ANÁLISE DAS VIAS AÉREAS SUPERIORES APÓS CIRURGIA ORTOGNÁTICA BIMAXILAR

ANALYSIS OF THE UPPER AIRWAYS AFTER BIMAXILLARY ORTHOGNATIC SURGERY

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7864741


Hellen Viana de Sousa
Amanda Gomes de Sousa
Larissa Pergentino Gurgel de Faria
Thais Passamani Petri
Raimundo José Cardoso Neto
Salvador de Oliveira Brandão Neto
Noemi Celerino dos Anjos Araujo
Hiago Ferreira Rosa
Marlúcia Anjos Oliveira
Sâmyla Amanda Rodrigues dos Santos
Danielle Do Nascimento
Juliana Lima Nogueira


RESUMO

A cirurgia ortognática bimaxilar é um procedimento comum realizado em pacientes com deformidades esqueléticas faciais. Embora a correção dessas deformidades seja o principal objetivo da cirurgia, ela também pode afetar as vias aéreas superiores e potencialmente levar a problemas respiratórios. O presente estudo possui como objetivo reunir, a partir de uma revisão integrativa da literatura, evidencias associadas as vias aéreas superiores após cirurgia ortognática bimaxilar. Para a construção deste artigo foi realizado um levantamento bibliográfico nas bases de dados SciVerse Scopus, Scientific Eletronic Library Online (Scielo), U.S. National Library of Medicine (PUBMED) e ScienceDirect, com auxílio do gerenciador de referências Mendeley A cirurgia ortognática bimaxilar pode levar a mudanças significativas nas dimensões das vias aéreas superiores, especialmente na área da via aérea orofaríngea. No entanto, a correlação entre as mudanças nas dimensões das vias aéreas e a melhoria dos sintomas respiratórios não é clara. São necessários mais estudos para avaliar os efeitos a longo prazo da cirurgia ortognática bimaxilar nas vias aéreas superiores e a correlação com a melhoria dos sintomas respiratórios.

Palavras-chave: Cirurgia ortognática. Remodelação das vias aéreas. Tomografia computadorizada de feixe cônico

SUMMARY

Bimaxillary orthognathic surgery is a common procedure performed in patients with skeletal deformities. While correction of these deformities is the main goal of surgery, it can also affect the upper airway and potentially lead to missed issues. The present study aims to gather, from an integrative literature review, evidence associated with upper airways after bimaxillary orthognathic surgery. For the construction of this article, a bibliographical survey was carried out in the databases SciVerse Scopus, Scientific Electronic Library Online (Scielo), U.S. National Library of Medicine (PUBMED) and ScienceDirect, with the help of the Mendeley Reference Manager Bimaxillary orthognathic surgery can lead to changes in the dimensions of the upper airway, especially in the area of ​​the oropharyngeal airway. However, the voice between changes in airway dimensions and improvement in respiratory symptoms is unclear. More studies are needed to evaluate the long-term effects of bimaxillary orthognathic surgery on the upper airway and the adaptation with the improvement of prescribed symptoms.

Keywords: Orthognathic surgery. Airway remodeling. Cone beam computed tomography

1 INTRODUÇÃO

A Apneia Obstrutiva do Sono (AOS) é caracterizada pela obstrução ou redução das vias aéreas de uma pessoa durante o sono, levando à interrupção temporária da respiração ou a respiração superficial (hipopneia). A Apneia Obstrutiva do Sono (AOS) é diagnosticada quando uma pessoa apresenta cinco ou mais eventos respiratórios obstrutivos por hora durante a polissonografia (PSG), que incluem apneias, hipopneias ou despertares relacionados ao esforço respiratório. Além disso, a presença de sintomas como sonolência diurna excessiva, respiração ofegante ou despertar durante o sono, fadiga diurna ou distúrbios médicos associados são levados em consideração para o diagnóstico (SPRENGER et al., 2017).

Além disso, é possível diagnosticar AOS em indivíduos que apresentam 15 ou mais eventos respiratórios obstrutivos por hora de sono, independentemente da presença de sintomas. A gravidade da AOS é determinada pelo Índice de Apneia-Hipopneia (IAH), que mede o número de eventos de apneia ou hipopneia que um paciente experimenta por hora de sono. A gravidade é classificada em leve (IAH de 5 a 14), moderada (15 a 29) ou grave (≥30) (GONÇALES et al., 2014; SPRENGER et al., 2017).

