FATORES QUE CONTRIBUEM PARA O DESENVOLVIMENTO  DA GASTRITE CRÔNICA EM PACIENTES IDOSOS

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8233468


Lucileide Menezes da Silveira de Lima
Verônica Repolho de Alcântara
Orientador: Maurício Rafael Novaes de Araújo


Resumo

Realizar uma revisão bibliográfica sobre a ação da bactéria Helicobacter pylori nas alterações gastrointestinais visando a entender o papel dos chamados “fatores que contribuem para o desenvolvimento da gastrite crônica em idosos”, assim como estudar a associação do H. pylori com doenças gastrointestinais e os mecanismos imunológicos desencadeados pela presença desta bactéria. Método: Foram selecionados os trabalhos publicados em revistas indexadas nas bases de dados MedLine e PubMed, sob os unitermos “H. pylori”, “gastrite”, “câncer”, “resposta imune”, “Cag A” e “VacA” com maior ênfase nos artigos publicados nos últimos 5 anos. Resultado: Trinta e dois artigos foram selecionados, todos de revistas estrangeiras, sendo um dos trabalhos desenvolvido por um grupo de cientistas brasileiros. Os artigos selecionados mostraram o amplo espectro de ação da H. pylori através de seus “fatores que contribuem para o desenvolvimento da gastrite crônica em idosos” tais como a vacuolização de células infectadas provocada pela proteína VacA e a adesão da bactéria às células através da atividade das adesinas e proteínas de membrana. Também foram descritas as interações da H. pylori com doenças gastrointestinais e com o sistema endócrino, assim como as peculiaridades da resposta imunológica humoral e celular contra esta bactéria. Conclusões: Fica clara a importância epidemiológica da H. pylori por sua evidente associação com o câncer gástrico e o importante papel desempenhado pelos fatores que contribuem para o desenvolvimento da gastrite crônica em idosos codificados pela bactéria.

Palavras-chave: Envelhecimento; Gastrite; Neoplasias Gástricas. Imunidade nas Mucosas.

Abstract 

Objective: To make a review about the action of the bacterium Helicobacter pylori in individuals with gastrointestinal disorders in order to understand the role of so-called “virulence factors”, and show the association of H. pylori with gastro-intestinal diseases and immune responses against infection by this bacterium. Method: We selected studies published in journals indexed in the databases Medline and PubMed, under the keywords “H. pylori”, “gastritis”, “cancer”, “ immune response”, “CagA” and “ VacA” with emphasis on articles published in the last five years. Results: Thirty-two articles were selected, all by foreign journals. One work was developed by a group of Brazilian scientists. Selected papers showed the broad spectrum of action of H. pylori through their “virulence factors” such as vacuolization of infected cells caused by VacA protein and the adhesion of bacteria to cells through the activity of adhesins and membrane proteins. Also was described the interactions of H. pylori with gastrointestinal diseases and the endocrine system and the peculiarities of the humoral and cellular immune response against this bacterium. Conclusion: It study showed the epidemiological association of H. pylori    with gastric cancer and the important role played by virulence factors encoded by the bacterium to developed this morbidity.

Keywords: Helicobacter   pylori. Stomach Neoplasms. Immunity Mucosal.

INTRODUÇÃO

A Helicobacter pylori é uma bactéria gram-negativa que infecta a mucosa do estômago provocando infecções localizadas de gravidade variável, tais como gastrite, úlceras pépticas e câncer de estômago. Esta bactéria tem como uma de suas características a capacidade de interagir com a célula do hospedeiro de forma de garantir sua permanência por longo tempo. Apesar da H. pylori ser causa de amplo espectro de doenças, a maioria dos humanos infectados por ela não apresentam qualquer tipo de sintomatologia.

A bactéria H. pylori é frequentemente adquirida na infância e pode persistir por toda a vida. A gastrite é uma consequência presente em quase todos os indivíduos infectados pela H. pylori e apesar de muitos hospedeiros permanecerem assintomáticos, outros apresentam úlcera péptica ou duodenal, adenocarcinoma gástrico e linfomas, principalmente o linfoma MALT (Linfoma do tecido linfóide associado à mucosa).

A capacidade de sobrevivência da H. pylori em ambiente tão ácido como o fornecido pelo estômago, característica singular desta bactéria, deve-se à excreção de amônia que a protege, neutralizando parcialmente esta acidez. Esta excreção dá-se pela ação da urease, produzida pela bactéria, que converte a uréia em amônia e CO2. O seu formato em hélice espiralada, de onde vem o nome “Helicobacter”, permite que a H. pylori atravessar com facilidade a camada de muco que protege o epitélio gástrico (PÉREZ-PÉREZ; BLASER, 1996). Apesar de descrita desde o século XIX e inicialmente nomeada de Vibrio regula por Jaworski, que sugeriu um papel patogênico da H. pylori nas doenças gástricas, apenas após o trabalho de Robin Warren, junto com Barry Marshall, na década de 80, a comunidade científica aceitou a importância da H. pylori na patogenia das doenças gástricas. Em 1994 o National Institutes of Health (NIH) reconheceu a H. pylori como causadora de úlceras gástricas recorrentes propondo o tratamento com antibióticos para estas patologias. Atualmente existem evidências de que as úlceras duodenais também estão associadas à infecção pela H. pylori (PIETROIUSTI et al., 2005).

A H. pylori tem de 2 a 4 micrômetros (µm) de comprimento e de 0,5 a 1 µm de diâmetro. Contém hidrogenases que são usadas para obter energia através da oxidação do hidrogênio molecular. (OLSON; MAIER, 2002). Os flagelos unipolares, de 2 a 6, com aproximadamente 3 µm de comprimento, ajudam na penetração do muco até chegarem à superfície das células epiteliais gástricas. A sua adesão ao muco e as células epiteliais dá-se pela produção de adesinas. A produção da amônia e a liberação, com a consequente ação de proteases, catalases e fosfolipases da H. pylori são responsáveis pela ação agressora às células epiteliais gástricas e utilizadas para a caracterização laboratorial, pois estas bactérias são positivas para teste de oxidase e catalase.

