A DESIGUALDADE NO ACESSO À MAMOGRAFIA COMO LIMITANTE DO RASTREIO DO CÂNCER DE MAMA NO BRASIL: UMA REVISÃO DE LITERATURA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8121683


José Iago Sampaio Bezerra1, Davi Miguel Alves Uchôa2, Daniel Lóssio Carvalho3, Juan Cavalcante Rodrigues4, Mateus Pinto Luciano Gualberto5, Júlio Couto Lossio Filho6, Ricardo Melo Brandao7, Ana Vitória Martins Lucena Miranda8, Mariana Serpa Peixoto9, Nardijackson Helon Oliveira Dantas Júnior10, Ádila Barbosa Lôbo Pereira 11, Beatriz Barbosa Cavalcante12, Bruna delys lima Vieira e Silva13, Erinaldo Pinto de Almeida Júnior14, Celine Leahy Santos15, Luiz Fernando de Lima16, Izabelle Lopes Quintino17.


Resumo

O artigo visa falar da importância da mamografia para detectar e auxiliar no tratamento de câncer de mama, dando ênfase também na cobertura e na desigualdade no acesso a tal exame para as mulheres no Brasil. Objetivo: Analisar os fatores associados à não realização desse exame considerando-se características sociodemográficas, econômicas, condições de saúde, hábitos de vida e uso dos serviços de saúde. Métodos: Foi realizada uma revisão de literatura utilizando os bancos de dados da plataforma de artigos científicos “SciELO”, através dos descritores “desigualdade no acesso à mamografia” e “câncer de mama”. Resultados: As principais características associadas à não realização de mamografia foram: baixa escolaridade, avaliar negativamente o próprio estado de saúde, possuir alguma doença crônica, não praticar exercício físico, não realizar o exame clínico da mama até um ano, ou o exame de Papanicolaou até três anos, não ter consultado com médico no último ano, não possuir plano de saúde, discriminação racial, e ter cadastro em uma unidade de saúde da família. Variáveis sociodemográficas se sobressaíram no Norte e Nordeste; e nas outras regiões, condições de saúde e hábitos de vida. Conclusão: Variáveis relacionadas ao uso dos serviços de saúde tiveram destaque na não realização da mamografia. Ações que reduzam a desigualdade no acesso ao exame devem ser adotadas em cada macrorregião do Brasil. 

Palavras-chave: Mamografia, Desigualdade em saúde, Câncer de mama,Saúde da mulher, Análise espacial, Saúde pública, Detecção precoce de câncer. Neoplasias da mama.

Introdução

O câncer de mama é o tipo mais comum entre as mulheres no mundo e o mais incidente no Brasil. Segundo as estatísticas de câncer no mundo no ano de 2017, a neoplasia mamária é o câncer que mais acomete as mulheres, aumentando ano após ano suas taxas de incidência e mortalidade (BEZERRA, 2018). No Brasil, estimou-se a ocorrência anual de 66.280 casos novos de câncer de mama no triênio 2020-2022, e um risco de 61,6 casos a cada 100 mil mulheres. Entre 1980 e 2018, a mortalidade por esse câncer aumentou 50,6%, revelando o desafio do controle da doença no âmbito nacional (TOMAZELLI, 2022).

A falta de acesso e oferta de exames no SUS pode ser um dos obstáculos para a realização da mamografia. Mulheres com plano de saúde tiveram prevalências superiores na realização do exame, quando comparadas àquelas que eram usuárias unicamente do Sistema Único de Saúde (SUS). Além disso, destacam-se outras dificuldades no acesso ao exame, como a falta de orientação dos profissionais de saúde sobre a importância e o motivo do exame para as mulheres, a falta de capacitação profissional para realizar o devido encaminhamento para realização da mamografia, a ausência de mamógrafo para o exame, a dificuldade de obter requisição médica e a demora na aquisição dos resultados dos exames. Além disso, alguns fatores, como discriminação por classe social, raça/cor, tipo de ocupação, tipo de doença, preferência sexual e religião/crença, também têm sido reportados para a não realização da mamografia. Essas disparidades em saúde impactam no diagnóstico precoce da doença, influenciando diretamente na mortalidade por câncer de mama.

