THE EFFECT OF CAFFEINE ON NONALCOHOLIC FATTY LIVER DISEASE
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8395873
Carmem Isaura Salles do Nascimento1
Nathalia Costa Macedo Noronha2
Alícia Calinne Melo Santos 3
Ana Paula Portela Andrade 4
Josilda Ferreira Cruz 5
Resumo
OBJETIVO: Avaliar os possíveis efeitos da cafeína na DHGNA. MÉTODOS: Estudo clínico, transversal, descritivo, tipo survey, com abordagem analítica quantitativa. Os dados foram coletados em um centro de referência de ultrassonografia no período de janeiro de 2023 a julho de 2023, onde foram incluídos adultos do sexo feminino e masculino de 17 a 83 anos de idade. RESULTADOS: Foram avaliados 100 pacientes. Do total de pacientes avaliados, 52% (n=52) tinham esteatose hepática não alcóolica e 78% (n=78) consomem café. Constatou-se que não houve relação entre o número de xícaras consumidas, quantidade consumida de café com a presença de infiltração gordurosa no fígado ou com a gravidade da esteatose hepática na população estudada. CONCLUSÃO: O presente estudo evidenciou que não houve associação estatisticamente significativa entre os efeitos da cafeína na DHGNA, porém não permite afirmar que o café e seus compostos não possuem benefícios.
Palavras-chave: Ultrassonografia, Cafeína, Esteatose Hepática.
1 INTRODUÇÃO
Abstract:
OBJECTIVE: To evaluate the possible effects of caffeine on NAFLD. METHODS: Clinical, cross-sectional, descriptive, survey study, with a quantitative analytical approach. The data were collected at an ultrasound reference center from January 2023 to July 2023, where female and male subjects aged 17 to 83 years were included. RESULTS: 100 patients were evaluated. Of the total patients evaluated, 52% (n=52) had non-alcoholic fatty liver disease and 78% (n=78) consumed coffee. It was found that there was no relationship between the number of cups consumed, quantity of coffee consumed and the presence of fatty infiltration in the liver or the severity of hepatic steatosis in the studied population. CONCLUSION: The present study showed that there was no statistically significant association between the effects of caffeine on NAFLD, but it does not allow us to state that coffee and its compounds have no benefits.
Keywords: Ultrasonography, Caffeine, Hepatic Steatosis.
A doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA) consiste na deposição de lipídeos nos hepatócitos representando 5% ou mais do peso do fígado, na ausência de outras etiologias em indivíduos que não fazem uso de álcool ou que o fazem em pequena quantidade (CRUZ et al., 2016; MOTA et al., 2018; GARCEZ et al., 2021; MACHADO GM, 2022).
Considerada um problema de saúde pública, a DHGNA é uma das doenças hepáticas crônicas não transmissíveis mais comuns no mundo, caracterizada por ser uma doença de grande espectro uma vez que sua apresentação pode variar desde uma esteatose simples a uma esteato-hepatite e até evoluir para uma cirrose hepática (CRUZ et al., 2016; FONTES et al., 2021; GOMES et al., 2021). Além disso, a DHGNA está relacionada a complicações metabólicas e a um estilo de vida não saudável como alimentação rica em gorduras, carboidratos, alimentos processados e sedentarismo, sendo a obesidade um fator de risco importante (GARCEZ et al., 2021; LOURENÇO et al., 2021; KANO HT, 2022).
A DHGNA é uma doença silenciosa, assintomática na maioria dos casos, e suspeitada quando alterações são encontradas em exames de rotina como alterações em provas de função hepática e em exames de imagem, como a ultrassonografia (USG). O exame padrão-ouro para o diagnóstico da DHGNA é a biópsia hepática, pois permite visualizar o hepatócito com infiltração gordurosa e o grau de fibrose e, assim, estratificar o risco da doença. No entanto é um exame invasivo e de alto custo. A USG é o exame mais indicado para diagnosticar, uma vez que permite observar a ecogenicidade do parênquima hepático e consequentemente a infiltração gordurosa (TAVARES et al., 2019; LOURENÇO et al., 2021; MENDONÇA et al., 2021).
O tratamento inicial da DHGNA consiste em mudança de hábitos de vida, que se mostra superior a possíveis terapias medicamentosas as quais não possuem evidências efetivas comprovadas na reversão do quadro da DHGNA (GARCEZ, et al., 2021; GOMES et al., 2021; KANO HT, 2022).