Embora as cirurgias ortognáticas tenham como objetivo corrigir discrepâncias ósseas, elas inevitavelmente impactam a relação entre os tecidos moles e esqueléticos. A substituição maxilar e/ou mandibular pode resultar em diferentes alterações no tamanho e na forma da via oral e das cavidades nasais, dependendo da magnitude e direção da correção realizada. Como resultado, essas alterações podem influenciar a qualidade do sono dos pacientes tratados no longo prazo, especialmente quando associadas a fatores de risco (YANG et al., 2020).

De acordo com Mattos et al. o comprimento anteroposterior da via aérea pode ser afetado de diversas maneiras pela cirurgia ortognática. Em uma cirurgia de recuo mandibular isolado (MdS), pode ocorrer uma diminuição na região do palato mole e na base da língua. Já em uma cirurgia combinada de avanço maxilar com recuo mandibular (MxA + MdS), pode haver um aumento na região da espinha nasal posterior e uma diminuição nas regiões do palato mole, língua e valécula. Por sua vez, a cirurgia de avanço maxilomandibular (AMM) pode resultar em um aumento na região do palato mole. No entanto, esses resultados foram baseados em análises cefalométrica (CHRISTOVAM et al., 2016).

Dessa forma, o presente estudo possui como objetivo reunir, a partir de uma revisão integrativa da literatura, evidencias associadas as vias aéreas superiores após cirurgia ortognática bimaxilar.

2 METODOLOGIA

Refere-se a uma revisão integrativa de literatura, de caráter qualitativa. A revisão de literatura permite a busca aprofundada dentro de diversos autores e referenciais sobre um tema específico, nesse caso análise vias aéreas superiores após cirurgia ortognática bimaxilar (PEREIRA et al., 2018).

Sendo assim, para a construção do presente artigo, foi estabelecido um roteiro metodológico baseado em seis fases, a fim de nortear a estrutura de uma revisão integrativa, sendo elas: elaboração da pergunta norteadora, organização dos critérios de inclusão e exclusão e a busca na literatura, caracterização dos dados que serão extraídos em cada estudo, análise dos estudos incluídos na pesquisa, interpretação dos resultados e apresentação da revisão.

Foi utilizada a estratégia PICOS para a elaboração da pergunta norteadora, sendo o PICOS (Patient/population/disease; Exposure or issue of interest, Comparison Intervention or issue of interest Outcome), a População (P): Pacientes submetidos à cirurgia ortognática; Intervenção (I): Correção cirúrgica envolvendo os aspectos anteroposteriores da maxila e/ou mandíbula; Comparador (C): Entre os diferentes tipos de cirurgia ortognática; Desfecho (O): Alterações dimensionais da via aérea superior (área e volume mínimos da seção transversal) medido usando imagens de TC.; Desenho do estudo (S) = Estudos prospectivos e retrospectivos, randomizados e não randomizados que avaliaram as vias aéreas superiores após cirurgia ortognática. Diante disso, construiu-se a questão norteadora: “Quais são os efeitos da cirurgia ortognática para correção anteroposterior da maxila e/ou mandíbula nas dimensões das vias aéreas superiores avaliados usando imagens 3D?” (Tabela 1).

Tabela 1 – Elementos da estratégia PICOS, Brasil, 2023.

ComponentesDefinição
P – populaçãoPacientes submetidos à cirurgia ortognática
I – IntervençãoCorreção cirúrgica envolvendo os aspectos anteroposteriores da maxila e/ou mandíbula
C – ComparadorEntre os diferentes tipos de cirurgia ortognática
O – DesfechoAlterações dimensionais da via aérea superior (área e volume mínimos da seção transversal) medido usando imagens de TC.
S – Desenho do estudoEstudos prospectivos e retrospectivos, randomizados e não randomizados que avaliaram as vias aéreas superiores após cirurgia ortognática.
Fonte: Autoria própria, 2023.

Buscas avançadas foram realizadas em estratégias detalhadas e individualizadas em quatro bases de dados: SciVerse Scopus (https://www-scopus.ez43.periodicos.capes.gov.br/), Scientific Eletronic Library Online – Scielo (https://scielo.org/), U.S. National Library of Medicine (PUBMED) (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/) e ScienceDirect (https://www-webofknowledge.ez43.periodicos.capes.gov.br/), com auxílio do gerenciador de referência Mendeley. Os artigos foram coletados no mês de dezembro de 2022 e contemplados entre os anos de 2000 a 2022. 

