A ARTETERAPIA COMO POSSIBILIDADE DE INTERVENÇÃO DO PSICÓLOGO NAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE, EDUCAÇÃO E ASSISTÊNCIA SOCIAL

ART THERAPY AS A POSSIBILITY OF PSYCHOLOGIST INTERVENTION IN PUBLIC HEALTH, EDUCATION AND SOCIAL ASSISTANCE POLICIES.

REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.8361645


Antônio Soares Junior
Pedro Romão dos Santos Junior
Maria Caroline Cavalcante dos Santos
Pania Pires dos Santos e Silva
Ana Paula Batista da Silva Brito


RESUMO

A arteterapia é uma abordagem terapêutica que utiliza a expressão artística como forma de promover a saúde emocional e psicológica dos indivíduos. Ela pode ser utilizada como uma ferramenta poderosa de intervenção do psicólogo nas políticas públicas do Brasil. Este artigo explora a arteterapia como uma técnica terapêutica baseada na expressão artística com o objetivo de refletir sobre o uso da arte como instrumento de trabalho no campo da Psicologia no âmbito das Políticas Públicas, com ênfase na de saúde, educação e assistência social. Através de uma revisão bibliográfica, o artigo examina a história e o desenvolvimento da arteterapia no Brasil, destacando os pressupostos teóricos que orientam a prática do psicólogo nessa abordagem. O artigo conclui que a arteterapia, embora tenha diferentes molduras teóricas, é fundamentada na concepção estética do ser humano como um ser criativo e capaz de se transformar em artista protagonista de sua própria vida. Portanto, a arte pode ser uma ferramenta valiosa para o psicólogo em diferentes contextos, dentre eles os das políticas públicas, apoiando o compromisso ético do profissional em ajudar o sujeito a se (re)constituir como autor de sua própria história.

Palavras – Chave: Arteterapia. Políticas Públicas. Psicologia.

ABSTRACT

Art therapy is a therapeutic approach that uses artistic expression as a way to promote the emotional and psychological health of individuals. It can be used as a powerful intervention tool for psychologists in public policies in Brazil. This article explores art therapy as a therapeutic technique based on artistic expression with the aim of reflecting on the use of art as a work tool in the field of Psychology within the scope of Public Policies, with emphasis on health, education and social assistance. Through a bibliographic review, the article examines the history and development of art therapy in Brazil, highlighting the theoretical assumptions that guide the psychologist’s practice in this approach. The article concludes that art therapy, although it has different theoretical frameworks, is based on the aesthetic conception of the human being as a creative being capable of becoming the protagonist artist of his own life. Therefore, art can be a valuable tool for the psychologist in different contexts, including public policy, supporting the ethical commitment of the professional to help the subject to (re)constitute himself as the author of his own history.

Keywords: Art Therapy. Public policy. Psychology.

Introdução

A arteterapia é uma técnica que se situa no cruzamento entre as áreas da arte e da psicologia, com teorias próprias que podem ser aplicadas por diversos profissionais da área da saúde, incluindo enfermeiros, assistentes sociais, fisioterapeutas, dentre outros e em diferentes contextos. Sua prática envolve a utilização de uma ampla variedade de recursos que expressam elementos terapêuticos e favorecem o desenvolvimento pessoal.

Segundo Carneiro (2014), a Arteterapia é um recurso terapêutico que utiliza a arte como meio para prevenir e tratar o sofrimento psíquico decorrente de diversos fatores. Essa técnica tem sua estrutura básica fundamentada nas teorias da Psicologia, bem como no conhecimento e vivência dos processos criativos.

O propósito deste artigo é refletir sobre a arte como uma ferramenta de trabalho para psicólogos, fornecendo um contexto histórico para a Arteterapia, examinando os pressupostos fundamentais que sustentam essa prática e suas possíveis aplicações nas políticas públicas brasileiras. Essa obra contribui ao oferecer uma visão geral sobre a Arteterapia, permitindo que estudantes e psicólogos se familiarizem com uma especialização que ainda é pouco abordada nos cursos de graduação universitários. Além disso, avança na reflexão sobre a contribuição da arte na atuação de psicólogos em outros contextos para além da clínica, pois atualmente, a arteterapia transcende as paredes dos consultórios e torna-se uma ferramenta valiosa para intervenções em diversas áreas, como a Psicologia social, escolar, organizacional, da saúde e outras. 

