SAÚDE MENTAL E QUALIDADE DE VIDA DE PACIENTES COM ESCLEROSE MÚLTIPLA.

MENTAL HEALTH AND QUALITY OF LIFE OF PATIENTS WITH MULTIPLE SCLEROSIS.

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10038620


Adriana Menezes de Lira¹
Rodrigo Dourado de Almeida²


RESUMO

Introdução: A esclerose múltipla é uma patologia crônica, autoimune, desmielinizante e progressiva, de etiologia multifatorial. Possui uma vasta sintomatologia e curso clínico imprevisível. Por conta do variado quadro clínico, terapia medicamentosa e alguns outros fatores a qualidade de vida dos pacientes é afetada e estes são acometidos por vários transtornos psiquiátricos como transtornos de humor e a depressão. Objetivo: Relacionar a saúde mental e a qualidade de vida de pacientes com esclerose múltipla. Método: Artigo de revisão integrativa da literatura usando bases de dados Scielo e PMC. Resultados e Discussão: A análise dos estudos selecionados evidenciou que os pacientes com esclerose múltipla, estão mais propensos ao desenvolvimento de transtornos psiquiátricos, como o transtorno depressivo, em relação a população em geral e a qualidade de vida está afetada, com redução de sua percepção associada a aspectos clínicos, efeitos adversos das medicações, fadiga, ansiedade, estresse e depressão, este último sendo o principal fator apontado para o risco de suicídio.Conclusão: Em conclusão foi observado que os pacientes com esclerose múltipla estão mais suscetíveis ao desenvolvimento de transtornos psiquiátricos e consequente redução da percepção da qualidade de vida.

Palavras-chave: Esclerose Múltipla. Saúde mental. Qualidade de vida. Depressão.

ABSTRACT

Introduction: Multiple sclerosis is a chronic, autoimmune, demyelinating and a progressive pathology of multifactorial etiology. It has a wide range of symptoms and an unpredictable clinical direction. Due to the varied clinical condition, drug therapy and some other factors, the quality of life of patients is committed and they are affected by some psychiatric disorders such as mood disorders and depression. Objective: Relate the mental health and quality of life of patients with multiple sclerosis. Method: Integrative literature review article using Scielo and PMC databases. Results and Discussion: The analysis of the selected studies showed that patients with multiple sclerosis are more prone to the development of psychiatric disorders, such as depressive disorder, in relation to the general population and quality of life is affected, with a reduction in their perception associated with clinical aspects, adverse effects of medications, fatigue, anxiety, stress and depression, the depression being the main factor pointed to the risk of suicide. Conclusion: In conclusion, it was observed that patients with multiple sclerosis are more susceptible to the development of psychiatric disorders and reduction in the perception of quality of life.

Keywords: Multiple sclerosis. Mental health. Quality of life. Depression.

INTRODUÇÃO

A esclerose múltipla (EM) é considerada a manifestação patológica não traumática, crônica, autoimune, desmielinizante e progressiva mais frequente do sistema nervoso central (PINTO & GUERRA, 2018; CAMPOS & TOLDRA,2019). A incidência é de 0,3-1,9 a cada 100.000 pessoas por ano, sendo afetados principalmente adultos jovens, do sexo feminino com relação de 2:1 em comparação ao masculino (FRAZAO et al.,2015). Sua etiologia ainda é algo incerto, entretanto, acredita-se em uma causa multifatorial, em que a EM decorreria de um conjunto de fatores genéticos e ambientais que juntos desencadeariam alteração no sistema imune do indivíduo, lesionando a substância branca de forma majoritária, destruindo mielina, oligodendrócito e axônio, provocando uma deficiência na condução dos impulsos nervosos e por sua vez, o aparecimento do quadro sintomatológico do paciente (CROVADOR et al., 2013; CERQUEIRA et al., 2015).

