SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL SINDICAL

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7781403


Jevan Batista Santos


RESUMO

Um dos direitos fundamentais dos indivíduos que compõem a sociedade é o acesso à justiça; isso somente pode ocorrer quando os serviços prestados no campo jurídico são efetivos e atendem a defesa dos direitos de todos os indivíduos. A sociedade tem se modificado ao longo dos anos, assim como as relações de trabalho, o que tem modificado também os conflitos que surgem e as necessidades para sua resolução. Não é mais adequado adotar apenas ferramentas para tutelar direitos individuais, uma vez que os conflitos têm se tornado coletivos, especialmente no âmbito do trabalho. A substituição processual, portanto, tem se mostrado como uma importante alternativa para a defesa dos direitos e interesses dos trabalhadores, evitando que este sofra qualquer tipo de represália por parte de seu empregador, o que amplia e garante o acesso a seus direitos, além de outras vantagens. Neste sentido, o presente trabalho teve como objetivo realizar uma discussão a respeito da substituição processual sindical, as relações de trabalho e a defesa dos direitos transindividuais. Foi possível observar que se trata de uma ferramenta muito importante de proteção aos trabalhadores e garantia de seus direitos, sendo ainda necessária a realização de novas avaliações a fim de adaptá-la à realidade em que a sociedade se insere.

PALAVRAS-CHAVE: substituição processual, direito trabalhista, substituição processual sindical, sindicato.

1 INTRODUÇÃO

A ampliação das sociedades implicou num aumento do número de pessoas vivendo juntas, dividindo os mesmos espaços e interagindo no dia a dia, o que resultou também na intensificação dos conflitos sociais, processos que se expandiram ainda mais após a Segunda Guerra Mundial. A sociedade foi se dando conta, portanto, que para lidar com tais conflitos era preciso sair da esfera individual e entrar no plano coletivo, buscando reparar tais problemas (LORA, 2012).

No Brasil, é a Consolidação das Leis do Trabalho de 1943 que deu início ao tratamento dos interesses coletivos, instituindo a ação de dissídio coletivo, que são ações ajuizadas em Tribula com o objetivo de resolver conflitos entre partes que representam um coletivo. Com o passar dos anos, em 1985, novas mudanças no contexto trabalhista ocorreram a partir da Lei da Ação Civil Pública, validada pela Constituição Federal de 1988, e que, posteriormente, foram complementadas pelo Código de Defesa do Consumidor, em 1990. Sabe-se que a doutrina e jurisprudência trabalhista se colocou contra a adoção de instrumentos que pudessem proteger os novos interesses sociais que eram considerados, em especial no que diz respeito ao contexto laboral. Neste contexto, os sindicatos enquanto representantes dos trabalhadores, foram impedidos de defender os interesses da categoria; assim, conforme a ampliação dos conflitos que atingiu também o Direito do Trabalho, houve a necessidade de se aplicar instrumentos que permitem a tutela dos interesses e direitos destes trabalhadores (LORA, 2012).

De acordo com Pimenta (2012), o ambiente de trabalho precisa ser saudável para o desenvolvimento das atividades, o que está previsto na constituição e legislação, sendo, portanto, um dos direitos dos trabalhadores. Apesar disso, conforme visto, sua normatização não é suficiente para garantir que este seja cumprido. A partir disso, a constituição indicou a possibilidade do sindicato de substituição processual, ajuizamento de ações em defesa dos direitos dos trabalhadores, em âmbito coletivo e individual homogêneo; o objetivo de tal ação é garantir, na prática, os direitos sociais previstos nas leis.

Nota-se com isso, que a busca por meios de efetivar a justiça na sociedade é contínua, é preciso que as ferramentas jurídicas se atualizem conforme são identificados novos tipos de problemas e questões que derivam das relações sociais; as técnicas processuais precisam se adaptar à realidade em que estão inseridas para que possam servir como um instrumento adequado de pacificação social, ou seja, atuar em âmbito coletivo e não apenas individual (REZENDE FILHO, 2009).

No contexto do trabalho, sabe-se que muitas vezes os funcionários não trabalham sob condições adequadas que respeitam todos os seus direitos previstos na legislação, neste caso, o indivíduo tem a possibilidade de entrar com um processo na justiça para buscar seus direitos; entretanto, sabe-se que muitas vezes os funcionários deixam de buscar seus direitos por temor de perder seu emprego ou benefícios. Uma adaptação da legislação que beneficia o trabalhador neste sentido, é a possibilidade de substituição processual sindical, ferramenta que permite a despersonalização do trabalhador que busca por seus direitos, o que evita ou minimiza a possibilidade deste sofrer qualquer tipo de represália por parte da empresa em que trabalha (REZENDE FILHO, 2009).

Nesta ótica, o presente trabalho visa realizar uma discussão acerca da substituição processual sindical, uma das ferramentas que atua em favor da defesa dos direitos e interesses dos trabalhadores no âmbito coletivo, com o objetivo de compreender melhor este dispositivo, permitindo um melhor entendimento de seu funcionamento. Por se tratar de um dispositivo cujo objetivo é garantir os direitos fundamentais dos trabalhadores, é de grande importância que o tema seja discutido e compreendido pois os cidadãos precisam ter consciência de seus deveres e direitos enquanto participantes de uma sociedade; os conflitos, inerentes à convivência humana, precisam ser tratados de forma adequada e justa, o que somente pode ocorrer a partir do conhecimento dos dispositivos que auxiliam em sua adequada resolução.