DESENVOLVIMENTO 

Genética e Patogenicidade

O tamanho do genoma da H. pylori é de aproximadamente 1,7 Mbp, com um conteúdo G-C em torno de 40%. A linhagem 26695 do H. pylori tem 1.587 genes, enquanto que o genoma da cepa J99 possui apenas 1491 genes (BONECA et al., 2003). Ambos os genomas contêm duas cópias dos genes 16S, 23S e 5S de rRNA.

A bactéria H. pylori é geneticamente heterogênea, o que sugere uma falta de clonalidade. Isso significa que cada indivíduo H. pylori-positivo carrega uma cepa distinta. Esta heterogeneidade genética pode ser provocada por uma série de fatores: por adaptação da bactéria H. pylori às condições gástricas do hospedeiro; através de rearranjos do DNA; processos de deleção ou inserção de sequências; ou ser consequente aos diferentes tipos de resposta mediada pelo sistema imunológico do hospedeiro à infecção da bactéria H. pylori (LEHOURS et al., 2004).

Os processos de seleção geralmente ocorrem quando existe um conteúdo aberrante de G-C ou sequências que muitas vezes carregam genes envolvidos na virulência. Um exemplo é região cag PAI (Ilhas de patogenicidade), que juntamente com outras regiões de plasticidade tem sido sugerida como tendo um papel na patogênese da infecção pela H. pylori (LEHOURS et al., 2004).

Fatores que contribuem para o desenvolvimento da gastrite crônica em idosos

Existem fatores que contribuem para o desenvolvimento da gastrite crônica em idosos codificados por genes da bactéria H. pylori, que exercem diferentes tipos de ações e estão associados a uma maior agressividade da bactéria. Os principais são:

Cag PAI

A maioria dos pacientes infectados pela H. pylori não desenvolvem complicações ou sintomas clínicos desta infecção. Este fato levou à consideração dos cientistas a possibilidade de que algumas cepas fossem mais virulentas que outras, provocando a investigação da patogenia de diferentes cepas da H. pylori. Estas investigações chegaram à conclusão de que as cepas mais virulentas da H. pylori tinham a capacidade de provocar alterações morfológicas, vacuolização e degeneração sucessivas em culturas de células. Esta capacidade foi relacionada à presença de uma proteína com aproximadamente 140 kDa de massa, nomeada CagA (de gene associado a citotoxina), altamente imunogênica e codificada pelo gene cagA presente em mais da metade das cepas da H. pylori.

Cepas que possuem a cag PAI são chamadas de linhagens cagA-positivas e induzem alta titulação de anticorpos anti-proteína CagA. Pacientes infectados por esta cepa desencadeiam uma maior resposta inflamatória, com maior risco de desenvolver um quadro sintomático, seja úlcera, gastrite atrófica ou câncer gástrico. Deve-se salientar que cepas que não possuem cag PAI são também encontradas em pacientes com úlcera péptica ou câncer gástrico, porém em menor frequência.

A ilha de patogenicidade cag codifica um sistema de secreção tipo IV (T4SS) que transporta as proteínas efetoras do cagA, como a proteína CagA e um peptideoglicano (PGN), codificados na ilha, para as células hospedeiras (VIALA et al., 2004). A presença da proteína CagA PAI está associada ao aumento da inflamação, promovendo a produção de interleucina-8 (IL-8) pela célula hospedeira. Linhagens de H. pylori cagA- positivas estão associadas à úlcera péptica e ao câncer gástrico. Dentro da célula hospedeira, a proteína CagA torna-se tirosina fosforilada no sítio C-terminal EPIYA (Glu-Pro-Ile-Tyr-Ala) por cinases da família Src. Cepas da H. pylori que possuem mais motivos EPIYA tipo C, sítios de fosforilação importantes, induzem efeitos mais fortes sobre células hospedeiras e estão associados com câncer gástrico (TALARICO et al., 2009).

Talarico e colaboradores (2009) demonstraram que há uma forte associação da infecção com cepas que continham o conjunto completo de genes cag PAI e o desenvolvimento de úlcera. Descreveram que todas as cepas estudadas que possuíam o conjunto completo de genes cag PAI foram capazes de induzir a secreção de IL-8 e provocaram o fenótipo de agressividade “hummingbird” ou “beija-flor”, enquanto as cepas em que faltavam alguns ou todos os genes cag PAI não foram capazes de obter a mesma resposta. A proteína Cag PAI também afetou a resposta imune devido à sua capacidade de induzir a apoptose de células T.

VacA

A proteína VacA, ou “citotoxina vacuolizadora”, é um fator que contribui para o desenvolvimento da gastrite crônica em idosos com papel crucial na patogênese da H. pylori. Tem três atividades celulares confirmadas: vacuolização celular, apoptose e ativação dos linfócitos T CD4 positivos e proliferação. Esta toxina foi descoberta como uma proteína secretada pela H. pylori que induz uma enorme vacuolização citoplasmática in vitro.

A proteína VacA formam canais aniônicos em membranas lipídicas que provocam inicialmente uma hiper acidificação dos compartimentos endocíticos tardios por transportar ânions para o interior destas organelas levando à hiperatividade da V-ATPase. A acumulação, por protonação, de bases fracas como a amônia, produzidas pela atividade da Uréase da H. Pylori, nestes compartimentos, cria um desequilíbrio osmótico que resulta em sua expansão. A oligomerização da toxina VacA cria uma cavidade no centro do oligômero e mimetiza a estrutura de uma toxina formadora de poro (RICCI; ROMANO; BOQUE, 2011).

As lesões nas células epiteliais gástricas são causadas pela proteína VacA, codificada pelo gene vacA, que induz a vacuolização da célula hospedeira. Variações específicas do alelo vacA apresentam diferentes níveis de atividade da toxina e estão associadas a diferentes riscos de doenças gastrointestinais. Existem dois tipos de regiões sinalizadoras (s1 e s2) e de regiões médias (m1 e m2) que possuem diferentes atividades vacuolizadoras. Cepas do genótipo vacA s2 codificam um encurtamento do peptídeo N-terminal da proteína madura, bloqueando a atividade vacuolizadora, enquanto cepas de genótipo vacA s1 têm sido associadas à inflamação gástrica grave e úlcera duodenal com atividade citotóxica reforçada. Geralmente os genótipos vacA s1 e m1 produzem uma grande quantidade de toxina e induzem maior atividade vacuolizadora no epitélio gástrico, enquanto os genótipos s2 e m2 produzem pouca ou nenhuma toxina. As cepas vacA s2-m2 são raramente associadas com o desenvolvimento da úlcera péptica e câncer gástrico (SUGIMOTO; YAMAOKA, 2009).

