A ANÁLISE JURÍDICA QUANTO A INEFICÁCIA DA PRISÃO CIVIL POR DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE PRESTAR ALIMENTOS

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102411291037


Régis Ferreira Barbosa1


RESUMO

O presente trabalho analisa a ineficácia da prisão civil por descumprimento da obrigação de prestar alimentos, abordando os desafios jurídicos e sociais dessa medida coercitiva no ordenamento jurídico brasileiro. O objetivo é investigar se a prisão civil cumpre adequadamente sua função de garantir o cumprimento da obrigação alimentar, examinando alternativas que respeitem a dignidade humana e promovam a efetividade do direito à prestação de alimentos. Utiliza-se o método dedutivo, com pesquisa bibliográfica em doutrinas, artigos científicos e jurisprudência, além da análise da legislação vigente. O estudo conclui que a prisão civil, embora prevista na Constituição, muitas vezes se mostra ineficaz, especialmente em casos onde o devedor não possui condições econômicas para arcar com a obrigação. Como alternativa, sugere-se a adoção de medidas mais eficientes e proporcionais, como a execução por sub-rogação e outras formas de coerção indireta, que assegurem a satisfação do direito sem comprometer os direitos fundamentais do devedor.

Palavras-chave: Alimentos. Prisão civil. Direito. Ineficácia. Dignidade humana.

ABSTRACT

This work analyzes the ineffectiveness of civil imprisonment for non -compliance with the obligation to provide food, addressing the legal and social challenges of this coercive measure in the Brazilian legal system. The objective is to investigate whether civil prison adequately fulfills its function of guaranteeing compliance with the food obligation, examining alternatives that respect human dignity and promote the effectiveness of the right to food provision. The deductive method is used, with bibliographic research on doctrines, scientific articles and jurisprudence, in addition to the analysis of current legislation. The study concludes that civil imprisonment, although provided for in the Constitution, often proves to be ineffective, especially in cases where the debtor does not have the economic conditions to bear the obligation. As an alternative, it is suggested to adopt more efficient and proportional measures, such as enforcement by subrogation and other forms of indirect coercion, which ensure the satisfaction of the right without compromising the debtor’s fundamental rights.

Keywords:    Food.    Civil    arrest.    Right.    Ineffectiveness.    Human    dignity.

1  INTRODUÇÃO

O direito à prestação de alimentos é uma obrigação legal de grande relevância no ordenamento jurídico brasileiro, essencial para garantir a subsistência e o bem-estar de dependentes que, muitas vezes, se encontram em situação de vulnerabilidade econômica. A previsão de medidas coercitivas para assegurar o cumprimento dessa obrigação, como a prisão civil do devedor de alimentos, está expressamente disposta na Constituição Federal de 1988 (art. 5º, LXVII), representando uma das poucas hipóteses de restrição à liberdade por dívida no Brasil. No entanto, a aplicação dessa medida vem sendo objeto de debates quanto à sua eficácia e adequação.

A prisão civil do devedor inadimplente, em tese, visa compelir o cumprimento da obrigação alimentar, funcionando como um meio de coerção para garantir o direito fundamental à vida e à dignidade daqueles que dependem dessa prestação. Contudo, na prática, verifica-se que essa medida nem sempre atinge o objetivo desejado, especialmente em situações onde o devedor não dispõe de meios financeiros para adimplir a obrigação ou utiliza o cárcere como um instrumento de recusa consciente, sabendo que a sanção imposta será temporária.

Diante disso, surge o questionamento central deste estudo: como suprir a ineficácia da aplicação da prisão civil do devedor de alimentos quanto ao fim que lhe é proposto? A análise dessa questão é fundamental para repensar o uso de instrumentos legais e judiciais que efetivamente assegurem o cumprimento da obrigação alimentar, sem comprometer os direitos fundamentais das partes envolvidas, especialmente a dignidade humana do devedor.

Este artigo tem como objetivo geral explorar, por meio de uma análise jurídica detalhada, a ineficácia da prisão civil como medida coercitiva no cumprimento de alimentos, destacando a necessidade de alternativas mais adequadas e eficientes. Para tanto, serão abordadas as características da obrigação alimentar, a distinção entre prisão penal e prisão civil, e os mecanismos de execução de alimentos, com foco na prisão civil do devedor inadimplente.

2     A ANÁLISE JURÍDICA QUANTO A INEFICÁCIA DA PRISÃO CIVIL POR DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE PRESTAR ALIMENTOS

A obrigação de prestar alimentos possui um papel fundamental na manutenção do sustento e da dignidade daqueles que dependem financeiramente de outrem, sendo especialmente relevante em casos que envolvem menores, idosos ou cônjuges em situação de vulnerabilidade. Para garantir o cumprimento dessa obrigação, o ordenamento jurídico brasileiro prevê a possibilidade da prisão civil do devedor inadimplente, conforme disposto no artigo 5º, inciso LXVII, da Constituição Federal de 1988. Tal medida, no entanto, vem sendo alvo de intensos debates quanto à sua eficácia na prática.

