PERFIL EPIDEMIOLÓGICO DA LEISHMANIOSE VISCERAL NO BRASIL

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8015499


Éryca Maria Teixeira da Silva1
Sâmia de Sá Moreira Braga2
Marcello de Alencar Silva3
Rayssa Maria De Araujo Carvalho4
João de Jesus Cantinho Júnior5
Gabriela Dantas Carvalho6
Suely Moura Melo7
Klégea Maria Câncio Ramos Cantinho8


RESUMO

INTRODUÇÃO:A leishmaniose visceral (LV) é uma zoonose transmitida pela picada do flebótomo fêmea Lutzomyia longipalpis, tendo como hospedeiros intermediário os cães de ambiente doméstico. Dentre os países da América Latina, o Brasil detém o maior número de casos documentados, onde 90% dos casos notificados são da região do Nordeste OBJETIVO: Descrever os fatores que pode influenciar na incidência da Leishmaniose Visceral no Brasil. METODOLOGIA: Trata-se de uma revisão sistemática, realizada no período setembro de 2020 à abril de 2021, através da busca nas bases de dados on-line: SCIELO, PUBMED e LILACS, através dos descritores: “leishmaniose visceral’’, “socioeconômico”, “clima” , “saneamento básico” e “cão”, nas línguas portuguesa e inglesa. Foram incluídos estudos com foco na LV no Brasil, publicados dentro do recorte temporal entre 2015 e 2020. Os dados foram organizados através do software Excel e foram expressos em tabelas. RESULTADOS: Foram selecionados 17.736 artigos, destes apenas 16 estudos foram contemplados. Os autores relataram que a população mais afetada vive em condições socioeconômicas precárias, tendo como principal fator a falta de saneamento básico nessas regiões e animais, como os cães, que por viverem no mesmo ambiente aumentando a possibilidade de se tornarem soropositivos para a doença. Segundo alguns autores, as mudanças climáticas ajudam na proliferação da doença, tanto por fazer com que o processo de migração de pessoas seja constante, por estarem em lugares onde o clima não favorece a sua vivência e levando as pessoas a morarem em possíveis áreas endêmicas, quanto pelas temperaturas influenciarem na multiplicação do vetor. Enfim, por meio do estudo realizado é possível averiguar que os fatores urbanos influenciam na infecção por Leishmaniose Visceral, porém não só os fatores urbanos, quanto a doença, não possuem uma visibilidade adequada como deveria ter.

Palavras-chaves: Leishmania visceral. Clima. Cão. Saneamento Básico. Socioeconômico

1 INTRODUÇÃO

De acordo com a Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ, 2013), a leishmaniose é uma doença causada pelo protozoário do gênero Leishmania, da família Trypanosomatídae, podendo ser dividida em leishmaniose tegumentar americana, que acomete a pele e mucosa dos infectados; e leishmaniose visceral (LV), conhecida popularmente como “calazar ou barriga d’água”, que acomete os órgãos internos, ao qual destaca-se pela alta letalidade, tendo maior prevalência pela periferia de zonas urbanas e rurais de regiões tropicais e subtropicais.

A LV é uma zoonose transmitida pela picada do flebótomo fêmea Lutzomyia longipalpis, onde os cães de ambiente domésticos (Canis familiaris) são os mais comuns hospedeiros intermediários e frequentes reservatório para os vetores, e em ambientes silvestres são as raposas e os marsupiais e tendo como hospedeiro definitivo o ser humano (GUIA DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE, 2016; LEWGOY et al., 2020). 

O período da incubação da LV no ser humano varia de 10 dias a 24 meses, com uma média de 2 a 6 meses, estando as crianças e os idosos mais propensos a serem acometidos pela doença, nos quais manifestarão a sintomatologia de forma aguda com febre, tosse, diarreia e hepatoesplenomegalia, ou crônica, apresentando caquexia, edema, hemorragias, piodermites, otite média aguda, infecções no trato respiratório e urinário, linfadenopatia, leucopenia com anemia, hipergamaglobulinemia e hipoalbuminemia (ALAVRENGA et al., 2010).