2 REVISÃO DE LITERATURA

2.1 Breve histórico sobre Relações e Direitos Trabalhistas

O trabalho teve sua origem unificada à origem do ser humano, pois o homem desde sempre teve a necessidade de sobreviver e se manter em um ambiente selvagem, precisando desenvolver métodos para se sustentar. Assim, o homem primitivo utilizava suas capacidades corporais para conseguir se sustentar e se defender dos animais selvagens, posteriormente descobrindo a possibilidade de adotar ferramentas para estes fins que, inicialmente, eram meros objetivos encontrados na natureza. Disso, surgiu a descoberta da possibilidade de utilizar ferramentas para modificar estes objetos naturais, o que deu origem as armas que facilitaram muito a vida destes homens, permitindo um melhor desempenho na caça e defesa, tanto contra animais quanto contra outros homens (SANTOS, 2005).

Assim, as sociedades foram se desenvolvendo, passando a se organizar de diferentes formas que pudessem atender as suas necessidades e interesses. Na antiguidade, o trabalho era considerado como algo ruim, um castigo, de forma que a palavra “trabalho” era relacionada a fadiga, esforço, sofrimento; assim, as pessoas mais ricas da sociedade se afastavam desta prática. A partir dessa ótica surge a escravidão, na sociedade pré-industrial, na qual a sociedade se divida entre senhores e escravos; os escravos, responsáveis pela realização de todo o trabalho não eram considerados ou tratados como sujeitos de direito, mas sim, uma posse (SILVA, 2018).

A escravidão é considerada a primeira forma organizada de trabalho, surge pelo aumento da demanda de mão-de-obra, e pelo fato de que os nobres não se submeteriam a tais atividades.

Através do aprisionamento de inimigos, as guerras passaram a fornecer mão-de-obra, iniciando sua relação de trabalho. Nesse regime, a pessoa era considerada como rés, propriedade de outra, sendo obrigada a trabalhar forçadamente, passível de punição corporal ou negociação comercial (SANTOS, 2005, p. 13).

No Brasil, em 1888 houve a abolição da escravidão, a legislação penal vigente considerava crime reduzir um sujeito a escravo; entretanto, atualmente ainda é possível observar pessoas que trabalham sob condições desumanizantes, como por exemplo trabalhadores rurais que são obrigados a comprar seus mantimentos no armazém da fazenda, a preços muito elevados, se mantendo endividados com seus patrões e não podendo se desvincular deles (SILVA, 2018).

Após a escravidão, surge o regime de servidão cuja relação era com a terra e não com os indivíduos. Assim, o senhor feudal era o sujeito que detinha direito sobre determinadas áreas e que cedia parte destas terras para o trabalho dos servos, de forma que este tinha a obrigação de lhe prestar diferentes tipos de serviços, além do pagamento de altas taxas sobre sua produção. Este regime, no entanto, trouxe alguns avanços no âmbito das relações de trabalho, conforme aponta Russomano (2001). O autor indica que os servos não mais eram considerados escravos e existiam agora alguns direitos para estes indivíduos, como por exemplo, o direito ao casamento, ainda que este dependesse da aprovação do senhor feudal. A partir disso, teve início um processo de ressignificação do trabalhador, que conquistava novos direitos, ainda que poucos.

Conforme aponta Santos (2005), na Idade Média, as cidades já estavam se estabelecendo, de forma que sua organização demandava por serviços e produtos, o que acabou obrigando os artesãos a contratarem auxiliares para confeccionar seus produtos de forma a tender as necessidades da população. Essa foi a origem das corporações de ofício, o objetivo era unificar pessoas que tinham certo conhecimento técnico, de forma a restringir o mercado, o que resultou em um monopólio do mercado por parte destas pessoas. A hierarquia em que eram divididos os trabalhadores de tais corporações era: aprendizes, companheiros e mestres. Os mestres eram aqueles que detinham o maior conhecimento e eram, normalmente, os donos das oficinas, sendo a única voz dentro destas corporações; os companheiros eram as pessoas que se qualificavam a partir de sua atuação por anos como aprendiz; e os aprendizes eram os jovens que trabalhavam sob a tutela dos mestres, aprendendo seu ofício.

Haviam muitos abusos dentro destas corporações por parte dos mestres, que acabavam gerando grande revolta dos companheiros, especialmente no que diz respeito à tendência em transformar o ofício em um bem familiar. Além disso, existia ainda um grande apego à produção e tendência ao monopólio, o que acabou incitando uma transição da sociedade artesanal para o capitalismo mercantil. As corporações de ofício foram extinguidas com a Revolução Francesa por serem incompatíveis com o Estado Liberal.

A abolição das corporações causou uma degradação do ser humano. O trabalhador se sujeitava a laborar por um preço vil em condições sub-humanas em troca da liberdade contratual. Com a Revolução Francesa, as corporações de ofício foram suprimidas, pois eram tidas como incompatíveis com o ideal de liberdade individual da pessoa (SILVA, 2018, p. 1).

Posteriormente, com o desenvolvimento da sociedade industrial no século XVIII surgiu o trabalho assalariado e com ele o Direito do Trabalho. A sociedade industrial se caracterizou por profundas transformações técnicas, sociais e econômicas, o avanço populacional que acabou resultando no surgimento de diversas cidades por toda a Europa; tais modificações acabaram tornando o Feudalismo insuficiente para atender as demandas da sociedade. Com isso, as descobertas da época, como as máquinas a vapor acabaram substituindo o trabalho humano; conforme aponta Silva (2018, p. 1), algumas das importantes modificações sociais que ocorreram com a Revolução Industrial:

a) afirmação de que os avanços tecnológicos são fatores determinantes do desenvolvimento econômico;
b) incremento quantitativo do rendimento de trabalho;
c) interação “ciência-tecnologia”;
d) a tecnologia impõe ao homem a divisão social do trabalho, com o emprego de novas tarefas e funções;
e) diminuição da população agrária;
f) surgimento de uma nova classe social, ou seja, o proletariado urbano industrial.