A prisão civil é um mecanismo coercitivo que visa pressionar o devedor a cumprir com suas obrigações alimentares, sob pena de restrição à sua liberdade. Apesar de seu caráter excepcional e sua previsão como forma de assegurar a subsistência do credor, a aplicação dessa sanção nem sempre se revela eficiente para atingir o fim desejado, sobretudo em contextos em que o devedor não possui recursos financeiros suficientes ou em que a medida acaba sendo vista como desproporcional à natureza da obrigação.

Neste capítulo, propõe-se uma análise jurídica detalhada sobre a ineficácia da prisão civil como instrumento de coerção no cumprimento da obrigação alimentar. A abordagem parte de uma revisão das normativas pertinentes, seguidas pela reflexão sobre os principais desafios enfrentados na prática, com o intuito de discutir alternativas viáveis que possam contribuir para a efetividade do cumprimento dessa obrigação sem ferir a dignidade humana.

2.1.    Obrigação alimentar e suas características

A obrigação alimentar é uma responsabilidade jurídica estabelecida principalmente nas relações de parentesco e união familiar, com o objetivo de garantir a subsistência de quem não possui meios próprios para satisfazer suas necessidades básicas. Essa obrigação é essencialmente destinada a cobrir gastos fundamentais, como moradia, alimentação, saúde, educação e vestuário, e baseia- se em princípios de solidariedade e assistência mútua entre familiares.

Dentre suas características principais, destaca-se o caráter indispensável e personalíssimo da obrigação, o que significa que ela se destina diretamente ao beneficiário e não pode ser transferível a terceiros. A obrigação alimentar é, em geral, irrepetível, isto é, o valor pago não pode ser reclamado de volta, uma vez que atende a necessidades imediatas.

Além disso, a obrigação é proporcional, considerando tanto as possibilidades financeiras de quem paga quanto as necessidades de quem recebe, e pode ser ajustada caso haja mudanças nas condições econômicas de qualquer das partes. Essas características visam garantir um equilíbrio entre as partes e assegurar que o alimentando receba o suporte necessário para viver com dignidade.

Da Evolução Histórica

O dever alimentar, presente desde as primeiras civilizações, estava inicialmente fundamentado na moral e na virtude, cumprido por motivos de consciência, sem a necessidade de regulamentação jurídica. Esse dever era exercido como officium pietatis, uma obrigação moral. Somente com o surgimento do ius positum (direito positivado) os alimentos adquiriram caráter legal, respaldado por normas e princípios constitucionais, sendo considerados de ordem pública (Tartuce, 2017).

No Direito Romano, o dever de prestar alimentos entre ascendentes e descendentes não era previsto até a era imperial. Durante o período arcaico, em uma sociedade patriarcal, o pater famílias exercia poder absoluto sobre a família, inclusive decidindo sobre a vida e morte de seus membros. Com a evolução do direito romano, especialmente no período imperial, o parentesco sanguíneo passou a ser valorizado, permitindo o reconhecimento do direito mútuo a alimentos entre consanguíneos. (Madaleno, 2017).

Nas Ordenações Filipinas, registrou -se a primeira normatização sobre o dever alimentar no Brasil, prevendo que os alimentos se limitavam ao necessário para a sobrevivência do alimentando. O Código Civil de 1916 trouxe a obrigação alimentar como dever dos cônjuges, ainda com uma visão patriarcal, atribuindo ao homem a responsabilidade de prover o sustento familiar. A Lei n.º 883/49 permitiu o reconhecimento de paternidade e o consequente direito aos alimentos para filhos “ilegítimos”, situação que evoluiu até a consagração da igualdade entre os filhos pela Constituição de 1988. (Gagliano; Filho, 2017).

Com o passar do tempo, as mudanças sociais exigiram novas legislações, como a Lei n.º 5.478/68, que estabeleceu procedimentos específicos para as ações de alimentos. O dever de prestar alimentos é de interesse público, com o Estado assumindo a responsabilidade de assistência quando o dever não é cumprido pelos familiares (Dias, 2017).

A Constituição de 1988 reforçou o dever mútuo entre pais e filhos, estabelecendo a assistência financeira entre eles. O Código Civil vigente manteve as disposições gerais sobre o direito a alimentos, aprimorando as normas aplicáveis entre cônjuges, companheiros, pais e filhos, reguladas entre os artigos 1.694 e 1.710. Assim, a obrigação de prestar alimentos sempre derivou do poder familiar, fundamentada no princípio da solidariedade e reciprocidade familiar.

Conceito e características

A palavra alimento vem do latim alimentu, sendo um substantivo masculino comumente usados para designar qualquer substância química digerível utilizada para nutrir e saciar a fome de seres vivos. No entanto, no campo jurídico, o termo assume uma conotação mais ampla. De acordo com Rosana Fachin (2005), “os alimentos têm como finalidade suprir as necessidades vitais de uma pessoa, o que confere ao termo um significado muito mais extenso do que apenas o simples sustento.”

