USO DE SUBSTANCIAS PSICOESTIMULANTES ENTRE ESTUDANTES DE MEDICINA NO BRASIL: UMA REVISÃO NARRATIVA

USE OF PSYCHOSTIMULANTS AMONG MEDICAL STUDENTS IN BRAZIL: A NARRATIVE REVIEW

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8136486


Cláudia Francisca Grandoi
Patrick Costa de Sousaii
Ana Paula Gonçalves Pinculiniiii
Lincon Bordignon Somensiiv


Resumo

O uso de psicoestimulantes entre acadêmicos de medicina é utilizado por esse público com a finalidade de aprimoramento cognitivo e na tentativa de driblar a grande demanda imposta a eles e podem ser naturais ou sintéticos. Os dados foram buscados através de artigos originais e artigos de revisão integrativa encontrados em revistas da SCIELO (Scientific Eletronic Library Online), BVS (Biblioteca Virtual em Saúde) e LILACS (Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde), dos quais foram definidos como qualidade entre os anos de 2012 e 2022. A seleção foi realizada através de critérios de inclusão e exclusão que correspondem aos objetivos da pesquisa que vão desde a investigação das principais substâncias utilizadas pelo público-alvo, comparação, seus efeitos colaterais e ação no organismo para que, assim, 5 artigos fossem selecionados e analisados dos quais os resultados foram distribuídos em uma tabela e texto de forma narrativa. Os resultados mostraram que a prevalência do uso de substâncias psicoestimulantes entre acadêmicos de medicina cresceram nos últimos anos. Além disso, o estudo mostrou que a substância natural de maior consumo nesse meio é a cafeína e a sintética é o cloridrato de metilfenidato demonstrando, também, os mecanismos de ação e efeitos colaterais. Nesse viés, é necessário que mais estudos sejam realizados para que essa crescente utilização seja melhor elucidada e que haja uma maior preocupação com o uso dessas substâncias estimulantes cerebrais sintéticas visto que possuem maior impacto no organismo e indiscriminado uso off label.

Palavras-chave: Psicoestimulante. Medicina. Cafeína.

Abstract – The use of psychostimulants among medical students is used by this public for the purpose of cognitive enhancement and in an attempt to get around the great demand imposed on them, and they can be natural or synthetic. The data were searched through original articles and integrative review articles, found in SCIELO (Scientific Eletronic Library Online), BVS (Virtual Health Library) and LILACS (Latin American and Caribbean Literature on Health Sciences) journals, of which quality was defined as between the years 2012 to 2022. The selection was made through inclusion and exclusion criteria that corresponded to the research objectives, ranging from the investigation of the main substances used by the target audience, comparing them, their side effects and action in the body so that, thus, 5 articles were selected and analyzed, of which the results were distributed in a table and text in a narrative way. The results showed that the prevalence of psychostimulant substance use among medical students has increased in recent years. Furthermore, the study showed that the natural substance with the highest consumption in this environment is caffeine and the synthetic one is methylphenidate hydrochloride, also demonstrating the mechanisms of action and side effects. In this bias, it is necessary that more studies be conducted for this growing use to be better elucidated and that there be more concern about the use of these synthetic brain stimulants, since they have a greater impact on the body and indiscriminate off-label use.

Keywords: Psychostimulant. Medicine. Caffeine.

INTRODUÇÃO

Durante a graduação o acadêmico de medicina é exposto a uma carga horária, na maioria das vezes, exaustiva, a qual compreende mais de 30 horas semanais de aulas em período integral logo nos primeiros anos de faculdade, o que aumenta com o decorrer do curso (FIOROTTI, 2009). Diante disso, os futuros médicos sentem a necessidade de usar substâncias psicoestimulantes naturais e/ou sintéticas a fim de aumentar o potencial cognitivo para suprir as demandas acadêmicas. Essas substâncias facilitam a ultrapassagem dos limites corpóreos e psicológicos que são cobrados diariamente dos acadêmicos (ZANDONÁ et al., 2020).

Além disso, esses compostos agem aumentando a atividade motora, a redução da necessidade de sono, aumento da atenção e da memorização e aprimoramento da realização de tarefas melhorando o desempenho acadêmico. Com isso, os psicoestumlantes funcionam como uma válvula de escape para os acadêmicos conseguirem driblar a exaustiva carga horária de estudos e suprir as exigências semestrais (BARBOSA et al., 2021).

No Brasil, a prevalência do uso de substâncias psicoestimulantes por estudantes de medicina tem aumentado significativamente, esse dado se confirma por pesquisas epidemiológicas feitas em algumas universidades do país. Em uma Universidade no Extremo Sul do Brasil a utilização foi de 58% para 68% de 2015 a 2018 (MEZACASA JÚNIOR, 2021). Já em uma Faculdade de Medicina do Oeste da Bahia as substâncias estimulantes mais utilizadas foram bebidas energéticas (69%), guaraná (8%) e metilfenidato (3%) no ano de 2019 dando-se o levantamento dos resultados a partir de um questionário aplicado a 156 pessoas (MASINI et al., 2019).

Diante disso, a relevância deste artigo baseia-se no crescente aumento do consumo de tais substâncias, bem como nos efeitos colaterais que elas causam visto que esse grupo de pessoas estudadas forma o público que mais utiliza compostos psicoestumulantes para a obtenção de melhor desempenho acadêmico e, como consequência, torna-se dependente de medicamentos ou de drogas na tentativa incessante de driblar as problemáticas encontradas durante a graduação.