Com o surgimento do trabalho assalariado, surge também o Direito do Trabalho, cujo objetivo era organizar as relações de trabalho, promovendo um ambiente e condições adequadas de trabalho para o proletário. As duas classes que existiam na época era a classe proletária e a classe capitalista, sendo que esta era quem detinha o poder; desta forma, o Estado tinha o dever de defender a liberdade e igualdade dos trabalhadores em prol do liberalismo econômico. Enquanto donos do poder econômico, os capitalistas determinavam as regras de trabalho dos funcionários sem se preocupar com seu bem-estar ou qualidade de vida, visando apenas o maior lucro. Assim, era exigido dos trabalhadores jornadas extensas de trabalho, a exploração de mulheres e crianças no ambiente de trabalho era bastante comum, além dos acidentes de trabalho que ocorriam com certa frequência e baixas condições salariais (SILVA, 2018).

Foi essa exploração que deu origem à demanda de uma legislação cujo objetivo fosse de proteger os direitos e interesses dos trabalhadores, regulando a segurança, higiene, o trabalho do menor de idade, o trabalho da mulher, limite de jornadas semanais de trabalho, políticas salariais, entre outros. Assim, as associações de trabalhadores começaram a ser reconhecidas e a reivindicar seus direitos realizando movimentos que deram origem ao Direito do Trabalho (SILVA, 2018).

Com isso, os trabalhadores que se sentirem lesados possuem ferramentas legais que o auxiliam na garantia de seus direitos, como a possibilidade de abertura de um processo judicial. Nessa ótica, cabe compreender melhor esta ferramenta. 

2.2 A Realização de um processo

O processo é elemento indispensável à função jurisdicional, sendo definido como o instrumento utilizado pela jurisdição para agir, ou seja, o Estado exerce sua jurisdição por meio dos processos movidos pelos cidadãos. Se trata de um método de solução dos conflitos, regulamentado, que atua com o objetivo de aplicar o direito em cada um dos casos, garantindo o que é de cada parte e impondo o cumprimento de sua decisão (SCHIAVI, 2015).

Um dos direitos constitucionais conferidos a todos os cidadãos brasileiros é o acesso à justiça; para tanto, conforme aponta Augusto (2014), é preciso combinar alguns elementos como a legitimidade ad causam, o interesse processual e a possibilidade jurídica do pedido, sendo estas as chamadas “condições de ação”, com isso entende-se que é preciso existir um vínculo entre o sujeito da demanda e o objetivo litigioso que autorize a atuação do Poder Judiciário.

O processo se trata de uma técnica jurídica cujo Estado é legitimado e atua conforme jurisdição; assim, atua podendo indicar o que é direito em cada caso concreto, ação determinada por uma série de leis que impõem limites e conduzem seu funcionamento adequado. Assim, tais limites são indicados através das regras e princípios próprios que constroem o processo e regulam a atividade do juiz, servindo como um guia para a ação diante dos casos (TREVISAN, 2015).

É direito dos cidadãos a manifestação de desejo de ação do poder judiciário na resolução de algum conflito, assim, quando o indivíduo se coloca diante do Estado-juiz com uma reclamação acerca de determinada situação dá-se início a um processo jurídico. Desta forma, jurisdição, processo e direito a ação são elementos relacionados, sendo que também são regulamentados por normas para garantir o funcionamento adequado. O direito de ação, portanto, se configura como a possibilidade que qualquer indivíduo participante da sociedade possa recorrer ao Estado, sem maiores dificuldades (TREVISAN, 2015).

Neste contexto, as condições de ação são elementos básicos para que uma ação processual se desenvolva, Trevisan (2015, p. 4) complementa:

Qualquer pessoa pode peticionar ao judiciário para que intervenha em uma situação de conflito, a fim de que cesse a lesão ou ameaça de lesão ao bem jurídico objeto da demanda. Contudo, para não ter extinto o processo no qual é discutida sua pretensão prematuramente, o autor deve demonstrar a ocorrência de requisitos básicos que sustente sua demanda. A existência de condições jurídicas, como se nota, não destrói toda construção dogmática ao longo da historia do processo que culminou na concepção do direito de ação como categoria abstrata e autônoma em relação ao direito material. Quando declarada a inexistência das condições da ação houvera manifestação jurisdicional. O Estado declarou sua vontade por meio do juiz, malgrado não tenha resolvido definitivamente sobre a controvérsia. A análise da existência ou não das condições da ação pressupõe, irremediavelmente, uma operação de imersão apenas superficial no mérito. Apesar de a legislação reservar a extinção sem resolução do processo quando verificada a ausência das condições da ação, melhor seria considerar a possibilidade de resolução prima facie do mérito, devido a tênue relação com o direito material.

Assim, compreende-se que o Estado pode anular qualquer processo que não cumpra com as condições de ação. É importante compreender, conforme aponta Schiavi (2015), que apenas o indivíduo que postula a ação precisa cumprir como os requisitos de legitimidade e interesse; assim, o direito de defesa é expresso pela possibilidade de oferecer contestação, e não necessita do preenchimento das condições de ação.

Assim, o que mais interessa para o atual tema é a compreensão da legitimidade ad causam enquanto a capacidade de condução do processo pela parte, frente ao direito material. Compreende-se, portanto, que a parte legítima se trata daquela que se encontra em posição processual que tenha relação com a situação legitimadora, sendo que seu pedido precisa concordar com o que se prevê na legislação (AUGUSTO, 2014).

2.3 Substituição Processual

A partir da compreensão da legitimidade ad causam, é importante saber que esta se classifica em legitimação ordinária e legitimação extraordinária, sendo que a ordinária se trata do processo como regra geral, o que ocorre quando a parte que pede o processo coincide com a parte material, disso entende-se que a parte que vai a juízo seja o próprio titular do direito material; desta forma o processo ocorre a partir do pedido de um sujeito em seu próprio nome, para defender seus direitos e interesses. No entanto, nem sempre a parte é titular da relação jurídica de direito material, de forma que a legislação permite que sujeitos estranhos à relação de direito sejam parte principal de um processo, o que designa a legitimação extraordinária (AUGUSTO, 2014; SANTOS, 2010).