O café, uma das bebidas mais consumidas no mundo é uma rubinácea que possui várias espécies, é principalmente composto por cafeína e antioxidantes. O grão do café tem em sua composição 0,9% a 2,4% de cafeína, porcentagem que varia de espécie para espécie (DAMASCENO et al., 2019).
A cafeína, estimulante do sistema nervoso central (SNC), é alvo de diversos estudos em diversas áreas a fim de se conhecer seus benefícios para o ser humano (DAMASCENO et al. 2019; RAMOS et al., 2020). A literatura mostra que o café, em especial a cafeína, tem efeito hepatoprotetor por melhorar o nível de plaquetas no vírus C, reduzir níveis de AST, melhorar a progressão da doença hepática, do quadro de fibrose e os marcadores hepáticos quando presentes vírus A, B e C (AGUILAR et al., 2016).
Diante disso, o presente estudo tem como objetivo avaliar os possíveis efeitos da cafeína na DHGNA. A evidência de que a cafeína possui efeito hepatoprotetor, identificar seus efeitos na DHGNA consiste em mais uma alternativa que pode ser associada, se benéfica, aos hábitos de pacientes portadores da doença.
2 METODOLOGIA
Estudo clínico, transversal, descritivo, tipo survey, com abordagem analítica quantitativa. Os dados foram coletados em um centro de referência de ultrassonografia no período de janeiro de 2023 a julho de 2023. Os exames de ultrassonografia foram realizados por um único examinador. Médico com experiência em diagnóstico de esteatose hepática, no mesmo equipamento com boa resolução de imagem.
Foi redigido um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) conforme as normas do Conselho Nacional de Saúde do Ministério da Saúde explicitadas na resolução 196/96. Este projeto foi encaminhado ao Comitê de Ética em pesquisa da Universidade Tiradentes (CEP), situada em Aracaju – Se, e foi aprovado (56783416.3.0000.5371).
Como critérios de inclusão foram considerados adultos de ambos os sexos de 17 a 83 anos de idade. E os critérios de exclusão foram o consumo de álcool ≥ 140g/semana nos homens e ≥ 70g/semana nas mulheres; portadores de neoplasias malignas primárias do fígado; portadores de doenças crônicas do fígado; deficiência cognitiva; e uso regular de drogas indutoras de esteatose (esteroide, amiodarona, tamoxifeno).
Foram analisadas as seguintes variáveis independentes: sexo, idade, consumo de cafeína em ml e em xícaras em relação a variável dependente esteatose hepática não alcoólica diagnosticada pela ultrassonografia.
O procedimento de coleta está dividido em duas etapas:
Etapa 1
Todos os pacientes, após assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido, responderam a um questionário com informações sociodemográficas, comorbidades e de medicamentos. No referido questionário constou informações sobre as seguintes variáveis: nome, idade, data de nascimento, naturalidade, frequência de etilismo, comorbidades associadas como hepatopatias prévias, uso de medicamentos e consumo de cafeína.
Foi considerado uma xícara média correspondente a 240 ml.
Para se formular a hipótese diagnóstica de DHGNA o consumo de álcool semanal foi considerado ≤ 140 g/ semana para homens e ≤ 70 g/ semana para mulheres, através do questionário sociodemográfico com informações sobre hábitos etílicos. A presença e frequência de etilismo foi conhecida e o consumo foi calculado, utilizando-se a fórmula: dose em ml x grau x 0,8 / 100, onde os graus ou teor alcoólico das bebidas são conhecidos, a saber: cerveja 4, vinho 12, conhaque 40, rum 40, uísque 43, pinga 46 (MINCIS; MINCIS, 2011).
Etapa 2
Nesta etapa, foi realizado o exame de ultrassonografia abdominal modo B com transdutor convexo, dinâmico (com formação da imagem contínua e automática), de frequência de 3,75 MHz. Os pacientes se apresentavam com preparo adequado, ou seja, jejum de no mínimo 6 horas e uso de antiflatulento.
No exame ultrassonográfico abdominal modo B foi observada a ecogenicidade do parênquima hepático e classificada a esteatose hepática em graus (SAADEH et al., 2002)
– Grau 0: Ecogenicidade Normal;
– Grau 1: Esteatose Leve, com visualização de ecos finos do parênquima hepático, visualização normal do diafragma e de vasos intra-hepáticos;
– Grau 2: Esteatose Moderada, com aumento difuso nos ecos finos, visualização prejudicada dos vasos intra-hepáticos e diafragma;
– Grau 3: Esteatose severa, com aumento importante dos ecos finos, com visualização prejudicada ou ausente dos vasos intra-hepáticos.