Portanto, o objetivo deste estudo foi realizar um levantamento bibliográfico sobre o uso de substâncias psicoestimulantes entre estudantes de medicina esclarecendo sobre tais substâncias, como elas atuam no organismo humano, quais são seus efeitos colaterais e quais são as principais substâncias utilizadas por este público.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

SUBSTÂNCIAS PSICOESTIMULANTES

Os psicoestimulantes são substâncias que podem ser naturais, encontradas facilmente e comercializadas amplamente, além de serem bem aceitas na sociedade, pois elas fazem parte do cotidiano da maioria das pessoas (MEZACASA JUNIOR et al., 2021). Já os estimulantes do Sistema Nervoso Central (SNC) não naturais, ou sintéticos, estão restritos ao comércio controlado, pois são produzidos laboratorialmente e só podem ser adquiridos através de prescrições médicas (ZANDONÁ et al., 2020).

Estas substâncias atuam no SNC estimulando-o de diversas formas, todavia, eles têm a mesma finalidade que é a promoção de um melhor desempenho cognitivo, maior foco, diminuição da fadiga e do sono (FREDHOLM, 2010).

Assim, eles são utilizados desde os primórdios, datados desde o século XI, pela população africana com a utilização de psicoestimulantes naturais para o tratamento de doenças e disseminados conforme a globalização aconteceu, tornado o comércio dessas substâncias ampliado. A partir disso, foram criados sinteticamente fármacos e drogas para controlar patologias e ampliar a estimulação neuronal respectivamente (ZANDONÁ et al., 2020).

Substâncias Psicoestimulantes não Sintéticas Utilizadas por Acadêmicos de Medicina

As demandas universitárias, muitas vezes, ultrapassam as barreiras físicas e mentais dos acadêmicos fazendo-os buscar algo que amplie a forma de absorção daquilo que é imposto, como aumento da capacidade psíquica, diminuição do sono e aumento do estado de alerta. A carga horária é exaustiva e a busca por conhecimento não se restringe somente dentro da universidade, pois são necessárias longas horas de estudo para absorção dos conteúdos. Além disso, as cobranças não são somente universitárias, elas advêm da sociedade, dos familiares e, também, da autocobrança.

Em função disso, a válvula de escape, muitas vezes, são as substâncias psicoestimulantes, sejam elas sintéticas ou naturais, essa última é mais aceita socialmente, pois os derivados já são amplamente utilizados devido a demanda que o meio impõe à população. No meio acadêmico não é diferente sendo que as demandas são até maiores (COELHO; FARIA, 2015).

Os estimulantes do SNC não sintéticos são assim definidos por possuírem a característica de serem encontrados de forma natural no meio ambiente. São amplamente vendidos em inúmeros locais, como supermercados, e difundidos através da cultura regional e familiar e por meio de comerciais apresentados nas televisões, nas redes sociais, nos aplicativos de conversa e na internet em geral. Eles não precisam de prescrição médica para serem adquiridos, o que aumenta o consumo populacional.

Esses compostos atuam no SNC como antagonistas dos receptores adenosina, como a cafeína, bloqueando canais A1 e A2a e tornando a adenosina mais disponível em outras vias cerebrais fazendo com que os efeitos estimulantes sejam acentuados (FREDHOLM, 2010).

Essas substâncias são neuroprotetores, pois aumentam a neuroplasticidade e diminuem os radicais livres prevenindo doenças mentais, como Parkinson e Alzheimer, já que as mesmas ocorrem por meio da deposição de substâncias betaamiloides no cérebro e as xantinas driblam essa produção em larga escala (FREDHOLM, 2010).

Cafeína

A cafeína é a substância psicoativa mais popular e mais consumida em todo o mundo. É utilizada como estimulante SNC, além de ser uma substância alcaloide derivada da xantina, da qual a cafeína é o estimulante mais potente. Os efeitos no organismo humano vão desde prejudiciais, se consumidos em excesso, até efeitos benéficos, como aumento do desempenho em diversas atividades e capacidades psicomotoras. As fontes de cafeína são diversas como folhas, grãos (do café e do guará, por exemplo), frutos e ervas, delas podem ser extraídas a cafeína e utilizados no dia a dia. Sendo assim, bebidas como café, chá, refrigerantes, energético, chocolates, suplementos para pessoas que fazem atividades físicas e medicamentos (ZHANG et al., 2022).

Farmacodinamicamente é metabolizada no fígado, tem um ciclo de atuação de três a seis horas e é excretada pela urina. Sua apresentação molecular é C8H10N4O2 (1,3,7-trimetilxantina), possui gosto amargo, é inodora, é hidrossolúvel, com densidade de 1,2 g/cm3, ponto de sublimação de 178°C e fusão de 238°C (ARAUJO; RIBEIRO; VANDERLEI, 2020).

Sua estrutura molecular é semelhante à da adenosina e atua como antagonista nos receptores dela, especialmente dos subtipos A1 e A2A, tornando impossível a ligação do SNC com as moléculas de adenosina (COELHO; FARIA, 2015). Assim, estimula centros vasomotores, moduladores e respiratórios alterando a frequência cardíaca e respiratória podendo, também, aumentar a pressão arterial.