No caso da legitimação extraordinária, esta se configura como uma exceção, sendo apenas adotada em certos casos, e se trata da situação em que um terceiro que vai a juízo em nome próprio, mas para defender os direitos e interesses de outra pessoa.

Neste caso, uma pessoa possui o poder de dar início a um processo que não irá tratar de seu próprio direito, mas sim, o direito de outra pessoa. Assim, o que se compreende por substituição processual é que se trata de uma hipótese de legitimação extraordinária, não podendo ser confundida com outros conceitos como por exemplo, o de representação ou sucessão (AUGUSTO, 2014).

A representação ocorre quando a parte vai a juízo em nome alheio para defender os interesses e direitos alheios, diferente da substituição processual, que a parte vai a juízo em nome próprio para defender os direitos e interesses alheios. O substituto, portanto, é parte do processo. O conceito também se difere da sucessão processual, que é o que ocorra quando uma das partes não mais pode participar do processo, por exemplo em caso de morte da pessoa natural, ou extinção da pessoa jurídica, e ainda quando existe a alienação do objeto litigioso; assim, o sucessor entra no processo da onde ele tiver parado (AUGUSTO, 2014; BIANCHI, 2014).

Existindo a alienação, a ação continua entre as partes originárias, conforme exs-urge da leitura do artigo 42 do CPC. Ou seja, a titularidade do direito material postulado em juízo se altera, mas a legitimidade não, razão porque evidente a ausência de pertinência subjetiva da ação, num segundo momento (SANTOS, 2010, p. 1).

A parte que dá início ao processo em nome próprio mas em defesa do direito alheio precisa atuar como parte principal; se o substituto age como parte acessória, ele não será substituto autêntico, mas sim, assistente, o que configura outro tipo de legitimação, a subordinada. Além disso, é importante notar que não basta que uma parte entre em nome próprio pela defesa do outro, mas também que a lei atribua a alguém o direito de defender este interesse do outro, e que o titular do direito não se faça presente como parte principal, somente assim a situação poderá se configurar como substituição processual (BIANCHI, 2014).

Representar não é a mesma coisa que substituir ou assistir. Juridicamente, tem implicações diversas. O conceito, também, é diferente: REPRESENTAR é estarem lugar de. SUBSTITUIR é colocar-se em lugar de. ASSISTIR é colocar-se ao lado de. Representação processual significa estar alguém em juízo no lugar do autor ou do réu, não na qualidade de parte, mas sim, de representante delas, enquanto que a substituição processual é a ocupação de um dos pólos da demanda, na qualidade de autor ou de réu, no processo em que o substituto não é o titular do direito material defendido. Assistência é o ato de estar em juízo ao lado do autor ou do réu, porquanto tem o assistente algum interesse jurídico no conflito posto à apreciação do judiciário, ou em face da incapacidade relativa de uma das partes (ABREU, 1997, p. 44).

Compreende-se, portanto, que o substituído não é parte do processo, entretanto, sofre com os efeitos da decisão tomada sobre o processo; este ainda pode atuar como assistente. Assim, a legislação indica que o substituído não pode tomar lugar do substituto, mas pode intervir como assistente, o que leva a um entendimento um pouco contraditório (TESHEINER, 2004).

2.4 Substituição processual pelo sindicato

Este tema começou a ser discutido a partir da observação da massificação dos conflitos, pelo aumento da complexidade das relações que se estabelecem na sociedade, assim como o aumento do número de pessoas convivendo juntas. Com isso, notou-se a necessidade de utilização de instrumentos eficazes que pudessem tutelar os direitos dos cidadãos, especialmente dos trabalhadores, já que o Ministério Público não se faz suficiente para atender a demandas deste segmento. Assim, observam-se os direitos transindividuais, que consistem em interesses difusos, coletivos e, especialmente, individuais homogêneos; ainda, na Justiça do Trabalho, existe uma discussão controversa a respeito da legitimidade do sindicato quanto a sua capacidade e possibilidade de defender a categoria em casos de processo, como substituto processual (LORA, 2012).

A substituição processual no contexto do trabalho, até a Constituição Federal de 1988 somente poderia ser adotada em casos de ação de cumprimento, ação de cobrança de adicional por periculosidade ou insalubridade ou então ações para o pagamento de diferenças originadas de reajustes salariais, nestes casos o sindicato poderia substituir seus associados. A partir da Constituição de 1988, houveram algumas modificações que tiveram como objetivo fortalecer os direitos sindicais e aumentar as possibilidades de atuação do sindicato como substituto processual, bem como ampliou a possibilidade do sindicato substituir não apenas seus associados (AUGUSTO, 2014).

No âmbito do direito brasileiro, o sindicato possui algumas funções muito importantes dentro do contexto trabalhista que tem relação com sua atuação enquanto representante e defensor dos interesses e direitos coletivos; assim, os sindicatos possuem a obrigação de tutelar os direitos dos trabalhadores de sua categoria para sua atuação econômica, social e política dentro do país. A concepção de uma coletividade neste sentido tem se desenvolvido pelas transformações sociais que tem afetado as relações de trabalho (SANTOS, 2010).

Conforme apresenta Rezende Filho (2009), é importante salientar que houve uma necessidade de mudanças no modelo sindical, para evitar que os trabalhadores sejam substituídos por uma entidade despreparada ou desinteressada; assim, o fortalecimento destas entidades foi um processo necessário para que a substituição processual pudesse ser adotada em larga escala. A substituição processual pelo sindicato não surtiria o efeito desejado caso a entidade coloque os seus próprios interesses acima do interesse dos trabalhadores que seriam representados (REZENDE FILHO, 2009).

Além disso, esta ferramenta tem importante papel no acesso dos trabalhadores à justiça, visto que com um número elevado de processos, a Justiça do Trabalho não pode oferecer uma solução rápida e justa, pois a demora de anos para a solução de um processo não seria considerado algo justo para o trabalhador. Assim, a possibilidade de realizar processos coletivos pode desafogar o sistema jurídico, permitindo uma resposta mais rápida e eficaz (REZENDE FILHO, 2009).