As desigualdades regionais e sociais na cobertura da realização dos exames preventivos de mamografia e citopatológicos tornam-se ainda mais preocupantes diante da constatação de que, no ano de 2020, mais de 80 mil mulheres foram acometidas por câncer de mama ou de colo do útero no Brasil, respectivamente o primeiro e o terceiro tipos de câncer mais frequentes no sexo feminino no país. Em 2018, mais de 107 mil mulheres brasileiras morreram devido ao câncer, entre as quais 16% em consequência de câncer de mama e 6% de câncer de colo do útero (SCHÄFER, 2021).

Apesar de as desigualdades ainda persistirem, podemos destacar achados positivos neste estudo: mulheres sem plano de saúde já alcançaram a meta estipulada pelo Ministério da Saúde e apresentam tendência crescente. Mulheres menos escolarizadas tiveram um aumento na cobertura de mamografia, destacando a relevância das ações de prevenção e promoção de saúde do SUS nos últimos anos, especialmente nessa categoria de escolaridade, reduzindo as disparidades sociais (Saes-Silva E. et al.).

As ações de controle do câncer de mama no Brasil vêm sendo progressivamente incorporadas às políticas públicas de saúde. O Ministério da Saúde recomenda a realização da mamografia bienal para mulheres entre 50 a 69 anos e para as mulheres consideradas de risco elevado (alto risco) para câncer de mama (aquelas com história familiar de câncer de mama em parentes de primeiro grau), recomenda-se o acompanhamento clínico individualizado. Para isso, se faz necessário uma maior organização da atenção à saúde em prol da garantia do acesso e a continuidade do cuidado a essa população (BEZERRA, 2018).

Tendo em vista a necessidade de analisar fatores que promovem desigualdades no rastreamento mamográfico no Brasil para o desenvolvimento de intervenções adequadas, a fim de melhorar o acesso e a realização desse exame e sabendo da importância do diagnóstico precoce como forma de reduzir morbimortalidade da doença , além dos custos para o sistema de saúde , o objetivo deste estudo foi verificar a tendência de desigualdade na realização de mamografia de acordo com dados do Sistema de Informação do Câncer, do Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (VIGITEL) e de dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS).

Metodologia

Foi realizada uma revisão de literatura utilizando a plataforma de base de dados de artigos científicos de acesso aberto, a Scientific Library Online (SciELO). A plataforma oferece busca por descritores de de ciências da Saúde (DeCS), que é uma lista de assuntos padronizados para indexação de artigos científicos. Os descritores utilizados foram “desigualdade no acesso à mamografia” e “câncer de mama”. Os critérios de inclusão utilizados nas seleções dos artigos foram os seguintes: artigos completos publicados em língua portuguesa no período de dois mil e dezoito, a dois mil e vinte um, disponíveis gratuitamente. Os artigos também foram avaliados quanto à relevância, qualidade metodológica, abrangência, e conclusões com o fito de uma maior coerência para a revisão de literatura. A primórdio foram encontrados vinte e cinco artigos.Desses, vinte foram excluídos por incompatibilidade ou divergência com o tema principal. Logo,após a exclusão,restaram um total de cinco artigos para a elaboração dessa revisão de literatura.

