A ATUAÇÃO DOS CERESTS E SEU PODER FISCALIZATÓRIO/SANCIONADOR

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8248089


Carolina Braga Boynard Freitas1
Claudio Victor de Castro Freitas2


RESUMO: Objetivos: analisar a importância e atuação CERESTs dentro do contexto do plano nacional de saúde do trabalhador e trabalhadora. Métodos: realização de pesquisa bibliográfica com livros da área jurídica e análise de decisões judiciais da mais alta corte trabalhista do país. Resultado: a observância da importância da atuação dos CERESTs na promoção da saúde do trabalhador e trabalhadora, tanto de modo preventivo, quanto na elaboração de políticas públicas de saúde. Conclusão: a possibilidade de estabelecimento de poder sancionador aos CERESTs, desde que preenchidos determinados requisitos legais de acordo com cada ente federativo.

PALAVRAS-CHAVE: saúde do trabalhador – poder fiscalizatório – poder sancionador.

ABSTRACT: Objectives: analyze the importance and performance of CERESTs within the context of the national worker health plan. Methods: conducting a bibliographical research with books in the legal area and analysis of judicial decisions of the highest labor court in the country. Result: observance of the importance of the performance of the CERESTs in promoting the health of male and female workers, both preventively and in the elaboration of public health policies. Conclusion: the possibility of establishing sanctioning power for the CERESTs, provided that certain legal requirements are met according to each federative entity.

KEYWORDS: worker’s health – supervisory power – sanctioning power.

 

1- INTRODUÇÃO
As análise propostas no presente trabalho tomam como base a necessidade de configuração de um meio ambiente laboral saudável como forma de garantia da integridade não só física, mas psíquica do trabalhador em seu local de prestação de serviços e na vida social como um todo.

Para tal entendimento usualmente se trabalha com o prévio e necessário conceito de “saúde” emanado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), pelo qual se tem “um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não consiste apenas na ausência de doença ou de enfermidade”, sendo direito fundamental de todo o ser humano, sem distinção de raça, religião, credo político, condição econômica ou social, devendo haver sua promoção para atingimento da paz e a segurança entre os povos [1].

Tal conceituação, no entanto, não escapa a críticas ferrenhas de Dejours, para quem a referida ideia apresentada não seria possível, sendo a saúde uma verdadeira liberdade de adaptação dentro de uma sucessão de compromissos com a realidade, ou seja, uma“liberdade de dar a esse corpo a possibilidade de repousar, é a liberdade de lhe dar o que comer quando tem fome, de fazê-lo dormir quando ele tem sono” [2]. Assim, conceitua-se o bem-estar psíquico (saúde mental) como “a liberdade que é deixada ao desejo de cada um na organização de sua vida” [2].

Dito isso, é preciso termos em mente que um meio ambiente saudável é conteúdo do princípio da dignidade da pessoa humana, estampado no artigo 1º, III da CRFB/88 [3], sendo resguardado por princípios nucleares, como ubiquidade, desenvolvimento sustentável, precaução, prevenção, participação [4] e poluidor-pagador [5].

A partir de tal apuração é que se pode averiguar a importância da instituição de uma política nacional de saúde do trabalhador e trabalhadora, bem como a importância de seus órgãos, destacadamente os CERESTs, conforme abaixo se propõe.

2. DISCUSSÃO E DESENVOLVIMENTO.
2.1. A POLÍTICA NACIONAL DE SAÚDE DO TRABALHADOR E DA TRABALHADORA E A ATUAÇÃO DOS CERESTS.

Seguindo-se as diretrizes dos artigos 6º, I, “c” e V, §3º, 13, VI, 15, VI, 16, II, “c” e V, 17, IV, “d” e VIII, 18, III e IV, “e”, todos da Lei 8.080/1990 (que tratam no campo de atuação do SUS a execução de ações em saúde do trabalhador, incluído o meio ambiente laboral), no ano de 2002 houve a criação da Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador (RENAST), por meio da Portaria no 1.679/2002 do Ministério da Saúde (MS), que teve como objetivo a disseminação das ações de saúde do trabalhador, articuladas às demais redes municiais e estaduais do Sistema Único de Saúde – SUS.