Outra atividade exercida pela proteína VacA é a indução a apoptose. Uma subunidade desta proteína, a p34VacA, é encaminhada a mitocôndria das células alvo sendo somente requerida para a apoptose. A subunidade p34 é um polipeptídeo de 319 resíduos de aminoácidos. Os primeiros 32 resíduos não possuem carga e são exigidos para a inserção da VacA na membrana plasmática das células do hospedeiro e para a toxicidade. A p34VacA oligomeriza e formam canais aniônicos de características semelhantes ao canais produzidos pela proteína VacA inteira. A formação destes canais na membrana mitocondrial interna ou endossômica dá-se pela ação do domínio nuclear da p34VacA sendo que a extração dos 32 resíduos N- terminal não altera a atividade formadora de poros da subunidade p34 VacA, porém prejudica o encaminhamento da p34 para a mitocôndria que têm papel importante na toxicidade da proteína. Já a deleção simples (ä 49-57) em domínio nuclear da p34 inibe a oligomerização da toxina e a vacuolização da célula hospedeira. Portanto os 32 resíduos N-terminais da p34VacA são responsáveis pelo direcionamento à mitocôndria, sem ter ação formadora de poros (DOMAÑSKA et al., 2010).

Adesinas e proteínas da membrana externa

Adesinas são proteínas que medeiam a adesão da H. pylori ao epitélio gastrointestinal, juntamente com algumas proteínas da membrana externa que também são reconhecidas como fatores que contribuem para o desenvolvimento da gastrite crônica em idosos. As mais conhecidas são: BabA (blood group antigen binding adhesin), OipA (outer membrane inflammatory protein), SabA (sialic acid binding adhesin), AlpA e AlpB (adherence-associated lipoprotein) e Leb (HopZ. Lewis b antigen).

O gene babA codifica uma adesina que media a ligação com antígenos Lewis b expressos em células epiteliais gástricas. A interação entre BabA e os antígenos Lewis b é a interação adesina-receptor melhor caracterizada. São vários os mecanismos de regulação da expressão do babA tanto em nível de transcrição como de tradução. A formação de proteínas quiméricas (BabA / B ou BabB / A) parece desempenhar um papel importante na regulação da tradução. O gene babA foi inicialmente clonado da linhagem CCUG17875, que contém um gene babA1 silencioso e um gene babA2 expresso. Eles diferem na sequência pela deleção de 10bp no códon inicial de babA1. No entanto, a exclusão do tipo babA1 foi encontrada apenas na linhagem CCUG17875. O “status” babA-positivo foi associado com a presença de outros fatores que contribuem para o desenvolvimento da gastrite crônica em idosos, como o status cagA-positivas e genótipo vacA s1 (YAMAOKA, 2008).

A presença de um alelo babA funcional é associado com úlcera duodenal e adenocarcinoma gástrico (TALARICO et al., 2009).

Fatores que contribuem para o desenvolvimento da gastrite crônica em idosos e taxas de erradicação terapêutica do H. pylori

Sugimoto e Yamaoka (2009) buscaram relacionar os genótipos dos fatores que contribuem para o desenvolvimento da gastrite crônica em idosos com o grau de cura na erradicação terapêutica da H. pylori. Através de meta-análise eles verificaram que a taxa de cura em pacientes infectados com cepas cagA-positivas foi em média 83,1% , enquanto a média dos pacientes infectados com cepas cagA-negativas encontrada foi de 69,9%. Demonstraram que as taxas de cura foram menores em pacientes cagA-negativos do que em pacientes cagA-positivos conforme inicialmente pensado. Do ponto de vista biológico, a relação entre o sucesso ou o fracasso da terapia de erradicação da H. pylori relacionado ao status cagA foi explicado pelo aumento da inflamação da mucosa gástrica encontrado em cepas cagA-positivas. Em relação ao status vacA, a taxa em pacientes infectados com o genótipo vacA s1 foi em média 79,2% , com o genótipo vacA s2 a média foi de 72,1%. Já a taxa de cura em pacientes infectados com o genótipo vacA m1 foi em média de 82,7% e a média do genótipo vacA m2 foi de 82,3%. Uma vez que cepas isoladas positivas para cagA geralmente possuem o genótipo vacA s1, estes resultados confirmam que cepas altamente virulentas estão relacionadas a altas taxas de cura.

Infecção e Epidemiologia

Apesar da resposta imunológica celular e humoral, a bactéria H. pylori pode permanecer infectando o hospedeiro por toda a vida. Porém, nos idosos é provável que a infecção possa desaparecer à medida que a mucosa do estômago vai-se atrofiando e inviabilizando a infecção. A persistência das infecções ainda não está bem definida e a possibilidade de eliminação espontânea deve ser considerada. A maioria dos portadores desta bactéria é assintomática e apenas uma pequena percentagem de pacientes infectados desenvolvem respostas mais severas à infecção, sendo a gastrite o quadro clínico aparente mais comum.

A gastrite crônica induzida pela H. pylori aumenta o risco para um amplo espectro de resultados clínicos, que vão de úlcera péptica (úlcera gástrica o duodenal) ao adenocarcinoma gástrico distal e linfoma não- Hodgkin. Embora os fatores que determinam esta variedade de resultados clínicos da infecção pela H. pylori não estejam bem compreendidos, o desenvolvimento de uma resposta imune inflamatória gástrica sustentada à infecção parece ser fundamental para o desenvolvimento da doença. Maior risco pode estar relacionado a diferenças na expressão de produtos bacterianos específicos (CagA, VacA e outros), a variações na resposta inflamatória do hospedeiro a bactérias ou a interações específicas entre o hospedeiro e a bactéria (ISRAEL; PEEK, 2001).

A infecção pela H. pylori ocorre em todo o mundo, mas a prevalência varia muito entre países e entre grupos populacionais dentro do mesmo país. A H. pylori coloniza o estômago de 50% da população nos países desenvolvidos e cerca de 80% no mundo em desenvolvimento. A infecção é adquirida pela ingestão da bactéria e transmitida principalmente dentro das famílias. A principal fonte de transmissão dentro da família é a mãe (PORTAL-CELHAY; PEREZ-PEREZ, 2006).

