ANÁLISE DO PERFIL EPIDEMIOLÓGICO DO CÂNCER DE PELE NO BRASIL EM 2022 COMO FERRAMENTA PARA ESTRATÉGIAS NA ATENÇÃO BÁSICA

ANALYSIS OF THE EPIDEMIOLOGICAL PROFILE OF SKIN CANCER IN BRAZIL IN 2022 AS A TOOL FOR STRATEGIES IN PRIMARY CARE

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8305696


Anderson Guilherme de Lima Soares[1]
Gabryella Maria Torres Rocha [2]
Luciana Rachel Vieira de Menezes [3]
Rafaela de Brito Alves [4]


Resumo

A quantidade, intensidade e o tempo de exposição aos raios solares são potenciais precipitantes do câncer de pele. No Brasil, essa doença representa 30% das neoplasias malignas, e o tipo não melanoma ocorre com mais frequência na população. O sistema de saúde brasileiro dispõe de dispositivos responsáveis por hierarquizar o atendimento em saúde, desde o rastreamento precoce até o tratamento. Desse modo, objetivou-se analisar o perfil sociodemográfico dos indivíduos afetados por neoplasias cutâneas nas diferentes regiões do Brasil no ano de 2022, com a finalidade de auxiliar políticas públicas voltadas para o seu combate. Com isso, o trabalho consiste em um estudo epidemiológico, descritivo e quantitativo, com a busca dos números de diagnósticos de neoplasia de pele em 2022, disponíveis em base de informações eletrônica pública. O percentual de pessoas do sexo feminino afetadas foi o maior (56,07%), em especial na região Nordeste. Na análise das faixas etárias, percebeu-se alta incidência entre 60-69 anos e 70-79 anos, respectivamente em ordem decrescente, com o Centro-Oeste liderando os números. Compreendeu-se relação da alta incidência no sexo feminino com a cultura do bronzeamento da pele, além do fator idade associado à exposição cumulativa. Evidenciou-se valor preditivo na associação entre câncer de pele e características como idade e sexo, tornando claro o público alvo afetado para que possam ser elaboradas ações preventivas e de combate pela equipe de saúde.

Palavras-chave: Câncer de Pele. Fatores de Risco. Neoplasia cutânea.

1 INTRODUÇÃO

Com estimativas próximas a 3,5 milhões de casos, o câncer de pele se apresenta como a neoplasia mais frequente no mundo (BAKSHI et al. 2017). Desses, cerca de 75% corresponde ao carcinoma basocelular e 20% carcinoma espinocelular, os quais compõem o grupo de câncer de pele não melanoma (CNPM), responsável por 30% das neoplasias malignas no Brasil, de acordo com o Instituto Nacional do Câncer – INCA (INCA, 2023). A origem deste câncer está atrelada a fatores genéticos e ambientais capazes de aumentar as chances para seu desenvolvimento, dentre os quais podem ser citados os raios ultravioletas (UV) e as condições associadas ao contato com essa radiação, como: tempo, intensidade e quantidade de exposição. Além disso, existem formas para proteger a pele contra os raios solares, que consistem em: sombra ao ar livre, aplicação de protetor solar, roupas de proteção, chapéus e óculos de sol (GUPTA; BHARADWAJ; MEHROTRA, 2016).

Por ser uma doença com surgimento mediante excessivas situações de exposição ao estressor envolvido (raios UV), tende a apresentar um desenvolvimento mais demorado na maioria das vezes. O seu lento progresso pode levar os pacientes à alusão de ser uma ferida não cicatrizante ou uma lesão de acne (AMARO-ORTIZ; YAN; D’ORAZIO, 2014). Tal fato dificulta a adesão dos indivíduos aos métodos preventivos, especialmente quando são considerados os aspectos culturais brasileiros, em que a busca pelos cuidados com a saúde geralmente ocorre apenas em face de situações emergenciais (GIOVANELLA et al. 2021).

Todavia, o Brasil disponibiliza de uma Rede de Atenção à Saúde (RAS), estabelecida no ano de 2010 pela Portaria N.º 4279, com o dever de organizar as ações dos serviços de saúde, com diversas densidades tecnológicas e de gerenciamento, de maneira a garantir o cuidado integral (BRASIL, 2021). Dentro desse sistema, encontra-se a Atenção Básica (AB), caracterizada por ser o primeiro nível de acesso e por trabalhar prevenindo e promovendo saúde à comunidade, por meio do cuidado integral e continuado (MENDES, 2010).