Em sentido amplo (lato sensu), os alimentos englobam tudo o que é essencial para o sustento, incluindo habitação, vestuário, despesas médicas e educacionais, conforme ensinado por Pontes de Miranda, citado por Rosana Fachin (2005). De acordo com Maria Berenice Dias (2017) complementa essa visão, afirmando que:

Os alimentos não se destinam apenas à manutenção f ísica da pessoa. A inexistência de necessidade de indigência ou pobreza por parte de quem os recebe reflete os princípios constitucionais, ampliando o conceito para além da mera subsistência, reconhecendo a ampla dimensão da dignidade humana. Assim, o conceito de necessidade deve ser compreendido à luz da ideia de dignidade humana, como estipulado na Constituição.

Desse modo, o instituto dos alimentos busca atender às necessidades vitais do beneficiário, fundamentando-se no princípio da dignidade humana. Por esse motivo, os alimentos devem abranger tanto o necessário para a sobrevivência quanto outras necessidades básicas. O artigo 1.694 do Código Civil reflete essa amplitude ao dispor que:

Podem os parentes, cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos necessários para viver de forma compatível com sua condição social, inclusive para atender às necessidades de educação.” O Código Civil de 2002 dedicou um subtítulo com 17 artigos (arts. 1.694 a 1.710) especificamente ao direito a alimentos.

Além disso, a doutrina classifica os alimentos em duas categorias: naturais (ou necessários) e civis (ou congros). Os alimentos naturais visam exclusivamente ao essencial para a sobrevivência, abrangendo sustento, cura, vestuário e habitação (art. 1.920 do CC). Já os alimentos civis destinam-se a cobrir necessidades adicionais, como educação, lazer, transporte, higiene e até aspectos culturais, conforme as possibilidades financeiras do alimentante (Dias, 2017).

Desta forma, os alimentos podem ser classificados conforme a causa jurídica que os originou: legítimos, voluntários ou indenizatórios. Alimentos indenizatórios são decorrentes de ato ilícito, funcionando como forma de compensação (ex delicto) (art. 948, II e art. 950 do CC). Já os alimentos voluntários (art. 1.920 do CC) são aqueles que, sem obrigação legal, são prestados por vontade própria, podendo ser declarados em testamento ou outro ato de última vontade (Gagliano; Filho, 2017).

Os alimentos legítimos, foco deste estudo, resultam de uma obrigação legal baseada em vínculos de conjugalidade, parentalidade ou solidariedade, conforme previsto no art. 1.694 do CC. Em alguns casos, essa obrigação pode ter início desde a concepção, como ocorre com os chamados alimentos gravídicos.

O direito aos alimentos é personalíssimo, ou seja, a pessoa que necessita de alimentos é a titular desse direito e pode reivindicá-lo a qualquer momento. Como destaca Madaleno (2017), “o direito a alimentos visa a preservar a vida do indivíduo, não podendo ser transferido a outra pessoa, como se fosse um negócio jurídico.”

Por fim, Flávio Tartuce (2017) observa que a obrigação alimentar está mais

ligada a direitos existenciais e de personalidade do que a direitos patrimoniais, destacando as particularidades desse direito. Entre elas, estão a irrenunciabilidade, impenhorabilidade, imprescritibilidade, incompensabilidade e a sua indisponibilidade. As     características        do       direito aos alimentos possuem uma natureza personalíssima, o que lhe confere particularidades únicas  em comparação com outros direitos e obrigações previstos no Código Civil, sendo ele condicionado ao direito à vida.

Irrenunciável

O direito aos alimentos é irrenunciável, ou seja, mesmo que o alimentando decida não exercer o direito, ele não pode renunciá-lo de forma definitiva (art. 1.707 do CC). Caso ele venha a necessitar futuramente, poderá reivindicá-lo. Assim, o

direito a alimentos é inalienável, não passível de cessão ou compensação, e nem mesmo pode ser penhorado. Como explica Rolf Madaleno (2018), essa irrenunciabilidade se baseia no interesse social e na dignidade humana. No entanto, o credor pode decidir não cobrar as prestações alimentícias vencidas, como previsto no art. 775 do Código de Processo Civil.

Imprescritibilidade

O direito de pedir alimentos é imprescritível, podendo ser requerido a qualquer tempo, mesmo que nunca tenha sido exercido. Isso significa que o alimentando, enquanto possuir necessidade, poderá pleitear alimentos independentemente de qualquer lapso temporal. A prescrição se aplica apenas à cobrança de prestações alimentícias, que deve ser realizada no prazo de dois anos, conforme o art. 206, §2º, do Código Civil.

Incompensabilidade

Os valores fixados para alimentos não podem ser compensados com outras dívidas ou valores prestados ao alimentando. Isso ocorre devido à natureza específica da obrigação, que visa exclusivamente a subsistência do credor. Como bem explica Rolf Madaleno, os alimentos estabelecidos judicialmente devem ser pagos integralmente, sem que o devedor alegue ter cumprido a obrigação através de outras prestações, como o pagamento de despesas escolares ou médicas.