A aquisição da H. pylori é mais comum na primeira infância. O aumento contínuo da prevalência da H. pylori com a idade é devido a um efeito de coorte, refletindo a transmissão mais intensa enquanto crianças em indivíduos de coortes com nascimento anterior ao mesmo. As bactérias têm sido isoladas de fezes, vômitos, saliva e placa dentária de pacientes infectados, sugerindo vias gastro-oral e/ou fecal-oral como possíveis vias de transmissão.

A prevalência da H. pylori está fortemente correlacionada com as condições socioeconômicas. Fatores como a alta densidade de habitantes no lar e falta de água corrente tem sido vinculada a uma maior aquisição de infecção pela H. pylori.

A acidez gástrica e o peristaltismo normalmente inibem a colonização bacteriana do estômago humano. No entanto, a seleção natural forneceu a bactéria H. pylori vários mecanismos para evitar estas defesas (como a ação da Uréase e a sua forma espiralada) e estabelecer uma infecção persistente.

Após ser ingerida, a H. pylori foge da atividade bactericida do conteúdo do lúmen gástrico e estabelece contato íntimo com a camada de muco. A enzima Uréase metaboliza a uréia em dióxido de carbono e amônia para tamponar o ácido gástrico. Os flagelos permitem que a bactéria passe através do viscoso muco gástrico e atinja o pH mais neutro abaixo do muco. Uma vez abaixo do muco, a H. pylori adere firmemente às células subjacentes. A adesina melhor caracterizada, BabA, uma proteína de membrana externa com 78 kDa liga-se ao antígeno do grupo sanguíneo Lewis b.

A colonização persistente vai depender da capacidade de resposta às mudanças das condições ambientais e de contornar os mecanismos de defesa do hospedeiro iniciadas durante a infecção. O rearranjo do DNA genômico permite a uma variedade de patógenos de se adaptarem à expressão de antígenos de superfície e escaparem da imunidade do hospedeiro. A H. pylori tem a maior taxa de recombinação genética entre as espécies conhecidas de bactérias, sugerindo que este processo confere uma vantagem seletiva na colonização.

Diagnóstico

Os métodos diagnósticos podem ser divididos em invasivos e não invasivos. Entre os não invasivos o mais utilizado é o teste respiratório da uréia. O paciente ingere uma solução de uréia com carbono marcado radioativamente C14 ou C13. Estando infectado, a H. pylori degrada a uréia em amônia e CO2 marcado com radioisopo, este é absorvido pelo sangue e depois liberado para os pulmões e exalado no ar, o CO2 marcado com radioisopo excretado é coletado e analisado. Outro método é a pesquisa de anticorpos anti-H. pylori no sangue, no entanto este exame não acusou atividade da bactéria por isso não serve como parâmetro de eficiência terapêutica. Esta eficiência pode ser mensurada pelo teste respiratório da uréia.

O exame invasivo mais comum é a biópsia por endoscopia digestiva, o material biopsiado pode ser investigado com o teste rápido da Uréase, pode servir de material para cultura microbiana como também ser feito a imunohistoquímica para detectar a presença da bactéria.

O diagnóstico histológico obtido da biópsia é o estudo padrão ouro para avaliar a extensão do dano ao tecido gástrico ocasionado pela bactéria. Após a infecção pela H. pylori na mucosa normal evolui para a gastrite crônica ativa, que pode evoluir a depender de fatores do hospedeiro para metaplasia intestinal e/ou atrofia gástrica.O próximo passo da evolução é a displasia e o passo final é o câncer gástrico. Exames histológicos do tecido biopsiado conseguem diagnosticar o ponto desta evolução, tendo valor prognóstico e terapêutico importante.

Tratamento

O tratamento clínico padrão para a infecção pela H. pylori combina o uso de dois antibióticos, Amoxicilina e Claritromicina, com um inibidor de bomba de prótons, Omeprazol, Lanzoprazol ou Pantoprazol. O Metronidazol pode substituir a Amoxicilina em pacientes alérgicos. Em casos de resistência a antibióticos, mudanças podem ainda serem feitas, como a substituição da Claritromicina pela Azitromicina ou Levofloxacina. Ou do Metronidazol por Tetraciclina, Estreptomicina ou Rifampcina. Alguns médicos adicionam o Bismuto como um quarto elemento terapêutico.

A erradicação da H. pylori tem importância não apenas epidemiológica como também é responsável pela regressão do linfoma MALT. Em um estudo com 102 pacientes com linfoma MALT H. pylori positivos, verificou-se que após a erradicação da H. pylori, 78 pacientes (76%) apresentaram regressão histológica do Linfoma MALT, sendo que 66 pacientes apresentaram completa remissão e 12 apresentaram remissão parcial, demonstrando a eficiência da terapêutica de erradicação (STATHIS et al., 2009).

Em um trabalho de revisão sistemática foram verificadas taxas de remissão completa do linfoma MALT variando entre 46 e 94% (SUZUKI; SAITO; HIBI, 2009). O fato da terapia de erradicação da H. pylori resultar na maioria dos casos em regressão histológica do linfoma MALT tornou a administração de antibióticos o tratamento inicial único quando o linfoma MALT está confinado a parede gástrica em pacientes H. pylori positivos.

Associação com Gastrite

Apesar da colonização gástrica com H. pylori induzir uma gastrite histológica em todos os indivíduos infectados, apenas uma minoria desenvolve sinais clínicos aparentes desta colonização. Os riscos para o desenvolvimento de úlcera e câncer gástrico distal são dependentes de fatores do hospedeiro, bacterianos e ambientais relacionados ao padrão e a gravidade da gastrite. A colonização com H. pylori leva à infiltração da mucosa gástrica, tanto no antro quanto no corpo do estômago, de células mononucleares e neutrófilos. O processo inflamatório crônico é responsável por grande parte das associações da H. pylori com outras doenças. Dados   sobre a fase aguda   da infecção  são escassos e geralmente originados de indivíduos que ingeriram H. pylori ou foram submetidos a procedimentos com material contaminado (MARSHALL et al., 1985; MORRIS; NICHOLSON, 1987). Um modelo de infecção pela H. pylori foi utilizado com a infecção deliberada de voluntários saudáveis com uma bem caracterizada cepa de laboratório da H. pylori para permitir estudos controlados da fase aguda da infecção (GRAHAM et al., 2004). Esses estudos demonstraram que a fase aguda da colonização com H. pylori pode estar associada com sintomas dispépticos inespecíficos e transitórios, tais como empachamento, náuseas e vómitos. Também apresentam uma extensa inflamação da mucosa do estômago. Não está claro se essa colonização inicial pode ser seguida por eliminação espontânea e resolução de gastrite ou se é frequente. Estudos de acompanhamento de crianças com exames sorológicos positivos para H. pylori sugeriram que a infecção pode desaparecer espontaneamente em alguns pacientes nessa faixa etária (MALATY et al., 1999; PÉREZ- PÉREZ et al., 2003).

