 35) afirma que:

[…] o dinheiro interpõe, entre o homem e seus desejos, uma instância de mediação, um mecanismo facilitador. E porque, quando ele é alcançado, inúmeras outras coisas tornam-se alcançáveis, cresce a ilusão de que todo o resto seria mais fácil de alcançar.

A aspiração à felicidade parece passar pelo crivo do dinheiro. Assim, a paixão tem medida monetária. Saagesi (2002) apud SERPONE (2011) atenta para o seguinte ponto de vista: “a felicidade, na paixão, só é possível em um horizonte de plenitude financeira”. Ora, assim, no entendimento de Simmel (1997, p. 35):

[…] com a aproximação da felicidade […] aumenta o desejo dela, pois não é o absolutamente remoto e proibido que acende a chama da paixão e da saudade máxima, mas sim, o que não é possuído e cuja posse parece aproximar-se […] como acontece por meio da organização monetária.

Conforme o entendimento de Simmel (1997, p. 31 e 35) apud SERPONE (2011), em fins do Século XIX, anteriormente ao discurso psicanalítico, passa a existir no mundo em geral a frustração do homem moderno, o qual carece ser tratado pelos profissionais que atuam no campo da psicanálise: “acredita-se […] que se possua no dinheiro o equivalente exato e total do objeto. [No entanto] encontra-se nisso […] um motivo profundo para o caráter problemático, a inquietação e a insatisfação da nossa época”.

2.4  A visão cósmo-folosófica sobre a prática do mal

Segundo Cantista (s/d), a prática do mal está presente quando o pensamento humano se faz ausente em um sujeito pensante, em vista de que somente ele é responsável por judiciar e discernir a ação humana, racionalmente, entre a prática do bem e do mal. Existir em um mundo é o mesmo que habitar em um universo, no qual deve ser manifestada a opinião sincera e coerente, que se viabilize o surgimento de um pensamento que expurgue o mal e cada sujeito pense e acolha o bem. A oratória e a liberdade do pensar e do agir humano caminham sempre juntas, é somente mediante o diálogo que surge uma opinião na mente humana, a qual sanciona a pluralidade de significações sociais, ambientais e psíquicas.

Conforme Ritzer (1993, p.437), conceitualmente, a sociologia é uma ciência multiparadigmática, assim sendo, não confunde teorias específicas com paradigmas – os conceitos marxistas, freudianos, durkheimiano, weberiano, fenomenológico ou etnometodológico e interacionista não se confundem. Assim, a sociologia procura analisar os fenômenos e paradigmas e os fundamentos a que estão alicerçados. Max Weber estudou a ação social e concluiu que emerge em paradigmas, que nada mais são que pontos de vista existentes em uma sociedade, vigentes em determinado tempo e espaço.

O mal enquanto fenômeno não é um paradigma, veio ao mundo, não pela contingência, fragilidade humana ou pela capacidade do homem exprimir-se ou debater sua opinião particular com a opinião de seu semelhante, enquanto pensamento ausente fundamenta-se em paradigmas sociais interesseiros – em imitações que vão em busca de um nivelamento irracional. Assim sendo, as significações não são tuteladas ou submetidas aos modelos apriorísticos, como lógicas, exatas ou certas, na sua forma de representar (CANTISTA, s/d).

O necessitarismo (tese que tenta provar que somente o atual é possível e aceito) mundano, biológico, natural ou lógico metafísico, embora se corresponda com alguma faceta humana, animal e racional, não se correspondem com o homem íntegro (humano), homem livre e pretencioso (CANTISTA, s/d).

O homem tem natureza comunicacional, se realiza no espaço e no tempo, medeia entre o nascimento e sua morte em uma cena personificada e inacabada que carece empenho para qualificar-se e habilitar-se humanamente, que tem como palco de sua história um mundo (polis) multifaceteado e ilusionista. Não obstante, o mal caminha juntamente com o reino das necessidades e desejos humanos, aos quais, uma vez insaciáveis, impedem o homem de ter acesso a um mundo completo de satisfações, para as quais, frente ao totalitarismo tornam-se supérfluas e insignificantes depois de obtidas. Os termos “mal e não mundo” se aproximam. O mal não decorre da culpabilidade, pois quando um homem é capaz da prática do mal absoluto fecha o ciclo histórico de um homem desumanizado e assim, também, torna- se um ser culpável, tratado pelo Direito que verificará o grau da culpa, em um contexto sócio-histórico criminal (CANTISTA, s/d).