Ao conhecer os princípios e obrigações da AB, nota-se sua importância no fomento de medidas propagadoras relacionadas às medidas protetoras contra formas de adoecimento, com foco nas doenças que mais acometem a população e são possíveis de serem evitadas (DEMARZO et al. 2010). Nesse aspecto, insere-se a relevância da discussão acerca da temática Câncer de Pele nos ambientes desse nível de atenção à saúde, identificados como Unidades Básicas de Saúde (UBS), com a finalidade de conter os números de casos que rotineiramente são notificados.

O atual estudo objetivou avaliar os parâmetros sociodemográficos dos indivíduos com diagnóstico de neoplasias cutâneas nas diferentes regiões do Brasil durante o ano de 2022, a fim de traçar o perfil do principal público-alvo em risco, como forma de auxílio às equipes de saúde na construção e execução de ações voltadas à prevenção e ao combate desse câncer.

 2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 Câncer de pele

O câncer de pele é um dos subtipos mais comuns de câncer que começa com a reprodução anormal das células da pele. Uma diversidade de fatores ambientais pode influenciar o desencadeamento desse câncer. Pode ocorrer devido a radiação ultravioleta do sol, e faz com que as células da pele se dividam descontroladamente e formem tumores malignos (NAQVI et al. 2023). O câncer de pele é uma das principais razões de morbidade em todo o mundo (GANDHI; KAMPP, 2015). 

Há dois tipos básicos de câncer de pele, os não-melanoma, geralmente das células basais ou das escamosas, e os melanomas, que têm origem nos melanócitos, as células produtoras de melanina (ROSENDAHL et al. 2011). O conhecimento acerca do diagnóstico precoce e a probabilidade de cura constitui-se em um dos pilares básicos do tratamento do câncer. Quanto mais avançada a doença, maior será a probabilidade da existência de metástases em outras partes do organismo, com menores chances de cura (DUNCAN; SCHMIDT; GIUGLIANI, 2013). 

É muito relevante o trabalho de conscientização da população sobre a prevenção do câncer de pele (BRASIL, 2019). Desse modo, a retirada de lesões cutâneas pigmentadas (nevos) de surgimento recente ou com crescimento rápido, sobretudo nas pessoas de pele clara, com história prévia de câncer de pele e que tem muitos nevos ou nevos atípicos torna-se fundamental (DUNCAN; SCHMIDT; GIUGLIANI, 2013).

3 METODOLOGIA

Trata-se de um estudo epidemiológico, observacional, com abordagem quantitativa, realizado a nível nacional, de acordo com as cinco regiões do Brasil, compreendendo os diagnósticos de câncer de pele em 2022. A pesquisa foi realizada em dezembro de 2022, por meio da busca dos dados no Painel-Oncologia e no Sistema de Informações de Câncer (SISCAN), disponíveis na plataforma DATASUS/TABNET e, portanto, públicos e anônimos em conformidade com o artigo I da resolução 510/2016 da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa8.

Os critérios de inclusão foram: ano (2022) e tipos de diagnóstico (Melanoma maligno da pele; Outras neoplasias malignas da pele e Carcinoma in situ da pele), os quais correspondem, respectivamente, aos códigos CID10-43; CID10-44 e CID10-D09. Já os critérios de exclusão consistiram em: anos anteriores a 2022 e tipo de diagnóstico distintos dos supracitados.

4 RESULTADOS E DISCUSSÕES

Foram coletados 57.891 casos de neoplasias de pele notificados no ano de 2022. Ao analisar de maneira ampla (Tabela 1), apenas a nível nacional, a faixa etária com maior incidência foi a de 60-69 anos de idade, seguida de 70-79 anos, com percentuais de 25,27% (n=14.634) e 23,92% (n=13.851), respectivamente.

Com a avaliação separada por macrorregiões do país (Tabela 2), percebeu-se permanência do predomínio do número de pessoas diagnosticadas com a idade entre 60 e 69 anos na maioria das regiões. Para essa faixa etária, a Centro-Oeste obteve destaque entre as demais localidades, com 26,46% (n=810), em detrimento da Norte que apresentou 20,39% (n=358). Todavia, dentre todas as faixas etárias em análise, a Nordeste teve maior índice em indivíduos de 70-79 anos, com 23,13% (n=1.949).