Estudos em gêmeos homozigotos mostraram uma concordância em seu status H. pylori independentemente de terem crescido juntos ou não (MALATY et al., 1994). Este resultado não foi verificado entre os gêmeos heterozigotos. Isto sugere que alguns indivíduos estão propensos à colonização pela H. pylori, enquanto outros podem ser capazes de prevenir a colonização ou resolver uma infecção estabelecida.

Na colonização persistente da bactéria H. pylori, que leva a gastrite crônica, existe uma estreita correlação entre o nível de secreção ácida e a distribuição de gastrite. De forma geral, quanto menos ácido é secretado maior é a disseminação da bactéria, portanto a produção de ácido é importante na determinação do prognóstico da infecção pela H. pylori.

Quando há baixa secreção ácida a evolução para a pangastrite pode levar a gastrite atrófica que por sua vez pode evoluir para a metaplasia intestinal, displasia e finalmente chegar ao câncer gástrico. Na presença de secreção ácida elevada, a gastrite fica limitada ao antro, geralmente evoluindo para a úlcera péptica.

Associação com úlcera péptica e duodenal

Estudos de coorte estimaram que o risco de desenvolver úlceras está entre 3 a 10 vezes maior para indivíduos H. pylori-positivos do que em H. pylori- negativos (NOMURA et al., 1994). O aparecimento dos tratamentos para erradicação da H. pylori forneceu a evidência de uma relação causal entre H. pylori e doença ulcerosa, ao mostrar que a erradicação desta bactéria reduziu acentuadamente o risco de úlcera recorrente. Isto teve grande importância no tratamento e prognóstico da úlcera péptica na prática clínica diária. Antes destes dados, a úlcera era considerada uma doença crônica e recorrente, com alta morbidade, necessitando de terapia antiácida ou cirúrgica. Metade dos pacientes com úlcera péptica associada a H. pylori sofrem recidivas da úlcera. A erradicação da H. pylori alterou o curso natural da doença impedindo quase completamente a sua recidiva (RAUWS; TYTGAT, 1990). A recorrência da úlcera após a erradicação terapêutica da H. pylori pode dever-se a reinfecção pela H. pylori, ao uso de antiinflamatórios não esteróides ou representar o aparecimento de úlcera idiopática. Na presença da H. pylori, fatores do hospedeiro e da bactéria influenciam o aparecimento de úlceras.

A prevalência de úlceras pépticas tem diminuído nos países ocidentais pela redução da recorrência consequente a erradicação da H. pylori e pela melhora na higiene e das condições de vida, e principalmente ao uso de terapia antimicrobiana.

A erradicação da H. pylori reduz o risco de úlceras hemorrágicas em pacientes que apresentaram prévia hemorragia ulcerosa quando infectados pela H. pylori (GISBERT et al., 2004).

Helicobacter pylori é o mais importante fator de risco conhecido para o desenvolvimento de úlcera duodenal. No entanto, apenas 20% dos pacientes infectados desenvolvem úlcera.

De acordo com o modelo aceito da patogênese da H. pylori relacionada à úlcera duodenal, a colonização do duodeno pelo organismo é o passo final. Assim sendo, a presença de colonização duodenal pode representar um risco muito elevado para o desenvolvimento da úlcera duodenal. Pietroiusti e colaboradores (2005) usaram culturas para testes de colonização duodenal. Avaliaram se esta condição conferia um maior risco de desenvolver úlcera duodenal entre pacientes com achados endoscópicos basais normais. Perceberam também a presença da citotoxina associada ao gene A (CagA), um fator que contribuem para o desenvolvimento da gastrite crônica em idosos bacteriana que aumenta em três vezes o risco e avaliaram se a colonização duodenal com bactérias cagA positivas aumentavam ainda mais esse risco. Concluíram que o risco de desenvolvimento de úlcera duodenal pela H.pylori está aumentado quando o organismo é detectado por cultura do duodeno. Este achado pode influenciar as estratégias que visam à prevenção de úlcera duodenal, a doença mais comum provocada pela infecção por H. pylori.

Associação com câncer gástrico

Enquanto a maioria dos indivíduos infectados pela H. pylori permanecem assintomáticos, entre 10 a 20% vão desenvolver úlcera péptica e 1% evoluirão para o câncer gástrico (ERNST; PEURA; CROWE, 2006).

Após a infecção, a H. pylori ativa múltiplas vias intracelulares em células epiteliais, tais como MAPK, NF-kB, ativador de proteína (AP) -1, Wnt/â-catenina, PI3K, transdutores de sinal e ativadores de transcrição 3 (STAT3), ciclooxigenase2, que afetam as funções celulares tendo como consequência a produção elevada de citocinas inflamatórias, alteração das taxas de apoptose, proliferação e diferenciação de células epiteliais, e mais importante, resultam na transformação oncogênica de células epiteliais. Os fatores que contribuem para o desenvolvimento da gastrite crônica em idosos como a citotoxina CagA, a citotoxina vacuolizadora VacA e as proteínas de membrana externa (OMPs), são responsáveis por muitos destes efeitos. A H. pylori induz alterações epigenéticas, como a metilação do DNA e a modificação das histonas, que são importantes na transformação oncogênica (DING; GOLDBERG; HATAKEYAMA, 2010).

Modelos animais têm sido utilizados para uma melhor compreensão do papel dos fatores que contribuem para o desenvolvimento da gastrite crônica em idosos da H. pylori possibilitando observar os mecanismos de indução da oncogênese. Em um modelo de camundongo transgênico, demonstrou-se que a expressão de CagA em camundongos induziram vários tumores, hiperplasia epitelial gástrica, pólipos hiperplásicos, carcinomas gastrointestinais e doenças hematológicas malignas, como leucemia mielóide e Linfoma de célula B. Observação importante foi a ausência de sinais de gastrite ou inflamação sistêmica e identificação de câncer em células autônomas (OHNISHI et al., 2008).