A importância do presente estudo para o meio acadêmico é evidenciada pela escassez de fontes de pesquisa sobre o tema proposto. Dessa forma, este trabalho pode contribuir para futuras produções acadêmicas e servir como fonte de consulta para pesquisas subsequentes na área. Além disso, essa pesquisa pode ter um impacto significativo na sociedade, já que a divulgação dos resultados para a população pode aumentar a conscientização e o conhecimento científico sobre o assunto em questão.

Desenvolvimento

A história da arteterapia no Brasil remonta à primeira metade do século passado, quando se relacionou com a psiquiatria e foi influenciada tanto pela vertente psicanalítica quanto pela junguiana. Osório Cesar (1895-1979) e Nise da Silveira (1905-1999), psiquiatras precursores no trabalho com arte junto a pacientes em instituições de saúde mental, representam essas vertentes, respectivamente. Ambos contribuíram para o desenvolvimento de uma outra abordagem frente à loucura, em contraposição aos métodos agressivos de contenção em vigor na época (como o eletrochoque e o isolamento), abrindo a possibilidade de expressão da loucura e de sua eventual cura através da arte.

Nise da Silveira foi uma das figuras pioneiras mais importantes responsáveis por introduzir a arte no campo da psiquiatria no Brasil. Ela estabeleceu uma conexão entre a expressão artística e a experiência da loucura, ao realizar intervenções com pacientes psicóticos. Suas contribuições tiveram um impacto significativo na psicopatologia, já que ela enfatizava como a arte tinha o poder de tocar a essência humana por meio de diferentes formas de expressão e comunicação, como mencionado por (Simões, 2011).

 Segundo Silveira, esse caminho alternativo levou a um tratamento mais humano, com efeitos terapêuticos inegáveis na reabilitação dos pacientes, promovendo “a recuperação do indivíduo para a comunidade em nível até mesmo superior àquele em que se encontrava antes da experiência psicótica” (2001, p.19). A história da arteterapia no Brasil tem grande importância no meio acadêmico por contribuir para pesquisas futuras e também na sociedade, permitindo uma maior conscientização sobre o tema em questão.

A história da Arteterapia no Brasil remonta também à atuação pioneira de Margarida Carvalho, que iniciou sua formação na área em um curso de extensão em Arteterapia com Hanna Kwiatkowska na PUC-SP, em 1964. A partir de então, Carvalho seguiu seus estudos de forma independente e começou a atuar na área. 

Andrade (2000) destacou outro marco importante na história da arteterapia brasileira, que foi a criação da Clínica Pomar em 1982, coordenada por Angela Philippini, que oferece um curso de formação em arteterapia com orientação junguiana. Em 1990, outra abordagem foi introduzida na arteterapia brasileira com a implantação de uma especialização em arteterapia gestáltica por Selma Ciornai, no Sedes Sapientae. 

Outro ponto significativo para a Arteterapia no Brasil foi a fundação da Associação de Arteterapia do Estado de São Paulo (AATESP) em 2003 e, em 2006, a fundação da União Brasileira de Associações de Arteterapia (UBAAT), ambas dedicadas à formação de arteterapeutas e estabelecimento de critérios mínimos para cursos de especialização na área.

Atualmente, a Arteterapia está em fase de expansão no Brasil. De acordo com informações disponíveis no site da UBAAT, “A Arteterapia, assim como a literatura especializada na área, tem crescido consideravelmente no Brasil nas últimas décadas. Vários congressos nacionais já foram realizados, reunindo arteterapeutas de diversos estados do Brasil, da Europa e dos EUA, onde a prática é amplamente difundida”. 