Esta patologia possui características clínicas bem amplas onde déficits motores, sinais cerebelares, neurite óptica, diplopia, alterações sensoriais e dos esfíncteres podem se manifestar. Além de sintomas psiquiátricos como, choro, riso patológico, mania, alucinações e depressão que comumente estão presentes nesses pacientes (CERQUEIRA et al., 2015). Em adição a diferentes manifestações clínicas, apresenta curso clínico imprevisível, podendo ser categorizada em 4 tipos : 1 – remitente recorrente (RR), é o mais frequente e se define por intervalo de tempo com surto de sintomas e posterior remissão parcial ou total; 2 – primária progressiva (PP) nesta, a partir do início da patologia há diminuição de forma progressiva; 3- secundária progressiva (SP) este é conhecido por ter deterioração continuada depois de período surto remissão, e 4 – Progressiva recorrente (PR) que segue em progressão entre os períodos de surto (CAMPOS & TOLDRA,2019; TINOCO et al., 2019).

Para o diagnóstico são necessários alguns pontos, como, ter 2 ou mais ataques ou evidência clínica objetiva de duas ou mais lesões, ou ter evidência clínica objetiva de 1 lesão junto com história de 1 ataque anterior. O paciente ao receber esse diagnóstico, passa por um período em que considera ter sua identidade “perdida” e o processo de adaptação com a doença vai necessitar de um “reencontro” do sentido da vida (FINKELSZTEJN,2014; PINTO & GUERRA, 2018). O seguimento da conduta terapêutica é feito com imunomoduladores que auxiliam a mudar o curso da patologia e terapia sintomática. Para tratamento de recidivas, geralmente é usado corticosteroides e ACTH que agem com efeito anti-inflamatório e imunomodulador (FINKELSZTEJN,2014).

Os aspectos gerais dessa patologia, impactam significativamente na saúde mental desses pacientes. O vasto quadro clínico apresentado acaba por influir, de forma negativa na qualidade de vida. Inúmeros transtornos psiquiátricos acometem frequentemente pacientes com EM, entre eles estão os transtornos de humor, que muitas vezes são decorrentes direta ou indiretamente da terapia medicamentosa usada, ou de reações psicológicas ligadas ao diagnóstico, e a depressão que é o principal transtorno que acomete esses indivíduos, chegando a afetar metade destas pessoas. Esses transtornos psiquiátricos podem ser associados com a lentificação da condução dos axônios devido ao quadro neurodegenerativo e inflamatório da doença (PINTO & GUERRA, 2018; TAUIL et al., 2018; FERREIRA et al., 2011).

Tendo em vista os pontos apresentados, o presente artigo visa relacionar a saúde mental e qualidade de vida de pacientes com esclerose múltipla, visto que há um impacto significativo na saúde mental desses e é necessário trazer um conhecimento sobre esse tema de extrema relevância para os profissionais da saúde e a sociedade como um todo.

MATERIAL E MÉTODO

O presente artigo se trata de uma revisão integrativa da literatura, de natureza básica e objetivo descritivo, onde foram utilizadas as seguintes ferramentas para pesquisa: bases de dados Scientific Electronic Library Online (SCIELO) e PubMed Central (PMC).

A construção do artigo foi feita a partir das 6 etapas propostas para realização de uma revisão integrativa da literatura, iniciada com a elaboração da pergunta norteadora e escolha do tema (1), seguida da determinação dos critérios de exclusão e inclusão (2), seleção das informações a serem coletadas (3), avaliação dos estudos incluídos (4), análise dos resultados obtidos (5) e apresentação da revisão (6) (MENDES et al., 2008).

A pergunta norteadora da pesquisa foi “como se apresenta a saúde mental e qualidade de vida dos pacientes com esclerose múltipla?” e a partir dela foram selecionados alguns descritores a serem pesquisados em cada base de dados, na base Scielo buscou-se por “esclerose múltipla”, “depressão” “qualidade de vida” e “saúde mental”, sendo feita uma primeira seleção dos artigos que tinham no máximo 15 anos e obtidos 228 artigos inicialmente. Já na base de dados, PMC foram feitas buscas com os descritores “esclerose múltipla”, “depressão”, “multiple sclerosis and depression”, resultando em 37 artigos.