Além disso, é inibidora competitiva da fosfodiesterase que hidrolisa ligações fosfodiéster, também da adenosina 3,5-monofosfato cíclico (cAMP), ou seja, não ocorre a degradação de cAMP. Esse é o mecanismo de ação da cafeína responsável pela estimulação do SNC que produz os efeitos mais utilizados pelos consumidores para combater o cansaço (ARAUJO; RIBEIRO; VANDERLEI, 2020).

Os efeitos exercidos no corpo humano variam de acordo com a quantidade ingerida, idade e massa corporal. A cafeína é um composto dose dependente, pois doses próximas a 300mg podem gerar efeitos benéficos na estimulação neural tornando-a efetiva para suprir as demandas dos universitários. Já doses acima de 600mg podem gerar efeitos que não são buscados pelos acadêmicos, como confusões mentais e até possíveis falhas intelectuais (COELHO; FARIA, 2015).

Por ser uma substância psicoestimulante a cafeína torna os seres humanos mais ativos reduzindo o sono. Assim, um ciclo vicioso pode ser iniciado, pois o estado de alerta no dia seguinte pode ser reduzido devido à má qualidade do sono e mais quantidade da substância é necessária. Então, os acadêmicos, geralmente, recorrem a esse composto para conseguir driblar as demandas acadêmicas e, por consequência, tornam-se dependentes. A apresentação da cafeína pode ser através de bebidas, a qual é a forma mais utilizada, mas ainda pode ser ingerida através de medicamentos contendo a substância (PEREIRA et al., 2022).

Esse potencial de aprimoramento das capacidades fisiológicas favorecidas por tal composto pode acarretar formas negativas, tal qual a dependência química. É necessário que um profissional da saúde intervenha na forma e quantidade que esse público utiliza essas substâncias, pois a dependência pode gerar estresse e algo que era utilizado como benéfico pode se tornar patológico.

Bebidas energéticas

Na maioria dos energéticos são encontradas cafeína, taurina, vitaminas do complexo B e açucares. Desses compostos, a psicoestimulação se dá através da taurina e cafeína (MOURA et al., 2022).

A taurina, geralmente, está associada a bebidas energéticas. É um aminoácido não essencial e está envolvido em vários processos metabólicos como o aumento da síntese proteica e com a produção de neurotransmissores, isso tem papel fundamental na performance cognitiva (COELHO; FARIA, 2015).

Guaraná

Guaraná é uma substância psicoestimulante de origem nativa da Amazônia, seu efeito sobre o corpo humano se dá através dos compostos presentes na planta, que são as xantinas. A cafeína está presente na composição do guaraná e é o principal mecanismo de ação responsável pela estimulação do SNC. Existem alguns outros compostos como saponinas e taninas, as quais aumentam o tempo de meia- vida da cafeína promovendo estado de alerta, estímulo das funções psíquicas, melhor associação de ideias e atividades intelectuais e maior resistência ao cansaço. É encontrado em diversas fontes como bebidas, suplementos para pessoas que fazem atividades físicas e medicamentos (TORRES et al., 2022).

As doses entre 37,5 e 300mg são recomendadas para que tal necessidade seja suprida por esse público (COELHO; FARIA, 2015).

Substâncias Psicoestimulantes Sintéticas Utilizadas pelos Acadêmicos de Medicina e sua Automedicação

As substâncias psicoestimulantes sintéticas são chamadas assim por serem produzidas artificialmente em laboratórios. Esse grupo, em especial, possui efeito estimulante, majoritariamente, no sistema nervoso central sendo utilizadas para alterar a função mental e comportamental causando euforia, excitação, redução do tempo de sono e aumento da atividade motora (RANG et al., 2015)

Esses compostos estimulantes têm como base a anfetamina, que é uma amina simpática, a qual atua por meio da liberação das catecolaminas nas terminações nervosas cerebrais como dopamina e norepinefrina e, também, é inibidora da captura das catecolaminas fazendo com que altas concentrações delas fiquem disponíveis nas fendas sinápticas (WHALEN; FINKEL; PANAVELIL, 2016).

No SNC seu efeito principal é a estimulação de todo o eixo cerebrospinal, o córtex, o tronco cerebral e o bulbo fazendo a liberação e a potencialização de dopamina e norepinefrina. Com isso, seus efeitos farmacológicos relacionados com a dopamina são a ampliação do estado de alerta e da insônia e a diminuição da fadiga e do apetite. Além disso, há ações simpatomiméticas periféricas que causam elevação da pressão arterial e a inibição da motilidade gastrintestinal através da atuação no sistema adrenérgico ativada pela liberação de norepinefrina (WHALEN; FINKEL; PANAVELIL, 2016).

No que concerne a farmacocinética das substâncias psicoestimulantes sua absorção ocorre completamente no trato gastrointestinal, sua biotransformação se dá no fígado e sua excreção é feita pela urina. Pode ser usada em forma oral, aspirada ou injetada mudando a velocidade de sua absorção conforme a via de uso. A meia-vida desses sintéticos no plasma é de, aproximadamente, 5 horas, podendo perdurar por 20 a 30 horas e o estado de exaltação dura em torno de 4 a 6 horas (RANG et al., 2015).