Irrepetibilidade

O princípio da irrepetibilidade estabelece que os alimentos pagos não podem ser devolvidos, mesmo que pagos indevidamente. Isso se justifica pela própria natureza da obrigação alimentar, que visa garantir a sobrevivência do alimentando. Uma vez consumidos, os alimentos não podem ser restituídos. Assim, protege-se o alimentando de eventuais situações em que teria que devolver valores já utilizados para sua subsistência.

Transmissibilidade

Apesar de ser uma obrigação personalíssima, o Código Civil prevê a transmissibilidade da obrigação alimentar aos herdeiros do devedor (art. 1.700 do CC). No entanto, essa previsão gera controvérsia doutrinária e jurisprudencial, uma

vez que muitos autores consideram inadequada a transmissão de uma obrigação tão pessoal. Na prática, a obrigação alimentar geralmente se extingue com a morte do devedor, sendo transmitidas apenas as prestações vencidas e não pagas.

Reciprocidade

O dever de prestar alimentos é recíproco, aplicando-se entre cônjuges, companheiros, pais e filhos, assim como entre ascendentes e parentes em grau mais próximo (arts. 1.694 e 1.696 do CC). Isso significa que o alimentante de hoje pode, em um momento futuro, se tornar o alimentando. A reciprocidade também abrange relações socioafetivas, conforme o Enunciado n. 341 da IV Jornada de Direito Civil, o que permite a obrigação alimentar mesmo em casos sem vínculo sanguíneo, mas onde exista paternidade socioafetiva.

2.2 Distinção entre prisão penal e prisão civil

A prisão civil por dívida envolve a restrição da liberdade de um indivíduo como consequência de um ilícito civil, onde o devedor é aprisionado no âmbito privado. A Constituição brasileira, em seu art. 5º, LXVII, prevê a prisão civil apenas para o devedor de alimentos, sendo a única forma de prisão civil permitida após a Súmula Vinculante n. 25 do STF, que proibiu a prisão do depositário infiel.

Em conformidade com Azevedo (2016) define a prisão civil como “o ato de constrangimento pessoal, autorizado por lei, mediante segregação do devedor, para forçar o cumprimento de uma obrigação”. Ele destaca que essa prisão tem caráter civil e coercitivo, sendo um instrumento de pressão para que o devedor pague a dívida alimentícia. Já Marinoni e Arenhart (2018) reforçam essa ideia ao afirmarem que a prisão não visa punir, mas garantir o pagamento da dívida, desde que o inadimplemento seja voluntário e sem justificativa.

No entanto, é possível questionar essa visão. Alguns autores defendem que a prisão civil deve ser uma medida de último recurso, não a primeira solução. Como Azevedo, 2016) destaca que, historicamente, a prisão civil passou por três estágios: o primeiro envolvia a servidão do devedor ao credor; o segundo estágio introduziu o aprisionamento do devedor como vingança do credor; e o terceiro, mais recente, utiliza a prisão como uma forma de pressão psicológica para forçar o pagamento da dívida, sem a intenção de punição física.

De acordo com Kim e Ezequiel (2016) discutem:

A evolução da obrigação alimentar, originalmente uma questão moral entre familiares, que o direito positivo transformou em uma obrigação jurídica. Nesse contexto, a prisão civil foi desenvolvida como forma de aliviar o Estado da responsabilidade de garantir a sobrevivência de seus cidadãos, transferindo essa obrigação para o âmbito familiar.

Embora a prisão civil seja um mecanismo patrimonial, alguns autores, como Luiz Fux, ministro do STF, defendem sua legitimidade como forma de assegurar o cumprimento da obrigação alimentícia, dada sua natureza urgente e indispensável (Fux, 2019, p. 427). No entanto, o art. 528, § 5º do CPC refere-se à prisão civil como uma “pena”, o que levanta debates sobre sua natureza jurídica.

Para Mazzuoli (2012) argumenta que a prisão civil tem uma função coercitiva, agindo como pressão psicológica sobre o devedor para forçá-lo a cumprir a obrigação alimentícia. Azevedo (2012) concorda, afirmando que a prisão civil é um instrumento coercitivo de natureza econômica. Da mesma forma, Rodrigues e Talamini (2013) sustentam que, embora o CPC utilize o termo “pena”, a prisão civil não é punitiva, mas sim uma forma de pressão psicológica.

Em conformidade com Medina (2014) ressalta que o caráter coercitivo da prisão civil não exime o devedor de pagar a dívida alimentícia, sendo possível que a medida seja ineficaz. No entanto, há quem defenda que, apesar da doutrina majoritária considerar a prisão civil como uma forma de coerção, ela possui uma natureza penal, pois priva o indivíduo de sua liberdade.