A partir desse marco, a arteterapia tem se expandido cada vez mais, ultrapassando os limites do contexto clínico, demonstrando ser uma ferramenta valiosa para intervenções em diversas áreas, incluindo Psicologia social, escolar, organizacional, saúde e contexto hospitalar. O ponto crucial aqui é ressaltar que a arte representa um canal de expressão altamente eficaz da subjetividade humana. Isso viabiliza que tanto o psicólogo quanto o cliente, sejam individuais ou em grupo, possam explorar conteúdos emocionais por meio da prática artística, possibilitando a reconfiguração desses elementos.

A arteterapia vem se estabelecendo como uma intervenção valiosa nas práticas dos psicólogos, ampliando as abordagens tradicionais de tratamento e fornecendo uma plataforma única para a exploração e a expressão emocional. Como intervenção, a arteterapia se baseia na ideia de que a expressão artística pode servir como uma forma alternativa e poderosa de comunicação, permitindo que os pacientes revelem sentimentos e pensamentos que podem ser difíceis de expressar verbalmente.

Os psicólogos que incorporam a arteterapia em sua prática reconhecem que a criação artística proporciona um meio seguro para os pacientes explorarem seus desafios emocionais e pessoais. A atividade artística pode agir como uma ponte entre o consciente e o inconsciente, permitindo que os pacientes acessem conteúdos internos mais profundos. Além disso, a natureza tangível e visual da arte cria uma distância segura dos temas difíceis, tornando mais fácil para os pacientes abordarem questões traumáticas ou delicadas.

Ao utilizar a arteterapia, os psicólogos podem oferecer uma gama diversificada de modalidades artísticas, como pintura, desenho, escultura e colagem, adaptando-as às preferências e necessidades de cada paciente. Essas atividades artísticas são orientadas pelo psicólogo de maneira a explorar os sentimentos, simbolismos e padrões que emergem através da criação.

Segundo Philippini (p.23, 2011), a abordagem da arteterapia engloba um processo criativo e imaginativo que abre portas para diversas possibilidades de expressão e criatividade. Essa abordagem tem o potencial de revitalizar, resgatar, recuperar, redirecionar e liberar o fluxo de energia psíquica. Quando aplicada de maneira personalizada a cada indivíduo, ela não apenas promove bem-estar, mas também renova as capacidades inerentes ao processo criativo. Processo este, que também oferece oportunidades para reflexão conjunta entre o paciente e o terapeuta, facilitando insights e insights terapêuticos.

Vale ressaltar que a arteterapia não exige habilidades artísticas prévias; trata-se mais de explorar o processo criativo do que produzir uma obra de arte esteticamente agradável. A ênfase recai sobre a jornada emocional do paciente durante a criação e a análise subsequente.

A arteterapia tem expandido suas técnicas em diversas esferas de atuação, colaborando com profissionais da saúde ao empregá-la como uma ferramenta para a promoção e prevenção da saúde. Essa abordagem busca aprimorar a formação de psicólogos, integrando-a em contextos variados, como o educacional, clínico, comunitário e organizacional. Sua aplicação engloba avaliações, tratamentos, prevenção e reabilitação, principalmente focados em questões de saúde mental. É importante ressaltar que a arteterapia não se restringe apenas aos consultórios, abrangendo uma gama mais ampla de contextos (Reis, 2014)

Em suma, a arteterapia serve como uma ferramenta valiosa nas intervenções dos psicólogos, permitindo que eles abordem questões emocionais de maneira inovadora e holística. Através da exploração artística, os pacientes podem encontrar insights profundos, desenvolver mecanismos de enfrentamento saudáveis e avançar em direção ao crescimento pessoal e ao bem-estar emocional.

A presença da arte nas políticas públicas desempenha um papel fundamental na construção de sociedades mais enriquecedoras, inclusivas e saudáveis. A arte transcende barreiras culturais, sociais e linguísticas, permitindo a expressão e a conexão entre pessoas de diferentes origens e perspectivas. Ao reconhecer a importância da arte nas políticas públicas, os governos não apenas enriquecem a experiência cultural de seus cidadãos, mas também promovem o desenvolvimento humano, a criatividade, a identidade e a coesão social.