Em tal aspecto, as secretarias estaduais devem elaborar o Plano Estadual de Saúde do Trabalhador, conformando a rede estadual de atenção integral à saúde do trabalhador e em consonância com as diretrizes da Norma Operacional de Assistência à Saúde (NOAS/SUS) n. 01/2002: a regionalização como estratégia de hierarquização dos serviços de saúde e de busca de maior equidade, a criação de mecanismos para o fortalecimento da capacidade de gestão do SUS e a atualização dos critérios de habilitação de estados e municípios (artigo 2º, caput da Portaria 1.679/2002 do MS).

A gestão e a coordenação das ações relativas à Saúde do Trabalhador no âmbito do Ministério da Saúde (incluindo todos os entes federativos) é exercida pela Secretaria de Vigilância em Saúde – SVS (artigo 1º da Portaria 1.956/2007 do MS e artigos 4º, VI, 6º, I, 9º, I e 11, I da Portaria 1.378/2013 do MS1). A respectiva organização e estruturação passaram a ser implantada pelas ações na rede de Atenção Básica e nos Programas de Saúde da Família (anterior PSF, atualmente Estratégia de Saúde da Família – ESF), bem como nas redes de Centros de Referência em Saúde do Trabalhador (CEREST2) e ações na rede de assistência de média e alta complexidade do SUS, sempre sendo exigida a participação das organizações de trabalhadores urbanos e rurais (artigos 3º a 8º da Portaria 1.679/2002 do MS).

Os CERESTs surgiram como alternativas para facilitar o diálogo com os sindicatos e capacitar os profissionais a fim de desenvolverem as ações propostas [6]. Dentre as suas atribuições e ações a serem desenvolvidas estão execução, organização e estruturação da assistência de média e alta complexidade, relacionados com os problemas e agravos à saúde, destacadamente (i) alterações neurofisiológicas relacionadas ao trabalho e (ii) transtornos  mentais condicionados pela organização do trabalho (Anexo II da Portaria 1.679/2002 do MS).

Consequentemente, considerando que a gravidade do quadro de saúde dos trabalhadores brasileiros é expressamente apresentado, entre outros indicadores, pelos acidentes do trabalho e doenças relacionadas ao trabalho, o Ministério da Saúde, por meio da Portaria 777/2004, passou a regulamentar a notificação compulsória de agravos à saúde do trabalhador (acidentes e doenças relacionados ao trabalho, considerando como agravo de notificação compulsória, dentre outros, os “Transtornos Mentais Relacionados ao Trabalho”, conforme artigo 1º, §1º, X da Portaria 777/2004 do MS, complementado pelo subitem “6” do item “I” do anexo presente à Portaria 205/2016 do MS e Portaria de Consolidação 05/2017 do MS.).

De acordo com os artigos 2º a 4º da Portaria 777/2004 do MS, tais notificações devem ser feitas por funcionários qualificados pelo SUS em articulação com os procedimentos técnicos da vigilância ambiental, sanitária e epidemiológica (seguindo-se a diretriz do artigo 6º, §3º da Lei 8.080/1990) e através da Rede Sentinela de Notificação Compulsória de Acidentes e Doenças Relacionados ao Trabalho. Tal sistema abrange os CERESTs, os hospitais de referência para o atendimento de urgência e emergência, bem como e serviços de atenção básica e de média complexidade credenciados como tais, por critérios a serem definidos em instrumento próprio, tendo enorme relevância na verificação de ocorrência de agravos e, consequentemente, construção de políticas públicas preventivas.

Finalmente, considerando o papel do Ministério da Saúde de coordenar nacionalmente a política de saúde do trabalhador (16, V da Lei 8.080/1990), fora instituído, por meio da Portaria 1.823/2012, a Política Nacional de Saúde do Trabalhador e Trabalhadora (PNSTT3), que serviu, “entre muitos outros aspectos, para superar o distanciamento entre a produção de conhecimentos de setores da academia e as necessidades de fundamentação na prática dos serviços” [7].

Baseado nisso, o artigo 2º da Portaria 1.823/2012 do MS, a Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (PNSTT) tem como finalidade definir os princípios, as diretrizes e as estratégias a serem observados pelas três esferas de gestão do Sistema Único de Saúde (SUS), para o desenvolvimento da atenção integral à saúde do trabalhador, com ênfase na vigilância, visando à promoção e a proteção da saúde dos trabalhadores e a redução da morbimortalidade decorrente dos modelos de desenvolvimento e dos processos produtivos.