Estudos citados por Maia (2013) apontam que não há como dissociar a prisão civil da penal, uma vez que ambas implicam a restrição da liberdade. Hentz (2016) também enxerga a prisão por dívida alimentícia como uma sanção jurídica comparável à prisão penal, enquanto Wedy (2013) sustenta que, embora os fundamentos sejam diferentes, os efeitos são os mesmos, já que o cerceamento da liberdade é igual em ambos os casos.

Segundo Cordeiro (2018) reforça que é incoerente admitir uma dupla identidade para a prisão civil, ora como medida privativa de liberdade, ora como coercitiva. Pena Júnior (2018) questiona se, para quem está preso, importa a natureza da prisão, já que a perda da liberdade é a mesma.

Conclui-se que, embora a prisão civil seja defendida como um meio coercitivo, ela carrega consigo uma carga punitiva, afetando psicologicamente o devedor. Segundo a Súmula 309 do STJ, a prisão civil por dívida alimentícia só é permitida para os três últimos meses de inadimplemento, além das prestações vencidas durante o processo. Para Cahali (2013), a prisão civil é um meio de execução patrimonial, enquanto Marmitt (2016) a descreve como uma técnica de pressão psicológica.

Portanto, embora a prisão civil seja amplamente aceita como uma medida coercitiva, seu caráter penal não pode ser ignorado, já que a liberdade do devedor é restringida, gerando efeitos semelhantes aos da prisão penal.

A distinção entre prisão penal e prisão civil é uma questão relevante dentro do estudo do direito, sendo que cada uma possui natureza, fundamentos e objetivos distintos. A prisão penal está associada ao Direito Penal e ocorre como consequência de uma condenação criminal após o devido processo legal. Em contraste, a prisão civil surge no âmbito do Direito Civil e não está ligada a crimes, mas sim ao descumprimento de certas obrigações civis específicas. Essa diferença reflete a dualidade de sistemas normativos voltados para a proteção de bens jurídicos distintos.

A prisão penal tem caráter punitivo e ressocializador. De acordo com Norberto Avena (2019), “a pena privativa de liberdade tem por finalidade não apenas punir o infrator, mas também ressocializá-lo, garantindo a segurança social e a prevenção de novos delitos.” A pena, aplicada após um processo penal, é sancionatória e visa a responsabilização criminal de um indivíduo que tenha cometido um ilícito penal. Esse tipo de prisão tem previsão na Constituição Federal (CF), que assegura que ninguém será privado de liberdade sem o devido processo legal (art. 5º, LIV, CF).

Já a prisão civil, como explica Carlos Roberto Gonçalves (2020), “é uma medida coercitiva voltada ao cumprimento de uma obrigação civil inadimplida, como no caso da prisão do depositário infiel e do devedor de alimentos.” A prisão civil não possui o caráter de sanção, mas sim de coerção, objetivando garantir o cumprimento de obrigações civis impostas por decisão judicial. Sua aplicação está hoje praticamente limitada ao inadimplemento de prestação alimentícia, conforme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), que declarou a prisão do depositário infiel inconstitucional (Súmula Vinculante n.º 25).

A principal diferença entre as duas prisões reside na natureza do ato que as desencadeia. Enquanto a prisão penal decorre de uma violação a normas criminais, a prisão civil ocorre pelo descumprimento de uma obrigação civil. Além disso, o objetivo das prisões penais é retributivo e preventivo, enquanto o da prisão civil é exclusivamente coercitivo. Para Diniz (2019), “a prisão civil, especialmente no caso de devedores de alimentos, visa assegurar a sobrevivência do alimentando, impondo ao devedor uma sanção de caráter pessoal.”

A prisão civil também se diferencia da penal quanto à sua duração e finalidade. Segundo o Código de Processo Civil (art. 528, §3º, CPC), a prisão por dívida alimentícia, por exemplo, deve ter duração limitada a três meses, enquanto a prisão penal pode ter durações variadas, de acordo com a gravidade do crime, podendo até chegar à pena de prisão perpétua em regimes penais estrangeiros. A prisão civil cessa assim que a obrigação é cumprida, ao passo que a penal não se extingue pelo mero desejo do apenado.

Além disso, a prisão civil por dívida alimentícia deve respeitar os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, como bem aponta Ada Pellegrini Grinover (2018). Ela destaca que “não se pode conceber a prisão civil como uma pena imposta ao devedor, mas como um meio coercitivo para compelir o devedor a cumprir uma obrigação essencial à subsistência de outrem.” Dessa forma, ela cumpre a função de pressionar o devedor para o cumprimento da obrigação.

Um ponto de conexão entre as duas modalidades de prisão é o respeito aos direitos fundamentais. Conforme o art. 5º, LXVII, da CF, é vedada a prisão civil por dívida, exceto no caso de inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia. Esse dispositivo reflete o compromisso do Estado brasileiro com a dignidade da pessoa humana, princípio central no ordenamento jurídico pátrio, que se manifesta na proibição de prisões arbitrárias tanto no âmbito penal quanto no civil.