A arte tem o poder de tocar as fibras mais profundas da experiência humana, permitindo a expressão de emoções complexas e pensamentos abstratos que muitas vezes não podem ser comunicados por meio de palavras. Essa dimensão emocional e estética da arte a torna um meio eficaz para a promoção da saúde mental, uma vez que proporciona um espaço seguro para a exploração de sentimentos e traumas. Dessa forma, a inclusão da arteterapia nas políticas públicas relacionadas à saúde e ao bem-estar tornou-se uma ferramenta poderosa para abordar questões de saúde mental e emocional.

Em 03 de maio de 2006, o Ministério da Saúde publicou a Portaria nº 971, que regulamentou o uso de Práticas Integrativas e Complementares no Brasil. Essas práticas incluem um conjunto de recursos terapêuticos provenientes da medicina tradicional, que visam a prevenção e tratamento da saúde por meio de uma abordagem holística do indivíduo, estimulando seus mecanismos naturais de autocuidado e preservação (BRASIL, 2006).

Segundo a ABAAT (2019), a inclusão da Arteterapia no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) foi efetivada por meio da Portaria nº 849, datada de 25 de março de 2017, em acréscimo à Portaria nº 145, emitida em 13 de janeiro do mesmo ano. Essa inserção ocorreu sob a classificação específica, a saber, o Procedimento 01.01.05.006-2, que pertence à categoria ambulatorial de atenção básica. A Arteterapia foi incorporada como parte integrante das Práticas Integrativas/Complementares, enquadradas no Grupo 01 das Ações Coletivas/Individuais em Saúde. Tal medida foi categorizada nos códigos RENASES como 007 – Práticas Integrativas e Complementares, 008 – Ações Comunitárias, bem como 010 – Atividades Educativas, Terapêuticas e de Orientação à População.

A integração da arteterapia nas políticas públicas brasileiras representa um passo significativo em direção à promoção da saúde mental e ao bem-estar da população. A arteterapia, que envolve o uso terapêutico da expressão artística, tem ganhado reconhecimento como uma abordagem eficaz para lidar com questões emocionais, psicológicas e sociais. Sua inclusão nas políticas públicas reflete a compreensão crescente de que a saúde mental é uma preocupação central e merece abordagens inovadoras e holísticas.

A utilização da arteterapia nas políticas públicas permite a democratização do acesso a práticas terapêuticas que empregam a criatividade como uma ferramenta para explorar e expressar sentimentos, experiências e traumas. Ao reconhecer a importância do autocuidado emocional, a arteterapia oferece uma alternativa complementar aos métodos tradicionais de intervenção, como a psicoterapia verbal. Além disso, sua aplicação em contextos educacionais, de saúde e sociais atende às diversas necessidades de grupos variados, incluindo crianças, adolescentes, adultos e idosos, bem como comunidades em situações vulneráveis.

No entanto, a implementação da arteterapia nas políticas públicas requer um compromisso rigoroso com a regulamentação e a formação qualificada dos profissionais envolvidos. É essencial estabelecer diretrizes claras para a prática da arteterapia, garantindo padrões éticos e técnicos adequados. Além disso, investimentos em pesquisa e avaliação são necessários para evidenciar a eficácia da arteterapia em diferentes contextos e populações, a fim de embasar a tomada de decisões políticas informadas.

A arteterapia nas políticas públicas brasileiras não apenas reconhece a importância da saúde mental, mas também enriquece a abordagem de cuidados ao considerar a dimensão criativa e expressiva da experiência humana. Ao capacitar os indivíduos a se engajarem na arte como um meio de autoconhecimento e autocura, as políticas públicas que incorporam a arteterapia podem contribuir significativamente para a construção de uma sociedade mais saudável, resiliente e conectada emocionalmente.

A arteterapia pode ser vista como uma possibilidade de intervenção psicológica nas políticas públicas, pois a atuação do psicólogo se estende por uma ampla gama de áreas, abrangendo desde os aspectos mais individuais e emocionais até os complexos desafios sociais e organizacionais. Como profissionais especializados na compreensão do comportamento humano e das questões mentais, os psicólogos desempenham um papel crucial em diversas esferas da sociedade. Suas habilidades e conhecimentos são requisitados em contextos que vão desde a clínica até a educação, da saúde pública ao mundo corporativo, da justiça criminal à promoção de políticas sociais.

