OSTEONECROSE DE MANDÍBULA RELACIONADA A TRATAMENTO MEDICAMENTOSO

OSTEONECROSIS OF THE JAW RELATED TO DRUG TREATMENT

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7701726


Débora Martins de Moura Lopes¹
Bárbara Fernanda Nunes de Albuquerque Soares²
Gerciano Monteiro de Carvalho³
Anderson Dilly de Medeiros⁴
Eleniza Rodrigues Mororó⁵
Aquila de Oliveira Afonso⁶
Lucas Pires da Silva⁷
Nathalia Silva Béda⁸
Marciele Gomes dos Santos⁹
Alexandre Moura Leite¹⁰
Moises João de Oliveira¹¹
Isabella Costa Hebach¹²
Daniel Cardeal Ramos¹³
Leonardo dos Santos Dias¹⁴
Ana Gabriela Reis Arouca¹⁵
Laís dos Reis de Lacerda¹⁶
Geovani Carvalho de Jesus¹⁷
Evanio da Silva¹⁸


RESUMO

Este estudo objetivou revisar a literatura acerca da osteonecrose mandibular relacionada a tratamento medicamentoso, abordando os métodos de diagnóstico, bem como os protocolos de prevenção e tratamento dessa doença. Para a construção deste artigo foi realizado um levantamento bibliográfico nas bases de dados SciVerse Scopus, Scientific Eletronic Library Online (Scielo), U.S. National Library of Medicine (PUBMED) e ScienceDirect, com auxílio do gerenciador de referências Mendeley. Os artigos foram contemplados entre os anos de 2010 a 2023. Embora a ocorrência de osteonecrose mandibular relacinada a tratamento medicamentoso seja rara, ela apresenta-se como uma complicação grave. Está principalmente associado ao uso de amino-bifosfonatos mais potentes por longos períodos de tempo. Os tratamentos odontológicos invasivos, tais como cirurgias orais, são os fatores de risco com maior recorrência. Diante disso, é importante afirmar a responsabilidade que os profissionais, sobretudo médicos e cirurgiões-dentistas, possuem acerca da compreensão de sua etiologia e tratamento.

Palavras-chave: Drogas antirreabsortivas; Bisfosfonatos; Denozumabe; Osteonecrose dos maxilares relacionada com medicamentos; Osteorradionecrose dos maxilares.

SUMMARY

This study aimed to review the literature on mandibular osteonecrosis related to drug treatment, addressing diagnostic methods, as well as prevention and treatment protocols for this disease. For the construction of this article, a bibliographical survey was carried out in the databases SciVerse Scopus, Scientific Electronic Library Online (Scielo), U.S. National Library of Medicine (PUBMED) and ScienceDirect, with the help of the Mendeley reference manager. The articles were contemplated between the years 2010 to 2023. Although the occurrence of mandibular osteonecrosis related to drug treatment is rare, it presents itself as a serious complication. It is mainly associated with the use of more potent amino bisphosphonates for long periods of time. Invasive dental treatments, such as oral surgeries, are the risk factors with the highest recurrence rate. In view of this, it is important to affirm the responsibility that professionals, especially physicians and dentists, have regarding the understanding of its etiology and treatment.

Keywords: Antiresorptive drugs; Bisphosphonates; Denozumab; Drug-related osteonecrosis of the jaws; Osteoradionecrosis of the jaws.

1. INTRODUÇÃO

Os bisfosfonatos (BPs) são usados ​​terapeuticamente para prevenir complicações ósseas, tais como mieloma múltiplo e câncer ósseo metastático. Além disso, previne a reabsorção óssea no tratamento da osteoporose. O BP atua inibindo a atividade dos osteoclastos que normalmente é responsável pela reabsorção óssea (ŞAHIN et al., 2022).

Em estudos recentes, medicamentos antirreabsortivos e antiangiogênicos (por exemplo, denosumabe, bevacizumabe e sunitinibe) além dos bisfosfonatos foram relatados como causadores de osteonecrose da mandíbula relacionada aos bisfosfonatos (OMRB). O uso de drogas antirreabsortivas (ARDs) preocupa muitas especialidades, seja em relação à sua prescrição para osteoporose ou câncer, seja em relação ao tratamento de seus efeitos colaterais (DEBIÈVE et al., 2023; ŞAHIN et al., 2022). 

Em 2014, a Associação Americana de Cirurgiões Orais e Maxilo-Faciais deu a seguinte definição de OMRB: Tratamento atual ou anterior com agentes antirreabsortivos ou antiangiogênicos, Osso exposto ou osso que pode ser sondado através de uma fístula intraoral ou extraoral na região maxilofacial que persiste por mais de 8 semanas; sem história de radioterapia nos maxilares ou doença metastática óbvia nos maxilares (MOVAHEDIAN ATTAR et al., 2020).