Resultados

Os estudos acerca dos determinantes sociais relacionados com a detecção do câncer de mama fazem parte cada vez mais da comunidade científica. De início, adianta-se que condições desiguais, sejam elas de vida ou trabalho, são determinadas por diferenças sociais. Tais disparidades influenciam na exposição e vulnerabilidade de grupos populacionais aos fatores de risco para a saúde e aos procedimentos necessários para combatê-los. (MOREIRA et. Al., 2018)

O rastreamento do câncer de mama no Brasil, apesar de ser uma neoplasia de altíssima incidência entre as mulheres brasileiras, ainda não é totalmente eficaz. (BEZERRA et. Al., 2018)

O baixo acesso à realização da mamografia perpassa por uma maior disponibilização de recursos necessários para o procedimento e por um maior serviço assistencial, sobretudo em regiões e para populações específicas. À frente dessa situação, têm-se uma alta taxa de mortalidade, devido à escassez de diagnósticos precoces. (BEZERRA et. Al., 2018)

Nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, o número de mamografias realizadas é especialmente baixo, uma vez que tais locais apresentam escassez de recursos disponíveis para a realização do exame, como uma pequena cobertura de assistência médica e um número menor de aparelhos para a realização do exame das mamas. (SCHAFER et. Al., 2021)

As regiões Norte e Nordeste, principalmente, apresentam um baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), atrelado à alta desigualdade social, aos baixos níveis de escolaridade e renda, e à ausência de planos de saúde, portanto, levando a um escasso número de detectação precoce de neoplasias mamárias e a uma alta taxa de mortalidade. Entretanto, as regiões Sul e Sudeste possuem alto IDH e um cenário oposto ao apresentado. (BEZERRA et. Al., 2018)

A atenção primária à saúde tem importante papel frente à deficiência na atenção especializada em locais menos desenvolvidos, sendo necessário o rastreio na população de apresentações clínicas suspeitas e na orientação da população feminina, o que, na prática, não é devidamente realizado. (BEZERRA et. Al., 2018)

Na perspectiva da atenção básica, outro fator fortemente associado à não realização da mamografia é a não realização do exame clínico das mamas em menos de 1 ano, do exame Papanicolau em menos de 3 anos ou de uma consulta médica no último ano, evidenciado a dificuldade e defeitos associados a esses serviços na sociedade. (BARBOSA et. Al., 2018) Mulheres que possuem vínculos com entidades privadas, a partir de planos de saúde, tendem a realizar mamografia em maior número do que as que não possuem tal vínculo e dependem exclusivamente dos meios disponibilizados pelo governo. (SCHAFER et. Al., 2021)

Diversas barreiras impedem a realização desses procedimentos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), que vão desde o desconhecimento social, problemas do próprio sistema de saúde, até condições trabalhistas individualizadas. (SCHAFER et. Al., 2021)

Dentre as mulheres que apresentavam cadastro em uma unidade de saúde da família, apenas 30% tinham a cobertura do exame das mamas. Logo, ter acesso a um plano de saúde ainda é determinante para o eficaz acesso à mamografia. (BARBOSA et. Al., 2018)

Ademais, em regiões desenvolvidas, como Sul e Sudeste, muitas mulheres realizam exames em empresas de saúde privadas, aumentando consideravelmente o número de mamografias efetivadas. (BEZERRA et. Al., 2018)

Nesse contexto, visto que mesmo com acesso a uma unidade de saúde da família, diversas mulheres são excluídas do direito de fazer uma avaliação de neoplasia das mamas, o que corrobora a ideia de que, mesmo com tal acesso, a realização do exame deve ser assegurada a toda população feminina. (BARBOSA et. Al., 2018). Além disso, é válido ressaltar que o nível de escolaridade influencia diretamente na realização da mamografia, quando se tem acesso a tal, uma vez que o conhecimento e a informação acerca da situação pode engajar e contribuir para a decisão de tratamento por parte da mulher, mostrando a importância e a necessidade de reforçar a educação em saúde para a população. (SCHAFER et. Al., 2021)

Exemplo disso é o número amplamente menor de mamografias realizadas entre mulheres que julgam o próprio estado de saúde, menosprezando a importância da busca por profissionais e do exame clínico, o que interfere negativamente no rastreio da neoplasia (BARBOSA et. Al., 2018).