Este estudo demonstrou que a proteína CagA isolada é capaz de induzir o câncer, sem processo inflamatório, identificando o papel da CagA na tumorigênese como sendo uma oncoproteína.

Com uma amostra de 436 pacientes brasileiros infectados com cepas cagA-positivas, Batista e colaboradores (2011) verificaram que a infecção com cepas de H. pylori com mais de um sitio cagA EPIYA C, sítios de fosforilação, estava claramente associada ao câncer gástrico, mas não havia associação com úlcera duodenal. O maior número de segmentos EPIYA C também foi associado a lesões gástricas pré-cancerosas.

A bactéria H. pylori também aumenta a expressão de CXCR4 no câncer gástrico através do TNF-a (ZHAO et al., 2010). CXCR4 é o receptor de quimosinas mais comumente super expresso em muitos tipos de cânceres, entre eles o gástrico. O TNF-a é um dos principais mediadores químicos implicados na inflamação associada a cânceres e está envolvido na promoção e progressão de cânceres humanos e experimentais. Os produtos da cag PAI podem estar envolvidos nesta indução.

O polimorfismo de interleucinas influência no desenvolvimento de úlcera péptica e câncer gástrico. Enquanto o polimorfismo das interleucinas (IL)-1B , IL- 1RN e TNF-A estão claramente relacionados com o risco de desenvolvimento das doenças acima citadas, o mesmo não ocorre com os genes IL-2 , IL-4 , IL-6 e IL-8. As citocinas são produzidas pelas células inflamatórias ativadas pela infecção crônica pela H. pylori (SUGIMOTO; YAMAOKA; FURUTA, 2010).

A associação da H. pylori ao linfoma MALT encontra-se bem estabelecida. A confirmada relação entre a erradicação da H. pylori e a remissão completa ou parcial do linfoma MALT (STATHIS et al., 2009; SUZUKI; SAITO; HIBI, 2009), torna a associação entre a H. pylori e o linfoma MALT muito importante e peculiar.

Esta associação levou à hipótese de que a bactéria é responsável por um estímulo antigênico que sustenta o crescimento do linfoma MALT no estômago. O prognóstico dos pacientes tratados com antibióticos não parece ser inferior ao tratamento com cirurgia, radioterapia ou quimioterapia. Com isto, hoje é aceito mundialmente que o tratamento preconizado para pacientes com linfoma MALT H. pylori-positivos seja a terapia que associa antibióticos com inibidores de bomba de prótons. Pacientes com linfoma MALT H. pylori- negativos são encaminhados para tratamento oncológico.

Pacientes com linfomas MALT que possuem a fusão API2-MALT1 geralmente são resistentes à terapia de erradicação da H. pylori, porém um estudo recente demonstrou que o tratamento com rituximabe (anticorpo monoclonal para CD20) foi responsável por remissão completa em 46% e remissão parcial em 31% dos pacientes com linfoma MALT com API2-MALT1 (SUZUKI; SAITO; HIBI, 2009).

Lin e colaboradores (2010) sugerem que a H. pylori através da translocação de sua oncoproteína cagA para dentro dos linfócitos B provocam a sua ativação. A oncoproteína cagA seria também diretamente responsável pela indução a formação dos linfomas MALT.

O papel da cagA foi visto na análise dos principais “fatores que contribuem para o desenvolvimento da gastrite crônica em idosos”. Em termos de perspectivas, investigações com células-tronco podem esclarecer muitos dos mecanismos ainda incompreendidos utilizados pela bactéria H. pylori que terminam por induzir a carcinogênese.

Associação com sistema endócrino

A produção local e principalmente a difusão sistêmica de citocinas pró-inflamatória provocada pela resposta imune à infecção da H. pylori pode exercer seus efeitos em tecidos e sistemas orgânicos distantes. Por causa disso a infecção pela H. pylori tem sido epidemiologicamente ligada a doenças extra-gástricas, incluindo distúrbios endócrinos.

Estão relacionadas à infecção da H. pylori doenças como Diabetes mellitus, Dislipidemia, Obesidade, Osteoporose, Hiperparatireoidismo primário e as doenças autoimunes da tireóide: Tireoidite atrófica auto-imune, Tireoidite de Hashimoto e Linfoma MALT.

Papamichael e colaboradores. (2009), após uma revisão crítica dos artigos publicados sobre o assunto, concluíram que resultados encontrados sugerem uma forte ligação entre dislipidemia e infecção pela H. pylori. Afirmaram que o papel desta infecção bacteriana em doenças autoimunes da tireóide estava cada vez mais evidente e é cientificamente provado. E em sentido contrário, a associação entre a infecção pela H. pylori e obesidade, hiperparatireoidismo primário, diabetes mellitus e osteoporose permanecia controversa, prejudicada por números pequenos de amostras e problemas metodológicos. Portanto, essas últimas associações devem ser interpretadas cautelosamente.

Resposta imune contra a H. pylori

A colonização do estômago pela H. pylori provoca a resposta imune celular e humoral, que na maioria dos casos não resultam na eliminação da bactéria.

Em artigo de revisão, Algood e Cover (2006) ofereceram uma visão geral da interação entre a H. pylori e a resposta imune do hospedeiro. Em resumo, a mucosa gástrica produz fatores que limitam a proliferação de bactérias, como os peptídeos antibacterianos defensinas 1 e 2. A lactoferrina inibe o crescimento bacteriano restringindo a disponibilidade de ferro e atuando na permeabilidade da membrana. Seu derivado, a lactoferricina, é um peptídeo com propriedades antimicrobianas. A lisozima pode degradar o peptideoglicano de muitas espécies bacterianas e componentes específicos da mucina gástrica podem inibir o crescimento bacteriano. Receptores Toll-like (TLRs) estão presentes na superfície das células epiteliais gástricas e reconhecem padrões moleculares associados aos patógenos. Se as bactérias invadem e penetram a barreira epitelial gástrica, uma via alternativa do complemento é ativada e as bactérias invasoras serão combatidas por macrófagos e neutrófilos. Como na maioria dos organismos a H. pylori permanece dentro da camada de muco gástrico sem penetrar o tecido, o contato entre a H. pylori e as células fagocitárias ocorre com pouca frequência.