No que tange à execução, a prisão penal segue o rito previsto na Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/1984), que estabelece o regime de cumprimento da pena, os direitos e deveres dos apenados e as medidas de ressocialização. A prisão civil, por outro lado, é regulada pelo Código de Processo Civil, que estipula o procedimento para sua aplicação e extinção, conforme observa Theodoro Júnior (2021), que enfatiza “o caráter eminentemente processual da prisão civil no Brasil, inserido no contexto do direito das obrigações.”

Sendo assim, embora tanto a prisão penal quanto a prisão civil resultem na privação de liberdade, as duas instituições possuem finalidades e características completamente distintas. Enquanto a prisão penal é uma forma de punição e prevenção a crimes, a prisão civil atua como um mecanismo coercitivo, limitado à garantia do cumprimento de certas obrigações civis, como o pagamento de pensão alimentícia. A distinção entre as duas formas de prisão é essencial para o entendimento da privação de liberdade em suas diferentes dimensões no ordenamento jurídico brasileiro.

3  A EXECUÇÃO DE ALIMENTOS COM PEDIDO DE PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR INADIMPLENTE

A Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015, conhecida como Novo Código de Processo Civil (NCPC), tem como objetivo proteger as situações jurídicas civis de maneira normativa, fornecendo uma base essencial para os atos processuais.

Nesse contexto, a relação processual é estabelecida entre o sujeito ativo, que pleiteia um direito, e o sujeito passivo, que deve atender a essa demanda. A partir dessa interação, surge uma obrigação que pode consistir em realizar um ato, se abster de um ato ou fornecer algo, como dinheiro ou bens definidos na lide. Após a fase de discussão sobre o direito em questão, a obrigação deve ser cumprida conforme estipulado.

Se o sujeito passivo não cumprir a obrigação, o legislador introduziu no NCPC o procedimento executivo especial no Título II, denominado “Cumprimento de Sentença”. Este estabelece normas para que a execução do direito pleiteado ocorra de forma eficaz. Este artigo se concentrará nos Capítulos III e VI, que abordam o cumprimento de sentença que reconhece a exigibilidade de obrigação de prestar alimentos e a execução de alimentos.

Uma vez definida a obrigação alimentar entre o alimentante e o alimentando, o primeiro assume um compromisso contínuo. Se o alimentante não cumprir com sua obrigação, o Código de Processo Civil de 2015 prevê a execução do crédito alimentar de diversas maneiras, sendo responsabilidade do Estado assegurar o cumprimento dessa obrigação.

Quando a obrigação está fundamentada em um título executivo judicial, o NCPC regula o cumprimento de sentença nos artigos 528 a 533. Para títulos executivos extrajudiciais, aplicam-se os artigos 911 a 913. Apesar das diferenças nas nomenclaturas e procedimentos, ambos visam a regularização da obrigação alimentar diante da inadimplência. Theodoro Júnior (2017) destaca que “o cumprimento de sentença para dar satisfação a crédito alimentício acha-se regulado pelos arts. 528 a 533, e o de verba da mesma natureza constante de título extrajudicial, pelos arts. 911 a 913”.

É importante ressaltar que, em ambos os procedimentos, utiliza-se a coação pessoal para garantir o cumprimento da obrigação, permitindo a prisão civil do alimentante. Esta medida reflete a seriedade da obrigação alimentar na relação familiar, com base no princípio da solidariedade. Assim, a prisão civil pode ser requerida pela parte interessada, constituindo uma exceção à regra constitucional que veda a prisão por dívida. Stolze (2016) pontua que:

A prisão civil decorrente de inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentar… é uma medida das mais salutares, pois a experiência nos mostra que boa parte dos réus só cumpre a sua obrigação quando ameaçada pela ordem de prisão.

Vale destacar que a prisão civil não é considerada uma pena ou sanção, mas uma medida coercitiva destinada a compelir o devedor ao cumprimento da obrigação. Assim, uma vez cumprida a obrigação, a prisão demonstra que atingiu seu objetivo, que é a quitação da dívida.

É preciso ressaltar que a prisão civil é aplicável apenas em casos de alimentos legítimos ou convencionais. Não se admite a prisão civil nem a adoção do procedimento de cumprimento de sentença para alimentos indenizatórios, que decorrem de indenizações por atos ilícitos. Além disso, o Ministério Público possui legitimidade ativa para a execução de alimentos nas hipóteses previstas no art. 201, III, da Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), independentemente do exercício do poder parental ou da situação de risco do menor.

No caso de a execução ser contra um funcionário público, militar ou empregado sujeito à legislação trabalhista, o artigo 912 do CPC autoriza o exequente a solicitar o desconto da prestação alimentícia diretamente em folha de pagamento. Por fim, o artigo 528 do NCPC é fundamental no processo de execução de alimentos, pois orienta o procedimento que pode resultar na prisão do devedor, caso não cumpra sua obrigação (Azevedo, 2019).

