A APLICAÇÃO DA ESTIMULAÇÃO MAGNÉTICA TRANSCRANIANA REPETITIVA NO TRATAMENTO DA DEPRESSÃO RESISTENTE

THE APPLICATION OF REPETITIVE TRANSCRANIAL MAGNETIC STIMULATION IN THE TREATMENT OF RESISTANT DEPRESSION.

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/fa10202412161738


Letícia Maria de Albuquerque Fontes Costa¹,
Rafaely da Silva Juvenal²,
Gabriel Henrique Rodrigues de Medeiros³,
Orientador: Angela Cavalcanti Marcondes⁴,
Co-orientador: Joana Helisa Assis da Silva⁵


RESUMO

A depressão resistente ao tratamento (DRT) afeta cerca de um terço dos pacientes com transtorno depressivo maior (TDM), sendo caracterizada pela ausência de resposta a pelo menos dois antidepressivos. A estimulação magnética transcraniana repetitiva (EMTr) tem sido estudada como uma alternativa eficaz para a DRT, com potenciais benefícios na redução de sintomas depressivos. Este estudo buscou avaliar a eficácia da EMTr como tratamento adjuvante para DRT por meio de uma revisão de literatura que analisou artigos publicados nos últimos cinco anos, utilizando as bases de dados PubMed e LILACS. A EMTr mostrou eficácia na redução dos sintomas depressivos e ideação suicida em pacientes com DRT, apesar da variação nos protocolos de estimulação utilizados, como diferentes frequências e durações. Embora a EMTr tenha demonstrado efeitos neuroplásticos, não houve evidências claras de que essas mudanças estruturais resultassem em melhorias clínicas significativas no curto prazo. Conclui-se que a EMTr é uma abordagem promissora para o tratamento da DRT, mas estudos adicionais são necessários para otimizar os protocolos e entender seus efeitos a longo prazo.

Palavras-Chaves: Depressão resistente ao tratamento, Estimulação Magnética Transcraniana, Transtorno Depressivo Maior, Neuroplasticidade.

ABSTRACT

Treatment-resistant depression (TRD) affects about one-third of patients with major depressive disorder (MDD) and is characterized by the failure to respond to at least two antidepressants. Repetitive transcranial magnetic stimulation (rTMS) has been studied as an effective alternative for TRD, with potential benefits in reducing depressive symptoms. This study aimed to evaluate the effectiveness of rTMS as an adjunctive treatment for TRD through a literature review that analyzed articles published in the last five years, using the PubMed and LILACS databases. rTMS showed effectiveness in reducing depressive symptoms and suicidal ideation in TRD patients, despite variations in stimulation protocols, such as different frequencies and durations. Although rTMS demonstrated neuroplastic effects, there was no clear evidence that these structural changes resulted in significant short-term clinical improvements. It is concluded that rTMS is a promising approach for TRD treatment, but further studies are needed to optimize protocols and understand its long-term effects.

Keywords: Treatment-resistant depression, Transcranial Magnetic Stimulation, Major Depressive Disorder, Neuroplasticity.

1. INTRODUÇÃO

O transtorno depressivo maior (TDM) é um problema de saúde pública que afeta aproximadamente 5% da população mundial. Estudos indicam que o TDM impacta várias dimensões da vida humana, incluindo a sociabilidade, o sono, a capacidade cognitiva e o desempenho profissional. A Organização Mundial da Saúde considera o TDM a principal causa de incapacidade global (Soares et al., 2021). Dentre as pessoas que sofrem com o TDM, cerca de um terço apresenta depressão resistente ao tratamento (DRT), a qual é definida pela falha de resposta a pelo menos dois antidepressivos adequadamente administrados por no mínimo dois meses, incluindo um inibidor seletivo da recaptação de serotonina (ISRS) e um inibidor da recaptação de serotonina-norepinefrina (IRSN) (Akpinar et al., 2022). A resistência aos tratamentos convencionais, como psicoterapia e medicações, estimulou o interesse por abordagens alternativas, como a estimulação magnética transcraniana repetitiva (EMTr), uma técnica não invasiva que utiliza campos magnéticos para estimular o córtex pré-frontal dorsolateral esquerdo, com efeitos neurofuncionais em diferentes regiões cerebrais (Zengin et al., 2021). Estudos recentes sugerem que a EMTr, quando usada como complemento ao tratamento medicamentoso, sem ajuste nas doses dos antidepressivos, apresenta resultados promissores no tratamento da DRT.

