TRATAMENTO DE MORDIDA CRUZADA ANTERIOR E POSTERIOR COM USO DE APARELHO AUTOLIGADO

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7823769


Luanna Corrêa Cad1
Carlos Eduardo Bezerra Pascoa2
Priscila Pinto Brandão de Araujo3
Elaine Rodrigues Bianco4
Tiago Drumond Valadares Freitas5
Débora Cristina Martins6


RESUMO

A mordida cruzada consiste na incapacidade dos arcos superior e inferior em ocluir normalmente no relacionamento transversal e/ou ântero-posterior, podendo ser decorrente de problemas de posicionamento dentário, de crescimento alveolar ou devido a desarmonia entre a maxila e mandíbula. Classificando-se em: mordida cruzada anterior: os dentes anteriores encontram-se em relação de oclusão inversa, podendo ser unitária, múltipla ou total. Mordida cruzada posterior: os dentes posteriores encontram-se cruzado ou de topo no sentido transversal, que pode ou não se manifestar como mordida cruzada uni ou bilateral, parcial ou total. Perdendo a característica normal de encaixe dos arcos dentários em uma relação de caixa- tampa. A escolha por um tratamento ortopédico ou ortodôntico depende da maturação óssea do paciente. A indicação para cada tipo de aparelho varia de  acordo com o número de dentes envolvidos, a fase de erupção dentária, as características de cada oclusão, a colaboração do paciente e o grau de severidade. Dessa forma o objetivo deste trabalho é apresentar a correção de mordida cruzada anterior e posterior bilateral, com ortodontia corretiva através do uso de aparelho fixo autoligado. A técnica escolhida no tratamento do paciente se mostrou eficiente no descruzamento da mordida anterior mesmo antes da conclusão do tratamento, possibilitando uma melhora estética e funcional.

Palavras-chave: Má oclusão, Mordida cruzada, Bráquetes autoligado.

ABSTRACT

Crossbite is the inability of the upper and lower arches to occlude normally in the transverse and/or anteroposterior relationship, which may be due to problems with dental positioning, alveolar growth or due to disharmony between the maxilla and mandible. Classifying into: -anterior crossbite: the anterior teeth are in an inverse occlusion relationship, which can be single, multiple or total. Posterior crossbite: the posterior teeth are crossed or top in the transverse direction, which may or may not manifest as a unilateral or bilateral, partial or total crossbite. Losing the normal characteristic of fitting the dental arches in a box-lid relationship. The choice for orthopedic or orthodontic treatment depends on the patient’s bone maturation. The indication for each type of appliance varies according to the number of teeth involved, the stage of tooth eruption, the characteristics of each occlusion, the patient’s compliance and the degree of severity. Thus, the objective of this work is to present the correction of bilateral anterior and posterior crossbite, with corrective orthodontics through the use of a self-ligating fixed appliance. The technique chosen in the treatment of the patient proved to be efficient in uncrossing the anterior bite even before the completion of the treatment, enabling an aesthetic and functional improvement.

Descriptors: Malocclusion, Cross bite, Self-ligating brackets.

INTRODUÇÃO

A mordida cruzada consiste na incapacidade dos arcos superior e inferior em ocluir normalmente no relacionamento transversal e/ou ântero-posterior, podendo ser decorrente de problemas de posicionamento dentário, de crescimento alveolar ou devido à desarmonia entre a maxila e mandíbula. (JANSON et al.,2004).

De acordo com Martins, Almeida e Dainesi as mordidas cruzadas se classificam em: mordida cruzada anterior: os dentes anteriores encontram-se em relação de oclusão inversa, podendo ser unitária, múltipla ou total. Mordida cruzada posterior: os dentes posteriores encontram-se cruzado ou de topo no sentido transversal, que pode ou não se manifestar como mordida cruzada uni ou bilateral, parcial ou total. Perdendo a característica normal de encaixe dos arcos dentários em uma relação de caixa- tampa. (PATEL et al.,2015).