A má saúde bucal tem sido relatada com um fator de risco para OMRB, portanto, um efeito de interação entre infecção bacteriana e drogas ósseas epecíficas (DOEs) poderia explicar por que a mandíbula é afetada. No entanto, poucos estudos investigaram se os DOEs também estão associados à osteonecrose de outros sítios (também conhecida como necrose avascular), e esses estudos mostraram resultados conflitantes.  Dado o uso generalizado de DOEs e o fato de que a osteonecrose de outros sítios esqueléticos é muito mais comum (BROZOSKI et al., 2012)

A Osteonecrose mandibular a sua prevenção desempenha um papel de grande e crescente importância, não só na Qualidade de Vida dos pacientes, mas também no processo de tomada de decisão da maioria dos médicos dentistas e cirurgiões-dentistas, envolvidos todos os dias na prevenção OMRB (primária e secundária) (DRAGO et al., 2020). Nesse sentido, este estudo objetivou revisar a literatura acerca da osteonecrose mandibular relacionada a tratamento medicamentoso, abordando os métodos de diagnóstico, bem como os protocolos de prevenção e tratamento dessa doença.

2. METODOLOGIA

Trata-se de uma revisão narrativa da literatura. A revisão de literatura permite a busca aprofundada dentro de diversos autores e referenciais sobre um tema específico, nesse caso, osteonecrose de mandíbula relacionada ao uso de medicamentos, sua prevenção e tratamento (PEREIRA et al., 2018)

Para a construção deste artigo foi realizado um levantamento bibliográfico nas bases de dados SciVerse Scopus, Scientific Eletronic Library Online (Scielo), U.S. National Library of Medicine (PUBMED) e ScienceDirect, com auxílio do gerenciador de referências Mendeley. Os artigos foram contemplados entre os anos de 2010 a 2022.

A estratégia de pesquisa desenvolvida para identificar os artigos incluídos e avaliados para este estudo baseou-se nos descritores contidos na lista dos Descritores em Ciência da Saúde (DeCS) e suas combinações no idioma português e inglês: [(bisfostonatos OR Bisphosphonate) AND (odontologia OR dentistry OR cirurgias OR surgeries OR cirurgias dento-alveolares OR dento-alveolar surgeries OR mandíblar OR jaw OR maxila) AND (osteonecrose OR osteonecrosis).

Considerou-se como critério de inclusão os artigos completos disponíveis na íntegra nas bases de dados citadas, nos idiomas inglês e português e relacionados com o objetivo deste estudo. Os critérios de exclusão foram artigos incompletos, duplicados, resenhas, estudos in vitro e resumos.

A estratégia de pesquisa baseou-se na leitura dos títulos para encontrar estudos que investigassem a temática da pesquisa. Caso contemplasse esse primeiro objetivo, posteriormente, os resumos eram lidos e, persistindo na inclusão, era feita a leitura do artigo completo. Quando havia dúvida sobre a inclusão, o artigo era lido por outro autor e, a decisão de inclusão ou exclusão era tomada em consenso.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com base na revisão de literatura feita nas bases de dados eletrônicas citadas, foram identificados 877 artigos científicos, dos quais 280 estavam duplicados com dois ou mais índices. Após a leitura e análise do título e resumos dos demais artigos outros 520 foram excluídos. Assim, 87 artigos foram lidos na integra e, com base nos critérios de inclusão e exclusão, apenas 11 artigos foram selecionados para compor este estudo. O fluxograma com detalhamento de todas as etapas de seleção está na figura 1.

Figura 1 – Fluxograma de identificação e seleção dos estudos.

Fonte: os autores, 2022.

3.1. Critério de diagnóstico

Para diagnosticar pacientes com OMRB, os pacientes devem ser atendidos: (1) manejo prévio ou contínuo com medicamentos antirreabsortivos ou antiangiogênicos; (2) osso visível ou uma fístula profunda no osso que continuou por mais de oito semanas e; (3) sem histórico de radioterapia na região maxilofacial (BARBOSA; SIMONATO, 2022; MAYLAND et al., 2022).

O diagnóstico é realizado, majoritariamente, pela análise clínica, identificando um ou mais locais com exposição de tecido ósseo. Além disso, o profissional deve estar ciente que esses locais podem permanecer assintomáticos por longos períodos de tempo ou sinais e sintomas clínicos podem se manifestar antes do desenvolvimento de OMRB clinicamente detectável (MAYLAND et al., 2022; RICE et al., 2015).

Os pacientes sintomáticos relatam, na maioria das vezes a presença de sintomatologia dolorosa, edema ósseo e/ou gengival, eritema, supuração, ulceração de partes moles, trajetos fistulosos intra ou extrabucais, mobilidade dentária, parestesia e até mesmo anestesia, na ausência de causa dentária/periodontal aparente (CAMPISI et al., 2020; SVEJDA et al., 2016).