Dentre os 12 países da América Latina onde a doença já foi notificada, é no Brasil o maior número de casos documentados (SCANDAR et al., 2011), onde 90% dos casos notificados teve como foco a região Nordeste (COSTA et al., 2018). Nos últimos dez anos, foram registrados 42.067 casos no Brasil. Diante disso, ocorreram 2.704 óbitos, e a incidência média foi de 1,92 casos por 100.000 habitantes (BRASIL, 2019).

No Brasil, o controle da LV está centrado no diagnóstico e tratamento precoces, redução da população de vetores e eutanásia de cães com diagnóstico sorológico e/ou parasitológico positivo(BRASIL, 2006), contudo, a ecologia e epidemiologia da doença é complexa, uma vez que o vetor apresenta elevada capacidade de adaptação a diferentes ambientes, inclusive o urbano, possibilitando a reativação constante do ciclo de transmissão(SILVA, et al., 2012; COSTA, et al., 2013). 

De acordo com Drumond e Costa (2011), a incidência da doença está diretamente relacionada com os fatores socioeconômicas, tendo como principal agravante a falta de saneamento básico e a alta incidência de cães abandonados nas ruas que são susceptíveis a serem soropositivos para LV (COSTA et al., 2018; OMS, 2020).

Segundo o Ministério da saúde (2019), na área urbana, o cão (Canis familiaris) é a principal fonte de infecção. O governo brasileiro desenvolveu o Programa de Controle da Leishmaniose Visceral para o combate da doença através da criação de estratégias pactuadas para diminuir a transmissão do parasito a fim de controlar a ação dos vetores e reservatórios (BRASIL, 2014).

Partindo disso, uma das formas de promover o controle dos vetores é intervir de forma precoce no processo de disseminação parasitária. Diante deste cenário, considerando o alto índice de contaminação da LV na zona urbana, o objetivo deste estudo é investigar os fatores que podem influenciar na incidência da LV na área urbana no Brasil.

2 METODOLOGIA

Trata-se de uma revisão sistemática, realizada no período setembro de 2020 à abril de 2021, através da busca nas bases de dados on-line: Scientific Electronic Library Online (SCIELO), a U. S. National Library of Medicine (PUBMED) e Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), através dos descritores em ciências da saúde da BIREME (DECs): “leishmaniose visceral’’, “socioeconômico”, “clima” , “saneamento básico” e “cão”, nas línguas portuguesa e inglesa, de forma isolada e combinada, utilizando o operador booleano “and”.

A seleção dos estudos foi realizada pelos autores que compõem o presente trabalho de forma independente. Os artigos foram selecionados, inicialmente, pela leitura do título e resumo do trabalho, em seguida, os estudos potencialmente relevantes para a revisão foram analisados por meio da leitura do texto completo afim de se confirmarem os critérios de elegibilidade.

Contemplaram como critérios de inclusão: estudos com foco na LV no Brasil, publicados dentro do recorte temporal entre 2015 e 2020, sendo inclusos artigos observacionais transversais e de coorte, estudos retrospectivos, relato de casos, estudo de caso-controle, qualitativos, inquéritos, estudos ecológicos, descritivos, seccional, epidemiológicos, análise de impactos e ensaios clínicos randomizados. Foram excluídas publicações em anais de eventos, resumos de congressos, capítulos de livros, artigos de revisão ou sem metodologia clara e artigos duplicados, boletins informativos, cartas, dissertações e teses.

A qualidade metodológica foi analisada por dois avaliadores, e qualquer problema de divergência foi resolvido por consenso. Na elaboração da pergunta da pesquisa e na busca nas bases de dados foi baseada na estratégia do anagrama PICOS, onde vai evidenciar a população estudada,a intervenção, a comparação, o desfecho e o tipo de estudo (GALVÃO; PEREIRA, 2014). Sendo assim, pôde-se apurar melhor os dados encontrados. A seguir a tabela contendo os componentes da pergunta da pesquisa.

Os dados foram organizados utilizando o software Excel®, sendo expressos em forma de tabelas.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foram selecionados 17.736 artigos, destes apenas 13 estudos foram contemplados conforme os critérios de seleção apresentados, conforme descrito na Tabela 1. A estratégia de busca e seleção está sumarizada na Figura 1.