A atuação dos psicólogos na clínica é talvez a mais conhecida, envolvendo o tratamento de questões psicológicas e emocionais individuais ou em grupo. Essa área abrange desde a psicoterapia, onde os psicólogos ajudam os pacientes a lidar com questões como ansiedade, depressão e traumas, até a avaliação psicológica para diagnóstico e planejamento de intervenções.

Além disso, os psicólogos desempenham um papel vital na área da saúde, colaborando com equipes médicas para entender e tratar os aspectos psicológicos de doenças físicas. Eles também são atores-chave na promoção da saúde mental e prevenção de doenças, trabalhando para melhorar os hábitos de vida e o bem-estar emocional das pessoas.

Na educação, os psicólogos oferecem apoio emocional e orientação acadêmica aos estudantes, bem como desenvolvem estratégias para melhorar os ambientes de aprendizado. Eles também desempenham um papel crucial na área da psicologia escolar, avaliando o desenvolvimento e as necessidades dos alunos.

No contexto da assistência social, os psicólogos realizam avaliações psicossociais para compreender as necessidades individuais e coletivas dos beneficiários. Eles oferecem apoio emocional, aconselhamento e psicoterapia, auxiliando indivíduos e famílias a lidar com traumas, crises, perdas e outras dificuldades. Além disso, os psicólogos contribuem para o desenvolvimento de estratégias de enfrentamento saudáveis e habilidades de resiliência.

Nos campos organizacionais, os psicólogos aplicam seu conhecimento para promover ambientes de trabalho saudáveis, melhorar a comunicação entre equipes e otimizar a produtividade. Eles também desempenham um papel em questões de gestão de recursos humanos, seleção de pessoal e desenvolvimento de liderança.

Além disso, os psicólogos têm grande influência nas políticas públicas, contribuindo para a formulação e implementação de estratégias que abordam questões sociais como igualdade, inclusão e saúde mental da população.

Em suma, a atuação do psicólogo é vasta e diversificada, abrangendo áreas que impactam diretamente a vida das pessoas em níveis individuais, interpessoais e sociais. Seu compromisso com a compreensão e a promoção do bem-estar humano torna-os uma parte essencial da sociedade contemporânea. No entanto, para fins deste artigo abordaremos as atuações dos psicólogos na área da saúde, educação e assistência social, visto que, são essas áreas das políticas públicas que mais absorvem estes profissionais nas suas políticas públicas e são as que nos possibilita também usar a arteterapia como ferramenta para este saber da saúde.

Malavolta (2014) identifica a interconexão entre a arte e a psicologia, tendo confiança na capacidade de gerar e conceber novas perspectivas de existência e percepção do mundo. Para alcançar esse objetivo, é vital reservar um espaço para considerar a arte como um ponto inicial na concretização de símbolos. Nesse ambiente propício, surge a base para explorar novas formas de existir.

Para Barroco (2014), as interconexões entre a Arte, o processo criativo e a Psicologia podem ser identificados nas contribuições de teóricos como Vigotski. Esse enfoque considera que a natureza social inerente à arte intrinsecamente se relaciona com a psicologia, visto que a sociedade e a realidade humana são forjadas através das interações sociais protagonizadas pelas pessoas, muitas vezes mediadas pelo trabalho. Nesse mesmo raciocínio, as funções psicológicas superiores são concebidas e materializadas, transcendendo sua natureza meramente biológica. Portanto, no processo de criação artística e na vivência dela, emergem novas funções psicológicas, que são moldadas e enriquecidas nos indivíduos que participam desse processo.

Segue, nas linhas abaixo as possibilidades para o psicólogo atuar com arteterapia nas políticas públicas da saúde, educação e assistência social:

A atuação do psicólogo na saúde é multifacetada e abrange desde a prevenção até o tratamento, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida dos indivíduos, promovendo a saúde mental e emocional em conjunto com a saúde física. Trabalham para prevenir doenças, promovendo hábitos de vida saudáveis e fornecendo educação sobre saúde mental e emocional. Eles desenvolvem programas de promoção da saúde, abordando questões como gerenciamento do estresse, sono adequado e autocuidado emocional.