Os critérios de inclusão utilizados foram, trabalhos publicados no idioma português e inglês, com menos de 15 anos de publicação, acesso livre e conteúdo que abordava os aspectos clínicos da esclerose múltipla, saúde mental, depressão e qualidade de vida dos pacientes. Já os critérios de exclusão foram publicações com mais de 15 anos, em outro idioma fora o português e inglês, artigos duplicados, sem acesso livre e ausência de informações relevantes para o objetivo da presente pesquisa. Seguidamente a primeira seleção, foram aplicados os critérios de inclusão e exclusão propostos, que resultaram em 16 artigos selecionados para compor esta revisão integrativa.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Após as etapas descritas no método e a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão propostos, a seleção resultou em 16 artigos, publicados entre o ano de 2011 e 2022 que estão dispostos a seguir, no quadro 1.

Quadro 1 – Seleção de artigos analisados.

TÍTULOAUTOR/ ANOOBJETIVOCONCLUSÃO
A influência do sentido de vida e de fatores psicossociais na qualidade de vida de doentes com esclerose múltipla.PINTO & GUERRA, 2018.Analisar a influência do sentido de vida, suporte social, ansiedade e depressão na percepção de qualidade de vida de pessoas com esclerose múltipla.O sentido de vida, a depressão, e a ansiedade são as que mais parecem influenciar a qualidade de vida.
Avaliação da qualidade de vida em portadores de esclerose múltipla: impacto da fadiga, ansiedade e depressão.SILVA & CAVALCANTI, 2019.Avaliar a percepção da qualidade de vida em pacientes com esclerose múltipla (EM) e verificar se há associação com fadiga, ansiedade e depressão.A diminuição da percepção da qualidade de vida em pacientes com esclerose múltipla é mais crítica nas formas progressivas da doença e tem associação com a presença de fadiga, depressão e ansiedade.
The Effect of Depression on Health-Related Quality of Life Is Mediated by Fatigue in Persons with Multiple Sclerosis.