A estratégia de pesquisa desenvolvida para identificar os artigos incluídos e avaliados para este estudo baseou-se em uma combinação apropriada de termos MeSH (www.nlm.nih.gov/mesh/meshhome.html), nos idiomas português e inglês.

Considerou-se como critério de inclusão os artigos completos disponíveis na íntegra nas bases de dados citadas, nos idiomas inglês e português e relacionados com o objetivo deste estudo. Os critérios de exclusão foram artigos incompletos, duplicados, resenhas, estudos in vitro e resumos.

A estratégia de pesquisa baseou-se na leitura dos títulos para encontrar estudos que investigassem a temática da pesquisa. Caso atingisse esse primeiro objetivo, posteriormente, os resumos eram lidos e, persistindo na inclusão, era feita a leitura do artigo completo.  Na sequência metodológica foi realizada a busca e leitura na íntegra dos artigos pré-selecionados, os quais foram analisados para inclusão da amostra.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com base na revisão de literatura feita nas bases de dados eletrônicas citadas, foram identificados 2795 artigos científicos, dos quais 324 estavam duplicados com dois ou mais índices. Após a leitura e análise do título e resumos dos demais artigos outros 2390 foram excluídos. Assim, 81 artigos foram lidos na integra e, com base nos critérios de inclusão e exclusão, apenas 22 artigos foram selecionados para compor este estudo. O fluxograma com detalhamento de todas as etapas de seleção está na figura 1.

Figura 1 – Fluxograma de identificação e seleção dos estudos.

Fonte: os autores, 2023.

É amplamente reconhecido que a anatomia das vias aéreas superiores pode desempenhar um papel importante na obstrução das vias aéreas. Em pacientes com apneia do sono, é comum observar uma redução do tamanho da via aérea orofaríngea superior em comparação com indivíduos de controle sem distúrbios do sono. As estruturas craniofaciais ao redor ou o acúmulo de gordura corporal podem reduzir o volume das vias aéreas superiores, aumentando a probabilidade de colapso faríngeo (PARK et al., 2012).

Em uma revisão sistemática realizada por Steegman et al. (2023) a cirurgia isolada de recuo mandibular resultou em redução do volume da via aérea total e dos três segmentos da via aérea em quase todos os estudos incluídos, o que é o oposto da cirurgia isolada de avanço maxilar, que resultou em aumento no volume das vias aéreas. A cirurgia bimaxilar incluindo recuo mandibular resultou em um aumento no volume das vias aéreas na maioria dos estudos (PARK et al., 2019; SPRENGER et al., 2017). 

A cirurgia ortognática também altera as vias aéreas, que se localizam à frente da coluna vertebral, atrás das cavidades nasal e bucal e do osso hioide , passando da porção basilar do osso occipital até os pulmões. Esse conjunto de estruturas anatômicas se estende desde a cavidade nasal até os alvéolos pulmonares , servindo apenas como passagem para o ar inspirado ou expirado (SHIN et al., 2015). 

As vias aéreas são divididas em duas partes: as vias aéreas superiores, que são constituídas pelo nariz, faringe e laringe, e as vias aéreas inferiores, formadas pela traquéia, brônquios, bronquíolos e alvéolos pulmonares (SHIN et al., 2015). 

A fim de avaliar o impacto da cirurgia ortognática no espaço aéreo superior, estudos têm utilizado radiografias cefalométricas laterais para medir as dimensões lineares e angulares em diferentes pontos das vias aéreas, incluindo a nasofaringe, orofaringe e hipofaringe, tanto antes quanto após o procedimento cirúrgico (GILBERT, 2011).

Alguns estudos relataram uma melhora significativa na respiração nasal e nos sintomas de apneia do sono após a cirurgia ortognática bimaxilar. Outros, entretanto, não encontraram uma correlação clara entre as mudanças nas dimensões das vias aéreas e a melhoria dos sintomas respiratórios. Essas divergências podem ser atribuídas a diferenças metodológicas entre os estudos, como o tamanho da amostra, o período de acompanhamento pós-operatório e a avaliação subjetiva dos sintomas respiratórios (AN et al., 2019; GONÇALES et al., 2014).