Tabela 1:

Banco de basesDescritores
    SCIELO e na LILACS  “leishmaniose visceral AND clima”
“leishmaniose visceral AND fatores socioeconômico”
“leishmaniose visceral AND cão”
“leishmaniose visceral AND saneamento”
    PUBMED  “visceral leishmaniasis AND climate”
“visceral leishmaniasis AND socioeconomic factors”
“visceral leishmaniasis AND dog”
“visceral leishmaniasis AND sanitation”

Fonte: Autoria própria (2020)

Figura 1: Fluxograma com seleção dos estudos

Fonte: Autoria própria (2020)

Os artigos selecionados são apresentados Tabela 2, onde descrevem a caracterização dos artigos selecionados. 

Tabela 2: Caracterização dos estudos incluídos nessa revisão.

AUTOR/ANOOBJETIVOSTIPOS DE ESTUDOS
(ORTIZ; ANVERSA., 2015)Descrever as características epidemiológicas dos casos de leishmaniose visceral notificados no município de Bauru, no período de 2004 a 2012.Estudo descritivo, com dados obtidos do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN), gerido pela Secretaria Municipal de Saúde.
(CARMO; LUZ; BEVILACQUA., 2016)Compreender a percepção de agentes de saúde e população sobre as ações de prevenção e controle da LV, procurando identificar lacunas, desafios e perspectivas.Qualitativa que se volta para os significados e a intencionalidade das ações nos contextos das estruturas sociais.
(COSTA et al., 2016)Descrever a atuação da Vigilância Ambiental em Saúde no controle da Leishmaniose visceral em um condomínio do Distrito Federal no ano de 2012.Relato de caso, foram realizadas, em parte, medidas de prevenção e controle da LV frente a ocorrência de casos de LVH no Distrito Federal.
(MENEZES et al., 2016)Investigar o conhecimento da população sobre as leishmanioses e a ocorrência de fatores de risco peri domiciliares associados à população no município de Formiga, Minas Gerais.Inquérito domiciliar com uma amostra de 427 indivíduos entre maio e julho de 2011.  
(FIGUEREDO et al., 2017)Examinar o papel de fatores ambientais relacionados à ocupação urbana na ocorrência de infecção por L. infantum em cães, utilizando imagens de sensoriamento remoto (SR).Estudo caso-controle em que foram definidos como domicílios com, pelo menos, um cão com infecção por L. infantum, e controles (n = 453) corresponderam a moradias onde não foram registrados cães infectados.
(RODRIGUES et al., 2017)Analisar os dados relacionados à transmissão da leishmaniose visceral, no município de Fortaleza, e discutir a respeito da distribuição do vetor, reservatório doméstico e casos humanos ocorridos no período de 2009 a 2013.Estudo é do tipo descritivo realizado por meio de levantamento de dados secundários.
(TOLEDO et al., 2017)Analisar os determinantes da ocorrência da leishmaniose visceral humana vinculados às condições de vulnerabilidade.Trata-se de um estudo ecológico, cuja unidade de análise espacial foi a Unidade de Análise Territorial em Araguaína, Estado do Tocantins, Brasil, de 2007 a 2012.
(ABRANTES et al., 2018)Avaliar a associação entre características ambientais obtidas por sensoriamento remoto e a ocorrência da leishmaniose visceral canina em área de recente introdução da doença no bairro do Jacaré, Município de Niterói.Estudo seccional para avaliação da prevalência de leishmaniose visceral canina, definida por meio da positividade no teste imunocromatográfico rápido.
(RANGEL., 2018)Descrever os atuais cenários e os desafios da vigilância e do controle para o enfrentamento da doença no estado de São Paulo.O estudo realizado foi do tipo descritivo retrospectivo, considerando a detecção e a frequência dos principais elementos da cadeia de transmissão da leishmaniose visceral e período de ocorrência nos diversos municípios e mesorregiões do estado de São Paulo.
(REIS et al., 2019)Identificar a correlação entre a taxa de incidência de leishmaniose visceral e fatores climáticos e ambientais, nos municípios do Estado do Tocantins de 2007 a 2014.Estudo ecológico e analítico que utiliza como unidades de análise os municípios do Estado do Tocantins.
(EVARISTO et al., 2020)Determinar a soroprevalência, fatores associados à soropositividade à infecção por Leishmania em cães e análise espacial em seis municípios do semiárido de Pernambuco, Brasil.Um inquérito sorológico, observando a distribuição espacial e outros fatores associados à leishmaniose entre cães em áreas endêmicas para este parasita nos municípios deste estudo.
(MORAIS et al., 2020)Analisar as ações desenvolvidas para o controle da leishmaniose visceral a partir de indicadores epidemiológicos de controle de reservatórios caninos e as associações entre esses indicadores e a ocorrência de leishmaniose visceral em Belo Horizonte.Trata-se de um estudo longitudinal observacional, onde foram utilizados indicadores para avaliar o controle do reservatório da leishmaniose visceral canina consolidado para Belo Horizonte.
(VAZ et al., 2020)Determinar a prevalência atual de cães soro reagentes para LVC no município de Iguatama e observar o impacto das eutanásias de cães soro reagentes para LV como única medida de controle realizada neste município, considerado área enzoótica para a doençaUm novo inquérito epidemiológico canino no município de Iguatama, seguindo as normas do Manual de Vigilância e Controle da Leishmaniose Visceral.