A arteterapia como ferramenta do psicólogo na área da saúde desempenha um papel essencial ao integrar a expressão criativa com abordagens terapêuticas para promover o bem-estar físico, mental e emocional dos pacientes. Em diversos contextos de saúde, como hospitais, clínicas e centros de reabilitação, o arteterapeuta utiliza atividades artísticas como meio de exploração, comunicação e cura.

Através da criação artística, os pacientes podem abordar e processar questões emocionais, traumas e dores físicas de maneira não verbal. Isso é especialmente valioso para aqueles que enfrentam dificuldades em expressar seus sentimentos com palavras. O processo criativo oferece um espaço seguro e livre de julgamento para a expressão de emoções profundas, facilitando a compreensão e a transformação dessas experiências.

O psicólogo/arteterapeuta também ajuda os pacientes a desenvolverem formas saudáveis de enfrentamento e a adquirirem resiliência por meio da exploração artística. As atividades artísticas podem ser usadas para aliviar o estresse, reduzir a ansiedade e melhorar o estado de ânimo. Ao trabalhar com pacientes com condições crônicas ou graves, o arteterapeuta oferece uma abordagem holística que complementa os tratamentos médicos tradicionais.

Coutinho (2013) compartilhou vivências que teve com seus pacientes, evidenciando de maneira inequívoca que a arte tem o poder de desencadear reações e emoções mais profundas do que as palavras. Ela utiliza a experiência artística como uma via para promover o autoconhecimento e a transformação pessoal. A arte coloca o indivíduo em um estado de criatividade, capacitando-o a ser um criador e recriador, permitindo que as emoções se expressem de maneira única

Além disso, o psicólogo pode contribuir para a melhoria da comunicação entre pacientes e equipes médicas, permitindo que os pacientes expressem suas preocupações e necessidades de maneira mais eficaz. Isso é particularmente relevante em situações onde a doença ou a dor podem dificultar a comunicação verbal direta.

A arteterapia juntamente com a psicologia na saúde abrange desde a promoção da saúde mental até o auxílio no processo de reabilitação física e emocional. Seu compromisso com a criação de um espaço terapêutico através da arte ajuda a melhorar a qualidade de vida dos pacientes, fornecendo-lhes ferramentas para a autodescoberta, a expressão e a cura.

Lopes (2009) nos afirma que a Arteterapia se estabelece como uma abordagem de cuidado altamente eficaz na área da saúde. A utilização da expressão artística para dar forma à subjetividade deriva da ideia fundamental de que a linguagem das artes frequentemente espelha, de maneira mais precisa em muitos casos do que a linguagem verbal, as nossas vivências internas. Esse processo possibilita uma expansão da consciência em relação aos aspectos subjetivos, permitindo uma compreensão mais ampla dos fenômenos internos.

Já na área da educação, os psicólogos escolares desempenham um papel central na identificação e intervenção de desafios emocionais e comportamentais que podem afetar o desempenho acadêmico. Eles realizam avaliações psicológicas, oferecem aconselhamento individual ou em grupo e desenvolvem planos de intervenção para ajudar os alunos a superar obstáculos emocionais e sociais.

A arteterapia como ferramenta do psicólogo pode desempenhar um papel significativo na área da educação, integrando a expressão artística com abordagens terapêuticas para promover o desenvolvimento emocional, cognitivo e social dos alunos. Sua atuação abrange uma ampla gama de idades e contextos educacionais, contribuindo para um ambiente de aprendizado mais inclusivo, criativo e enriquecedor.

A arte, enquanto forma de linguagem, e a educação, como um processo em constante desenvolvimento, estão profundamente arraigadas na essência humana, emergindo como resultados da expressão e da comunicação. Esses elementos se entrelaçam ao combinar emoção e cognição na construção e organização das culturas de diversas comunidades, representando a interseção entre ambas” (Carvalho, 2009, p. 3)

Na educação, o psicólogo poderá utiliza atividades artísticas como ferramentas para a exploração emocional e o autoconhecimento. Por meio de pintura, desenho, escultura e outras formas de expressão artística, os alunos podem externalizar seus sentimentos, pensamentos e experiências de maneira não verbal. O processo criativo oferece um espaço seguro para a expressão de emoções complexas, o que pode ser particularmente benéfico para estudantes que têm dificuldade em comunicar seus sentimentos verbalmente.