Foram obtidas variáveis qualitativas nominais e variáveis quantitativas, onde a análise dos dados foi realizada de duas formas, descritiva e inferencial. Para as variáveis qualitativas a análise descritiva procedeu com a categorização dos dados e obtenção das respectivas frequências e percentuais, e para as variáveis quantitativas foram calculadas a média, desvio padrão e valor mínimo e máximo.
Para a análise inferencial, inicialmente foi verificada a aderência à distribuição Normal da variável idade, quantidade de café (ml) e número de xicaras, utilizando o teste de Shapiro-Wilk. Quando foi observada normalidade da distribuição, utilizou-se os testes ANOVA e calculou-se para cada grau da esteatose a média e o desvio-padrão. E foi aplicado o teste de Tukey para avaliar o contraste entre as médias. Quando não foi observada a aderência à Normal, utilizou-se o Kruskal-Wallis e foram calculadas as medianas e o intervalo interquartil para cada grau da doença.
Para verificar a associação entre esteatose (sim ou não) com a idade, quantidade de café (ml) e número de xicaras, utilizou-se o teste t quando observada a normalidade, caso contrário o Teste Mann-Whitney.
O software utilizado foi o R, versão 4.0.4.
3 RESULTADOS
Nesse estudo foram avaliados 100 pacientes com idade variando de 17 anos a 83 anos, apresentando uma idade média de 45,6 (+/-16,3) anos. Do total, 52% (n=52) tinham esteatose hepática não alcóolica e 78% (n=78) consomem café (Tabela 1).
Tabela 1: Características gerais das pacientes
Variável | Média | Desvio-Padrão | Mínimo | Máximo |
Idade | 45,6 | 16,3 | 17 | 83 |
Número de xícaras | 2,1 | 1,4 | 0,5 | 10 |
Quantidade em ml | 504,2 | 336,1 | 120 | 2.400 |
Variável/Categoria | Frequência | Percentual | ||
GRAU DE ESTEATOSE | ||||
0 | 48 | 48 | ||
1 | 22 | 22 | ||
2 | 22 | 22 | ||
3 | 8 | 8 | ||
ESTEATOSE | ||||
Não | 48 | 48 | ||
Sim | 52 | 52 | ||
CONSOME CAFÉ | ||||
Não | 22 | 22 | ||
Sim | 78 | 78 | ||
Fonte: dados do estudo, 2023.
A Tabela 2 apresenta a relação entre o consumo de café e o grau da esteatose hepática não alcoólica. Verificou-se que não há relação entre o consumo de café e o grau de esteatose (p-valor superior que o nível de significância de 5%).
Tabela 2: Relação entre o consumo de café com o grau de esteatose hepática não alcoólica
Consumo de café | |||
Variável/Categoria | Não | Sim | P-valor |
N (%) | N (%) | ||
GRAU DE ESTEATOSE | |||
0 | 13 (27,1) | 35 (72,9) | 0,394 |
1 | 2 (9,1) | 20 (90,9) | |
2 | 5 (22,7) | 17 (77,3) | |
3 | 2 (25) | 6 (75) | |
ESTEATOSE | |||
Não | 13 (27,1) | 35 (72,9) | 0,349 |
Sim | 9 (17,3) | 43 (82,7) |
Fonte: dados do estudo, 2023.
A Tabela 3 apresenta a relação entre a idade, número de xicaras e quantidade em ml de consumo de café com o grau de esteatose hepática não alcoólica. Observa-se que não houve relação entre o número de xicaras, quantidade consumida de café com o grau de infiltração gordurosa hepática.
Tabela 3: Relação entre a idade, número de xicaras e quantidade em ml com o grau de esteatose
Variável | Grau de esteatose | p-valor | |||
0 | 1 | 2 | 3 | ||
NÚMERO DE XÍCARAS (IIQ) | 2 (1,5) | 2 (1) | 2 (0) | 2,5 (1,8) | 0,8510 |
QUANTIDADE EM ML, (IIQ) | 480 (360) | 480 (240) | 480 (0) | 600 (420) | 0,8300 |
Legenda: IIQ: é o intervalo interquartil.
Fonte: dados do estudo, 2023.
Observa-se na Tabela 4 que não há relação entre o número de xícaras, quantidade consumida de café com o fato de ter ou não infiltração gordurosa no fígado.