Fonte: Autoria própria (2020).

Tabela 3: Avaliação da qualidade metodológica dos estudos incluídos nessa revisão

DESCRIÇÃOABREVIAÇÃOCOMPONENTES DA PERGUNTA
PopulaçãoPPopulação Brasileira
IntervençãoIFatores urbanos
ComparaçãoCInfluência na infecção por leishmaniose visceral
DesfechoODe que forma os fatores urbanos influenciam na infecção por LV.
Tipos de estudosSEstudos observacionais, descritivos, epidemiológicos e seccionais.

Fonte: (Modificado) GALVÃO, PEREIRA (2014).

Ortiz e Anversa (2015), realizaram um estudo descritivo utilizando dados do Sistema de Informações de Agravos de Notificação (SINAN) e de acordo com o tempo em que foi feito a pesquisa, evidenciaram que a maioria dos casos envolve a população que mora na periferia dos bairros, com condições socioeconômicas precárias e. escassez de saneamento básico, fazendo com que haja um aumento da transmissão da parasitose devido ao grau elevado de exposição dessa população ao vetor.

De forma complementar, Toledo et al. (2017) ao relatarem a vulnerabilidade da população de Araguaína (TO) em relação a LV no período de 2007 a 2012, mostrou que houve aumento da população em 30% no período avaliado. Segundos os autores, a falta de saneamento básico e infraestrutura nas regiões consideradas endêmicas fazem com que esse ambiente se torne propício para a proliferação do vetor.

Segundo o Manual da Vigilância e Controle da LV (ano) medidas simples como limpeza urbana, eliminação dos resíduos sólidos orgânicos e destino adequado dos mesmos, eliminação de fonte de umidade, não permanência de animais domésticos dentro de casa, entre outras, contribuem para evitar ou reduzir a proliferação do vetor.

Menezes et al. (2016) realizaram um levantamento a respeito do conhecimento da população sobre as formas de contrair a LV, das 427 pessoas entrevistadas, apenas 7,5% demostraram algum conhecimento em relação a doença. Concomitante a isso, foi investigado os riscos do desenvolvimento de LV no local, evidenciando a presença dos fatores peri domiciliares, tais como os animais domésticos, matas, criatório de galinhas, arvores frutíferas, dentre outros. Essa multiplicidade de fatores ecológicos e epidemiológicos, associada à ocupação urbana desordenada e a outros subjacentes a esse processo, tais como, condições insalubres de moradia e saneamento básico e dificuldades no acesso e na organização dos serviços de saúde, contribuem para a conformação de cenários heterogêneos de transmissão da LV (WERNECK, 2008).