Desta forma,

Dentro de suas características próprias, entende-se que a substituição processual trabalhista corresponde a um dos mais legítimos meios de coletivização das ações. Através de ações propostas pelos sindicatos substitutos, desde que devidamente representativos, economizam-se dezenas de processos que seriam promovidos pelos empregados substituídos individualmente. Outra não é a opinião de Carlos Henrique Bezerra Leite, para quem “no âmbito da jurisdição civil coletiva ou jurisdição trabalhista metaindividual o estudo da substituição processual revela-se extremamente importante, especificamente na temática dos interesses ou direitos individuais homogêneos”. Através da substituição, portanto, pode-se incrementar o acesso à justiça, vez que haverá diminuição do número de processos com consequente agilização no procedimento, sempre observadas as particularidades necessárias ao procedimento (REZENDE FILHO, 2009, p. 10).

Assim, o sindicato possui certo poder, o que o torna um órgão responsável por guardar os interesses sociais e, por conta de seus aspectos de estruturação institucional democrática, sua obrigação é de defender o direito social e democrático que lhe confere poder. A partir desta compreensão, os sindicatos passaram a ser os principais representantes de toda a categoria, sendo também responsável pelos processos oriundos de reclamações que representem o direito de todos estes trabalhadores (SANTOS, 2010).

2.4.1 Direitos transindividuais

Ao final da Segunda Guerra Mundial, a legislação brasileira foi modificada quanto aos diretos fundamentais, seguindo uma tendência europeia, a partir da qual foram adicionados os direitos ao meio ambiente, direito à cultura, entre outros. A observação de tais mudanças permitiu identificar que não apenas os direitos individuais foram contemplados, como por exemplo o direito à vida, a liberdade e a privacidade, mas também os direitos transindividuais, que consideram a coletividade. A necessidade de se considerar a dimensão transindividual se evidenciava a partir da observação das características da sociedade moderna, que foi se tornando mais complexa, assim como as relações que se estabelecem nela (SILVA, 2017).

Assim, as discussões do campo jurídico deixaram de contemplar apenas os aspectos individuais, passando a alcançar os moldes coletivos, abrangendo inclusive a proteção jurídica à direitos que não podem ser atribuídos a nenhum sujeito, de forma individual. A partir deste entendimento, o processo enquanto uma importante ferramenta jurídica, também precisou se modificar para se adequar as novas demandas e compreensões da sociedade, de forma que o acesso à justiça pudesse ser garantido a todos, e que todos os direitos pudessem ser respeitados (REZENDE FILHO, 2009).

Desta forma, compreende-se que a origem dos direitos transindividuais tem relação com o reconhecimento e proteção de direitos como a educação, segurança, saúde, meio ambiente, e outros, considerados fluidos, que pertencem a todos os cidadãos que compõem a sociedade. É possível afirmar que são direitos que se situam entre os interesses público e privado pois apesar de não serem estatais, eles são referentes a um grupo de pessoas, vão além do caráter individual (OLIVEIRA, 2012).

O que caracteriza os direitos transindividuais não é apenas o fato de serem compartilhados por vários titulares individuais reunidos pela mesma relação fática ou jurídica, mas também pela necessidade de substituir o acesso individual à justiça por um acesso coletivo, solucionando o conflito adequadamente e evitando insegurança jurídica(OLIVEIRA, 2012, p. 4).

Nesta ótica, os titulares dos direitos não mais poderiam ser identificados apenas de forma individual, assim como a defesa desses direitos coletivos precisaria ser realizada a partir da intervenção do Estado ou então um órgão que representasse a classe. Tais direitos foram previstos pelo artigo 81, da Lei nº 8.009/90 do Código de Direito do Consumidor, sendo classificados em três categorias distintas: os direitos coletivos em sentido estrito, os direitos difusos e os direitos individuais homogêneos (SILVA, 2017).

De acordo com Silva (2017), os direitos coletivos em sentido estrito se tratam daqueles de natureza individual, indivisível, porém comuns a determinada classe ou grupo de pessoas que possam ser reunidos pela mesma relação jurídica, ou seja, pode ser um grupo de pessoas que assinaram algum tipo de contrato que tenha alguma irregularidade. Conforme Lora (2012), direitos e interesses coletivos no sentido lato abrangem todas as espécies de interesses da categoria transindividuais, ou seja, difusos, coletivos em sentido estrito e individuais homogêneos.

Lora (2012, p. 73) cita exemplo de interesse coletivo no contexto trabalhista:

(…) o dos trabalhadores de determinada empresa de desfrutarem de ambiente de trabalho salubre e seguro. A transindividualidade emerge demonstrada na medida em que esse grupo de trabalhadores objetiva a eliminação dos riscos a vida, a saúde e a segurança. O objeto e indivisível, pois a eliminação dos riscos beneficiara a todos, sem distinção. Os trabalhadores estão ligados entre si (são membros da mesma categoria) e com a empresa (com ela mantém vinculo de emprego) por meio de uma relação juridica-base.

Os direitos difusos são aqueles nos quais não é possível determinar os sujeitos, que existe a indivisibilidade do objetivo, conflito intenso e duração passageira, se tratam dos direitos que não afetam em caráter institucional, mas afetam uma certa coletividade, sendo fluidos e dispersos. Pela indeterminação dos sujeitos, entende-se que não existe vínculo jurídico que unifique os sujeitos afetados, de forma que estes apenas se unem por conta de circunstâncias ocasionais. Desta forma, interesses ou direitos difusos tem grande relação com o que é subjetivo, indeterminado, se tratam de interesses fragmentados, coletivos. (SILVA, 2017; LORA, 2012).