Ademais, seus efeitos adversos no organismo compreendem vertigem, hipertensão, insônia, cefaleia, diarreia, náusea e êmese. O uso crônico das anfetaminas pode acarretar dependência visto que ela, um neurotransmissor associado ao prazer, está com a concentração elevada durante a ação dos psicoestimulantes sintéticos verificando-se o comportamento compulsivo pelo fármaco em busca de maior tempo de prazer e de seus benefícios na otimização da concentração para os estudos (WHALEN; FINKEL; PANAVELIL, 2016).

Diante disso, muitos acadêmicos de medicina buscam esses fármacos psicoestimulantes para conseguir atingir a quantidade de horas em estado de vigília necessárias para frequentar as aulas, fazer trabalhos, provas e potencializar a concentração durante as atividades que exigem um longo período para realização e entendimento. Sendo assim, a automedicação é uma prática comum e frequente entre este público. Apesar destes medicamentos exigirem receita médica controlada os acadêmicos, muitas vezes, conseguem as receitas com os próprios professores médicos, compram em farmácias que realizam a venda sem a receita médica ou adquirem clandestinamente em sites e outros meios de venda ilegal (MORAES et al., 2018).

De acordo com diversos estudos realizados há uma alta prevalência da automedicação entre acadêmicos de medicina, pois eles acreditam que o conhecimento adquirido nas aulas e nos livros são suficientes para saberem se medicar sozinhos e tratar seus problemas de saúde (BRITO; CASTILHO, 2021).

A busca por receitas médicas de psicofármacos, ou a sua compra ilegal, se deve pelo excesso de produtividade e de obrigações impostas pelo curso de medicina conforme a sua evolução. Apesar dessa prática ser maléfica para a saúde dos discentes eles, constantemente, buscam apoio nesses compostos para aumentar seu rendimento acadêmico condicionando seu cérebro a receber um estímulo a mais para realização das tarefas já que, por consumirem de maneira inadequada, acabam tornando-se dependentes químicos de substâncias psicoestimulantes sintéticas (ARAUJO; RIBEIRO; VANDERLEI, 2021).

Metilfenidato

O metilfenidato é o princípio ativo da Ritalina, medicamento utilizado para tratamento de Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), ou seja, doença crônica que causa dificuldade de atenção, impulsividade e hiperatividade em adultos e crianças (RANG et al., 2015). Essa droga possui efeito estimulante agindo, principalmente, como inibidor do transporte de norepinefrina e dopamina nas fendas sinápticas do SNC (WHALEN; FINKEL; PANAVELIL, 2016).

O consumo desse fármaco está crescendo cada vez mais no Brasil e no mundo. Conforme pesquisas da Organização das Nações Unidas (ONU), em 2013, a produção mundial de Ritalina atingiu 71,6 toneladas e o Brasil foi o 5º maior consumidor da substância. A produção e a importação de metilfenidato cresceram 373% no Brasil nos últimos dez anos e, devido a essa maior disponibilidade no mercado nacional, houve um aumento de 775% no consumo da substância psicoestimulante de acordo com uma pesquisa realizada pelo Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). Neste contexto, fica claro o aumento do consumo de metilfenidato, que também é conhecido no meio acadêmico pelo seu uso off label, isto é, fora da descrição devido ao seu efeito psicoestimulante. Ao ingressar no curso de medicina os alunos se deparam com uma carga horária extensa e exaustiva de aulas, estágios, trabalhos para fazer, provas e estudo complementar fora da faculdade. Sendo assim, esse composto é largamente usado com o intuito de aprimorar a habilidade cognitiva do indivíduo, pois ele auxilia na realização de tarefas em um menor espaço de tempo (PRAXEDES; SÁ-FILHO, 2021).

Por conta disso, esse medicamento é utilizado de forma indiscriminada por pessoas que, provavelmente, não precisam desse fármaco para tratar TDAH ou alguma outra patologia semelhante. Assim, as consequências e os efeitos colaterais provocados são mais intensos e, na maioria das vezes, provocam o chamado efeito rebote no qual o indivíduo sente-se depressivo e ansioso após passar o efeito do medicamento no organismo fazendo com que os usuários passem a querer tomar todos os dias, independentemente de ser acometido pelo transtorno de déficit de atenção ou não (PRAXEDES; SÁ-FILHO, 2021).

Por outro lado, tem-se os benefícios dessa droga no desempenho intelectual como a diminuição no sono, aumento na concentração, na produtividade, no rendimento e na energia em indivíduos que possuem o transtorno e naqueles que não possuem. Tais efeitos são dose-dependentes, em doses mais elevadas há uma diminuição nos benefícios e os malefícios apresentam-se de forma mais agravada, assim como seu uso crônico (RODRIGUES; ANDRADE, 2022).

No que se refere a forma de aquisição do metilfenidato acredita-se que a maioria dos acadêmicos de medicina conseguem a receita médica através de amigos, colegas e professores médicos, pois trata-se de uma medicação que exige receita médica controlada. Outras formas de obtenção são o mercado negro, na maioria das vezes, pela internet, por farmácias que vendem sem receita médica e por importação do Paraguai. Em vista disso, observa-se que o uso da Ritalina vai além das prescrições médicas ultrapassando as barreiras reguladoras exigidas pelos órgãos de fiscalização e vigilância em saúde, assim, os acadêmicos conseguem fazer o uso da substância sem terem o diagnóstico de TDAH e de forma indiscriminada (LAGE et al., 2015)

A utilização do metilfenidato fora da descrição é uma prática corriqueira no meio acadêmico, principalmente, no curso de medicina. O maior motivo para tal é o aprimoramento do poder cognitivo para obter o aumento no rendimento acadêmico, sobretudo, em épocas de provas e realização do Trabalho de Conclusão do Curso (TCC). Logo, torna-se indispensável uma reflexão sobre essa problemática já que os efeitos adversos causados pelo medicamento em indivíduos que não possuem indicação de tratamento ainda não são completamente conhecidos.