Fatores da bactéria H. pylori a protegem da resposta imune do hospedeiro, como a liberação da Uréase e os flagelos. As adesinas e proteínas da membrana externa facilitam a aderência da H. pylori às células epiteliais gástricas, que resultam na ativação de vias sinalizadoras que terminam por liberar citotoxinas dentro das células.

Algood e Cover (2006) compartimentalizaram a interação entre o H. pylori e a resposta imune da seguinte maneira:

Interação da H. pylori com os neutrófilos – Os neutrófilos são recrutados no início da infecção. Quando existe persistência da infecção a resposta é caracterizada pela infiltração de neutrófilos ativada por produtos bacterianos, a proteína ativadora de neutrófilos (HP-NAP) e a proteína da membrana externa

Saba. A H. pylori pode resistir a esta defesa. A migração de neutrófilos em resposta a quimiocinas IL-8 e Gro é mediada através dos receptores de quimiocinas CXCR1 e CXCR2. A H. pylori pode inibir a expressão destes receptores inibindo esta migração.

Interação da H. pylori com Mastócitos – Os mastócitos podem ser ativados pela proteína VacA. A ativação dos mastócitos pela H. pylori pode contribuir para a resposta inflamatória associada à infecção.

Interação da H. pylori com Macrófagos – O contato entre macrófagos e bactérias H. pylori intactas ou de seus componentes resulta em ativação de macrófagos e a secreção de numerosas citocinas e quimiocinas. O reconhecimento pelos macrófagos pode ser mediada por TLR2 ou TLR4. A H. pylori pode ser capaz de inibir sua captura pelos macrófagos. Um mecanismo pelo qual a

H. pylori prejudica a atividade antimicrobiana dos macrófagos e envolve a expressão de catalase. Outro mecanismo é o bloqueio da produção de óxido nítrico, mediado pela Arginase da H. pylori. E mais importante, a H. pylori pode induzir a apoptose de macrófagos.

Interação da H. pylori com Células Dendríticas – Em resposta a H. pylori, células dendríticas expressam moléculas co-estimulatórias e um complexo de histocompatibilidade classe II, que aumentam a eficiência da apresentação de antígenos. A H. pylori também estimula as células dendríticas para expressarem citocinas como IL-6, IL-8, IL-10 e IL-12. A produção acentuada de IL-10 pode inibir a resposta inflamatória.

Interação da H. pylori com Linfócitos B – A H. pylori possui vários efeitos inibitórios sobre linfócitos B. A proteína bacteriana VacA inibe a capacidade dos linfócitos B em estimular as células T CD4. A proteína CagA inibe a proliferação de células B interleucina-3- dependente por inibição da sinalização JAK-STAT, levando a uma produção ineficiente de anticorpos e reduzindo a expressão de citocinas.

Interação da H. pylori com Linfócitos T – A H. pylori pode interferir com múltiplas funções dos linfócitos T ou até mesmo levar a apoptose de células T. A proteína VacA tem importância fundamental nestes processos. A Arginase da H. pylori também contribui para a inibição da proliferação de células T. Uma proteína da H. pylori de baixo peso molecular inibe a proliferação de linfócitos T bloqueando a progressão do ciclo celular na fase G1.

CONCLUSÕES

A infecção pela H. pylori é, epidemiologicamente, importante em vários países, por sua interação com doenças de vários sistemas do organismo e, principalmente, pelo seu potencial neoplásico, assim, deve-se gerar medidas de impacto a serem utilizadas por organizações mundiais no sentido de sua erradicação. Neste estudo foi mostrado a importância

dos fatores bacterianos na virulência e patogêneses de doenças gástricas. Também o papel fundamental do sistema imunológico do hospedeiro na evolução da infecção sendo o estudo do polimorfismo genético das citocinas fundamental para entender a interação hospedeiro-bactéria.

Como muitos fatores que influenciam na sua prevalência estão relacionados às condições humanas de subsistência, não basta apenas a implementação generalizada do tratamento preconizado como, também de medidas sócio-políticas que melhorem a condição de vida das populações pobres, pois a persistência dos fatores de proliferação da H. pylori aumenta o risco de re-infecção pela bactéria.

REFERÊNCIAS

1. ALGOOD, H. M.; COVER, T. L. Helicobacter pylori Persistence: an Overview of Interactions between H. pylori and Host Immune Defenses. Clin. Microbiol. Rev., Washington, DC, v. 19, n. 4, p. 597–613, Oct. 2006.

2. BATISTA, S. A. et al. Higher number of Helicobacter pylori CagA EPIYA C phosphorylation sites increases  the risk  of gastric cancer, but not duodenal ulcer. BMC Microbiol., London, v. 11, n. 61, p. 1-7, Mar. 2011.

3. BONECA, I. G. et al. A revised annotation and comparative analysis of Helicobacter pylori genomes. Nucleic Acids Res., Oxford, v. 31, n. 6, p. 1704–1714, Mar. 2003.

4. DING, S. Z.; GOLDBERG, J. B.; HATAKEYAMA, M. Helicobacter pylori infection, oncogenic   pathways and   epigenetic mechanisms in gastric carcinogenesis. Future Oncol., London, v. 6, n. 5, p. 851–862, May 2010.

5. DOMAÑSKA G. et al. Helicobacter pylori VacA toxin/subunit p34: targeting of an anion channel to the inner mitochondrial membrane. PLoS Pathog., San Francisco, v. 6, n. 4, p. 1-14, Apr. 2010.

6. ERNST, P. B.; PEURA, D. A.; CROWE, S. E. The translation of Helicobacter pylori basic research to patient care. Gastroenterology, Baltimore, v. 130, n. 1, p. 188–206, Jan. 2006.

7. GISBERT, J. P. et al. Meta-analysis: Helicobacter pylori eradication therapy vs.   antisecretory   non-eradication   therapy for the prevention of recurrent bleeding from peptic ulcer.Aliment. Pharmacol. Ther., Oxford, v. 19, n. 6, p. 617– 629, Mar.2004.

8. GRAHAM, D. Y. et al. Challenge model for Helicobacter pylori infection in human volunteers. Gut, London, v. 53, n. 9, p. 1235– 1243, Sep. 2004.