Lora (2012, p. 72) apresenta um exemplo de interesse difuso no contexto do trabalho:

(…) na exigência de as empresas com mais de cem empregados preencherem de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas (art. 93 da Lei no 8.213/1991). O objeto e indivisível, pois a garantia estabelecida pela lei alcança indistintamente todas as pessoas portadoras de deficiência. Os sujeitos são indeterminados e indetermináveis, na medida em que não há entre eles e as empresas potenciais empregadoras relação jurídica-base. O que une os beneficiários da norma e o fato de serem reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas.

Os direitos coletivos se diferem dos direitos difusos uma vez que, no âmbito do interesse coletivo, existe a presença de uma relação jurídica-base entre os titulares (LORA, 2012).

Por fim os direitos individuais homogêneos são aqueles que tem alguma identidade e homogeneidade, assim, seus titulares podem buscar de forma individual a tutela judicial. De acordo com o art. 81 do Código de Defesa do Consumidor, os interesses individuais homogêneos têm relação com uma origem comum, é possível determinar os titulares e o objeto pode ser dividido uma vez que as reparações das lesões sofridas nestes casos podem ser apuradas de forma individual. Interesse individual e interesse individual homogêneo se diferem pela existência de homogeneidade e origem comum no caso do homogêneo, o que permite que haja uma tutela coletiva e evita a multiplicação de ações com o mesmo intuito (SILVA, 2017; LORA, 2012).

Como exemplo de interesse individual homogêneo, Lora (2012, p. 74) coloca:

(…) pode-se citar o dos empregados de uma determinada empresa, com setores diversos, expostos a agentes nocivos no ambiente de trabalho, a receber o adicional de insalubridade, que não e pago pela empregadora. A causa comum e a omissão ilegal da empregadora, o que faz nascer para cada um dos trabalhadores o direito individual ao pagamento do adicional de insalubridade, cujos valores, contudo, são divisíveis e variáveis, conforme o grau da insalubridade que venha a ser apurado nos diversos departamentos e as eventuais diferentes bases de cálculo, em razão do entendimento jurisprudencial consubstanciado na Súmula no 17 do Tribunal Superior do Trabalho.

Assim, é possível compreender as categorias de direitos transindividuais que permeiam as relações trabalhistas e a busca dos trabalhadores por seus direitos, dando base para a compreensão dos aspectos da substituição processual neste contexto.

2.4.2 Aspectos da substituição processual pelo sindicato na defesa dos direitos dos trabalhadores

Quando a lei permite, de forma legal, que alguém ou uma entidade defenda em seu próprio nome o direito alheio, compreende-se que se trata de uma substituição processual, conforme foi apresentado; isso pode ocorrer em situações de defesa dos interesses individuais homogêneos,

Se a legitimação legal para agir ocorrer para a defesa de direitos de pessoas indeterminadas (direitos difusos e coletivos), não há a figura da substituição processual e sim legitimação autônoma para a condução do processo. Diz-se autônoma porque independe do direito material discutido em juízo, na medida em que, não tendo os direitos difusos e coletivos titulares determinados, o legislador escolheu alguém ou algumas entidades para que os defendam em juízo (LORA, 2012, p. 76).

É importante saber que a substituição processual trabalhista possui características específicas, portanto, difere-se da substituição processual no âmbito no processo civil. A diferenciação se dá, principalmente porque no âmbito do trabalho, a substituição não precisa ser determinada por alguma relação entre o direito que se defende e o substituto. Assim, no campo do processo civil, existem dois importantes aspectos para que tal ferramenta possa ser adotada:

(a) Aquele em que a existência do direito subjetivo material do substituído depende da existência de um direito do substituto;
(b) aquele em que da inexistência de um direto do substituído depende a existência de obrigação do substituto (MARQUES, 1962, P. 228).

Assim, ocorre a diferenciação uma vez que se compreende que a substituição processual sindical não depende de nenhuma relação jurídica entre o órgão e os empregados. Portanto, a substituição processual sindical não pode ser observada a partir do entendimento da substituição processual civil (REZENDE FILHO, 2009).

No contexto do Direito do Trabalho, muitos foram os dispositivos legais que validaram a substituição processual pelo sindicato, como exemplifica Lora(2012, p.77):

a) a ação de cumprimento de sentença normativa prevista no parágrafo único do art. 872 da Consolidação das Leis do Trabalho;
b) a permissão conferida ao sindicato pelo art. 195, § 2o, da Consolidação das Leis do Trabalho para pleitear o pagamento de adicional de insalubridade e/ou periculosidade em nome dos integrantes da categoria;
c) a possibilidade prevista no art. 25 da Lei do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (Lei no 8.036/1990) de o sindicato acionar a empresa, por intermédio da Justiça do Trabalho, para compeli-la a efetuar o deposito das importâncias devidas nos termos dessa lei;
d) a ação de cumprimento de convenções coletivas de trabalho ou acordos coletivos de trabalho mencionada na Lei no 8.984/1995.

O que muito se observa no contexto trabalhista são os trabalhadores suportando situações abusivas sem buscar por seus direitos enquanto o contrato de trabalho se encontra ativo, somente se movendo neste sentido quando o contrato expira; isso ocorre porque ainda que as denúncias sejam feitas e forma embasada contra alguma irregularidade, o trabalhador poderá perder seu emprego como reação da empresa à abertura de um processo. Esse é um dos principais motivos pelos quais é importante que o sindicato tenha o poder de exercer de forma livre a substituição processual, representando os trabalhadores lesados, garantindo a estes seus direitos de forma justa. Entende-se, portanto, que, como o sindicato é a parte processual, ele quem irá atuar em juízo de forma a não permitir que exista o risco para o trabalhador de entrar em alguma “lista negra” (LORA, 2012; AUGUSTO, 2014).