Urrutigaray (2011) explora a capacidade criativa através de uma abordagem focada na imaginação, que incita o indivíduo a enxergar o mundo em sua plenitude. Dessa forma, o sujeito reconfigura sua realidade e sua própria identidade, ampliando sua percepção e estruturação do pensamento. Isso, por sua vez, está intrinsecamente ligado aos processos cognitivos.

No contexto das criações, Winnicott (1975) afirmou que tanto crianças quanto os adultos são inerentemente criativos, empregando suas expressões artísticas para modelar suas identidades e construir sua autoimagem.

A arteterapia também promove o desenvolvimento das habilidades de resolução de problemas, pensamento criativo e autoestima dos alunos. Ao explorar diferentes materiais e técnicas artísticas, os alunos são incentivados a experimentar, explorar e encontrar maneiras únicas de expressar suas ideias. Isso não apenas fortalece sua autoconfiança, mas também incentiva a inovação e a autenticidade.

Além disso, pode abordar questões emocionais e comportamentais dos alunos, proporcionando aconselhamento e apoio por meio da atividade artística. Eles podem ajudar os alunos a lidar com o estresse, a ansiedade e outras preocupações emocionais, oferecendo um meio de expressão que é muitas vezes menos ameaçador do que a terapia tradicional.

Em suma, a atuação do psicólogo / arteterapeuta na educação contribui para um ambiente de aprendizado mais aberto, diversificado e engajador. Ao integrar a arte com a terapia, eles capacitam os alunos a explorar suas emoções, desenvolver habilidades de autoexpressão e cultivar a criatividade, promovendo um desenvolvimento holístico e saudável.

Por fim, já na área da assistência social, o Psicólogo desempenha um papel crucial na promoção do bem-estar e na melhoria da qualidade de vida de indivíduos e comunidades em situação de vulnerabilidade. Ao integrar conhecimentos psicológicos com os princípios da assistência social, os psicólogos desempenham diversos papéis para abordar desafios emocionais, psicossociais e interpessoais.

Na assistência social, a arteterapia como um caminho do fazer psicologia pode desempenhar um papel significativo na promoção do bem-estar emocional, no desenvolvimento pessoal e na inclusão de indivíduos e comunidades em situação de vulnerabilidade. Integrando a expressão artística com abordagens terapêuticas, o psicólogo contribui para o fortalecimento psicossocial e para a melhoria da qualidade de vida dos beneficiários da assistência social.

Por meio das atividades artísticas, o psicológo oferece um espaço seguro para a exploração emocional e a expressão criativa. Isso é particularmente valioso para aqueles que enfrentam dificuldades em comunicar suas emoções de maneira verbal. O processo artístico permite que os participantes expressem sentimentos complexos, experiências traumáticas e desafios pessoais, facilitando o autocuidado emocional e a construção de resiliência.

O psicológo/arteterapeuta também promove o empoderamento dos beneficiários da assistência social, auxiliando-os a desenvolverem habilidades criativas, autoestima e autoexpressão. As atividades artísticas incentivam a autodescoberta, o pensamento criativo e a confiança pessoal, o que é fundamental para a reconstrução de identidades positivas e para a superação de adversidades.

Nesse contexto, o papel do psicólogo é significativo no desenvolvimento da jornada de autoconhecimento facilitada pela Arteterapia. Através de uma observação atenta, cuidadosa e empática, o terapeuta possibilita a identificação, o despertar da curiosidade e o encantamento do indivíduo tanto consigo mesmo quanto com suas expressões artísticas. Esse engajamento intensifica o processo de descoberta interna e frequentemente contribui para a construção de uma autoestima mais sólida (Ciornai, 2004).

Além disso, o psicológo pode facilitar processos de grupo, promovendo a coesão social, a comunicação interpessoal e o desenvolvimento de redes de apoio. Os participantes compartilham experiências e colaboram de maneira construtiva por meio da criação artística, fortalecendo os laços comunitários e a construção de conexões saudáveis.