Dimesilato de Lisdexanfetamina

O dimesilato de lisdexanfetamina (LDX) é derivado da anfetamina, assim como o metilfenidato. O medicamento é mais conhecido como Venvanse e a Shire Pharmaceuticals recebeu a aprovação da LDX em 2007 pela Food and Drug Administration (FDA) para o tratamento de TDAH. No Brasil, a comercialização do fármaco aconteceu no mês de julho de 2010 a partir da autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) (BASTOS NETA et al., 2019).

Essa substância é um pró-fármaco que é transformado na droga ativa, dextroanfetamina, através da hidrólise enzimática e atua na liberação de catecolaminas, na inibição da recaptação das mesmas e inibe a enzima monoamina oxidase (MAO) que é responsável pela degradação de noradrenalina, tiramina, dopamina e serotonina. Por conta disso, a concentração dessas substâncias no cérebro aumenta provocando uma maior excitação dos neurônios que possuem receptores para essas aminas promovendo uma estimulação do SNC (CERQUEIRA; ALMEIDA; CRUZ JUNIOR, 2021).

Os efeitos colaterais causados pelo medicamento incluem diminuição do apetite, insônia e cefaleia. No que diz respeito as interações medicamentosas, a substância a qual o remédio é derivado, anfetamina, possui efeitos inibitórios em bloqueadores adrenérgicos utilizados no tratamento de algumas patologias cardíacas e anula o efeito sedativo de anti-histamínicos. Além disso, o metabolismo da droga é reduzido se o indivíduo faz uso concomitante de antidepressivos inibidores da monoamina oxidase, entre outras interações medicamentosas (BASTOS NETA et al., 2019).

Ainda, o LDX possui custo elevado em comparação com o metilfenidato fazendo com que a condição financeira do acadêmico seja um empecilho na compra do medicamento e, também, há a necessidade de receita médica controlada. Porém, como foi visto anteriormente, a receita médica é disponibilizada por diversos meios, assim como a sua comercialização ilegal.

Apesar de seus efeitos adversos e seus impasses, o Venvanse é muito utilizado por acadêmicos de medicina para obter os mesmos resultados proporcionados pelo metilfenidato, ou seja, elevação da concentração, privação de sono e melhoria no desempenho acadêmico (CERQUEIRA; ALMEIDA; CRUZ JUNIOR, 2021). A motivação por trás do uso do remédio se dá por altos níveis de estresse, principalmente, em semanas de provas, competição no meio universitário, fadiga, necessidade de maior concentração, memorização e otimização do tempo (CONCEIÇÃO et al., 2019).

Sendo assim, o uso indiscriminado dessa droga já se tornou uma realidade no meio universitário sendo fundamental a ampliação de estudos sobre o dimesilato de lisdexanfetamina a fim de informar melhor sobre seus efeitos no organismo e orientar sobre o perigo de seu uso indevido.

PIRACETAM

O piracetam é um princípio ativo que possui uma ação estimulante e sedativa sendo utilizado em altas doses para potencializar a cognição, a memorização e a aprendizagem. Sua forma comercial possui o nome de Nootropil e age estimulando e modulando canais iônicos (MARTELLO et al., 2020)

Seu mecanismo de ação se dá através da ligação do piracetam na extremidade fosfolipídica das membranas gerando estabilidade da mesma e aprimorando as funções vasculares e neurais do organismo. Esse medicamento é dose-dependente, ou seja, a concentração utilizada está diretamente relacionada com sua eficácia e com seus efeitos colaterais, porém, se comparado a outras substâncias psicoestimulantes esse fármaco possui menos toxicidade sobre o cérebro (SILVEIRA et al., 2014).

Seus efeitos farmacológicos são relacionados com o envelhecimento, hipóxia, privação de glicose ou danos causados pelos radicais livres visto que ele promove a fluidez cerebral, a oferta de oxigênio e de glicose (CORDEIRO; PINTO, 2017). Contudo, seus efeitos colaterais mais comuns são hipercinesia, ansiedade, insônia, aumento de peso e neurastenia quando consumido em excesso diariamente (FREITAS et al., 2017).

Pesquisas relacionadas as uso do Nootropil em países estrangeiros mostram um aumento da sua utilização de forma off label. Por exemplo, no Reino Unido e na Irlanda 887 estudantes participaram de um estudo e obteve-se como resultado uma prevalência de 9,4% desses estudantes que já usaram essa substância como potencializador cognitivo (CORDEIRO; PINTO, 2017).

Apesar de ser muito utilizado e estar presente em diversas pesquisas nacionais, o piracetam possui poucos estudos sobre sua ação no sistema nervoso central e sobre sua comercialização no Brasil. Sendo assim, a ampliação de estudos quanto a seu mecanismo de ação e efeitos no organismo é fundamental para garantir uma melhor segurança no seu uso.