Para Ritzer (1993, p.439) existem teorias que podem se incluir em paradigmas de definição social, como: a Teoria da Ação, Teoria do Interacionismo Simbólico, Teoria Fenomenológica, da Etnometodologia e do Existencialismo. O homem é por natureza um ser existente no universo, uma vez nascido compõe-se de matéria e espírito, enquanto fenômeno surgido e existente, ao longo de sua vida, assimila para si diversos paradigmas. Um homem que não aceita sua finitude frágil foge em busca da liberdade, tornando-se um ser irresponsável, frívolo e vil, ingressando à porta de entrada do mal (que é a prática do que é ruim e indesejável à humanidade), seja pelo necessitarismo lógico-ideológico, de uma verdade utópica ou uma virtude política. Um homem que compreende fantasmas, mas não aprendeu a entender a si próprio, não entende as liberdades mundanas e torna-se escravo destas – um algoz para si (CANTISTA, s/d).

O mal remete à questão humana da cognição (pensamento, inteligência), circunstância esta em que inviabiliza a faculdade de pensar e agir humano, mediado pela razão e sensibilidade – reunião entre teoria versus prática. O pensamento é fonte de todo o conhecimento gerado no mundo, assim, existe um mundo físico separado do mundo sensível (o que existe e o que pensa – objetivo versus subjetivo), constituído de realidades imutáveis, perfeitas e imperfeitas. Deste modo, os modelos, ideias e os paradigmas são coisas sensíveis, criadas primeiro abstratamente para depois acontecer na sua forma física, por assim dizer, residem no mundo do pensamento para ainda tornar-se um fato acontecido (CANTISTA, s/d).

Segundo Ritzer (1993), em uma visão micro-macroscópica afirma que é fácil considerar que o mundo social é constituído de uma série de entidades que oscilam desde maiores a menores. E, assim, a grande maioria das pessoas concebe o mundo segundo estes termos – maior e menor. Tanto é fato, que entre os elementos vida (bios/vida) e razão (logos/pensamento) está situada a constituição de experiências prestes a acontecer (no futuro) – pensa-se a age-se, que tem como fonte originária o próprio pensamento humano – o pensar dá existência a fatos futuros, seja para manifestar uma opinião, à liberdade ou de contingência (gera tumulto ou confusão permanente). No entanto, curiosamente, a personificação de ambas (bio e logos) acontece somente no homem e simbolicamente situa-se no coração, o qual, abstratamente, representa a sensibilidade humana, o sentimento pelo outro. Porém, essa ausência gera indiferentismo da vontade pessoal e se mostra sem paixão e sem sentimento quanto a si próprio e ao mundo, assemelhando-se à impessoalidade de ser e de existir no mundo fático. Neste sentido, então, deduz-se que se não há pensamento há mal e se há pensamento sem sentimento tendo como pressuposto a sensibilidade (expressado simbolicamente pelo coração) também há mal (CANTISTA, s/d).

A modernidade introduziu o comportamento de um sujeito imparcial, neutro e totalmente desprovido de afeto (desafetado), inserido e tido como um modelo de conhecimento verdadeiro, próximo ao totalitarismo (encarna o mal absoluto), responsável por engendrar o horror e a carnificina de uma sociedade que se “agarra” no que sobra para sobreviver, representado pelo mal absoluto, banal e radical, para o qual Hobbes anteviu antropológico e socialmente a desertificação do sentimento no homem e consequentemente a produção do terror (CANTISTA, s/d).

CONCLUSÃO

Em resumo, pode-se afirmar que a prática da banalidade do mal arquitetada e colocada em prática no caso Richthofen, deixa claro que exerce profunda relação com os fenômenos sociais, políticos, religiosos e econômicos, criados pelo liberalismo e experimentados pela sociedade moderna. Por outro lado, a formação de paradigmas, quando deliberadamente controvertidos, torna a ação do homem uma aberração, triunfando o mal na sua forma mais pura, cinzenta e pujante.

REFERÊNCIAS

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1 Graduado em Direito pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), especialista em Direito Processual pela Universidade Tuiuti do Paraná (UTPR), professor de Direito Processual Penal e Direito Civil na Faculdade Inspirar de Curitiba, advogado com registro na OAB/PR.