De acordo com o artigo 5º, inciso LXVII, da Constituição de 1988, a prisão civil é considerada uma exceção, uma vez que a Constituição proíbe a prisão por dívidas. No entanto, o legislador reconheceu a importância da obrigação alimentar, especialmente no que diz respeito à proteção dos menores (artigo 227, CF/88).

O Novo Código de Processo Civil (NCPC), em seu artigo 528, orienta a ação do credor ao possibilitar que o Estado seja utilizado para coagir o devedor a efetuar o pagamento das dívidas alimentares, sob pena de prisão civil. A norma estabelece que o valor a ser cobrado deve se restringir a no máximo três meses de inadimplência anterior ao ajuizamento da execução. O credor também pode exigir judicialmente o pagamento de dívidas referentes a um ou dois meses anteriores, mas em hipótese alguma poderá solicitar valores que excedam três meses, sob pena de indeferimento da ação (Martins, 2021).

Essa interpretação é corroborada pela súmula 309 do Superior Tribunal de Justiça, que afirma “o débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo”. Se o processo se prolongar, as parcelas que ainda vencerem durante a execução também são incluídas no crédito (artigo 911, caput, do Código de Processo Civil).

O juiz, a pedido do exequente, deve citar o executado para que este, no prazo de três dias, efetue e comprove o pagamento das parcelas devidas. A citação é um ato essencial para garantir a validade e a segurança jurídica do processo de execução. É através da citação frutífera que se inicia o prazo que poderá resultar na satisfação do crédito ou na prisão do devedor. A citação pode ser realizada por meio postal, onde a citação só é considerada válida se o executado a receber e assinar; por um oficial de justiça, contando o prazo a partir da juntada do mandado de citação (artigo 241, inciso II, do CPC); ou por carta precatória, cujo prazo começa a contar quando o juiz deprecante for informado de seu cumprimento (artigo 232, do CPC). Ademais, a citação por edital também é permitida (artigo 256, do CPC). Existe ainda a possibilidade de citação efetiva caso o executado compareça espontaneamente, conforme dispõe o artigo 239, § 1º, do CPC:

Para a validade do processo é indispensável a citação do réu ou do executado, ressalvadas as hipóteses de indeferimento da petição inicial ou de improcedência liminar do pedido.

§ 1º O comparecimento espontâneo do réu ou do executado supre a falta ou a nulidade da citação, f luindo a partir desta data o prazo para apresentação de contestação ou de embargos à execução.

Após a citação, se o executado não responder dentro do prazo estipulado, o juiz determinará, de ofício, o protesto do pronunciamento judicial (artigo 528, § 1º, do CPC). Se o exequente já tiver solicitado anteriormente, o juiz poderá decretar a prisão do devedor, que pode ser em regime fechado por um período de 30, 60 ou 90 dias (artigo 528, § 3º, do CPC). É importante ressaltar que o preso deve ser separado dos demais presos comuns (artigo 528, § 4º, do CPC). Além disso, a pena de prisão não exime o executado da obrigação de pagar as prestações vencidas e aquelas que ainda vencerão (artigo 528, § 4º, do CPC).

4   A INEFICÁCIA DA PRISÃO CIVIL POR DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE PRESTAR ALIMENTOS

A prisão civil do inadimplente de pensão alimentícia é um tema que gera intensos debates, sendo amplamente discutido por diversos doutrinadores. Essa medida é vista como uma norma coercitiva que visa garantir o cumprimento de obrigações, sem a intenção de punir. Embora tenha como objetivo assegurar a execução da obrigação alimentícia, há discussões sobre sua eficácia como ferramenta de coerção.

Nesse contexto, Stolze e Pamplona Filho (2021) afirmam que:

A prisão civil decorrente de inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentar, considerando a importância do interesse em questão (subsistência do alimentando), é uma medida necessária, pois a experiência mostra que muitos réus só cumprem suas obrigações quando ameaçados com a ordem de prisão. (Stolze e Pamplona Filho, 2021, p. 251).

Os autores sustentam que a prisão civil pode ser eficaz, levando o devedor a saldar suas dívidas, uma vez que a possibilidade de encarceramento é um forte desincentivo. No entanto, é crucial considerar a dignidade da pessoa humana, pois o inadimplemento da obrigação alimentar compromete essa prerrogativa, que deve ser preservada mesmo diante da prisão civil. Por outro lado, Marinoni, Arenhart e Mitidiero (2016) argumentam que, embora a prisão civil seja um meio drástico de coação, é fundamental para a execução das pensões alimentícias:

Embora constitua um meio violento de restrição da liberdade, a prisão civil é um mecanismo crucial para assegurar o cumprimento das obrigações alimentícias. Não deve haver preconceito em seu uso, pois é imprescindível para garantir a manutenção digna do alimentando, sendo aplicável apenas quando o devedor descumpre sua obrigação de forma ‘voluntária e inescusável’, ou seja, quando possui condições f inanceiras e ainda assim não paga. (Arenhart e Mitidieiro, 2016, p. 1.028).