MODAFINIL

O modafinila é um fármaco utilizado para tratamento de sonolência diurna excessiva referente a narcolepsia e é comumente conhecido por seu nome comercial Stavigile. Seu uso é incentivado para redução do cansaço e melhora na cognição (CARNEIRO et al., 2013).

Seu mecanismo de ação se dá pela neurotransmissão no sistema nervoso central através do aumento dopaminérgico pelo bloqueio da proteína transportadora da recaptação da dopamina, pela liberação da atividade colinérgica excitatória colinérgica e glutamatérgica e pelo aumento indireto da neurotransmissão histaminérgica. A posologia mais segura desse medicamento é de 200mg pela manhã, podendo ser aumentada até 400mg por dia (ALÓE et al., 2010).

Seus efeitos colaterais ocorrem em menos de 5% dos usuários e, principalmente, na dose de até 600mg por dia, sendo os mais frequentes a cefaleia, nervosismo, diarreia, náusea e redução do apetite. O Stavigile é classificado com baixo potencial de abuso e limitada dependência física e psicológica (ALÓE et al., 2010).

Por conta dos seus efeitos psicoestimulantes muitos acadêmicos de medicina fazem o uso dessa medicação para manter-se acordado por mais tempo e conseguir suprir as demandas universitárias.

DELIMITAÇÕES METODOLÓGICAS

Para a realização desta revisão narrativa foi conduzida uma busca na literatura utilizando as palavra-chave dos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS):

“uso de psicoestimulante na medicina”. Foram consultadas as bases de dados Lilacs, SciELO e BVS. As buscas, realizadas por dois autores de modo independente, foram limitadas ao período entre janeiro de 2012 a outubro de 2022 e restritas a artigos publicados em português, inglês e espanhol.

Os critérios de seleção aplicados incluíram: estudos qualitativos, quantitativos, de revisão ou editoriais cujo tema central tenha sido a análise da relação entre o uso de substâncias psicoestimulantes, tanto sintéticas quanto naturais, e seu emprego entre estudantes de medicina. Os títulos e resumos de 200 citações foram revisados, excluindo-se os duplicados, e desses 5 preencheram os critérios a serem abordados.

Os critérios de exclusão foram aplicados naqueles que não possuem análise de psicoestimulantes, que não sejam compostos por alunos do curso de medicina e artigos que relatam casos de doenças ou distúrbios psiquiátricos em estudantes de medicina como depressão, ansiedade e suas consequências em relação ao indivíduo e ao curso em questão.

A partir desse conhecimento prévio foi realizada essa revisão narrativa sobre o uso de substâncias psicoestimulantes em acadêmicos de medicina.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados desta pesquisa bibliográfica foram dispostos, em forma de texto, na Tabela 1. Nela estão presentes os artigos que foram selecionados, os quais estão divididos em autor e ano de publicação, a base de dados em que eles foram encontrados, o quantitativo das amostras, quais foram os psicoestimulantes estudados por estes trabalhos e seus resultados conforme cada estudo.

Tabela 1 – Artigos selecionados e demonstrados por autor e ano de publicação, base de dados, amostra, psicoestimulantes e resultados

Autor e ano de publicaçãoBase de dadosAmostraPsicoestimulantesResultados
Nasário; Matos (2022)Scielo243 QuestionáriosCloridrato de metilfenidato2,9% fazem uso e 19,3% já fizeram uso do psicoestimulante
Mezacasa et al. (2021)Lilacs880 questionáriosCafeína, piracetam, cloridrato de tilfenidato, anfetaminas, bebidas energéticas ,e metilenodioximentanfetaminaEm 2015, 58% dos alunos usavam psicoestimulantes e 15% dos alunos do 1º ano de graduação começaram a usar psicoestimulantes. No ano de 2016, 54% dos alunos usavam psicoestimulantes e 22% começaram a usar no 1º ano de graduação.No ano de 2017, 65% usavam psicoestimulantes e 31% começaram a usar durante o 1º ano de graduação. Já no ano de 2018, 68% usavam psicoestimulantes e 30% começaram a usar durante o 1º ano de graduação.
Santana et al. (2020)Lilacs e Scielo600 alunosCloridrato de metilfenidato, cafeína, pó de guaraná, modafinila,piracetam, energético,anfetamina e ecstasy.40,5% fazem uso de cafeína, 14,5% fazem uso de bebidas energéticas, 2% fazem uso de pó de guaraná, 3% fazem uso de anfetamina, 3% fazem uso de cloridrato de metilfenidato, 1,7% fazem uso de ecstasy, 0% faz uso de piracetam e modafinil.
Morgan et al. (2017)Lilacs200 questionáriosCafeína, cloridrato de metilfenidato,modafinil, piracetam, bebidas energéticas, anfetaminas e ecstasy.27% fazem uso de cafeína, 38% fazem uso de bebidas energéticas, 6% fazem uso de anfetamina, 5,5% fazem uso de cloridrato de metilfenidato, 5% fizeram uso de ecstasy, 2% fizeram uso de piracetam e 1% fez uso de modafinil.
Silveira et al. Lilacs (2014)Lilacs152 alunosCloridrato de metilfenidato34,2% já fizeram usode cloridrato de metilfenidato.
Fonte: Os Autores (2022).