Este estudo tem como objetivo explorar a eficácia da EMTr como adjuvante na terapia medicamentosa para DRT, avaliando seu impacto na qualidade de vida dos pacientes e buscando ampliar a compreensão sobre o uso dessa intervenção em contextos neuropsiquiátricos.

2. METODOLOGIA

A metodologia deste estudo envolveu uma revisão de literatura com o objetivo de investigar a aplicação da Estimulação Magnética Transcraniana Repetitiva (EMTr) no tratamento da depressão resistente. Foram realizadas buscas nas bases de dados PubMed e Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), utilizando os descritores “Transcranial Magnetic Stimulation” OR “TMS” AND “Refractory Depression” OR “Treatment-Resistant Depression”. As estratégias de busca foram ajustadas para cada base de dados conforme suas especificidades. No total, foram encontrados 667 artigos, sendo 344 publicados nos últimos cinco anos.

A seleção dos estudos foi conduzida em duas fases. Na primeira fase, títulos e resumos foram triados com base nos critérios de inclusão previamente definidos. Na segunda fase, os textos completos dos artigos pré-selecionados foram avaliados detalhadamente, aplicando-se os critérios de exclusão. Os critérios de inclusão consideraram estudos publicados nos últimos cinco anos e que abordassem especificamente a aplicação da EMTr em pacientes com depressão resistente. A restrição temporal foi adotada para garantir a relevância dos achados à luz das evidências mais recentes.

Os critérios de exclusão foram: (1) estudos publicados há mais de cinco anos; (2) pesquisas não originais, como revisões, editoriais, comentários e capítulos de livros; (3) artigos sem texto completo disponível, como resumos de congressos; (4) estudos que focavam exclusivamente em outros desfechos, como ansiedade, sem avaliação clara do fenótipo depressivo; e (5) artigos duplicados. Para minimizar o viés de seleção, dois revisores independentes conduziram a triagem e seleção dos estudos, com divergências resolvidas por um terceiro revisor.

Após a aplicação desses critérios, 7 artigos foram selecionados para análise final. Os dados desses estudos foram analisados por meio de uma síntese narrativa, focando na eficácia da EMTr no tratamento da depressão resistente e buscando identificar padrões e lacunas na literatura recente. A ênfase foi dada aos desfechos clínicos mais relevantes para a prática terapêutica, a fim de fornecer uma visão abrangente e atualizada sobre o tema.

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES

A Estimulação Magnética Transcraniana Repetitiva (EMTr) foi aprovada pela Food and Drug Administration (FDA) dos Estados Unidos em 2008 como uma alternativa à terapia eletroconvulsiva para o tratamento do transtorno depressivo maior (TDM), especialmente em pacientes que não respondem a um ou mais medicamentos antidepressivos. O primeiro dispositivo autorizado pela FDA focava a estimulação no córtex pré-frontal dorsolateral esquerdo (DLPFC). Desde então, mais cinco dispositivos foram aprovados, ampliando o leque de opções terapêuticas disponíveis (Matsuda, 2019).

Os efeitos da EMTr variam conforme os parâmetros de estimulação, como frequência dos pulsos, número de sessões e localização cerebral. Quando aplicada ao córtex, a EMTr pode ter efeitos excitatórios ou inibitórios, dependendo da frequência de estimulação. Além da depressão, a EMTr tem sido investigada para o tratamento de diversas outras condições, incluindo dor crônica, esquizofrenia e doenças neurodegenerativas, como Parkinson e Alzheimer (Matsuda, 2019).