9. ISRAEL, D. A.; PEEK, R. M. Review article: pathogenesis of Helicobacter pylori-induced gastric inflammation. Aliment. Pharmacol. Ther., Oxford, v. 15, n. 9, p. 1271-1290, Sep. 2001.

10. LEHOURS, P. et al. Evaluation of the association of nine Helicobacter pylori virulence factors with strains involved in low-grade gastric mucosa-associated lymphoid tissue lymphoma. Infect. Immun., Bethesda, v. 72, n. 2, p. 880–888, Feb. 2004.

11. LIN, W. C. et al. Translocation of Helicobacter pylori CagA into Human B Lymphocytes, the Origin of Mucosa-Associated Lymphoid Tissue Lymphoma. Cancer Res., Baltimore, v. 70, n. 14, p. 5740-5748, Jul. 2010.

12. MALATY, H. M. et al. Helicobacter pylori infection: genetic and environmental influences. A study of twins. Ann. Intern. Med., Philadelphia, v. 120, n. 12, p. 982–986, Jun. 1994.

13. MALATY, H. M. et al. Natural history of Helicobacter pylori infection in childhood: 12-year follow-up cohort study in a biracial community. Clin. Infect. Dis., Chicago, v. 28, n. 2, p. 279–282, Feb. 1999.

14. MARSHALL, B. J. et al. Attempt to fulfil Koch’s postulates for pyloric Campylobacter. Med. J. Austr., Sydney, v. 142, n. 8, p. 436–439, Apr. 1985.

15. MORRIS, A.; NICHOLSON, G. Ingestion of Campylobacter pyloridis causes gastritis and raised fasting gastric pH. Am. J. Gastroenterol., New York, v. 82, n. 3, p. 192–199, Mar. 1987.

16. NOMURA, A. et al. Helicobacter pylori infection and the risk for duodenal and gastric  ulceration. Ann. Intern. Med.,Philadelphia, v. 120, n. 12, p. 977–981, Jun. 1994.

17. OLSON, J. W.; MAIER, R. J. Molecular Hydrogen as an energy source for Helicobacter pylori. Science, New York, v. 298, n. 5599, p. 1788-1790, Nov. 2002.

18. OHNISHI, N. et al. Transgenic expression of Helicobacter pylori CagA induces gastrointestinal and hematopoietic neoplasms in mouse. Proc. Natl. Acad. Sci. USA, Washington, DC, v. 105, n. 3, p. 1003–1008, Jan. 2008.

19. PAPAMICHAEL, K. X. et al. Helicobacter pylori infection and endocrine disorders: Is there a link? World J. Gastroenterol., Beijing, v. 15, n. 22, p. 2701-2707, Jun. 2009.

20. PÉREZ-PÉREZ, G. I. et al. Transient and persistent Helicobacter pylori colonization in Native American children. J. Clin. Microbiol., Washington, DC, v. 41, n. 6, p. 2401–2407, Jun. 2003.

21. PÉREZ-PÉREZ, G. I.; BLASER, M. J. Campylobacter and Helicobacter – medical microbiology. 4th ed.  Galveston, Texas: University of Texas Medical Branch at Galveston, 1996.

22. PIETROIUSTI, A. et al. Helicobacter pylori duodenal colonization is a strong risk factor for the development of duodenal ulcer. Aliment. Pharmacol. Ther., Oxford, v. 21, n. 7, p. 909–915, Apr. 2005.

23. PORTAL-CELHAY, C.; PEREZ-PEREZ, G. I. Immune responses to Helicobacter pylori   colonization: mechanisms   and   clinical outcomes. Clin. Sci., London, v. 110, n. 3, p. 305–314, Mar. 2006.

24. RAUWS, E. A.; TYTGAT, G. N. Cure of duodenal ulcer associated with eradication of Helicobacter pylori. Lancet, London, v. 335, n. 8700, p. 1233–1235, May 1990.

25. RICCI, V.; ROMANO, M.; BOQUE, P. Molecular cross-talk between Helicobacter pylori and human gastric mucosa. World J. Gastroenterol., Beijing, v. 17, n. 11, p. 1383-1399, Mar. 2011.

26. STATHIS, A. et al. Long-term outcome following Helicobacter pylori eradication in a retrospective study of 105 patients with localized gastric marginal zone B-cell lymphoma of MALT type. Ann. Oncol., London, v. 20, n. 6, p. 1086–1093, Jun. 2009.

27. SUGIMOTO, M.; YAMAOKA, Y. Virulence factor genotypes of Helicobacter pylori affect cure rates of eradication therapy. Arch. Immunol. Ther. Exp., Warszawa, v. 57, n. 1, p. 45–56, Jan./ Feb. 2009.

28. SUGIMOTO, M.; YAMAOKA, Y.; FURUTA, T. Influence of interleukin polymorphisms   on development   of gastric   cancer and peptic ulcer. World J. Gastroenterol., Beijing, v. 16, n. 10, p. 1188-1200, Mar. 2010.

29. SUZUKI, H.; SAITO, Y.; HIBI, T. Helicobacter pylori and Gastric Mucosa-associated Lymphoid   Tissue   (MALT)   Lymphoma: Updated Review of Clinical Outcomes and the Molecular Pathogenesis. Gut Liver, Seoul, v. 3, n. 2, p. 81-87, Jun. 2009.

30. TALARICO, S. et al. Pediatric Helicobacter pylori Isolates Display Distinct Gene Coding Capacities and Virulence Gene Marker Profiles. J. Clin. Microbiol., Washington, DC, v. 47, n. 6, p. 1680–1688, Jun. 2009.

31. VIALA, J. et al. Nod1 responds to peptidoglycan delivered by the Helicobacter pylori Cag pathogenicity island.  Nat. Immunol., New York, v. 5, n. 11, p. 1166–1174, Nov. 2004.

32. YAMAOKA, Y. Roles of Helicobacter pylori BabA in gastroduodenal pathogenesis.   World J.   Gastroenterol., Beijing, v. 14, n. 27, p. 4265-4272, Jul. 2008.

33. ZHAO, C. et al. Involvement of tumor necrosis factor-a in the upregulation of CXCR4 expression in gastric cancer induced by Helicobacter pylori. BMC Cancer, London, v. 10, n. 419, p. 1-10, Aug. 2010.