Nasário e Matos (2022) analisaram por meio da aplicação de 243 questionários sobre o uso não prescrito de cloridrato de metilfenidato em acadêmicos de medicina de uma Universidade do Sul de Santa Catarina. Os resultados apontaram que 2,9% da população pesquisada faz uso do medicamento e 19,3% já fizeram o uso dele a fim de melhorar o desempenho cognitivo (10%) e diminuir as horas de sono (4,1%).

Mezacasa et al. (2021) realizaram um estudo sobre o consumo de psicoestimulantes com 880 questionários em acadêmicos de medicina da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (FURG) matriculados no período de 2015 a 2018. As informações captadas foram sobre o uso de cafeína, piracetam, metilfenidato, anfetaminas, bebidas energéticas e metilenodioximetanfetamina. De acordo com isso, a prevalência do consumo no passado e no presente desses psicoestimulantes cerebrais foi de 64,0%, com uma variação de 58% em 2015 a 68% em 2018 e a prevalência dos acadêmicos que iniciaram o uso durante a graduação foi de 15% em 2015 para 30% em 2018. A motivação para o uso de tais agentes psicoestimulantes foi para aumentar a capacidade cognitiva, a concentração, a memória, o raciocínio e o tempo de horas acordado.

Santana et al. (2020), a partir de um estudo quantitativo transversal, avaliaram 600 acadêmicos do curso de medicina na cidade de Montes Claros, em Minas Gerais, a respeito do uso de substâncias psicoestimulantes. Os resultados mostraram uma maior prevalência no uso atual de cafeína em 40,5% dessa população e de bebidas energéticas em 14,5%. Além disso, o pó de guaraná teve um resultado de 2%, a anfetamina e o metilfenidato com 3%, o ecstasy com 1,7% e o piracetam e o modafinil com 0%. No mesmo estudo, foi constatado que os principais efeitos observados pelo grupo analisado foi o aumento das horas em estado de vigília com 64,9%, a melhora na concentração (48%), no bem-estar (45,3%) e no raciocínio (38,5%).

Morgan et al. (2017) observaram, através da aplicação de 200 questionários em acadêmicos de medicina da FURG no ano de 2015, o uso de cafeína, metilfenidato, modafinil, piracetam, bebidas energéticas, anfetaminas e ecstasy. O desfecho dessa pesquisa mostrou que 52,3% desses alunos usavam algum desses psicoestimulantes no momento da pesquisa e os agentes mais utilizados foram as bebidas energéticas com 38% e a cafeína com 27% que consomem mais de 5 vezes por semana. Os principais estímulos para tal atitude foram a privação do sono e o aumento do potencial cognitivo.

Silveira et al. (2014) desenvolveram um questionário com 25 itens, com acadêmicos do 5º e 6º ano da faculdade de medicina no sul do Brasil, na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), com um total de 152 acadêmicos. De todos eles, 52 alunos (34,2%) já fizeram uso de cloridrato de metilfenidato dos quais 29 (82,85%) começaram a usar durante a graduação. 24 (68,57%) deles fizeram o uso para ajudar nos estudos, 11 (31,42%) com a finalidade de aprimorar a concentração, 11 (31,42%) somente experimentaram o medicamento, 6 (17,14%) para se manterem acordados e 2 (5,71%) para irem a festas.

O objetivo geral deste estudo é o levantamento bibliográfico sobre o uso de substâncias psicoestimulantes entre acadêmicos de medicina no Brasil. Com isso, os 5 artigos analisados constataram um aumento no uso dessas substâncias nesse público no período avaliado de 2012 a 2022 e o aumento do uso conforme os alunos iam avançando de fase. Esse aumento é caracterizado pela extensa carga horária de aulas semanais e pela alta exigência imposta pela universidade.

De acordo com o levantamento de dados, este estudo analisou um total de 2.075 questionários feitos em 5 faculdades de medicina localizadas nas regiões do extremo sul do Brasil, em Santa Catarina e em Minas Gerais.

Dessas regiões, a que teve maior prevalência do uso de substâncias psicoestimulantes foi em uma universidade localizada no extremo sul do país, na qual Mezacasa et al. (2021) aplicaram 880 questionários no período de 2015 a 2018 comprovando o aumento de 10% no consumo dessas substâncias.

Ainda no sul do Brasil, Morgan et al. (2017) constataram, durante a aplicação de 200 questionários no ano de 2015, que 52,3% dos acadêmicos de medicina na universidade analisada utilizavam algum psicoestimulante. Além disso, Silveira et al. (2014) analisaram 152 acadêmicos nos dois últimos anos da faculdade de medicina e apontaram que 34,2% já fizeram uso de alguma dessas substâncias.

Em Santa Catarina, Nasário e Matos (2022) aplicaram um questionário com 243 acadêmicos de medicina sobre o uso não prescrito de cloridrato de metilfenidato tendo como resultado que 2,9% fazem uso do medicamento e 19,3% alegam já ter feito o uso do fármaco.

Em Minas Gerais, Santana et al. (2020) realizaram um questionário com 600 acadêmicos e obtiveram como resultado que 64,66% desses fazem uso de algum psicoestimulante.