Diferentes fatores são responsáveis por essa má oclusão, tais como a respiração bucal, hábitos bucais, perda precoce ou retenção prolongada de dentes decíduos, migração do germe permanente, interferências oclusais, anomalias ósseas congênitas, falta de espaço nos arcos (diferença entre tamanho do dente e tamanho do arco), fissuras palatinas e hábitos posturais incorretos. (LOCKS et al.,2008).

Moyers classificou, com base em sua etiologia, como: dentária, quando resulta na erupção imperfeita de um ou mais dentes numa relação de mordida cruzada, não afetando o tamanho ou a forma do osso basal; muscular quando ocorre uma adaptação funcional às interferências dentárias, apresentando o deslocamento da mandíbula e o desvio da linha média; e óssea, que ocorre em consequência de uma discrepância na estrutura da mandíbula ou maxila, levando a uma alteração na largura dos arcos. (LOCKS et al.,2008).

A intervenção e manutenção tardia produzem um quadro anatomofuncional que torna o tratamento em adultos mais complexo. Considera-se que a idade e a maturação esquelética avançada tornam desfavorável o processo de expansão óssea, apresentando resistência por parte das estruturas faciais. Já em idades precoces, no período da dentadura mista e permanente jovem, apresentam um grande efeito ortopédico, quando comparado a dentadura permanente adulta. (PATEL et al.,2015).

A escolha por um tratamento ortopédico ou ortodôntico depende da maturação óssea do paciente. A indicação para cada tipo de aparelho varia de acordo com o número de dentes envolvidos, a fase de erupção dentária, as características de cada oclusão, a colaboração do paciente e o grau de severidade. (FIGUEIREDO et al.,2014).

Por ser um tema relevante e uma má oclusão frequente na clínica ortodôntica, é interessante que o ortodontista tenha conhecimento sobre essa má oclusão e suas formas de tratamento. Diante do exposto, o objetivo deste trabalho é apresentar a correção de mordida cruzada anterior e posterior bilateral, com ortodontia corretiva através do uso de aparelho fixo autoligado.

RELATO DE CASO

Paciente F.R.L., melanoderma, gênero masculino,17 anos de idade. Procurou atendimento na clínica Ceproeducar, queixando-se: “morder ao contrário”.

Após anamnese e análise de histórico médico, foram verificadas boas condições gerais de saúde.

Na avaliação extrabucal (figura1), foi observado biotipo facial reto, lábio superior retraído sem presença de assimetria significativa. Na análise intrabucal (figura2), notou-se a presença de mordida cruzada tanto na região anterior, quanto na posterior (bilateral) e relação molar de classe I. Verificou-se também apinhamento na região anterior com elemento 13 em infra oclusão e incisivos verticalizados.

Figura 6: Tabela cefalométrica inicial padrão USP.

Na radiografia panorâmica, não foram observadas alterações, sendo possível a visualização de germe dentário dos terceiros molares. Paciente orientado quanto a possível exodontia após tratamento ortodôntico. A partir da telerradiografia, foram feitos os traçados cefalométricos (padrão USP) e foi diagnosticado bom posicionamento da maxila e mandíbula, classificando-se como classe I esquelética.

Para o seguinte caso, foi planejado tratamento ortodôntico corretivo com aparelho fixo autoligado metálico (Morelli), prescrição Roth slot 22, e uso de fios termoativados e copper niti.