Seguindo o item “7” do Anexo I, a referida Portaria trabalha com o pressuposto da importância das ações de promoção, proteção e prevenção em saúde do trabalhador e trabalhadora. Isso porque parte do entendimento de que os problemas de saúde decorrentes do trabalho são potencialmente preveníveis, razão pela qual institui uma política que deve fomentar a substituição de matérias primas, tecnologias e processos organizacionais prejudiciais à saúde por substâncias, produtos e processos menos nocivos, orientando-se pela priorização de medidas de controle dos riscos na origem e de proteção coletiva.

O público-alvo e áreas de atuação são amplos, considerando-se todos os trabalhadores, homens e mulheres, independentemente de sua localização (urbana ou rural), de sua forma de inserção no mercado de trabalho e de seu vínculo de trabalho, abrangendo o labor formal ou informal, público ou privado, autônomo, avulso, temporário, cooperativados, aprendiz, estagiário, doméstico, aposentado ou desempregado (artigos 3º, caput e 7º da Portaria 1.823/2012 do MS).

Ao considerar a transversalidade das ações de saúde do trabalhador e o trabalho como um dos determinantes do processo saúde-doença, exigem os artigos 3º, parágrafo único e 9º da referida Portaria a interdisciplinaridade da PNSTT com o conjunto de políticas públicas do SUS e qualificação das equipes. Tal atuação interdisciplinar na fiscalização da saúde no trabalho e necessidade de qualificação das equipes para manutenção e continuidade das ações e longitudinalidade do cuidado são fortalecidas pela Resolução 588/2018 do Conselho Nacional de Saúde (destacadamente artigos 3º, 6º, XI, 8º, II e IV e 9º, I, “e”).

Segundo o artigo 8º da Portaria 1.823/2012 do MS, os objetivos da PNSTT são amplos, abrangendo o fortalecimento da vigilância em saúde do trabalhador e integração com os demais componentes da vigilância em saúde com a participação democrática, pressupondo identificação das atividades produtivas da população trabalhadora e das situações de risco à saúde da mesma no território e das necessidades, demandas e problemas de saúde dos trabalhadores no território. Também abrange a realização da análise da situação de saúde dos trabalhadores, intervenção nos processos e ambientes de trabalho, produção de tecnologias de intervenção, de avaliação e de monitoramento das ações de vigilância, controle e avaliação da qualidade dos serviços e programas de saúde do trabalhador, nas instituições e empresas públicas e privadas, produção de protocolos, de normas técnicas e regulamentares e participação dos trabalhadores e suas organizações.

Ademais, ainda dentro dos objetivos, apresenta-se a promoção da saúde em ambientes e processos de trabalhos saudáveis, o que pressupõe, dentre outros, o fortalecimento e articulação das ações de vigilância em saúde, identificando os fatores de risco ambiental, com intervenções tanto nos ambientes e processos de trabalho, como no entorno. Isso deve levar em consideração a qualidade de vida dos trabalhadores e da população circunvizinha, inserção, acompanhamento e avaliação de indicadores de saúde dos trabalhadores e das populações circunvizinhas nos processos de licenciamento e nos estudos de impacto ambiental e desenvolvimento de estratégias e ações de comunicação de risco e de educação ambiental e em saúde do trabalhador.

Além disso, deve garantir, dentre os objetivos, a integralidade na atenção à saúde do trabalhador, que pressupõe a inserção de ações de saúde do trabalhador em todas as instâncias e pontos da Rede de Atenção à Saúde do SUS, mediante articulação e construção conjunta de protocolos, linhas de cuidado e matriciamento da saúde do trabalhador na assistência e nas estratégias e dispositivos de organização e fluxos da rede. Consideram-se os componentes da atenção primária em saúde, atenção especializada, incluindo serviços de reabilitação, atenção pré-hospitalar, de urgência e emergência, e hospitalar, rede de laboratórios e de serviços de apoio diagnóstico, assistência farmacêutica, sistemas de informações em saúde, sistema de regulação do acesso, sistema de planejamento, monitoramento e avaliação das ações, sistema de auditoria e promoção e vigilância à saúde, incluindo a vigilância à saúde do trabalhador.