RODGERS et al., 2021.
Examinar a direcionalidade da fadiga e da depressão na qualidade de vida relatada em um banco de dados nacional da pessoa com EM, aplicando uma análise de caminho longitudinal.O presente estudo fornece novas evidências longitudinais, demonstrando que o impacto da sintomatologia depressiva não somática na qualidade de vida relatada foi explicado por um efeito indireto via fadiga. 
Positive correlation between functional disability, excessive daytime sleepiness, and fatigue in relapsing-remitting multiple sclerosis.BRAGA, et al., 2016.Avaliar a correlação entre fadiga, sonolência diurna excessiva e o grau de incapacidade em pacientes com EM.Fadiga e a sonolência diurna excessiva são frequentes em pacientes com EM. Houve correlação positiva entre incapacidade funcional, sonolência diurna excessiva e fadiga na remissão de EM e não associação entre o grau de incapacidade e fadiga em pacientes com subtipos progressivos.
Qualidade de vida relacionada à saúde de pacientes com esclerose múltipla antes do transplante de células-tronco hematopoiéticas.
CROVADOR, et al., 2013.Avaliar qualidade de vida (QV) e vulnerabilidade psicológica de pacientes com Esclerose Múltipla (EM) que seriam submetidos ao Transplante de Células-Tronco Hematopoiéticas.Houve impacto negativo nos domínios da QVRS dos pacientes, em especial nos aspectos físicos, presença de morbidades psicológicas (ansiedade e depressão) e quadro de estresse, e uma relação significativa entre os prejuízos físicos desencadeados pela enfermidade sobre a QVRS e as referidas morbidades.
Anxiety and depressive symptoms in clinically isolated syndrome and multiple sclerosis.ANHOQUE, et. al., 2011.Neste estudo, comparamos sintomas de ansiedade e depressão em pacientes com síndrome clínica isolada e em pacientes com esclerose múltipla. Também correlacionamos sintomas de ansiedade e depressão com parâmetros clínicos.Em conclusão, nossos dados confirmam que ansiedade e sintomas depressivos são mais frequentes em pacientes com EM do que em controles saudáveis.
The incidence and prevalence of psychiatric disorders in multiple sclerosis: a systematic review.MARRIE, Ruth Ann et al., 2015.Os objetivos desta revisão são estimar a incidência e a prevalência de transtornos psiquiátricos comórbidos selecionados na EM e avaliar a qualidade dos estudos incluídos.Esta revisão confirma que a comorbidade psiquiátrica, particularmente depressão e ansiedade, é comum na EM. No entanto, a incidência de comorbidade psiquiátrica permanece pouco estudada. Comparações futuras entre estudos seriam aprimoradas pelo desenvolvimento de uma abordagem consistente para medir a comorbidade psiquiátrica e relatar estimativas específicas de idade, sexo e etnia.
Prevalence of depression in multiple sclerosis.ANDRADE, 2011.Estimar a prevalência de depressão e os perfis clínicos e demográficos dos pacientes com esclerose múltipla e avaliar a aplicabilidade do Inventário de Depressão de Beck (IMC) entre essas pessoas.De acordo com a literatura atual, a depressão entre os pacientes com EM tem maior prevalência do que em outras doenças neurológicas incapacitantes, corroborando com nosso dado de 48,7%.
Prevalence of depression and anxiety in the different clinical forms of multiple sclerosis and associations with disability: A systematic review and meta-analysis.PERES DS, et al., 2022.Estimar a prevalência de depressão e ansiedade na EM e realizar análises de subgrupos em estudos observacionais.Então, nosso estudo reuniu dados atuais sobre transtornos psiquiátricos em pacientes com esclerose múltipla, que são comorbidades que afetam a qualidade de vida desses pacientes.
Suicidal ideation, anxiety, and depression in patients with multiple sclerosis.TAUIL, et al., 2018.Determinar a prevalência e a gravidade da depressão, ansiedade e ideação suicida entre pacientes com EM e sua relação com o estado funcional, gravidade da doença, tratamento atual e uso de antidepressivos.Uma alta prevalência de depressão e ansiedade e uma maior taxa de ideação suicida foram identificados em pacientes com esclerose múltipla em comparação com a população em geral. A presença de sintomas depressivos associados a uma influência direta no risco de suicídio.
Depression and Suicidality in Multiple Sclerosis: Red Flags, Management Strategies, and Ethical Considerations.
KALB, ROSALIND et al., 2019.Descrever a epidemiologia da depressão e do suicídio, destacar sinais de alerta para o comportamento suicida, fornecer recomendações e recursos para os médicos e discutir decisões éticas relacionadas à segurança do paciente versus direito à privacidade.Pessoas com EM podem ter uma variedade de fatores de risco para o suicídio. A conscientização de possíveis bandeiras vermelhas podem ajudá-lo a identificar pacientes em risco.
The Main Determinants for Suicidal Ideation in a Romanian Cohort of Multiple Sclerosis Patients.ROMANIUC, ANDREEA et al., 2021.Determinar a prevalência de preocupações suicidas em um grande grupo de pacientes com esclerose múltipla (EM) e avaliar os principais determinantes que estão implicados em sua ocorrênciaA prevalência de preocupações suicidas é maior em pacientes com esclerose múltipla em comparação com a população em geral. A sua ocorrência é maioritariamente influenciada pela própria doença (duração, recaídas, incapacidade adquirida) e pela depressão e falta de educação.
Risk factors for suicide in multiple sclerosis. CERQUEIRA, et al., 2015.
Avaliar a prevalência e o risco de suicídio em uma amostra brasileira de pacientes com EM e identificar potenciais fatores associados ao risco de suicídio.O risco de suicídio é alto e a depressão maior é o principal fator de risco associado ao suicídio. 
Testes de rastreio para alterações psiquiátricas em esclerose múltipla Revisão sistemática com metanálise.SILVA, et. al., 2018.Realizar uma revisão sistemática com metanálise visando evidenciar as ferramentas de rastreio psiquiátrico mais adequadas na abordagem de pacientes adultos com esclerose múltipla avaliadas por estudos de acurácia diagnóstica.Com base na literatura atual, as ferramentas HADS, CESD e PHQ-9 parecem ser as mais indicadas para o rastreio psiquiátrico de pacientes com esclerose múltipla.
Intervenções de Terapia Ocupacional com pessoas com esclerose múltipla: revisão integrativa da literatura.CAMPOS & TOLDRA, 2019.Analisar e sistematizar o conhecimento produzido pela terapia ocupacional relacionado às intervenções com pessoas com esclerose múltipla, no período entre 2012 e 2017.As intervenções desenvolvidas pelos profissionais apontam diminuição dos sintomas, melhora da funcionalidade, maior conhecimento das potencialidades, autocontrole, autocuidado e promoção da qualidade de vida. 
Avaliação dos efeitos da psicoterapia em grupo sobre a função cognitiva em pacientes com esclerose múltipla com disfunção cognitiva e depressão.BILGI, et. al., 2015.Avaliar como a melhora da depressão grave através da psicoterapia afeta a função cognitiva de pacientes com esclerose múltipla (EM) diagnosticados com depressão e disfunção cognitiva.Psicoterapia do grupo pode diminuir o comprometimento cognitivo em pacientes com EM.