Em relação à variável sexo, de modo geral o diagnóstico do câncer de pele foi mais incidente no sexo feminino, retratando 56,07% dos casos (n= 31.897), conforme a Tabela 1, em contraste com o sexo masculino (43,93%; n=24.994). Ao separar a amostra em regiões (Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste), tal padrão percentual manteve-se, com a liderança do sexo feminino em todas (Tabela 2). A região que notificou mais diagnósticos em indivíduos do sexo feminino foi a Nordeste, com 66,40% (n=4.593). Já a respeito do sexo masculino, aquela com maior porcentagem foi a região Centro-Oeste (45,99%; n=1.408).

Tabela 1. Dados sociodemográficos da amostra (Brasil)

Variáveisn%
Faixa Etária  
0-19 anos9251,59
20-29 anos1.4702,53
30-39 anos2.8444,91
40-49 anos5.2979,14
50-59 anos10.22617,66
60-69 anos14.63425,27
70-79 anos13.85123,92
80 anos ou mais8.64414,93
Sexo  
Masculino24.99443,93
Feminino31.89756,07
Fonte: Elaborado pelo autor.

                Tabela 2.  Dados sociodemográficos da amostra (Regiões do Brasil)

Fonte: Elaborado pelo autor.

O presente estudo avaliou a associação entre a faixa etária e sexo com o desenvolvimento de neoplasias cutâneas em todas as Regiões da Unidade Federativa, Brasil.

Além disso, é válido ressaltar que a região Norte apresentou menor número de neoplasias de pele notificadas de acordo com as amostras analisadas. Com isso, deve-se considerar, que mesmo sendo a neoplasia de maior incidência com 220 mil casos novos de câncer de pele não melanoma para o triênio 2023-2025, conforme o INCA, ainda existe subnotificação dos dados em algumas regiões do Brasil, já que, apesar da baixa letalidade, em alguns casos, pode levar a deformidade física e ulcerações graves, e consequentemente, onerar os serviços de saúde(SANTOS et al. 2015). Ademais, a subnotificação ainda dificulta o acesso da população as ações de detecção e diagnóstico precoce (ZINK et al. 2014).

A idade dos indivíduos mais afetados esteve entre 60 e 79 anos, com menor número na faixa etária de 0-19 anos, o que permitiu visualizar que o público mais afetado é o de pessoas idosas. Tal dado assemelhou-se com o trabalho de Wijayanti e Djawad (2020), no qual encontraram uma média de 60,06 anos para os casos de câncer de pele. Essa relação ocorre pelo fato de que a exposição cumulativa à radiação solar UV favorece o surgimento de neoplasias de pele, principalmente quando aliada ao uso inadequado de proteção da pele(INCA, 2023).

            De acordo com alguns estudos, como o de Pires e colaboradores (2017); Castilho, Sousa e Leitee Bomfim (2010), a maior prevalência de câncer de pele no decorrer dos anos pode ter algumas explicações, dentre as quais o desejo pela pele bronzeada muito difundido entre as mulheres e capaz de gerar práticas de exposições ao sol excessivas desprotegidas. Somado a isso, Shield e colaboradores (2017)destacou a existência da elevação na incidência de CBC na população feminina no lábio superior e que tal fato pode estar relacionado ao fato de homens terem uma proteção melhor dessa região, devido ao bigode que é menos presente nas mulheres.

            Tal perspectiva é capaz de explicar algumas das causas ambientais predisponentes à neoplasia de pele mais evidentes entre indivíduos do sexo feminino, os quais obtiveram destaque no atual estudo. Todavia, a pesquisa de Napoli e Matos (2022) realizada com foco no uso da proteção solar foi apta para evidenciar números distintos, em que os homens se apresentaram mais afetados pelo câncer de pele. A explicação provável foi de que pessoas do sexo masculino tem menos preocupação com os cuidados com a saúde em geral, especialmente com a pele, o que os torna pouco adeptos da proteção da pele contra raios UV e mais propensos ao surgimento de neoplasias cutâneas.

            Nesse ínterim, é válido ressaltar o papel da Atenção Primária à Saúde na promoção de ações que ressaltem a importância do diagnóstico precoce do câncer de pele, como reforçar para os pacientes a necessidade do uso de protetores solares (medida mais eficaz), aliado ao uso de roupas com mangas longas, chapéus, calças compridas, óculos, roupas com proteção UV(DOS SANTOS et al. 2020). Ademais, a adoção de mudanças comportamentais fomentadas pelos profissionais de saúde, principalmente direcionadas para a população em risco, são essenciais para a conscientização e modificação de hábitos e costumes, com isso podem auxiliar na diminuição da incidência do câncer de pele, uma vez que o usuário percebe que ele também tem autonomia sobre sua saúde(TINÔCO, 2020).