Conforme artigo 10 da Portaria 1.823/2012 do MS, são responsabilidades da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, em seus respectivos âmbitos administrativos, dentre outras, a garantia de transparência, a integralidade e a equidade no acesso às ações e aos serviços de saúde do trabalhador. Além disso, a orientação e ordenamento dos fluxos das ações e dos serviços de saúde do trabalhador, o monitoramento do acesso às ações e aos serviços de saúde do trabalhador, asseguramento da oferta regional das ações e dos serviços de saúde do trabalhador, estabelecimento e garantia da articulação sistemática entre os diversos setores responsáveis pelas políticas públicas, para analisar os diversos problemas que afetam a saúde dos trabalhadores e pactuar uma agenda prioritária de ações intersetoriais e desenvolvimento de estratégias para identificar situações que resultem em risco ou produção de agravos à saúde, adotando e ou fazendo adotar medidas de controle quando necessário.

Nesse ponto ganham enorme relevância prática os CERESTs, cabendo aos mesmos, segundo o artigo 15 da Portaria 1.823/2012 do MS, desempenhar as funções de suporte técnico, de educação permanente, de coordenação de projetos de promoção, vigilância e assistência à saúde dos trabalhadores.

Ademais, no âmbito da sua área de abrangência, deve dar apoio matricial para o desenvolvimento das ações de saúde do trabalhador na atenção primária em saúde (equacionado a partir da constituição de equipes multiprofissionais e do desenvolvimento de práticas interdisciplinares, com estabelecimento de relações de trabalho entre a equipe de matriciamento e as equipes técnicas de referência, na perspectiva da prática da clínica ampliada, da promoção e da vigilância em saúde do trabalhador), nos serviços especializados e de urgência e emergência.

Além disso, deve atuar na promoção e vigilância nos diversos pontos de atenção da Rede de Atenção à Saúde e atuar como centro articulador e organizador das ações intra e intersetoriais de saúde do trabalhador, assumindo a retaguarda técnica especializada para o conjunto de ações e serviços da rede SUS e se tornando polo irradiador de ações e experiências de vigilância em saúde, de caráter sanitário e de base epidemiológica. As ações a serem desenvolvidas pelos CEREST serão planejadas de forma integrada pelas equipes de saúde do trabalhador no âmbito das Secretarias Estaduais de Saúde (SES) e das Secretarias Municipais de Saúde (SMS), sob a coordenação dos gestores.

2.2. PODER FISCALIZATÓRIO/SANCIONADOR DOS CERESTS: UMA ATUAÇÃO VIÁVEL?

Importante indagação que vem sendo feita no âmbito dos CERESTs se refere à viabilidade ou não de fiscalização do trabalho por eles promovidas. Isso porque os  Centros de Referência em Saúde do Trabalhador atuam na atenção pública à saúde do trabalhador e se torna relevante a viabilidade de ingerência não só de forma orientadora,  notificatória e construtora de políticas públicas, mas, também , fiscalizatória e sancionatória.

Não há consenso ainda na jurisprudência trabalhista acerca do assunto.

No sentido de inviabilidade, indicamos o seguinte precedente da 8ª Turma do TST:

(…) A Constituição Federal, em seu art. 21, XXIV, disciplina que compete à União “organizar, manter e executar a inspeção do trabalho”, e o art. 14, XIX, “c”, da Lei n° 9.649/1998 determina que compete ao Ministério do Trabalho e Emprego a fiscalização do trabalho, bem como a aplicação das sanções previstas em normas legais ou coletivas. (…) Dessa forma, nos moldes dos preceitos acima mencionados, a fiscalização e a eventual autuação da empresa, e, por conseguinte, a aplicação de multa em razão do descumprimento de normas de segurança e medicina do trabalho, são de competência exclusiva dos auditores fiscais do trabalho. Não obstante seja garantia constitucional inserta no art. 7º, XXII, da CF, a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança, além de a Constituição Federal assegurar um meio ambiente de trabalho saudável, é certo que as disposições constitucionais e legais mencionadas pelo Município de Jundiaí não conferem competência ao Centro de Referência em Saúde do Trabalhador – CEREST, órgão municipal vinculado à Secretaria de Saúde, para fiscalizar as empresas, lavrar auto de infração, assim como aplicar a multa cabível quando constatado que não foram observadas as normas relativas à segurança, saúde e medicina do trabalho. Nesse contexto, revela-se acertada a decisão do Regional que declarou a nulidade do auto de infração, tendo em vista a incompetência do seu emissor, e, por conseguinte, concluiu que a multa dele derivada perdeu o seu valor impositivo. (…) (TST. RR-10420-06.2015.5.15.0096, 8ª Turma, Relatora Ministra Dora Maria da Costa, DEJT 07/06/2019)