Inicialmente realizou-se a colagem direta do aparelho superior, utilizando fios termoativados 0,012 TermoNiTi com stop de resina na mesial dos incisivos centrais e mola de secção aberta de NiTi ativadas entre 11 e 13, 21 e 23. (figura 6- A,C,D)

Planejou-se a confecção de um levante oclusal fixado sobre os dentes póstero- inferiores, tendo como material de escolha o cimento de ionômero de vidro restaurador. (figura 6-B)

No mês seguinte, foi realizada a colagem do aparelho fixo inferior e ativação das molas de NiTi entre as laterais superiores. Após espaço suficiente e posição favorável, procedeu-se com a colagem dos bráquetes 12 e 22 com técnica de sobre utilizando fio 0,012 Termo NiTi e fio de aço redondo 0,018, permanecendo a mola de secção aberta (figura 7- A, B). Seguiu-se com o alinhamento e nivelamento dos arcos com a sequência de fios copper NiTi até 17×25.

Após o alinhamento e nivelamento dentário, obteve-se o descruzamento anterior da mordida, necessitando de descruzamento posterior unilateral direito que ainda manteve -se no topo. Iniciou-se a mecânica com dobras no fio de aço 0,018 na arcada superior do 13 ao 16 com dobra off set, e na inferior foi realizado dobra inset da mesial do 44 para o descruzamento (figura 9 D, E).

Em 12 meses de tratamento, foi possível realizar alinhamento e nivelamento dos arcos dentários e descruzamento da mordida anterior. Paciente ainda se encontra em tratamento, faltando a correção de mordida de topo lado direito, e intercuspidação para finalização do caso. No entanto, os resultados obtidos até a fase apresentada foram satisfatórios e o paciente continuará sendo acompanhado até a conclusão do tratamento (figura 9 A, B, C).

DISCUSSÃO

O tratamento da mordida cruzada pode ser conduzido de várias maneiras, dependendo do grau de envolvimento esquelético e dentário. Quando esquelético, há necessidade de intervenção ortodôntica e/ ou ortopédica direcionando o crescimento maxilo-mandibular. (TASHIMA.,2003) Em idade precoce elimina ou minimiza os danos de um crescimento anormal das bases ósseas e dento alveolares, evitando problemas futuros, como hábitos bucais deletérios, bruxismo e desenvolvimento de mordida cruzada esquelética. (FIGUEIREDO et al., 2014).

As mordidas cruzadas dentária ou dentoalveolares caracterizam-se pelo envolvimento de um ou mais dentes, onde os incisivos superiores encontram-se palatinizados e os inferiores vestibularizados, mantendo-se um bom relacionamento das bases apicais em relação à base do crânio. (TERADAET., 1997).

Figueiredo et al.,2014, relata em seu estudo que quando a remodelação alveolar é suficiente para corrigir satisfatoriamente a má oclusão, a mordida cruzada é frequentemente tratada com procedimento de expansão. Para realizar a expansão dentoalveolar, alguns aparelhos podem ser utilizados, como aparelhos removíveis de expansão, quadri-hélice, expansor palatal de níquel titânio, barra transpalatina, placa lábio ativa e aparelhos fixos autoligado, indo de acordo com o nosso caso clínico.

Assim como Tavares et al.,2015, relatou em seu estudo, o aparelho fixo autoligado possui uma filosofia que se baseia no uso de forças leves, através dos raquetes e fios de níquel titânio termoativados, obtendo-se movimentação dentária mais natural, ocorrendo um aumento no perímetro do arco, localizado na região anterior e posterior, justificando assim nossa escolha por esse tipo de aparelho.

Os bráquetes autoligados têm sido apresentados como diferencial na tentativa de oferecer um tratamento eficaz e com menor tempo possível. No entanto, a quantidade de informações por verdades estabelecidas e não comprovadas a longo prazo vem crescendo ao longo dos anos. (CASTRO.,2009).

Outra vantagem no sistema autoligado, descrita por Zanelato et al., 2013, baseia-se no conceito de atrito que, de acordo com o autor, é a principal resistência oferecida pelos dentes durante o deslizamento. O autor ainda enfatiza que, em função da evolução das mecânicas de tratamento da técnica do deslizamento, conhecer os fatores que dificultam a movimentação dentária é muito importante. Quanto maior o atrito, maior será a força e isso aumentará os efeitos colaterais, danos teciduais e tempo de tratamento. A diminuição do atrito está diretamente relacionada com o sistema de amarração do aparelho autoligado, sendo sua principal característica, facilitando o início da movimentação dentária e diminuição no tempo de tratamento, o que foi constatado com o caso clínico descrito.