Observa-se que uma das grandes problemáticas para o controle da LV está no desconhecimento por parte da população sobre os fatores de risco envolvidos na transmissão do vetor. Semelhante ao estudo de Menezes et al. (2016), o estudo realizado por Carmo, Luz, Bevilacqua. (2016), relata as incertezas da parte dos moradores em relação a forma de transmissão da doença. Conforme a descrição da população investigada a falta do saneamento básico foi dita como um dos fatores que influenciam na proliferação da doença e a falta de informação sobre o vetor fez com que os moradores correlacionassem com o mosquito da dengue.

Somado aos fatores de saneamento básico, o clima é um dos fatores que influencia na proliferação dos flebotomíneos, por se desenvolverem em ambientes úmidos na sua forma larval. Segundo Reis et al. (2019) em Tocantins no período entre os anos de 2007 a 2014 foram evidenciados 2.885 casos de LV. Os autores descrevem que clima ajuda na distribuição da infecção de forma significativa, através da elevação da temperatura no período na noite, a umidade do ar tanto elevada quanto baixa, índice de vegetação melhorado e a precipitação. Contudo, apesar da LV ser caracterizada como uma doença de clima tropical e subtropical, Lima et al. (2021) relatam que a doença apresenta aspectos climáticos, sociais e geográficos diferenciados.

Apesar do saneamento básico e o clima favorecerem o desenvolvimento dos vetores, há consenso entre os estudos que a principal forma de transmissão se dá pelo Canis familiaris, como mostra os estudos de Rangel (2018) e Morais et al. (2020) que descrevem a alta infecção de LV em São Paulo e Belo Horizonte, avaliados como um dos dois grandes centros urbanos com maior incidência de LV.

De forma semelhante, Costa et al. (2016) discorreram em seu relato de caso a contaminação de uma criança de 11 anos com LV no Distrito Federal, sendo observadas medidas de prevenção com o controle por meio da população humana, o vetor e para os cães. Segundo os autores, mesmo com todas as medidas de controle e de segurança adotada, no mesmo ano um novo caso foi notificado no mesmo condomínio e diante disso foi proposto seguir as medidas de prevenção de acordo com o Manual de Vigilância e Controle da Leishmaniose Visceral, enfatizando o saneamento básico no ambiente, controle dos cães em forma de vacinas, coleiras ou em casos extremos a eutanásia e controle do vetor com a utilização de inseticidas.

Evaristo et al. (2020), evidenciou no inquérito sorológico realizado com a coleta de amostra sanguínea de 467 cães, 77 de cada município de Pernambuco, detectando a positivo para a soroprevalência canina em 42,8%, tendo uma variação no município de Cabrobó de 29,8% a 55,8% considerando a área em que foi realizada do estudo endêmica por conta dos altos níveis de casos, que são associados aos fatores socioeconômicos, ambientais e a presença de cães positivos para a doença, apresentando um risco de transmissão muito grande para a população do municípios de Cabrobó.

Segundo Rodrigues et al. (2017), a LV no município de Fortaleza no período de 2006 a 2008 evidenciou uma alta transmissão por meio dos cães soropositivo. Dos cães testados, 39.626 os animais positivaram para a doença e destes apenas 14.313 passaram pelo processo da eutanásia, com predomínio para as regiões urbanas: Centro, Quintino Cunha, Messejana, Couto Fernandes, Moundobim e Barra do Ceará.

O convívio do cão com outros cães e animais silvestres levou Abrantes et al. (2018), em seu estudo a evidenciar um aumento na presença de Leishmaniose Visceral Canina (LVC). A doença passou a ser observada de forma endêmica e epidêmica nas regiões urbanas devido a migração e urbanização, o que era limitada nas zonas rurais nas regiões no Estado do Rio de Janeiro, tendo uma grande dificuldade de eliminação dos reservatórios e do vetor pela sua capacidade de se adaptar e falta de medidas para o controle de ambos. Os fatores relacionados ao clima e a ocupação de áreas com uma vegetação com muitas florestas, faz com que o ambiente peri domiciliar e domiciliar se torne propício para o vetor.