Tabela 4: Relação entre a idade, número de xicaras e quantidade em ml com esteatose
Variável | Esteatose | P-valor | |
Não | Sim | ||
39,4 | 51,3 | ||
NÚMERO DE XÍCARAS (IIQ) | 2 (1,5) | 2 (1) | 0,8100 |
QUANTIDADE EM ML(IIQ) | 480 (360) | 480 (240) | 0,7210 |
Legenda: IIQ: intervalo interquartil.
Fonte: dados do estudo, 2023.
4 DISCUSSÃO
A DHGNA tem prevalência crescente em todo o mundo, desde em crianças até adultos, e isso se deve a uma associação entre a doença, alterações metabólicas e mal hábitos de vida, como obesidade, diabetes mellitus tipo 2 (DM2), dislipidemia e sedentarismo (TAVARES et al., 2019). Concomitante a isso, o café, uma das bebidas mundialmente mais consumidas, possui diversos efeitos benéficos os quais são alvo de estudo há muitos anos e, por ser uma bebida antioxidante, pode inibir enzimas do fígado, resultando em redução da lesão em hepatócitos com consequente efeito hepatoprotetor (AGUILAR, 2016).
Quanto maior a quantidade de café ingerido, maior é o benefício para o fígado e, entre os benefícios está o efeito da cafeína em diminuir a progressão da fibrose hepática e na redução da mortalidade por cirrose ou risco de carcinoma celular (AGUILAR, 2016). No entanto, os dados obtidos neste estudo não possibilitaram elucidar esses ou outros benefícios para o fígado, uma vez que não houve relação entre o número de xícaras, a quantidade de café consumida e o grau de infiltração gordurosa hepática, haja vista que dos 100 pacientes avaliados 52% possuem DHGNA e 78% são consumidores de café.
A ausência de relação entre grau de esteatose e quantidade de café consumida pode ser decorrente da qualidade do café. De acordo com este estudo, 39,4% dos pacientes que não apresentam infiltração gordurosa no fígado consomem 480 mL, mesma quantidade ingerida por 52% dos pacientes diagnosticados com esteatose hepática grau 2. A moagem do grão de café interfere na qualidade da bebida final, pois quanto maior o grau de moagem mais tempo é necessário para que a água passe pelo pó e, assim, maior será a extração dos compostos do café (AGUILAR, 2016). E a população em geral consome café de qualidade inferior, bastante processado, não tão puro e com a presença de resíduos da fabricação e ausência ou redução significativa dos compostos do grão de café que já comprovadamente podem trazer benefícios à saúde humana.
5 CONCLUSÃO
No presente estudo não houve associação estatisticamente significativa entre os efeitos da cafeína na DHGNA, porém não significa que o café e seus compostos não tenham benefícios. O tipo do café, sendo o extrato de café verde o mais citado como puro, se é torrado ou não e o grau de moagem são fatores influentes na qualidade da bebida, em seus componentes pós processamento e em seus possíveis benefícios para a esteatose hepática.
Sabe-se que o grão de café possui 0,9% a 2,4% de cafeína em sua composição, que varia de acordo com o tipo de café. O grão cru do tipo arábica tem 1,2g/100g-1 de cafeína, porém não é o tipo mais consumido. É importante, então, que novos estudos com padronização do tipo de café consumido sejam realizados com intuito de melhor elucidar os benefícios da cafeína sobre a DHGNA.
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1 Discente do Curso Superior de medicina da Universidade Tiradentes. Instituição: Universidade Tiradentes – UNIT. E-mail: carmem.salles9@gmail.com
2 Discente do Curso Superior de medicina da Universidade Tiradentes. Instituição: Universidade Tiradentes – UNIT. E-mail: macedoacad@gmail.com
3 Discente do Curso Superior de medicina da Universidade Tiradentes. Instituição: Universidade Tiradentes – UNIT. E-mail: aliciacalinne@gmail.com.
4 Discente do Curso Superior de medicina do Centro Universitário de Maceió. Instituição: Centro Universitário de Maceió – UNIMA/AFYA. E-mail: aninhaportela21@gmail.com
5 Docente do Curso Superior de medicina da Universidade Tiradentes. Instituição: Universidade Tiradentes – UNIT. Mestre em Saúde e Ambiente. (UNIT). Doutorado em Saúde e Ambiente (UNIT). E-mail: josildafcruz@gmail.com