Em sentido inverso, entendendo pelo cabimento, vemos a 2ª, 3ª e 5ª Turmas do TST:

(…) A jurisprudência desta Corte se orienta no sentido de que tanto o órgão de vigilância sanitária municipal, quanto outro órgão municipal vinculado à Secretaria de Saúde, como no caso o CEREST, possuem competência para fiscalizar, lavrar auto de infração, bem como aplicar as multas e penalidades cabíveis quando não forem observadas as normas relativas à saúde, segurança e medicina do trabalho. (…) (TST. RR-421-29.2012.5.15.0130, 2ª Turma, Relatora Ministra Delaíde Miranda Arantes, DEJT 31/08/2018)

(…) Nesse quadro, o órgão denominado CEREST – Centro de Referência em Saúde do Trabalhador –, de inserção municipal, tem atribuição constitucional e legal para orientar, fiscalizar e punir empresas com respeito ao cumprimento de normas de saúde e segurança no ambiente laborativo. É o que dispõe, a propósito, os artigos 154 e 159 da CLT, com redação dada pela Lei Federal n. 6.514/1977, relativos à segurança e medicina do trabalho, além da Lei Federal n. 9.782/1999, que rege o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária – SNVS (art. 1º), envolvendo sempre todas as esferas da Administração Pública (Federal, Estadual, Distrital e Municipal). Dessa maneira, configurada infração ao art. 122, VII, do Código de Vigilância Sanitária (“manter condição de trabalho que ofereça risco à saúde do trabalhador”), além de ofensa aos artigos 30, I, 110 e 122, VII, do Código Sanitário do Estado de São Paulo, regras correlacionadas às NRs 1 e 12 do Ministério do Trabalho, incide, sim, a apenação respectiva. (…) (TST. RR-10721-07.2016.5.15.0002, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 31/08/2018)

(…) A jurisprudência desta Corte é no sentido de que o CEREST – Centro de Referência em Saúde do Trabalhador, órgão municipal, possui competência para fiscalizar e autuar empresas por descumprimento de normas atinentes à segurança, saúde e medicina do trabalho. 2. No caso, a Corte a quo manteve a sentença de origem que entendeu ser o CEREST órgão incompetente para a fiscalização ou imposição de multa administrativa no âmbito laboral e anulou o auto de infração por ele expedido. (…) (TST. RR-390-46.2012.5.15.0053, 5ª Turma, Relator Ministro Ives Gandra Martins Filho, DEJT 29/06/2018)

De nossa parte, seguindo análise da literatura especializada [8], estamos no sentido da viabilidade de fiscalização pelo CEREST, mas desde que haja expressa indicação em lei municipal ou estadual (como nos respectivos Códigos de Vigilância Sanitária) das obrigações a serem seguidas pelos empregadores e tipificação do poder fiscalizatório/sancionatório daquele órgão.

Ou seja, a atuação do CEREST deverá ser vinculada à legislação do respectivo ente a que se submete hierarquicamente, não cabendo eventual imposição de infração por CEREST municipal ou regional por violação à lei federal ou Norma Regulamentar.

Tal conclusão decorre do exercício do poder de polícia, a exigir a expressa previsão legal para o seu exercício (norma geral impositiva estampada no artigo 78, parágrafo único do Código Tribuitário Nacional), bem como atende os artigos 198, caput, I, §§1º e 3º, III, da CRFB/88 (responsabilidade e fiscalização das diversas entidades federadas na promoção da saúde), artigos 200, II, VIII e 225 também da CRFB/88 (proteção ao meio ambiente, incluído do trabalho e execução de ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador) e Lei 9.782/1999 (que rege o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária – SNVS).

Tal atribuição deve ser buscada como forma de efetivação da importante atuação dos CERESTs, possibilitando-se, de forma mais robusta, o cumprimento de medidas orientadoras e fiscalizatórias.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS.

Conforme análise baseada na legislação brasileira e literatura especializada, há enorme relevância na atuação dos CERESTs na promoção da saúde do trabalhador e trabalhadora em nosso país.