Fonte: quadro elaborado pela autora.

Dentre os estudos selecionados para discussão, foi perceptível que a qualidade de vida dos pacientes com esclerose múltipla está afetada e potencialmente reduzida e que esses indivíduos têm um potencial maior de desenvolvimento de diversos transtornos psiquiátricos, com ênfase no transtorno depressivo e no transtorno de ansiedade. Estes podendo sofrer influência de diversos fatores que vão desde o vasto quadro clínico até as inúmeras propostas terapêuticas ineficazes (PINTO & GUERRA, 2018; CROVADOR et al., 2013; TAUIL et al., 2018).

Em relação a qualidade de vida, um estudo realizado em 2018, com participantes com EM analisou a influência do sentido de vida e de fatores psicossociais na qualidade de vida (QV) desses e demonstrou que a depressão, o sentido da vida e a ansiedade são os fatores que mais a impactam (PINTO & GUERRA, 2018). Em concordância, outro autor ao avaliar a percepção da qualidade de vida em pacientes com esclerose múltipla mostrou que há a diminuição de sua percepção em especial para os casos de esclerose múltipla (EM) de forma clínica progressiva e esta redução está associada a aspectos clínicos, efeitos adversos dos medicamentos adjuntos à fadiga (presente em 63% dos participantes), ansiedade (em 43%) estresse e depressão (em 48%) (SILVA & CAVALCANTI, 2019).

Considerando a evidência de que a fadiga está entre um dos aspectos relacionados a redução da percepção da qualidade de vida (SILVA& CAVALCANTI, 2019), em reafirmação, outro trabalho menciona a fadiga (física, mental e cognitiva) como um fator que medeia a relação entre a depressão e qualidade de vida relacionada à saúde (RODGERS et al., 2021). No mesmo seguimento, outros autores ao correlacionarem a incapacidade funcional, sonolência diurna e a fadiga nos pacientes com EM, evidenciaram a fadiga como uma queixa frequente, descrita como, um cansaço em excesso ou falta de disposição que influenciam na qualidade de vida (BRAGA et al., 2016).

Ademais, uma pesquisa transversal realizada com pacientes brasileiros, ao averiguar a qualidade de vida e vulnerabilidade psicológica dos pacientes que seriam submetidos ao transplante de células tronco hematopoiéticas, evidenciou que as pessoas que têm indicação do transplante já passaram por um longo caminho com os sintomas, vasta tentativa e falha de abordagens terapêuticas que junto com a presença de ansiedade, depressão e estresse trazem um impacto negativo para a qualidade de vida (CROVADOR et al., 2013).