Além disso, sabe-se também que as ligaduras elásticas provocam muita resistência à movimentação. Ou seja, nos aparelhos convencionais onde são utilizadas ligaduras elásticas, a aplicação da força da biomecânica deve quebrar a resistência provocada pela ligadura para promover a movimentação dentária. Com isso, faz-se necessário níveis de força mais elevados, podendo ser mais vantajoso a escolha pelo aparelho autoligado, sua utilização elimina o atrito e diminui os níveis de força aplicados nas biomecânicas. (ZANELATO et al.,2013).

Em contrapartida, segundo Ehsani et al.,2009, quando comparados à quantidade de resistência de atrito entre os bráquetes autoligados e convencionais, o diâmetro do fio que é usado na mecânica de deslize possui influência direta sobre o resultado final. Quanto maior for essa espessura, maior será o atrito gerado, não havendo, então, diferença entre os dois grupos de bráquetes. (OLIVEIRA.,2011). Essa comparação não é possível de ser mensurada no nosso trabalho, pois não temos a possibilidade de mensurar o tempo de tratamento utilizando bráquetes convencionais no nosso paciente.

Entretanto, os bráquetes autoligados têm se mostrado uma alternativa interessante nos casos com apinhamentos dentários. No entanto, acredita-se que ainda existem muitas variáveis a serem comprovadas cientificamente em relação aos bráquetes convencionais. Neste caso apresentado, obteve-se resultado satisfatório com a técnica do sistema autoligado, em curto período de tratamento.

CONCLUSÃO

A correção ortodôntica da mordida cruzada dentoalveolar pode ser realizada de muitas maneiras para alcançar um resultado satisfatório. A técnica escolhida no presente relato foi por meio do sistema de bráquetes autoligado, mostrando-se eficiente no descruzamento da mordida anterior mesmo antes da conclusão do tratamento, possibilitando uma melhora estética e funcional ao paciente.

REFERÊNCIAS

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Locks, Arno et al. Mordida cruzada posterior: uma classificação mais didática. Revista Dental Press de Ortodontia e Ortopedia Facial, Maringá, v. 13, n. 2, p. 146- 158, 2008 mar/abr.

Oliveira LSD, Avaliação da força de atrito estático em braquetes autoligados e convencionais- estudo in vitro (dissertação). Santa Maria, (RS): Universidade federal de Santa Maria.;2011.

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Tashima AY, Verrastro AP, Ferreira SLM, Wanderley MT, Guedes-Pinto E. Tratamento Ortodôntico Precoce da Mordida Cruzada Anterior e posterior: Relato de caso clínico. JBP- J Bras Odontopediatra Odonto Bebê, Curitiba, V.6,n.29, p. 24=31, 2003.

Tavares S, Capristano A, Tavares N, Junior GF. Sistema autoligável- tratamento de apinhamentos moderados e severos sem extrações. Orthod. Sci. Pract. 8(31):294- 304; 2015.

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Zanelato AT, Zanelato ACT, Zanelato RCT. Mudança de paradigmas na utilização de forças em ortodontia com o uso de aparelhos autoligados. Ortodontia SPO46(2):161-5; 2013.

Zanelato RCT. Tratamento Ortodôntico com aparelho autoligado passivo- SmartClip. 50- www.saudeoral.pt


1Especialista em Ortodontia.
2Especialista em Ortodontia.
3Doutora em Ortodontia.
4Mestre em Implantodontia.
5Especialista em Ortodontia.
6Mestre em Ortodontia.

Trabalho desenvolvido no Curso de Especialização em Ortodontia da    Ceproeducar/FaSerra – Manaus /AM