Apesar dessas limitações, é evidente que a cirurgia ortognática bimaxilar pode ter efeitos significativos nas vias aéreas superiores. Por isso, é importante avaliar cuidadosamente os pacientes com distúrbios respiratórios antes da cirurgia e considerar as implicações potenciais da intervenção na melhoria da respiração. Mais pesquisas são necessárias para entender melhor a relação entre as mudanças nas dimensões das vias aéreas e a melhoria dos sintomas respiratórios após a cirurgia ortognática bimaxilar (AN et al., 2019; GONÇALES et al., 2014).

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A cirurgia ortognática bimaxilar pode levar a mudanças significativas nas dimensões das vias aéreas superiores, especialmente na área da via aérea orofaríngea. No entanto, a correlação entre as mudanças nas dimensões das vias aéreas e a melhoria dos sintomas respiratórios não é clara. São necessários mais estudos para avaliar os efeitos a longo prazo da cirurgia ortognática bimaxilar nas vias aéreas superiores e a correlação com a melhoria dos sintomas respiratórios.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AN, J. H. et al. Cone-Beam Computed Tomography Evaluation of Pharyngeal Airway Space Changes After Bimaxillary Orthognathic Surgery in Patients With Class III Skeletal Deformities: A 6-Year Follow-Up Study. Journal of Oral and Maxillofacial Surgery, v. 77, n. 12, p. 2534–2544, 2019.

CHRISTOVAM, I. O. et al. Upper airway dimensions in patients undergoing orthognathic surgery: a systematic  review and meta-analysis. International journal of oral and maxillofacial surgery, v. 45, n. 4, p. 460–471, abr. 2016.

GILBERT, L. Ludwig’s Angina. In: FLEISHER, L. A.; ROIZEN, M. F. B. T.-E. OF A. P. (THIRD E. (Eds.). Philadelphia: W.B. Saunders, 2011. p. 229.

GONÇALES, E. S. et al. Computerized Cephalometric Study of the Pharyngeal Airway Space in Patients Submitted to Orthognathic Surgery. Journal of Maxillofacial and Oral Surgery, v. 13, n. 3, p. 253–258, 2014.

PARK, J. H. et al. Changes in position of the hyoid bone and volume of the pharyngeal airway after mandibular setback: three-dimensional analysis. British Journal of Oral and Maxillofacial Surgery, v. 57, n. 1, p. 29–35, 2019.

PARK, S.-B. et al. Cone-beam computed tomography evaluation of short- and long-term airway change and stability after orthognathic surgery in patients with Class III skeletal deformities: bimaxillary surgery and mandibular setback surgery. International Journal of Oral and Maxillofacial Surgery, v. 41, n. 1, p. 87–93, 2012.

PEREIRA, A. et al. Método Qualitativo, Quantitativo ou Quali-Quanti. [s.l: s.n.].

SHIN, J.-H. et al. A 2-Year Follow-Up of Changes After Bimaxillary Surgery in Patients With Mandibular Prognathism: 3-Dimensional Analysis of Pharyngeal Airway Volume and Hyoid Bone Position. Journal of Oral and Maxillofacial Surgery, v. 73, n. 2, p. 340.e1-340.e9, 2015.

SPRENGER, R. et al. A retrospective cephalometric study on upper airway spaces in different facial types. Progress in Orthodontics, v. 18, n. 1, p. 25, 2017.

STEEGMAN, R. et al. Cone beam computed tomography volumetric airway changes after orthognathic surgery: a systematic review. International Journal of Oral and Maxillofacial Surgery, v. 52, n. 1, p. 60–71, 2023.

YANG, H. J. et al. Airway changes and prevalence of obstructive sleep apnoea after bimaxillary  orthognathic surgery with large mandibular setback. International journal of oral and maxillofacial surgery, v. 49, n. 3, p. 342–349, mar. 2020.


1https://orcid.org/0000-0001-6074-0308

2https://orcid.org/0009-0005-8632-3402

3https://orcid.org/0009-0005-1643-748X

4https://orcid.org/0009-0002-1668-7516

5https://orcid.org/0009-0004-4284-4196

6https://orcid.org/0009-0003-2465-1035

7https://orcid.org/0009-0000-5373-1382

8https://orcid.org/0000-0002-3552-5419

9https://orcid.org/0009-0001-9550-0416

10https://orcid.org/0009-0003-8573-132X

11https://orcid.org/0009-0002-7944-8248

12https://orcid.org/0009-0003-0571-4731