3.1 Características dos Estudos Incluídos

A revisão incluiu estudos que investigaram a eficácia da EMTr no tratamento da depressão resistente ao tratamento (DRT). O foco principal foi na eficácia terapêutica, comparações de protocolos de tratamento e a busca por biomarcadores capazes de prever a resposta ao tratamento.

Os estudos variaram em termos de design, incluindo ensaios clínicos randomizados e estudos observacionais longitudinais. A maioria das investigações focou a EMTr no DLPFC esquerdo, variando parâmetros como a frequência e a duração da estimulação.

3.2 Eficácia Geral da EMTr

Um estudo comparou a eficácia da EMTr bilateral padrão com a estimulação burst theta (TBS) em adultos mais velhos com DRT. A EMTr foi aplicada por 48 minutos, enquanto o TBS por apenas 4 minutos. Os resultados sugerem que a TBS demonstrou eficácia equivalente à EMTr tradicional, com a vantagem de ser mais rápida. (Blumberger et al., 2022).

Outro estudo investigou a EMTr sincronizada com a fase alfa do EEG em pacientes com DRT. Não foram observadas diferenças significativas na resposta clínica entre os grupos sincronizados e não sincronizados, embora a sincronização tenha mostrado potencial para aprimorar a precisão do tratamento (George et al., 2023).

3.4 Comparação entre Diferentes Protocolos de EMTr

A comparação de diferentes protocolos foi um foco importante na revisão. Um estudo randomizado comparou a EMTr padrão com a estimulação theta burst intermitente personalizada (cgiTBS) guiada por neuroimagem. Ambos os tratamentos se mostraram igualmente eficazes na redução dos sintomas ao longo de 26 semanas, sugerindo que a personalização do tratamento pode não ser superior à aplicação padrão (Morriss et al., 2024).

Em outro estudo, a EMTr de 10 Hz foi comparada com o TBS intermitente (iTBS) em pacientes com DRT e ideação suicida. Ambos os tratamentos foram eficazes na redução da ideação suicida, sem diferença significativa entre eles, reforçando a viabilidade dessas duas modalidades para esse grupo de pacientes (Mehta et al., 2022).

3.5 Resultados Neuroplásticos e Implicações Clínicas

Estudos recentes investigaram os efeitos neuroplásticos da EMTr. Dalhuisen et al. (2020) relataram aumento na espessura cortical no giro do cíngulo esquerdo após tratamento com EMTr em pacientes com DRT. No entanto, essas mudanças estruturais não se traduziram necessariamente em melhorias clínicas evidentes no curto prazo. Por outro lado, Cheng et al. (2022) relataram que o theta burst intermitente prolongado (piTBS) foi mais eficaz na redução de sintomas somáticos associados à ansiedade, embora tenha mostrado eficácia limitada em sintomas gerais de depressão.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os estudos analisados indicam que a Estimulação Magnética Transcraniana Repetitiva (EMTr) é uma ferramenta eficaz para o tratamento da depressão resistente ao tratamento, mostrando-se promissora na redução de sintomas depressivos e ideação suicida. No entanto, a eficácia da EMTr pode variar conforme o protocolo de estimulação utilizado e as características individuais dos pacientes. Embora a EMTr possa promover mudanças neuroplásticas no cérebro, não há evidências conclusivas de que esses efeitos estruturais resultem em benefícios clínicos significativos a curto prazo. Os estudos revisados apresentam algumas limitações que devem ser consideradas. A variabilidade nos protocolos aplicados, como a diferença nos parâmetros de estimulação e o tamanho relativamente pequeno das amostras em alguns estudos, pode impactar os resultados e dificultar a generalização dos achados. Dessa forma, é essencial realizar mais pesquisas que busquem otimizar os protocolos e personalizar as intervenções, visando maximizar os resultados terapêuticos e clínicos.

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