A educação em saúde se torna imprescindível na observação de que mulheres pretas realizam menos mamografias do que mulheres brancas, evidenciando o racismo institucional presente na sociedade e a necessidade de estender mais ainda os serviços a essa população, além de direcionar campanhas educativas de saúde para essa situação. (SCHAFER et. Al., 2021)

Considerações finais

É fundamental que exista uma ampla análise socioeconômica quando se trata do câncer de mama, visto que o bom prognóstico desta patologia está diretamente relacionada ao acesso da população feminina aos serviços fundamentais de saúde. Isso é provado, principalmente, nas regiões brasileiras onde a desigualdade e a pobreza se fazem mais presentes, sendo evidente que mulheres com maior nível de instrução e melhores condições sociais são as que fazem exames preventivos constantemente.

Verifica-se ainda que é extremamente importante que o sistema de saúde pública, principalmente na atenção primária, trabalhe de forma eficaz nas localidades mais humildes, conscientizando e indo até a parcela da população que não tem acesso aos serviços privados. Juntamente a isso, também é preciso que as autoridades públicas destinem recursos suficientes para que seja possível realizar exames indispensáveis, como a mamografia e o exame clínico das mamas.

Referências

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BARBOSA, Yonna Costa; OLIVEIRA, Ana Gabriela Caldas; RABÊLO, Poliana Pereira Costa; SILVA, Francelena de Sousa; SANTOS, Alcione Miranda dos. Fatores associados à não realização de mamografia: Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Revista Brasileira de Epidemiologia, [S. l.], p. 1-13, 5 out. 2018. DOI 10.1590/1980-549720190069. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbepid/a/xHPpC9rzbMttbfpBMtBNVcG/?lang=pt. Acesso em: 12 maio 2023.

SCHÄFER, Antônio Augusto; SANTOS, Leonardo Pozza; MIRANDA, Vanessa Iribarrem Avena; TOMASI, Cristiane Damiani; QUADRA, Micaela Rabelo; MELLER, Fernanda Oliveira. Desigualdades regionais e sociais na realização de mamografia e exame citopatológico nas capitais brasileiras em 2019: estudo transversal. Epidemiologia e Serviços de Saúde, [S. l.], p. 1-10, 22 jul. 2021. DOI 10.1590/S1679-49742021000400016. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ress/a/qL9Y85JGT5ttkXJby7StN7x/?lang=pt. Acesso em: 12 maio 2023.

TOMAZELLI, Jeane; DIAS, Maria Beatriz Kneipp; RIBEIRO, Caroline Madalena; ASSIS, Mônica de; PLA, Maria Asunción Sole; CANELLA, Ellyete de Oliveira; MIGOWSKI, Arn. Avaliação de indicadores de monitoramento do rastreamento do câncer de mama na população do sexo feminino atendida no Sistema Único de Saúde, Brasil, 2018-2019: estudo descritivo. Epidemiologia e Serviços de Saúde, [S. l.], p. 1-14, 23 nov. 2022. DOI 10.1590/S2237-96222023000200009. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ress/a/m9j469rVptrgtNpSBDC6YBS/abstract/?lang=pt. Acesso em: 12 maio 2023.

BEZERRA, Héllyda de Souza; MELO, Tulio Felipe Vieira de; BARBOSA, Joyce Viana;

FEITOSA, Eva Emanuela Lopes Cavalcante; SOUSA, Layanne Cristini Martin. Avaliação do acesso em mamografias no Brasil e indicadores socioeconômicos: um estudo espacial. Revista Gaúcha de Enfermagem, [S. l.], p. 1-9, 31 jul. 2018. DOI 10.1590/1983-1447.2018.20180014. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rgenf/a/YYzXw5mJMKyPyFzQshYQNdL/?lang=pt. Acesso em: 12 maio 2023.


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