Nesse sentido, seguindo posicionamento de relevo e considerando a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, temos pela plena possibilidade de instituição de poder sancionador dos CERESTs, desde que preenchidos os condicionamentos legais do ente federativo em que atua.

Tal atribuição deve ser buscada como forma de efetivação da importante atuação dos CERESTs, possibilitando-se, de forma mais robusta, o cumprimento de medidas orientadoras e fiscalizatórias.

4. REFRERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

[1] Organização Mundial da Saúde (OMS). Constituição da Organização Mundial da Saúde (OMS/WHO), 1946.

[2] DEJOURS, C. Por um novo conceito de saúde. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, vol.54, n.4, p.11, 1986.

[3] SARLET, I.W.; FENSTERSEIFER, T. Direito Constitucional Ambiental: Constituição, Direitos Fundamentais e Proteção ao Ambiente. 4ª ed. São Paulo: RT, 2014.

[4] LEMOS, P.F.I. Meio ambiente e responsabilidade civil do proprietário: análise do nexo causal. 2ª ed. São Paulo: RT, 2012.

[5] MELO, R.S. Direito ambiental do trabalho e saúde do trabalhador. 5ª ed. São Paulo: LTr, 2013.

[6] DIAS, E.C,; HOEFEL, M.G. O desafio de implementar as ações de saúde do trabalhador no SUS: a estratégia da RENAST. Ciências e Saúde Coletiva,Rio de Janeiro, vol.10, n.4, p.819, 2005.

[7] MINAYO-GOMEZ, C.; VASCONCELLOS, L.C.F.; MACHADO, J.M.H.. Saúde do trabalhador: aspectos históricos, avanços e desafios no Sistema Único de Saúde. Ciências e Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, vol. 23, n.6, p.1.967, jun/2018

[8] FREITAS, C.; DINIZ, A. CLT Comentada. 3ª ed. Salvador: Juspodivm, 2023, p.334.


[1] Médica graduada pela Faculdade de Medicina de Campos (FMC – 2023 – CRM 52 127800-2). Possui graduação em Fisioterapia pela Universidade Estácio de Sá – Campos dos Goytacazes (2005 – CREFITO 076606-F) e graduação em Enfermagem pela Universidade Estácio de Sá – Campos dos Goytacazes (2011 – COREN 292055). Pós-graduações em Fisioterapia Neurológia (Universidade Estácio de Sá – 2005/2006), Acupuntura e Eletroacupuntura (Academia Brasileira de Artes e Ciências Orientais – ABACO, 2007/2010) e Enfermagem do Trabalho (Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ, fevereiro/dezembro 2011).

[2] Juiz do Trabalho do TRT da 1ª Região. Mestre e Doutor em Relações Sociais e Direito. Doutorando em Direito do Trabalho e Previdenciário pela UERJ. Professor universitário do IseCensa (graduação) e Uniflu (pós-graduação).

  1. De modo mais específico, pela Coordenação-Geral de Segurança e Saúde no Trabalho (que faz parte do Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador), vinculada ao Ministério do Trabalho e Previdência, que possui (i) a Secretaria do Trabalho para formular, supervisionar e deliberar sobre diretrizes de políticas públicas e diretrizes e as normas referentes à fiscalização da legislação trabalhista e à segurança e à saúde do trabalhador, assim como (ii) Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, que pode formular e propor as diretrizes e as normas de atuação da área de segurança e saúde do trabalhador, (iii) a Subsecretaria de Políticas Públicas de Trabalho, que pode auxiliar na elaboração de normas de saúde e segurança do trabalho e (iv) Subsecretaria do Regime Geral de Previdência Social, que pode propor, no âmbito da previdência e em articulação com os demais órgãos envolvidos, políticas destinadas à saúde e à segurança no trabalho e à saúde dos trabalhadores, com ênfase na proteção e na prevenção (artigos 1º, VIII, 18, II e IX e 19, II, 20, VI e 25, XIV do Decreto Presidencial 11.069/2002). ↩︎
  2. A serem organizados em todos os estados da Federação, com abrangência estadual e regional, definidos por ordem crescente de complexidade e distinção de atribuições, integrados entre si e com as referências em saúde do trabalhador desenvolvidas na rede ambulatorial e hospitalar. ↩︎
  3. Instituída por meio do Decreto 7.602/11, conferindo competência ao Ministério do Trabalho e Previdência em conjunto com o Ministério da Saúde, de acordo com o item V do referido Decreto. ↩︎