Assim, a atuação dos sindicatos como substitutos na defesa dos direitos dos trabalhadores acaba se afastando da Justiça dos desempregados, uma vez que não é mais necessário esperar pela extinção do contrato de trabalho para que estes indivíduos busquem seus direitos, podendo ser feito durante o vínculo. Isso se dá porque, conforme já mencionado, em grande maioria dos casos, o empregado não se manifesta por seus direitos enquanto o vínculo empregatício está válido, com medo de perder seu emprego; o objetivo do empregado é de manter seu emprego e, somente depois, quando não existe mais risco, ele buscar por seus direitos. Destarte, com os sindicatos atuando como substitutos processuais, existe uma garantia dos direitos destes trabalhadores enquanto seus vínculos estão ativos, sem a necessidade de que estes esperem pelo fim do contrato (AUGUSTO, 2014).

Assim, Eça (2007), aponta que trabalhadores e empregadores podem exercer os seus direitos de forma direta, pois permanecem na qualidade de titulares, entretanto, quando se tratam de direitos transindividuais, cujos titulares sejam pessoas que integram uma categoria, o sindicato pode e deve atuar como o substituto processual. Assim, a legitimação extraordinária não contempla apenas os direitos trabalhistas strictu sensu, mas também outros como aqueles ligados à saúde, proteção e bem-estar dos trabalhadores.

Outro ponto importante da atuação dos sindicatos como substitutos processuais é a determinação mais rápida de uma solução para o caso, pois, um processo coletivo evita que vários processos sejam abertos para a mesma causa, por diferentes pessoas, sendo possível que uma ação resolva vários conflitos. Além disso, permite que decisões uniformes sejam tomadas, evitando decisões contraditórias ou que possam gerar injustiças (AUGUSTO, 2014).

É interessante compreender os limites de atuação do substituto uma vez que ocorre, de fato, a substituição processual. Conforme apontamentos de Eça (2007) e Fernandes (2011), não é permitido que o substituto realize atos de disposição de direitos, como por exemplo, a renúncia ao crédito, desistência do crédito, transacionar acerca dele, assim, estes atos somente poderão ser realizados com a expressa autorização dos substituídos; não é permitido que ele reconvenha, conforme art. 315 do CPC. De acordo com Fernandes (2011), na posição de substituto processual, este pode propor ação executiva em nome daqueles que substitui, sem que haja a necessidade de autorização até a fase de crédito, então nesta fase, para que haja levantamento de crédito, é preciso a autorização. A conciliação, por sua vez, deve ser incentivada, sendo este dos principais elementos da Justiça do Trabalho de forma que sua busca é o principal objetivo nos processos.

A necessidade de outorga de poderes especiais para a prática de atos de disposição de direito constitui, pois, uma limitação iminente ao próprio instituto da substituição processual – seja em ações coletivas, seja em ações individuais –, porque o substituto é “parte” apenas pelo prisma processual, não sendo“parte” pelo prisma material, substantivo. O substituto processual não pode dispor livremente do direito do substituído, como se fora seu, porque não é titular do direito material, mas apenas da prerrogativa de defendê-lo processualmente. O substituto processual é parte meramente processual (ou formal), e não parte material (ou substantiva) (FERNANDES, 2011, p. 3).

É importante que, quando o sindicato assume uma posição de substituto processual, tenha um senso de oportunidade e conveniência ao tentar alguma reconciliação, ressaltando que a controvérsia precisa ser caracterizada por rés dúbia, pois ele não pode renunciar os direitos das pessoas que compõem a categoria que substitui.

O autor complementa:

Essa perspicácia deve mesmo ser a tônica da performance sindical, pois em sua inestimável missão institucional jamais pode o sindicato oferecer ao integrante da categoria menos do que ele obteria ajuizando a demanda diretamente, ou seja, suportando diretamente os ônus econômicos, físicos e emocionais para o manejo de uma postulação judicial em face de seu empregador (EÇA, 2007, p. 222).

Uma das questões que gera certa discussão a respeito do tema é a possibilidade de substituição processual sindical para apenas um trabalhador, e não em nome de toda a categoria. O que se compreende, conforme aponta Augusto (2014) é que a doutrina é contra essa possibilidade, indicando que não é interessante ampliar a interpretação do conceito de forma a abarcar o que não faz parte de seu entendimento legítimo, ou seja “a forma processual pela qual o sindicato atua em juízo na defesa dos interesses e direitos individuais de seus representados”, conforme Nascimento (2010, p. 487). O trabalhador que se encontra em situação de desentendimento com o empregador, em caráter individual pode utilizar outros meios para resolver seus conflitos, sem que haja a necessidade de amparo do sindicato (PINTO, 2005).

Entretanto, nem todos são contra esta possibilidade, sendo que alguns tribunais têm admitido este tipo de substituição:

SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL – ÚNICO TRABALHADOR. Para a defesa de um único trabalhador em juízo, poderá o sindicato apresentar-se como assistente e/ou substituto processual, uma vez que não há na lei qualquer restrição para tanto, não cabendo ao intérprete distinguir aonde a lei não distingue. Assim, embora seja recomendável que, existindo um único trabalhador, o sindicato ajuíze a ação em nome do titular do suposto direito, apresentando-se como seu assistente, não há no ordenamento jurídico qualquer restrição impeditiva para que o sindicato se apresente como substituto processual de um único trabalhador, como ocorreu na hipótese. Na realidade, a substituição processual pelo sindicato, de trabalhadores lesados, pode abranger um conjunto que seja inclusive unitário, pois não é o número de substituídos que fixa a natureza da forma de se postular em juízo, mas o título a que se postula. Carência de ação rejeitada. Revista parcialmente conhecida e não provida. (TST – RR:5555113519995085555 555511-35.1999.5.08.5555, Relator: Ives Gandra Martins Filho, Data de Julgamento: 02/05/2001, 4ª Turma, Data de Publicação: DJ 24/05/2001).