A LVC foi evidenciada na cobertura de estruturas residenciais domiciliares, com um número de ≤ 25m² por área, ou seja, duas vezes maior quando assemelhada com áreas com pouca vegetação com alcance de ≥ 600m². E a junção de morar em locais com vegetação ampla, com clima propício e proximidade com o ciclo silvestre e peri doméstico faz com que haja uma elevação do número de flebótomos, reforçando a evidência de que os fatores ambientais influenciam na infecção por LVC, que, consequentemente, vai influenciar na infecção por LV humana (FIGUEREDO et al., 2017). De acordo com Silva et al. (2016), ao analisarem as amostras sanguíneas de 362 cães para avaliar a prevalência da LV canina no estado de Paraíba, o número de cães de sexo masculino está duas vezes mais propenso a contrair a doença, dando assim enfoque ao cão como um principal fator de risco para a transmissão da LVC para o humano, tanto de zona rurais como de zonas urbanas.

Carvalho et al., (2020) ressaltam a importância do controle não apenas dos cães de rua, mas chamam atenção para os cães domésticos. Segundo os autores, 385 cães foram testados no município de Nossa Senhora do Livramento, Mato Grosso, destes, 54 positivaram para LVC, onde seus donos desconheciam sobre a doença, evidenciando que a doença ainda segue de forma negligenciada.

A medida de controle do reservatório da LV mais utilizada é a eutanásia, e no município de Iguatama em Minas Gerais, com a realização do primeiro inquérito sorológico em cães, no ano de 2013, foi constatado a prevalência de 8,3% da Leishmania infantum nos cães reagentes e desses animais 84% passaram pelo processo de eutanásia e os demais 16% morreram. Diante disso, um novo inquérito epidemiológico foi realizado na mesma cidade, utilizando amostras sanguíneas de 270 cães, onde apenas 21 dos animais testados positivaram. Foram feitas novas testagens em animais que dera resultados inconclusivos para ambos os testes e o 1 animal que deu positivo no teste de ELISA e indeterminado no teste de DPP, teve soroconverção após 4 meses após a realização dos testes (VAZ et al., 2020).

E de acordo com Vaz et al. (2020), o município de Iguatama necessita de novas medida de controle da doença, por relatar no seu estudo a grande quantidade de casos de LVC, a população que veio a falecer nesse período há a possibilidade de terem sido diagnosticado incorretamente, por não terem registrado nenhum caso de LV no município, evidencia a importância da eutanásia de animais soropositivos para LV, o monitoramento, uso de outras medidas de controle da infecção e o conhecimento da população sobre o procedimento, ressaltando que isso prejudica na eficácia da eutanásia no município de Iguatama.

CONCLUSÃO

Com base nos dados que foram apresentados, pôde-se averiguar que os fatores urbanos mencionados e descritos no trabalho podem influenciar de forma significativa na infecção por Leishmaniose Visceral, diante da avaliação feita em cada estudo discutido sobre a população alvo mencionada. O estudo também ressaltou que a correlação entre os fatores socioeconômicos e os fatores urbanos, influência no aumento da doença por conta das condições de moradias dessas pessoas.

E de acordo com o que foi abordado em todo o trabalho, pôde-se observar que a doença ainda é negligenciada, levando em conta os níveis de pobreza, falta de saneamento básico e falta de informação adequada sobre a doença de forma geral, ressaltando desde como acontece a infecção, evolução, sintomas e de como se prevenir em relação a doença.

Fazendo-se necessário investir em mais campanhas de divulgação sobre e a doença e capacitação para profissionais da saúde que lidam com a população mais vulnerável, para que assim possam transmitir um conhecimento maior sobre a doença para a população que se encontram em áreas de risco.

REFERÊNCIAS

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1https://orcid.org/0000-0002-6541-1009
2https://orcid.org/0009-0000-1718-7703
3https://orcid.org/0000-0001-9451-2979
4https://orcid.org/0000-0002-2567-0209
5https://orcid.org/0000-0001-7025-3845
6https://orcid.org/0000-0002-9571-3323
7https://orcid.org/0000-0001-9996-0850
8https://orcid.org/0000-0002-1685-5658