Conforme as regiões analisadas, a região sul do Brasil foi a que apresentou maior prevalência no uso de substâncias estimulantes cerebrais devido ao maior número de estudos feitos, analisados e publicados.

Em relação as substâncias psicoestimulantes não sintéticas, presentes em 2 dos artigos selecionados, pode-se inferir que há divergência entre os estudos, pois Santana et al. (2020) mostraram em seus estudos que 40,5% dos avaliados faziam uso de cafeína como primeiro colocado e bebidas energéticas com uma prevalência de 14,5%, em segundo lugar de psicoestimulante utilizado. Já Morgan et al. (2017) apresentaram em primeira colocação as bebidas energéticas, com 38% dos participantes em uso, e cafeína em segunda posição, expondo um total de 27% dos acadêmicos questionados. Dessa forma, pode-se inferir que os estudos apresentam diferenças regionais, um deles foi realizado no estado de Minas Gerais e o outro no Rio Grande do Sul, respectivamente.

Já analisando a medicação que está presente nos 5 artigos, o cloridrato de metilfenidato, Nasário e Matos (2022) e Silveira et al. (2014) realizaram 243 questionários e 152 alunos, respectivamente, somente acerca da medicação em questão, Ritalina. No estudo de Nasário e Matos (2022) 7 (2,9%) acadêmicos faziam uso da mediação em discussão e 47 (19,3%) alunos afirmaram já terem feito uso dela. Já na avaliação de Silveira et al. (2014) foi documentado que 52 (34,2%) alunos já fizeram uso do medicamento.

Ainda acerca do assunto, Santana et al. (2020) apontaram em seus estudos com 600 alunos que 18 (3%) acadêmicos faziam uso de cloridrato de metilfenidato e Morgan et al. (2017) aplicaram 200 questionários, neles foram contatados que 11 (5,5%) dos alunos faziam uso do medicamento. Já Mezacasa et al. (2021) apontaram um aumento do uso de psicoestimulantes visto que foram descritos de forma geral somente uma crescente do uso de várias substâncias, não somente do cloridrato de metilfenidato, avaliando quantitativamente o aumento no período de 2015 a 2018 de 50% em relação àqueles que começaram a usar durante o primeiro ano de graduação.

Portanto, dentre todas as substâncias avaliadas, o cloridrato de metilfenidato (Ritalina) é o fármaco sintético de escolha em relação ao dimesilato de lisdexanfetamina (Venvanse), piracetam (Nootropil) e modafinil (Stavigile).

Ainda nesse estudo presume-se que as principais motivações para uso de tais agentes estimulantes cerebrais são o aumento do desempenho cognitivo, concentração, memória, raciocínio e para privação do sono a fim de aprimoramento acadêmico.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir deste estudo pode-se concluir que o uso de substâncias psicoestimulantes entre acadêmicos de medicina do Brasil vem crescendo no decorrer dos anos. As substâncias naturais mais utilizadas são a cafeína seguida por bebidas energéticas. Já o medicamento com maior consumo é o cloridrato de metilfenidato, sendo indicado para o tratamento do TDAH. Todavia, a maior parte do público consumidor e estudado não possui diagnóstico da patologia nem indicação médica para uso de tal substância sintética.

Desta forma, a necessidade de usar psicoestimulantes com o propósito de potencializar a cognição e de reduzir a necessidade de sono é impulsionada pela extensa demanda acadêmica imposta aos alunos de medicina. Assim, verifica-se a constante busca por meios de aperfeiçoamento no rendimento dos estudos e o desejo de resultados satisfatórios nas provas e nos trabalhos feitos a fim de, futuramente, tais acadêmicos alcançarem uma boa colocação no mercado de trabalho.

Porém, a literatura que aborda esse assunto com maior profundidade no Brasil é escassa e não há materiais que comprovem os benefícios da utilização dessas substâncias, principalmente as sintéticas, em pessoas que não preenchem os critérios de recomendações de uso. Infere-se, também, que os acadêmicos de medicina têm maior facilidade de acesso aos medicamentos psicoestimulantes que necessitam de prescrição médica, pois encontram-se inseridos em meios que facilitam a obtenção de tais receituários.

Diante disso, justifica-se a necessidade de mais estudos acerca do tema pautado, bem como, a realização de mais pesquisas para elucidar os impactos do uso, a dose segura, amenizar os efeitos adversos e a conscientização através de ações educativas, em âmbito universitário dos efeitos deletérios no sistema nervoso central, pois os efeitos colaterais e as consequências do uso off label geram dependência nos acadêmicos de medicina que as utilizam erroneamente.

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iDiscente do Curso de Medicina da Universidade Alto Vale do Rio do Peixe – Uniarp, Caçador, SC, Brasil;
iiDiscente do Curso de Medicina da Universidade Alto Vale do Rio do Peixe – Uniarp, Caçador, SC, Brasil;
iiiDocente do Curso de Medicina da Universidade Alto Vale do Rio do Peixe – Uniarp, Caçador, SC, Brasil; Especialista em Auditoria e Mecanismos em Regulação em Saúde pela Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais – FCMMG, Belo Horizonte, MG, Brasil.
ivDocente do Curso de Medicina da Universidade Alto Vale do Rio do Peixe – Uniarp, Caçador, SC, Brasil; Doutor em Ciências Farmacêuticas pela Universidade do Vale do Itajaí – Univali – Itajaí, SC, Brasil.