Pela análise radiográfica, é possível notar desde radiotransparência ou radiopacidade variável até a ausência de sinais radiológicos. Na ausência de exposição óssea, esses achados por si só não foram considerados suficientes para diagnosticar OMRB (CAMPISI et al., 2020). Com relação a apresentação clínica, a AAOMS define a OMRB em quatro estágios, a partir de suas manifestações clínicas (Quadro 1).

Quadro 1 – Estadiamento da Osteonecrose dos Maxilares Relacionada a Bisfosfonatos. Baseado nas recomendações da American Association of Oral & Maxillofacial Surgeons.

Fonte: Traduzido de McLeod et al. (2012).

3.2. Tratamento

O tratamento não cirúrgico da BRONJ visa melhorar o estágio da doença e evitar sua progressão. As opções não cirúrgicas incluem o uso de enxaguatórios bucais antimicrobianos , desinfecção/limpeza local de osso exposto e fístulas , controle da dor e administração de antibióticos e suporte nutricional quando necessário (GAVALDÁ; BAGÁN, 2016; SAWATARI; MARX, 2007). 

Em caso de exposição óssea, o desbridamento da superfície pode ajudar a reduzir bordas afiadas e atenuar a irritação dos tecidos moles. Mesmo nos casos em que a cirurgia é indicada, o manejo não cirúrgico antes e depois da cirurgia (ou seja, no período perioperatório) é fundamental. Como a cirurgia não é indicada para todos os pacientes com OMRB, mais pesquisas são necessárias para identificar os métodos não cirúrgicos mais apropriados (GAVALDÁ; BAGÁN, 2016; MCLEOD; BRENNAN; RUGGIERO, 2012). 

A cicatrização após o tratamento de OMRB é determinada pela evidência clínica de cobertura estável da mucosa oral, um critério utilizado pela grande maioria dos ensaios cirúrgicos. No entanto, a cobertura da mucosa oral não reflete necessariamente a ausência de osso necrótico. Embora vários estudos evidenciar que um período de acompanhamento clínico de 6 meses seja suficiente para confirmar a cura há evidências crescentes de que algumas BRONJ podem recorrer 1 ano ou mais após a conclusão da cirurgia (GAVALDÁ; BAGÁN, 2016). . As estratégias de tratamento de acordo com cada estágio da OMRB são resumidas na Quadro 2.

Tabela 2 – Estratégias de tratamento por estágio de MRONJ (classificação AOMS)

Fonte: Traduzido de Campisi et al. (2020)

3.3. Prevenção

O risco de desenvolver OMRB deve ser minimizado tanto quanto possível. Em primeiro lugar, é necessário aumentar a conscientização sobre a OMRB nas comunidades médica e odontológica para prevenir a doença. Inicialmente, é importante equilibrar o risco da doença com o benefício potencial desse tratamento (usando denosumabe ou BP) sobre a saúde óssea do paciente (ŞAHIN et al., 2022).

Medidas preventivas são obrigatórias para reduzir a riscos do ONM. É crucial evitar traumas ósseos e prevenir e tratar todas as infecções dentárias antes do denosumab ou Terapia de BP quando possível. Higiene oral, educação paciente o atendimento odontológico correto é primordial na prevenção de osteonecrose dos maxilares. Apesar disso, não há consenso na literatura acerca da efetividade do protocolo profilático em pacientes indicados para exodontia que fazem uso de BPs (CONTALDO et al., 2020; ŞAHIN et al., 2022).

Vários estudos recentes relataram que a infecção é um evento chave no desenvolvimento de OMRB, e que o controle extensivo da infecção antes do tratamento odontológico invasivo reduz o risco de BRONJ. Se necessário, o tratamento dentário adequado deve ser fornecido com base na avaliação dos achados orais, e os pacientes com OMRB devem ser aconselhados sobre a importância dos cuidados bucais preventivos (ou seja, remoção da placa dentária supra e subgengival, raspagem, alisamento radicular) e mantendo uma boa higiene bucal. A higiene bucal ideal requer motivação apropriada, ferramentas adequadas e instrução profissional (CONTALDO et al., 2020; ŞAHIN et al., 2022).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Embora a ocorrência de osteonecrose mandibular relacinada a tratamento medicamentoso seja rara, ela apresenta-se como uma complicação grave. Está principalmente associado ao uso de amino-bifosfonatos mais potentes por longos períodos de tempo.

Os tratamentos odontológicos invasivos, tais como cirurgias orais, são os fatores de risco com maior recorrência. Diante disso, é importante afirmar a responsabilidade que os profissionais, sobretudo médicos e cirurgiões-dentistas, possuem acerca da compreensão de sua etiologia e tratamento.