De acordo com Stolze e Pamplona Filho (2021) esclarecem que a prisão civil é autorizada apenas em casos de inadimplemento de pensões alimentícias, não se aplicando a situações de alimentos voluntários ou indenizatórios. Antes do Código de Processo Civil de 2015, a jurisprudência estabelecia que a prisão civil do devedor de alimentos era válida para as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e aquelas que vencessem durante o processo (Stolze e Pamplona Filho, 2021).

Assim, muitos doutrinadores consideram a prisão civil essencial para garantir os pagamentos de pensões alimentícias. Contudo, Pinto (2017) critica essa prática, afirmando que:

A prisão civil do devedor de pensão alimentícia viola princípios constitucionais, como a dignidade da pessoa humana e a cidadania, desrespeitando os direitos humanos e a liberdade. Essa medida afronta tratados internacionais, que proíbem a prisão civil por dívidas. (Pinto, 2017, p. 91).

O autor destaca que a prisão civil transgride a Constituição Federal de 1988, especialmente no que tange à dignidade da pessoa humana, gerando conflito com normas internacionais de direitos humanos. Segundo Júnior (2018) argumenta que:

Utilizar a prisão civil como meio de coerção para o devedor de alimentos é uma forma de violência. Muitos alimentandos, em sua maioria f ilhos do devedor, não concordariam com essa punição. A dignidade deles deve ser garantida pelo pagamento das pensões, não pela prisão  de seus  pais. (Pena Júnior, 2018, p. 359).

O autor enfatiza que a prisão civil do inadimplente alimentar pode violar a dignidade da pessoa, e que, se os filhos fossem consultados, muitos se oporiam a essa medida. Assim, as prestações alimentares devem ser pagas para garantir a dignidade dos dependentes, mas não através da prisão dos genitores, pois essa abordagem não atende ao melhor interesse das crianças. A oposição à prisão civil baseia-se no princípio da dignidade humana, e é necessário adotar medidas eficazes para combater a sonegação, priorizando a execução contra o patrimônio do devedor, com ações como expropriação de bens, aplicação de multas diárias e restrições em serviços de crédito.

Assim, a prisão civil do devedor de alimentos não é equivalente à prisão penal, e sua aplicação pode prejudicar a dignidade da pessoa humana, uma vez que existem métodos mais eficazes para garantir o cumprimento das obrigações alimentícias.

Em síntese, a prisão civil não deve ser uma solução prioritária para o inadimplemento de pensões alimentícias. A necessidade de proteção dos dependentes deve ser equilibrada com o respeito à dignidade do devedor. Há um claro consenso de que a privação da liberdade, embora considerada uma opção em certos casos, deve ser utilizada como último recurso, uma vez que pode gerar mais dificuldades para o devedor, dificultando seu cumprimento das obrigações alimentares.

Sendo assim, é necessário aplicar sanções ao devedor alimentar, mas a prisão se mostra desproporcional. As medidas coercitivas devem ser direcionadas de forma a garantir o cumprimento das obrigações alimentares sem comprometer a dignidade do devedor, buscando sempre soluções mais justas e eficazes.

5  CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise jurídica da ineficácia da prisão civil por descumprimento da obrigação de prestar alimentos revela uma série de inconsistências e limitações que comprometem a efetividade desse mecanismo coercitivo. Embora a prisão civil tenha sido concebida como uma medida para garantir o cumprimento das obrigações alimentares, sua aplicação frequentemente resulta em um desbalanceamento entre os direitos do devedor e a proteção dos direitos do alimentando.

Em primeiro lugar, a prisão civil pode agravar a situação do devedor, levando à perda da sua capacidade de trabalho e, consequentemente, dificultando ainda mais o cumprimento de suas obrigações. Além disso, a medida não aborda as causas subjacentes da inadimplência, como a falta de emprego ou de condições financeiras adequadas, e, assim, não contribui efetivamente para a satisfação das necessidades do alimentando.

Ademais, a desigualdade na aplicação da prisão civil em comparação com as sanções previstas para crimes comuns levanta questões sobre a proporcionalidade e razoabilidade da medida, que pode ser vista como um retrocesso em relação aos avanços na proteção dos direitos humanos. Em vez de proporcionar uma solução eficaz, a prisão civil pode perpetuar um ciclo de vulnerabilidade e desigualdade.

Diante desse panorama, é imprescindível buscar alternativas mais justas e eficazes para garantir a quitação das obrigações alimentares. Medidas como a penhora de salários, a criação de programas de trabalho comunitário ou a possibilidade de acordos flexíveis podem ser opções mais adequadas que respeitem a dignidade do devedor, ao mesmo tempo que asseguram os direitos do alimentando. Assim, a revisão das práticas atuais e a adoção de soluções mais humanas e pragmáticas são essenciais para efetivar o direito à alimentação de forma que respeite os princípios constitucionais e os direitos fundamentais de todos os envolvidos.

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1 Graduando do Curso de Direito do Centro Universitário Fametro. E-mail: ferreiraregis21@gmail.com. ORCID: 0009-0005-2341-8949.