Ao que se refere a saúde mental, as pesquisas analisadas entram em concordância quando se diz respeito a prevalência da depressão, uma delas denota a ansiedade e depressão como transtornos que acometem mais frequentemente pacientes com esclerose múltipla em relação ao grupo controle (saudável) utilizado no estudo (ANHOQUE et al., 2011). Outro trabalho feito com 76 portadores de EM aponta prevalência de 48,7% de casos de depressão e 21,3% de ideações suicida demonstrando uma prevalência alta de casos em relação a outras doenças crônicas (MARRIE et al., 2015).

Em concordância, mais um estudo brasileiro, executado com pacientes com esclerose múltipla utilizando as seguintes escalas: Escala Expandida do Estado de Incapacidade, Inventário de Depressão de Beck-II (IDB-II), Escala de Ideação de Suicídio (BSI) e Escala de Ansiedade e Depressão, constatou maior taxa de sintomas depressivos, ansiedade e ideação suicida em comparação com a população geral (TAUILet al., 2018).

A presença de comorbidades psiquiátricas (depressão, ansiedade, mania, psicose) principalmente a ansiedade e depressão nos pacientes portadores de esclerose múltipla podem ser correlacionadas a alterações imunológicas, inflamatórias, alterações na estrutura do cérebro como atrofia e lesões, uso das medicações modificadoras da doença como os corticosteroides e fatores psicossociais (ANDRADE, 2011).

No que concerne as formas clínicas um estudo realizado em 2022, analisou a ocorrência de transtornos de ansiedade e depressão nas diferentes formas de esclerose múltipla e revelou a maior taxa de ansiedade do que depressão nos pacientes, além de mostrar uma prevalência maior de ambos os transtornos nas formas clínicas, remitente recorrente e progressiva (incluindo primária e secundária), que pode se relacionar com a diferença no quadro clínico e no tratamento das formas clínicas mencionadas (PERES et al., 2022).

Como já exposto acima a prevalência do transtorno depressivo é maior em pacientes com EM do que no restante da população, a incidência chega a 979 casos a cada 100.000 pessoas e este é um dos principais determinantes da qualidade de vida, além de ter uma ligação importante com o risco de suicídio, este último, tendo como principais fatores de risco a elevada taxa de depressão, a diminuição da funcionalidade, o aumento da dependência e do isolamento, o estado civil de solteiro, viúvo, divorcio, menor escolaridade, presença de outros transtornos mentais, e com maior destaque a depressão maior. Neste sentido, um dos estudos identifica a necessidade de atenção aos sinais de alerta para o risco de suicídio como a abrupta mudança de comportamento, isolamento social, sistema de apoio inadequado, declaração de desesperança, entre outros (CERQUEIRA et al.,2015; KALB et al.,2019).

Ainda relacionado ao risco de suicídio nessa população, temos um estudo coorte feito com 349 participantes que reafirma a maior prevalência de ideação suicida entre os pacientes com EM quando comparados ao restante da população, revelando alguns fatores que podem estar relacionados com esse risco, como a depressão, nível de incapacidade aumentada, baixa escolaridade e adiciona dois pontos ainda não mencionados por outros autores em relação a doença, como o número alto de recorrências e tempo de duração prolongado da doença (ROMANIUC et al.,2020).

Em virtude da prevalência de quadros depressivos e transtornos psiquiátricos na população portadora de EM, faz-se necessário o seu rastreio, dessa maneira, estudos apontaram como mais eficazes a utilização das seguintes ferramentas HADS (Hospital anxiety and depression scale), CESD (center for epidemiological scale-depression) e PHQ (patient health questionnaire) (SILVA et al,2018).

Visando melhoria da qualidade de vida dos indivíduos com esclerose múltipla as intervenções com terapia ocupacional foram expostas como contribuintes para inúmeros benefícios como, promover uma melhor funcionalidade, autocontrole, autocuidado, e de forma geral uma melhoria na qualidade de vida desses pacientes (CAMPOS & TOLDRA, 2019).