Nessa perspectiva, evidencia-se o papel da equipe multiprofissional no diagnóstico precoce do câncer de pele(BRASIL, 2010). As estratégias incluem o exame clínico visual da pele dos pacientes, incluindo o mnemônico ABCDE, respectivamente, assimetria da lesão, irregularidade da borda, variabilidade de cor, diâmetro geralmente maior do que o tamanho de uma borracha de lápis, evoluindo ou qualquer alteração no tamanho, forma, cor, elevação ou outra característica, ou qualquer novo sintoma como sangramento, coceira ou formação de crostas(LOESCHER et al. 2013). Dessa forma, tanto a regra acima, como a detecção de sinais e sintomas suspeitos, devem estar inseridas na rotina das equipes de Saúde da Família, uma vez que um dos seus papeis é atuar na prevenção de agravos, por meio da orientação dos seus usuários(CARMINATE et al. 2021).

            Contudo, vale salientar que a amostra da pesquisa não retrata a realidade o ano de 2022 por completo, haja vista a busca dos dados realizada no mês de dezembro, antes de findar o período em análise. Mesmo com tal impasse, os números conseguiram retratar o que outras pesquisas avaliaram. Ademais, entende-se que as doenças caracterizadas por um desenvolvimento a longo prazo, mediante hábitos de vida não saudáveis, quando se apresentam com dados elevados e pouco controladas, refletem uma falha da Atenção Primária em Saúde no rastreio e tomada de medidas para combate e orientações.

5 CONCLUSÃO

Os fatores idade e sexo possuem valor preditivo na relação com o surgimento das neoplasias de pele em 2022 e estão em acordo com o que consta na literatura. Tal cenário, põe em foco a necessidade de melhorias nas medidas para o cuidado integral com a população, principalmente com a formulação de políticas públicas de saúde para a prevenção do câncer de pele na RAS com ênfase no cumprimento dos deveres da APS.

REFERÊNCIAS

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BAKSHI, Anshika et al. Basal cell carcinoma pathogenesis and therapy involving hedgehog signaling and beyond. Molecular carcinogenesis, v. 56, n. 12, p. 2543-2557, 2017.

BOMFIM, Simara Silva et al. Câncer de pele: conhecendo e prevenindo a população. Revista de Divulgação Científica Sena Aires, v. 7, n. 3, p. 255-259, 2018.

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CASTILHO, Ivan Gagliardi; SOUSA, Maria Aparecida Alves; LEITE, Rubens Marcelo Souza. Fotoexposição e fatores de risco para câncer da pele: uma avaliação de hábitos e conhecimentos entre estudantes universitários. Anais brasileiros de dermatologia, v. 85, p. 173-178, 2010.

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ZINK, Beatrix Sabóia. Câncer de pele: a importância do seu diagnóstico, tratamento e prevenção. Revista Hospital Universitário Pedro Ernesto (TÍTULO NÃO-CORRENTE), v. 13, 2014.


[1] Discente do Curso Superior de Medicina da Faculdade de Ciências Humanas, Exatas e da Saúde do Piauí/Instituto de Educação Superior do Vale do Parnaíba (FAHESP/IESVAP) e-mail: andrsonguilherme@gmail.com

[2] Discente do Curso Superior de Medicina da Faculdade de Ciências Humanas, Exatas e da Saúde do Piauí/Instituto de Educação Superior do Vale do Parnaíba (FAHESP/IESVAP). e-mail: gabyrochat15@gmail.com

[3] Discente do Curso Superior de Medicina da Faculdade de Ciências Humanas, Exatas e da Saúde do Piauí/Instituto de Educação Superior do Vale do Parnaíba (FAHESP/IESVAP). e-mail: luvieiramedicina@gmail.com

[4] Docente do Curso Superior de Medicina da Faculdade de Ciências Humanas, Exatas e da Saúde do Piauí/Instituto de Educação Superior do Vale do Parnaíba (FAHESP/IESVAP). Residência em clínica médica no Hospital Sagrada Família, em Salvador-BA. e-mail: rafaelabalves@hotmail.com