REFERÊNCIAS

BARBOSA, C. R.; SIMONATO, L. E. Manejo Terapêutico E Preventivo Da Osteorradionecrose. Revista Ibero-Americana de Humanidades, Ciências e Educação, v. 8, n. 4, p. 1893–1904, 2022.

BROZOSKI, M. A. et al. Osteonecrose maxilar associada ao uso de bisfosfonatos. Revista Brasileira de Reumatologia, v. 52, n. 2, p. 265–270, 2012.

CAMPISI, G. et al. Medication-Related Osteonecrosis of Jaws (MRONJ) Prevention and Diagnosis:  Italian Consensus Update 2020. International journal of environmental research and public health, ago. 2020.

CONTALDO, M. et al. Bisphosphonate-related osteonecrosis of the jaws and dental surgery procedures in children and young people with osteogenesis imperfecta: A systematic review. Journal of Stomatology, Oral and Maxillofacial Surgery, v. 121, n. 5, p. 556–562, 2020.

DEBIÈVE, M. et al. Medication-related osteonecrosis of the jaw, a risk to reassess in osteoporotic patients. Journal of Stomatology, Oral and Maxillofacial Surgery, v. 124, n. 1,  Supplement, p. 101316, 2023.

DRAGO, E. S. et al. OSTEONECROSIS OF THE JAWS ASSOCIATED WITH THE USE OF BISPHOSPHONATES. Oral Surgery, Oral Medicine, Oral Pathology and Oral Radiology, v. 130, n. 3, p. e261, 2020.

GAVALDÁ, C.; BAGÁN, J.-V. Concept, diagnosis and classification of bisphosphonate-associated osteonecrosis  of the jaws. A review of the literature. Medicina oral, patologia oral y cirugia bucal, v. 21, n. 3, p. e260-70, maio 2016.

MAYLAND, E. et al. Impact of preoperative and intraoperative management on outcomes in  osteoradionecrosis requiring free flap reconstruction. Head & neck, v. 44, n. 3, p. 698–709, mar. 2022.

MCLEOD, N. M. H.; BRENNAN, P. A.; RUGGIERO, S. L. Bisphosphonate osteonecrosis of the jaw: A historical and contemporary review. The Surgeon, v. 10, n. 1, p. 36–42, 2012.

MOVAHEDIAN ATTAR, B. et al. Protective effects of resveratrol against osteonecrosis at the extraction site in bisphosphonate-treated rats. International Journal of Oral and Maxillofacial Surgery, v. 49, n. 11, p. 1518–1522, 2020.

PEREIRA, A. et al. Método Qualitativo, Quantitativo ou Quali-Quanti. [s.l: s.n.].

RICE, N. et al. The management of osteoradionecrosis of the jaws–a review. The surgeon : journal of the Royal Colleges of Surgeons of Edinburgh and Ireland, v. 13, n. 2, p. 101–109, abr. 2015.

ŞAHIN, O. et al. Combined approach to treatment of advanced stages of medication-related osteonecrosis of the jaw patients. Brazilian Journal of Otorhinolaryngology, v. 88, n. 4, p. 613–620, 2022.

SAWATARI, Y.; MARX, R. E. Bisphosphonates and bisphosphonate induced osteonecrosis. Oral and maxillofacial surgery clinics of North America, v. 19, n. 4, p. 487–98,  v– vi, nov. 2007. SVEJDA, B. et al. [Position paper on medication-related osteonecrosis of the jaw (MRONJ)]. Wiener medizinische Wochenschrift (1946), v. 166, n. 1–2, p. 68–74, fev. 2016.


¹https://orcid.org/0000-0002-1859-3508
²https://orcid.org/0000-0002-3558-7548
³https://orcid.org/0000-0001-6477-7474
⁴https://orcid.org/0000-0002-1147-2754
⁵https://orcid.org/0000-0002-0782-0875
⁶https://orcid.org/0000-0003-2392-4022
⁷https://lattes.cnpq.br/6506318264056253
⁸http://lattes.cnpq.br/9473708023564725
⁹https://orcid.org/000-0001-8781-4856
¹⁰https://orcid.org/0000 0003 2567 1700
¹¹https://orcid.org/0000-0002-7663-761X
¹²http://lattes.cnpq.br/3659760577143029
¹³https://orcid.org/0000-0003-2734-6450
¹⁴https://orcid.org/0000-0001-8715-953X
¹⁵http://lattes.cnpq.br/9513433013537263
¹⁶laisreis.1990@gmail.com
¹⁷https://orcid.org/0000-0003-4936-5636
¹⁸https://orcid.org/0000-0001-9836-8484