Segundo as considerações de Bonafé Sei (2010), os grupos que utilizam a abordagem da arteterapia com objetivos terapêuticos e psicoterapêuticos têm como propósito primordial alcançar tanto a compreensão interna quanto a melhoria das condições de saúde dos indivíduos. Isso abrange tanto o âmbito físico quanto o psicológico, e frequentemente aborda ambos simultaneamente. Esses grupos visam também promover a obtenção de percepções mais profundas em relação a aspectos inconscientes, tanto em nível individual quanto no contexto do grupo como um todo. A autora também enfatiza que a utilização da expressão artística tem o potencial de fomentar uma conexão mais estreita entre os participantes do grupo, contribuindo para a integração do coletivo.

A atuação na assistência social abrange desde programas de intervenção individual até projetos comunitários, abordando temas como abuso, negligência, resiliência e inclusão. Sua abordagem única oferece uma maneira alternativa e eficaz de lidar com as complexidades emocionais que frequentemente acompanham as situações de vulnerabilidade.

Em resumo, a atuação do psicólogo/arteterapeuta na assistência social tem como objetivo fornecer ferramentas terapêuticas através da expressão artística, promovendo o fortalecimento emocional, a inclusão social e o desenvolvimento pessoal dos beneficiários. O arteterapeuta desempenha um papel vital ao criar um espaço seguro e criativo onde as pessoas podem explorar suas emoções, superar desafios e construir uma base sólida para o bem-estar duradouro.

Conclusão

Através da arteterapia, é possível trabalhar com indivíduos que enfrentam diversas situações de vulnerabilidade, como pessoas em situação de rua, pacientes em hospitais e indivíduos em situação de violência. A arteterapia pode ser utilizada para ajudar esses indivíduos a expressarem suas emoções, identificarem suas necessidades e fortalecerem sua autoestima.

Além disso, a arteterapia pode ser utilizada como uma forma de prevenção. O psicólogo pode trabalhar com grupos de crianças e adolescentes em escolas públicas, por exemplo, utilizando a arte como uma forma de desenvolver habilidades socioemocionais e prevenir problemas de saúde mental.

É importante destacar que a arteterapia não é uma prática isolada, mas deve ser integrada a outras políticas públicas que visam promover a saúde mental da população. O psicólogo pode trabalhar em conjunto com outros profissionais, como assistentes sociais, médicos e enfermeiros, para oferecer um atendimento integral aos indivíduos atendidos.

A arteterapia tem emergido como uma abordagem terapêutica inovadora e inclusiva, encontrando espaço nas políticas públicas brasileiras voltadas para o bem-estar e saúde mental. No contexto atual, onde a busca por alternativas eficazes e acessíveis para promover a saúde psicológica da população é primordial, a arteterapia se destaca como uma ferramenta capaz de transcender barreiras e atender às necessidades variadas de diferentes grupos sociais. Ao ser incorporada às políticas públicas, a arteterapia não apenas reconhece a importância da expressão criativa na promoção do equilíbrio emocional, mas também amplifica seu alcance, tornando-a acessível a uma gama diversificada de indivíduos, contribuindo assim para uma abordagem mais abrangente e inclusiva do cuidado mental.

No entanto, a integração da arteterapia nas políticas públicas brasileiras também apresenta desafios. É necessário estabelecer diretrizes claras que definam o papel da arteterapia dentro do sistema de saúde e educação, garantindo sua regulamentação e supervisão adequadas. Além disso, é crucial considerar as nuances culturais e socioeconômicas do país, a fim de adaptar as práticas arteterapêuticas de maneira sensível e eficaz para atender às diversas comunidades. Ao enfrentar esses desafios com determinação, o Brasil pode aproveitar os benefícios da arteterapia nas políticas públicas, promovendo a saúde mental de forma holística e inclusiva.

Portanto, a arteterapia pode ser uma importante ferramenta de intervenção do psicólogo nas políticas públicas do Brasil, contribuindo para a promoção da saúde mental da população e o desenvolvimento de uma sociedade mais saudável e justa.

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