Assim, nota-se que não existe um total entendimento quanto a essa questão, mas, conforme a interpretação de Augusto (2014), a doutrina tem caminhado no sentido de não aceitar tal substituição, pois uma vez que a legislação menciona os direitos individuais da categoria, conforme disposto no art. 8º, III da Constituição Federal, não se refere aos direitos individuais, se apenas um empregado, mas sim, nos direitos individuais homogêneos.

Não é apenas o sindicato que pode atuar como substituto de uma categoria, podendo outros órgãos atuar da mesma maneira desde que se relacionem com a natureza da pretensão formulada, respeitando os princípios de legitimidade ad causam.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A vivência do ser humano sempre esteve intimamente relacionada com a realização do trabalho, desde o início de sua existência. Conforme as sociedades foram se desenvolvendo e se modificando, as relações de trabalho também foram sendo modificadas, passando por diversas transformações como a mão de obra escrava, a servidão, o surgimento das corporações, a Revolução Industrial e o trabalho assalariado.

O surgimento do Direito do Trabalho foi consequência do desenvolvimento do trabalho assalariado, no qual os donos das empresas ditavam as regras para seus funcionários sem levar em conta seu bem-estar ou sua segurança; assim, o Direito do Trabalho é uma consequência de uma questão social com o intuito de preservar os direitos dos trabalhadores (SILVA, 2018).

Desta forma, o Estado passou a atuar como um instrumento de justiça social que poderia intervir quanto aos interesses coletivos a fim de equilibrar o cenário econômico com o bem-estar e a segurança da classe trabalhadora. Esta atuação do Estado também teve que se modificar a fim de se adequar as mudanças posteriores da sociedade que afetariam as relações entre as pessoas; especialmente no que diz respeito ao desenvolvimento das sociedades de massa, os conflitos sociais se intensificaram, trazendo a necessidade de modificar as formas como o Estado poderia intervir frente aos problemas que surgiam na sociedade. Assim, a tutela do Estado com relação aos direitos dos trabalhadores passou a ser individual passando a agir num plano coletivo, dando origem ao que se conhece como tutela dos direitos transindividuais (SILVA, 2018; LORA, 2012).

As mudanças no campo do processo são inegavelmente necessárias, por conta das mudanças sociais e da coletivização dos conflitos jurídicos, pois a necessidade de pacificação precisa ser atendida para manter a o funcionamento da sociedade. Quando se percebe que as ferramentas existentes são inadequadas ou insuficientes par atender as demandas sociais, surge a necessidade de adaptar ou criar novas ferramentas (REZENDE FILHO, 2009).

A defesa dos direitos transindividuais tem um especial valor no âmbito do trabalho pois tem sido importante para a defesa dos direitos dos trabalhadores de determinadas classes, ampliando suas possibilidades, considerando o sindicato como um órgão capaz de atuar em defesa dessas classes, sem comprometer os trabalhadores em sua atuação. O presente trabalho considerou o sindicato enquanto substituto processual, abordando as características desta ferramenta jurídica e a atuação sindical neste âmbito (LORA, 2012).

O mecanismo de substituição processual se caracteriza pela possibilidade de um terceiro ir a juízo em nome próprio com o objetivo de defender os direitos de uma outra pessoa; este tipo de ação tem aspectos peculiares e é importante que não se confunda com a representação ou a sucessão, conforme aponta. A possibilidade do sindicato agir como substituto processual teve início com as modificações que surgiram com a Constituição de 1988, que tinha o objetivo de ampliar as possibilidades do sindicato (AUGUSTO, 2014).

A substituição processual sindical possui suas próprias características, o que a diferencia da substituição processual no âmbito civil, sendo que neste contexto é preciso que haja a comunhão de interesses jurídicos entre a parte substituída e o substituto; no âmbito do trabalho, não é necessária a existência deste compartilhamento de interesses (REZENDE FILHO, 2009).

Foi possível observar que esta ampliação foi muito importante para os trabalhadores, uma vez que se observa um grande número de trabalhadores que atuam sob condições precárias e que muitas vezes ferem seus direitos deixam de ir atrás destes direitos por medo de perder seu emprego. Assim, uma das maiores vantagens da substituição processual sindical é que o trabalhador não mais precisa abrir um processo em casos de desrespeito aos seus direitos, pois o sindicato tem este poder de substituí-lo. Isso trouxe uma grande vantagem aos trabalhadores que não mais precisam esperar pelo término do contrato de trabalho para buscar os seus direitos (LORA, 2012; AUGUSTO, 2014).

É importante ressaltar que a substituição processual sindical se dá no âmbito coletivo, não sendo muito bem aceita a possibilidade de que isso ocorra para a defesa de um trabalhador, individualmente, conforme os apontamentos de Nascimento (2010). Para defesa dos direitos e interesses no âmbito individual, o funcionário pode recorrer a outras ferramentas, não sendo necessário o emprego do sindicato enquanto substituto processual.

Outra importante vantagem verificada, que se relaciona com o caráter de processo coletivo, é a agilidade na resolução de problemas e conflitos no âmbito do trabalho, afinal a abertura de um processo coletivo evita que vários processos sejam abertos pelo mesmo motivo, por vários trabalhadores. Isso garante uma maior agilidade, além de garantir que as decisões tomadas afetem de forma igual a todos, evitando possíveis injustiças (AUGUSTO, 2014).

Conclui-se, portanto, que a substituição processual sindical se trata de uma importante ferramenta no contexto dos direitos trabalhistas, sendo uma grande conquista para os trabalhadores. Entretanto, conforme visto, a sociedade está em constante transformação assim como as relações de trabalho, o que implica na necessidade de estudar sobre as possibilidades de adaptações e modificações nesta ferramenta de forma que ela se torne melhor e adaptada à realidade, para que possa atender as demandas que surgem dos conflitos atuais. Neste sentido, sugere-se que sejam realizadas novas pesquisas no âmbito das relações de trabalho, direito do trabalho e a ferramenta de substituição processual no contexto trabalhista a fim de identificar importantes pontos que possam servir como base para futuras mudanças positivas.

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