No mesmo sentido, outros autores apresentaram em seu estudo a depressão como um fator potencializador da disfunção cognitiva e expuseram a relevância da psicoterapia em grupo em pacientes com depressão e disfunção cognitiva, os resultados obtidos sugeriram que a psicoterapia cognitiva ou em grupo juntamente com o tratamento médico são eficazes para melhora do quadro e redução dos sintomas depressivos (BILGI et al., 2015).

CONCLUSÃO

A esclerose múltipla é uma patologia crônica, de característica autoimune que afeta uma parcela importante da população. Tem uma etiologia multifatorial influenciada por fatores genéticos e ambientais e um quadro clínico diverso que abrange muitos sintomas, que vão desde déficits motores, sinais cerebelares a sintomas psiquiátricos. Em virtude disso, ajunto a um curso clínico imprevisível nem sempre o diagnóstico costuma ser o mais rápido e em geral não é bem aceito, sendo considerada uma “perda da identidade”. Além de ter a terapêutica baseada em tratar sintomas e prevenir recidivas, onde muitos pacientes não obtêm sucesso e o processo acaba se tornando exaustivo.

Conforme a realização da presente revisão da literatura foi possível responder a indagação inicial, proposta como norteadora da pesquisa de como se apresenta a saúde mental e qualidade de vida dos pacientes com esclerose múltipla, constatando algumas informações já apresentadas por outros autores de que a qualidade de vida e a saúde mental nos pacientes com esclerose múltipla se encontram alteradas devido a diversos fatores como efeito adverso dos medicamentos, fadiga, estresse, ansiedade e depressão.

No que se refere a qualidade de vida evidenciou-se relação entre os sintomas de fadiga física e mental e a redução da percepção da qualidade de vida, além da depressão, sentido da vida tidos como fatores que causam maior impacto na qualidade de vida destes.

Notou-se ainda que a depressão tem uma prevalência consideravelmente maior nos pacientes portadores de esclerose múltipla em comparação a população em geral e consequentemente trazem potencial risco para suicídio que se associa a uma maior taxa de depressão, dependência, isolamento social e redução da funcionalidade dos pacientes. Devendo ser acompanhados com atenção aos possíveis sinais de alerta para suicídio como sistema de apoio ineficiente, declaração de desesperança, aumento do isolamento e mudança repentina de comportamento.

Foi observado que as pessoas com esclerose múltipla estão mais suscetíveis ao desenvolvimento de transtornos psiquiátrico como transtorno depressivo e transtorno de ansiedade e consequente redução da percepção da qualidade de vida. Dessa forma, é valido ressaltar que o problema de saúde mental nos pacientes com EM é evidente e deve ser levado em consideração, cada paciente tem que ser tratado de acordo com suas individualidades para uma promoção adequada de qualidade de vida, saúde e prevenção do suicídio, dentre as intervenções propostas que foram analisadas neste trabalho que demostraram eficiência no quadro estão a terapia ocupacional e psicoterapia em grupo que parecem auxiliar na redução dos sintomas depressivos, melhorar funcionalidade, promover autocontrole e autocuidado.

A saúde mental nos pacientes com esclerose múltipla tem sido estuda com maior frequência. Ainda assim, os estudos realizados até o presente momento nos trazem poucas informações a respeito de possíveis intervenções terapêuticas para esse grupo populacional específico. Neste sentido, é importante que pesquisas com essa temática sejam incentivadas no meio científico para nortear uma melhor abordagem desses pacientes pelos profissionais da saúde visando a promoção de saúde mental e melhoria da qualidade de vida.

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LIRA, Adriana Menezes de. Saúde mental e qualidade de vida de pacientes com esclerose múltipla. 13 páginas. Trabalho de conclusão de curso de Graduação em Medicina – Centro Universitário Uninorte, Rio Branco, 2023.

¹Graduanda do curso de Medicina do Centro Universitário Uninorte. e-mail: adrimenezesli@hotmail.com

²Orientador e docente do curso de Medicina do Centro Universitário Uninorte.